O Jornalismo entendeu a crise ecoclimática?
Ao longo deste ano de 2024, os pesquisadores do Observatório do Jornalismo Ambiental, ligado ao Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental (GPJA) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), produziram uma série de artigos críticos com foco na atuação da imprensa diante das questões climáticas. Foram 46 textos – contando com este, que finaliza o ano – com diversas abordagens e reflexões. A relação de títulos, com os respectivos links, está mais abaixo. É uma ótima sugestão de leitura de férias para quem ainda não leu e quer ter um panorama sobre como o jornalismo brasileiro tem se relacionado com a realidade ambiental e com seus públicos neste período.
Abrir um texto, já no título, com uma pergunta é uma opção que pode ser até interpretada como uma irresponsabilidade, ainda mais quando a resposta tende a não ser totalmente conclusiva. Nesse caso, é possível que alguém considere haver até uma certa prepotência do escritor, que carece de dados de uma pesquisa ampla, caso haja a pretensão de respondê-la. Já adianto aqui que não tenho essa intenção, mas que também não é uma pergunta retórica. Trata-se de uma inquietação que me parece importante compartilhar com leitores que talvez possam ajudar a elucidá-la ou a ampliar a reflexão sobre o tema.
Além de uma questão de difícil conclusão, fica claro que tenciono com um possível neologismo. Entendo, particularmente, que a crise climática que estamos vivenciando tem ligação direta com o descaso ecológico a partir do qual a sociedade está indicando o rumo a seguir. O clima não está mudando só por pressão extraterrena – como, por exemplo, devido à intensa atividade do Sol – e pela propalada ciclicidade das mudanças climáticas. Existe, como já identificado pela ciência há algumas décadas, uma forte influência das atividades humanas. Essas atividades, a exemplo da mineração de carvão e extração de petróleo, causam impactos ambientais e estão no início de processos de geração de poluentes climáticos. Os problemas, que vão muito além disso, se somam e se retroalimentam em uma escalada ecocida de difícil recuperação.
Daí a ideia de que a crise não é só climática nem só ecológica, mas sim a soma dessas duas dimensões diretamente interligadas, sem desconsiderar ainda outras possíveis camadas que incidem sobre esse ponto. Sim, o tema é complexo e, por isso, exige abordagens à altura. O jornalismo é capaz de fazer isso, mas, para tanto, precisa fazer valer suas melhores características. Cabe ressaltar ainda que o jornalismo é feito por humanos, uma das espécies que integra a biodiversidade da Terra. A amplitude do olhar, a empatia, a ética, o desprendimento e os sentidos de precaução e prevenção precisam estar presentes, cooperando com a boa prática do fazer jornalístico.
O percurso de pesquisas acadêmicas sobre Jornalismo Ambiental, com mais de 15 anos de dedicação ao tema no âmbito do GPJA, tem apontado caminhos significativos. Os pressupostos desse jornalismo engajado com as pautas de defesa da vida apontam para a relevância da contextualização correta, da visão sistêmica, da mudança de pensamento, da antecipação dos riscos – o princípio da precaução. Isso tudo buscando a desnaturalização da visão hegemônica sobre os fatos e a aproximação com os interesses da cidadania e da ecologia enquanto condição necessária à manutenção da vida no planeta.
Se 2023 foi o ano mais quente já registrado na história humana, 2024 está na fila pedindo passagem. Os dados de temperatura máxima e média deste ano ainda não estavam consolidados no momento da publicação deste texto, mas o saldo de eventos climáticos extremos, amplamente noticiados, já davam indícios de que a crise climática não pode mais ser negada e precisa ser enfrentada com urgência.
O jornalismo é obrigado a noticiar catástrofes, contar mortes e contabilizar prejuízos, mas não deve se ater a isso. Não é mais possível reduzir manchetes e reportagens climáticas a meras notas de pé de página. A pauta ganhou espaço nas redações. Mas como isso está sendo feito e que impactos tem gerado na população? Encerro com isso, com mais uma pergunta para te propor buscar respostas na produção deste ano do nosso grupo. Insira seus comentários. Os links seguem abaixo. Boa leitura e um ótimo final de ano! Que 2025 seja bem melhor!
Heverton Lacerda é jornalista, especialista em Ciências Humanas: Sociologia, História e Filosofia, mestrando em Comunicação Social, integrante do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental (UFRGS/CNPq) e presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (AGAPAN).
O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected]. O artigo será publicado se atender aos critérios do Jornal GGN.
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