Rui Daher
Rui Daher - administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor
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O dia em que Chico Buarque errou, por Rui Daher

Não creio que seus olhos verdes verteram lágrimas. Nem que seu intelecto admitiu ruins suas música e poética, já transmutadas à eternidade da cultura popular brasileira.

Acervo Nara Leão

O dia em que Chico Buarque errou, por Rui Daher

Alguns anos atrás, o compositor, cantor, escritor Chico Buarque de Holanda precisou das redes sociais para saber que não era a tão comentada unanimidade no Brasil.

Não creio que seus olhos verdes verteram lágrimas. Nem que seu intelecto admitiu ruins suas música e poética, já transmutadas à eternidade da cultura popular brasileira.

Pode, e se não o fez, deveria logo ter jogado o ego desgostoso às suas claras posições políticas. Talvez, o resultado das eleições presidenciais de 2018 possa ter sedimentado em Chico dúvidas e certezas.

Hoje em dia, planeta e Brasil patrocinam movimentos identitários que proíbem produtores de cultura e cidadãos comuns de afrontarem segmentos da população não adequados às maiorias brancas ocidentais, principalmente, aqueles que em diferentes intensidade e crueldade foram vitimizados por dominação, colonização e imperialismo.

Ou não? Sim. Vá você, retireiro de leite, que mora numa casinha à luz de lampião e velas em um hectare de latifúndio no semiárido nordestino, num barraco vizinho de um bar de chacina do complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, taipas ao lado de esgoto a céu aberto que margeiam as magníficas e bem pedagiadas estradas paulistas ou, mesmo, formado na USP e morando nos guetos de luxo paulistanos, dirigir-se a um desses grupos estigmatizados e fodidos pela história ou maldade humana como “japinha”, “negão”, “gostosa”, “judeuzinho”, “turco da 25”, “baiano”, “gordão”, “carcamano”, “viadinho”, “sapatona”.

O cardápio é vasto e o revide imediato. E não é que, diante disso, o Chico arregou.

E olhem, saudosos leitores e leitoras deste há oito meses imóvel blogueiro, não estou seguindo o ensaísta baiano Antônio Risério. Detestei e não concordo com seu artigo para a Folha de São Paulo (19/01/22), “Racismo de negros contra brancos ganha forças com identitarismo”.

Simplesmente, por não estar dando porra nenhuma de força a esse neologismo americanófilo.

Língua e literatura portuguesas e suas variantes e gírias brasileiras ou lusófonas são fortes o bastante para deixar o papo rolar livre. Viu mano, parça, tá ligado, chapa, mina (obrigado, Emicida).

Pois então. E não é justamente Chico que vem e cai nessa esparrela, ao anunciar que, a pedido de mulheres (quais?) não irá mais cantar “Com Açúcar, Com Afeto” (1967) por ser uma canção machista?

Na época a própria Nara pediu que Chico compusesse para ela “uma música de mulher sofredora”.

Ele fez. A seguir seu “arrependimento”, metade do cancioneiro brasileiro que fala de mulheres sofredoras teria que ser banida da cultura popular. Não só. De homens sofredores também.

O País se embrutece e emburrece. Há pouco tempo, certa cantora sertaneja, falecida em acidente aéreo, foi aclamada como a “Rainha da Sofrência”, pois defendia ser ela quem decidia amor e sexo em motéis de limitado luxo e canções de pequena extração sertaneja de raiz.

O que Chico comete é, antes de tudo, um desrespeito com Nara Leão, que estaria completando 80 anos de idade (ver documentário). No mais, um atentado contra tudo o que se escreveu na língua portuguesa, fossem em prosa ou poesia, realidade ou ficção.

E se não mudar de ideia e a cervical permitir, volto a falar da “Sofrência” feminina. Mas a de Elza Soares.

Inté!

Rui Daher – administrador, consultor em desenvolvimento agrícola e escritor

Este texto não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

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12 Comentários

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  1. Definitivamente, eu vejo Com Açúcar Com Afeto como uma letra de temática feminista. Sempre a vi muito mais como um ponto de vista crítico de Chico à opressão que obriga a submissão feminina do que como uma aceitação dessa submissão. Está muito mais próxima da denúncia do que da apologia, como assim também estão, por exemplo, Mulheres de Atenas ou Geni e o Zepelim. A exposição de uma situação degradante não significa necessariamente que o autor concorde com ela. Não se confunda literatura com leitura literal!!! Por outro lado, depois de tantas décadas de serviços prestados à sensibilidade humana e à delicadeza nacional, aspectos que definham a passos largos em nossa precária atualidade, é bizarro que haja pessoas que considerem razoável meter o bedelho naquilo que Chico Buarque de Holanda queira ou não queira cantar da obra que ele próprio criou, ou mesmo do juízo que faça de qualquer uma de suas maravilhosas músicas. Resumindo: deixem de encher o saco do cara, e vamos nos ocupar de questões mais relevantes. Já deu uma pancada no Guedes ou no Queiroga hoje?
    (Texto do compositor Sérgio Santos)

  2. Muito bom te ler de novo por aqui, seu Rui.
    A pauta idenitária é manipulação para pegar trouxa. Enquanto se dá importância a isso ao largo passa o roubo ao Brasil, os mortos pela Covid, a multidão de desempregados, o exército de moradores de rua.
    E ficamos réfens de regras emanadas do exterior que nos obrigam dizer: todes,
    Todes??? Tenha a paciência.
    -Ei Chico, cante agora aquela do açúcar

  3. Se essa música for machista então Chico terá de criar um longo Index de suas composições “machistas” para bani-las porque ele compôs muitas, uma melhor que a outra, com a temática da mulher submissa e sofrida.

  4. Desde de pequenininha sou superfa dessa gente talentosa. Fico triste por Chico ter decidido aceitar a pressão, sei lá de quem,pq eu não me sinto ofendida pela letra da música. Vou ouvi-la e enquanto viver, amando Chico sempre.

  5. Olha a ditadura do politicamente correto é uma cópia do modo norte americana de se fazer politica. Que as oligarquias brasileiras sejas truculentas, ignorantes, aculturadas e submissas as narrativas de fora país, sobretudo aos EUA não é novidade. Agora esse discurso a-histórico, neo-liberal, patrulesco e autoritário que assumi a esquerda feministas”que leu a orelha dos livros da Silvia Federici com uma leitura distorcida do que realmente é central para superação do patriarcado. E direcionam luta pela lógica de costumes e normatividade do campo do preconceito burguês e para isso negam a história e as formas que a produção cultural no Brasil foi composta. O negacionismo tem sua vertente nessa formas de lutas identitárias , a saber a negação da história e do patrimônio cultural da civilizações . Esse ato de enquadrar a vida e a cultura Brasileira à preceitos de uma forma fragmentada é um forma de luta anti dialética.
    Esse modo de fazer política dever ter razão e seu espaço nos EUA. Pode ser até seja justa e uma forma importante para a resistência do povo norte americano frente o conservadorismo fundamentalista e os resquício do MARCATISMO , Mas aqui no Brasil é preciso respeitar a sociologia e antropologia cultural brasileira é preciso entender estudar e apropriar-se dela, Vejam bem não estou dizendo aceitar a discriminação de modo passivo, mas parte fundamental é compreender a se reconhecer na contradição.dialética do povo brasileiro que é distinto das lutas nos EUA. Essa estupida, patrulesca e fascista ação de recriminar peças artísticas pode ser comparada a queima de livros pelo nazistas. Não passa de um idealismo estupido. Precisamos parar de copiar e reproduzir proponho que se estude mais Chico e o seu pai o Sérgio Buarque apropriar da nossa cultura nos libertará. E meu lugar de fala é o mundo enquanto tiver opressão a luta pela liberdade é humana.

  6. Ninguém é perfeito, é verdade. Mas eu nasci com um estranho defeito chamado sinceridade… (L. L. Santos)

    Ninguém é perfeito. Há sempre um lado imperfeito para todos. (Finn Christie)

    Acredito que após ser alertado sobre um possível teor machista, identificado na letra da música “Com açúcar e com afeto” quase 42 anos depois, Chico, talvez mais incomodado com o patrulhamento que fazem a ele, a seu pensamento e as suas ações, possivelmente concordou e se sensibilizou além da conta. Daí (quem sabe?), começou a sentir-se incomodado com o recente incomodo que ele próprio quis absorver e alimentar. Imagino que certamente ele tenha suas dúvidas sobre o que sente, visto que ele nunca se mostrou como um machista. Na música, a arte também é interpretativa, dúbia e fantasiosa. Porém, ela só se torna agressiva ou reprovável se for por decisão da parte autora e Chico nunca se enquadrou nesse perfil, mesmo em suas ácidas composições de protesto. Ninguém é perfeito e Chico tem o direito de ser compreendido, ainda que seja uma decisão pessoal e sincera.

  7. Algumas partes de seu texto são difíceis de entender e não sei se pela forma, pelo conteúdo ou pelos dois ao mesmo tempo. E explico: o leitor fica sem saber exatamente qual é o seu ponto de vista sobre determinados temas. Se certo obscurantismo for de propósito, peço desculpa. Senão, dá uma revisadinha, por favor!

  8. Voltei para dar um exemplo do que comentei no post anterior. Abre aspas: Não creio que seus olhos verdes verteram lágrimas. Nem que seu intelecto admitiu ruins suas música e poética, já transmutadas à eternidade da cultura popular brasileira. Pode, e se não o fez, deveria logo ter jogado o ego desgostoso às suas claras posições políticas. Talvez, o resultado das eleições presidenciais de 2018 possa ter sedimentado em Chico dúvidas e certezas.

    O QUE VOCÊ QUIS DIZER COM ISSO? NADA?!
    OBRIGADO!

  9. O que Chico comete é, antes de tudo, um desrespeito com Nara Leão, que estaria completando 80 anos de idade (ver documentário). ISSO É TÃO DOIDO. Como você sabe que a própria Nara, se viva estivesse, também não se desgostasse da canção sob eventual luz feminista? Argumento espantalho que chama? Ademais, o autor é Chico, Não Nara. (Vou explicar para não tentar imitar o seu texto que não explica nada: a responsabilidade do que é dito na música é de Chico e não de Nara. No máximo, Chico estaria desrespeitando a si mesmo mais jovem). De modo que falar em desrespeito para com ela chega a ser bizarro, no que há de pior na acepção deste palavra.

  10. A Patrulha da Gestapo Ideologica não se aguenta. Ela morde o próprio rabo !!! Está na sua genética, desde os Centros de Tortura e Polícia Politica de Filinto Muller comandado pelo Ditador Fascista Getulio Vargas e Nepotismo de Familiares Canalhas Tancredo Neves, Jango, Alzira Vargas, Leonel Brizola,…É o lobo que esconde o pelo mas não esconde o vício. Vício de nascença. O menino rico, branco, com berço e sobrenome, de olhos claros, vitorioso na meritocracia decorrente de seu talento, agora quer se enquadrar no Politicamente Correto? Chico, do alto da sua fortuna bilionária, agora também se declare um AntiCapitalista contra esta Burguesia Opressora!!!! Seria cômico se não fosse trágico. Como chegamos até aqui depois de 92 anos? Pobre país rico. Mas de muito fácil explicação.

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