Rússia está ganhando a guerra e os EUA cometendo haraquiri, por Marcus Atalla

A Rússia descobriu que não precisa de dólares como lastro para a taxa de câmbio do rublo e seu banco central pode criar os rublos necessários para financiar a formação de capital.

Rússia está ganhando a guerra e os EUA cometendo haraquiri

por Marcus Atalla

Agora, já está claro que o conflito Rússia e Ucrânia, não se trata de uma guerra entre os dois países vizinhos. É uma guerra do império decadente tentando se manter hegemônico. Também ficou visível que as sanções viriam de qualquer maneira, o conflito foi apenas um subterfúgio para impô-las.

Há analistas crendo que os EUA estão sendo bem-sucedido e a estratégia de Biden foi genial, pois sem dar um único tiro, criou uma russofobia e o afastamento da Rússia e Europa, através do controle dos aparelhos ideológicos ocidentais, das redes sociais à imprensa corporativa. O jornal GGN publicou um artigo mostrando outros pontos de vista, baseados na imprensa oriental. [leia aqui]. Mais fatos e agora analistas ocidentais surgem concordando com a imprensa oriental. A estratégia estadunidense não está sendo um tiro no pé, está sendo um haraquiri.

O economista norte-americano e pesquisador do Levy Econimics Institute do Bard College, Michael Hudson escreveu um duro artigo (08/03) sobre esse haraquiri estadunidense, o qual arrasta a Inglaterra junto: “O Império Americano se autodestrói. Mas ninguém pensou que isso aconteceria tão rápido”.

Para Hudson, a maior arma dos EUA sempre foi o poder do dólar, o Sistema de Bretton Woods. Através dele, os EUA puderam impor políticas neoliberais ao resto do mundo, sem usar diretamente sua força militar. Porém, as sanções impostas por Washington aos outros países, que já ocorrem há alguns anos, não apenas o fez perder oportunidades como aos seus aliados.

A recente escalada das sanções dos EUA que bloqueiam a Europa, a Ásia e outros países do comércio e investimento com a Rússia, Irã e China, impôs enormes custos de oportunidade – o custo das oportunidades perdidas – aos aliados dos EUA. E o confisco do ouro das reservas estrangeiras da Venezuela, Afeganistão e agora da Rússia, somado ao roubo de contas bancárias de estrangeiros ricos (O governo norte-americano está confiscando o dinheiro dos magnatas russos) acabou com a ideia de que o dólar, ativos em libras esterlinas e o euros fossem um porto seguro.

Hudson expressou desapontamento, pois, acreditava que a desdolarização da economia mundial seria forçada pela China, Rússia e demais nações reféns dos EUA. Mas para ele, é pior, pois quem está forçando a desdolarização são os EUA. E isso está ocorrendo muito rápido, as sanções estão tendo o mesmo efeito do que teriam tarifas alfandegárias, ou seja, pouco.

As sanções estadunidenses estão deixando um mercado interno russo vazio, uma grande oportunidade para os que irão o preencher. A Rússia descobriu que não precisa de dólares como lastro para a taxa de câmbio do rublo e seu banco central pode criar os rublos necessários para financiar a formação de capital. Abandonará a filosofia monetária neoliberal, em favor da Teoria Monetária Moderna (MMT), como Sergei Glaziev defende. E tem mais: 

“A diplomacia dos EUA esfregou o nariz da Europa em sua abjeta subserviência ao dizer a seus governos para que suas empresas despejem seus ativos russos por centavos de dólar, depois que as reservas estrangeiras da Rússia foram bloqueadas e a taxa de câmbio do rublo despencou. Blackstone, Goldman Sachs e outros investidores americanos agiram rapidamente para comprar o que a Shell Oil e outras empresas estrangeiras descarregaram.”

Quando os Estados vassalos europeus perceberem que só perderam nesse conflito, o confronto será a defesa de uma ruptura entre a União Europeia e os EUA, feita por políticos europeus nacionalistas. Vários observadores apontaram o que iria acontecer. Putin e Lavrov avisou qual seria a resposta se a OTAN insistisse em encurralá-los. Os neocons no controle da política externa dos EUA não se importaram.  As autoridades europeias foram surpreendidas pelo ressurgimento do ódio visceral à Rússia, através do secretário de Estado Blinken e Victoria Nuland-Kagan.

O que os países estrangeiros não fizeram por si; substituir o FMI, o Banco Mundial e outros braços fortes da diplomacia estadunidense; os políticos americanos os obrigaram a fazer, como fazem com a Rússia e a China. O aperto de preços de energia e alimentos está atingindo os países do Sul Global, coincidindo com seus próprios problemas de Covid-19 e o iminente serviço da dívida dolarizada que está chegando. Como as economias dos EUA e da Europa lidarão com as sanções contra as importações de gás e petróleo russos, cobalto, alumínio, paládio e outros materiais básicos.

Já existe uma desconexão entre a realidade do setor financeiro e da grande mídia da OTAN. Os mercados de ações da Europa caíram em sua abertura na segunda-feira, 7 de março, enquanto o petróleo Brent subiu para US$ 130 o barril. O noticiário da manhã “Today” da BBC apresentou o deputado conservador Alan Duncan, um comerciante de petróleo, alertando que a quase duplicação dos preços dos futuros de gás natural ameaçava falir empresas comprometidas em fornecer gás à Europa às taxas antigas.

Enquanto isso, a BBC continuou aplaudindo os bravos combatentes ucranianos e os políticos da OTAN pedindo mais apoio militar. Em Nova York, o Dow Jones Industrial Average caiu 650 pontos, e o ouro disparou para mais de US$ 2.000 a onça – refletindo a visão do setor financeiro de como o jogo dos EUA provavelmente se desenrolará.

Tentar forçar a Rússia a responder militarmente e, assim, parecer ruim para o resto do mundo está se tornando uma manobra destinada simplesmente para garantir que a Europa contribua mais para a OTAN, compre mais equipamentos militares dos EUA e se aprofunde na dependência comercial e monetária dos Estados Unidos. Logo, os europeus verão os EUA tão ameaçadores quanto a Rússia pode lhes parecer agora. [artigo].

Medidas e fatos não mostrados pela imprensa Otan, mas que corroboram com Hudson

No dia 7, a televisão turca, Haber noticiou que no dia anterior, o presidente turco, Erdogan telefonou ao Putin propondo manter o comércio bilateral, os quais poderiam ser liquidados em rublos, ouro e renminbi chinês. Além disso, Erdogan também mencionou que existem atualmente cerca de 30 navios carregados com sementes de girassol e trigo encalhados no Mar de Azov, e esses navios são destinados à Turquia. Putin aceitou a proposta e disse que instruiria navios relevantes a cruzar a fronteira.

No dia 9, a subsecretária de Estado para Assuntos Políticos dos EUA, a neocon, Victoria Nuland, disse acreditar que o projeto do gasoduto Nord Stream 2 está atualmente “morto” e é improvável que seja “revivido”. [Brasil 247]. Mas no dia anterior (8), os EUA anunciaram que não iriam impor aos aliados a proibição das importações de petróleo e energia da Rússia, disse a secretária de Energia dos EUA, Jennifer Granholm. [Brasil 247]. Isso é falso, a Alemanha se rebelou e não aceitou a imposição, restando aos EUA criaram sua própria versão dos fatos, para assim, esconder a ruptura entre si e seus vassalos europeus, Alemanha e França.

Alemanha pretende continuar comprando petróleo e gás da Rússia

A imprensa russa especializada em economia e negócios, Expert.ru, informou no dia 9. Sergey Manukov escreveu:  Até a ministra das Relações Exteriores da Alemanha, Annalena Berbock foi forçada a admitir que, se Berlim seguisse os Estados Unidos e a Grã-Bretanha proibindo as importações de energia da Rússia, no dia seguinte haveria um colapso. O Olaf Scholtz foi forçado a anunciar com relutância sua recusa em aderir ao embargo EUA-Britânico ao petróleo russo, gás e carvão. Olaf Scholz deixou claro que a maior economia da Europa não pretende fazer mais sacrifícios energéticos. A Europa removeu deliberadamente os suprimentos de energia russos da lista de sanções “, disse ele em comunicado. —  Agora a Europa não pode de outra forma (exceto com ajuda da Rússia) garantir a produção de energia para aquecimento, movimento, geração de eletricidade e necessidades industriais, e são vitais para a prestação de serviços públicos e para o dia a dia dos nossos cidadãos.”[Experte.ru].

Borrell: UE não vai proibir importações de energia da Rússia

Ainda dia 9, kommersant.ru noticiou que o chefe da diplomacia europeia Josep Borrell disse, no ar ao canal de TV Al Jazeera, que a União Europeia não pretende proibir a importação de fontes de energia russa, assim como fez os EUA. No entanto, procuraremos outras fontes de gás alternativo. [kommersant.ru].

Yuan e rupia substituirão dólar e euro na Rússia

Dia 9, Nikolai Ivashov editor do departamento de negócios Expert.ru escreveu: A partir de hoje, o VTB Bank forneceu aos russos a oportunidade de abrir depósitos em yuan. Agora os russos podem investir na moeda chinesa acessível com uma taxa máxima de 8% ao ano.Outros bancos estão se preparando para fazer o mesmo. Analistas cambiais observam a baixa volatilidade da moeda chinesa em relação ao dólar e sua estabilidade, o que hoje aumenta a atratividade desse tipo de investimento. Parece que os depósitos de RMB estão se tornando uma tendência de mercado.

Leonid Krutakov, professor associado da Universidade Financeira, diz que a Rússia não deve ter uma dependência do RMB chinês, como se fez com o dólar, e deve-se usar também a rupia indiana. Krutakov expressou a visão dos russos ao dizer que no quadro do sistema monetário ocidental, o ambiente institucional do Ocidente, mostrou-nos que não há espaço para crescimento e desenvolvimento. Eles simplesmente confiscaram as economias que ganhamos dentro da estrutura desse modelo. É limitado em todos os aspectos. Foi realizado um roubo franco. [aqui].

(Parte do comércio entre a Índia e Rússia é feito pelo SPFS, substituto russo aos SWIFT. Além disso, o primeiro-ministro indiano Narendra Modi foi um dos que se ofereceram para servir como mediador entre a Rússia e ocidente. Isso demonstra haver uma relação de interesses mútuos entre a Rússia e Índia).

O The Clockwork Orange Times, veículo grego, publicou que em substituição ao Master Card e Visa, houve a adoção do UnionPay e JCB japonês. Segundo a matéria “este será o início da desintegração da hegemonia do dólar”. [UnionPay: A China colocou à disposição dos bancos russos a segunda maior rede global de cartões de crédito e que mais cresce. E o Japão os cartões JCB].

É cedo para afirmar quem ganhará essa guerra, mas a Rússia não está sozinha, e muitos países veem tudo isso como uma grande oportunidade econômica.  Se o objetivo dos EUA era manter a hegemonia, está dando errado, gradualmente, estão destruindo sua maior arma, o poder do dólar. O que definirá quem irá vencer será quantos países e empresas aproveitaram para se libertar dos grilhões do dólar.

Marcus Atalla – Graduação em Imagem e Som – UFSCAR, graduação em Direito – USF. Especialização em Jornalismo – FDA, especialização em Jornalismo Investigativo – FMU

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN

Redação

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