Áudios sobre tortura e declarações de Mourão levantam debate sobre revogação da Lei da Anistia

Sociólogo Marcelo Coelho afirmou que “o acordo está rompido” e que “quem se vangloria dos próprios crimes não pode contar com a impunidade”

Foto: Agência PT

O escândalo causado pelo vazamento de áudios nos quais membros do STM (Supremo Tribunal Militar) fazem comentários jocosos sobre as torturas realizadas durante a Ditadura Militar (1964-1985) continua gerando reações na opinião pública.

Nos áudios, entre outras coisas, os magistrados comentam sobre diferentes métodos de tortura utilizados durante o período, incluindo até o caso de uma presa política que estava grávida e que acabou sofrendo um aborto devido às torturas recebidas.

Segundo o sociólogo Marcelo Coelho, o caso deveria iniciar um debate sobre a necessidade de se revogar a Lei de Anistia, imposta ainda durante a ditadura, durante o governo de João Figueiredo (1979-1985).

“Em 1979, a anistia garantiu impunidade aos torturadores e assassinos da ditadura militar. Foi uma solução negociada, dentro das condições políticas da época. Procurava-se acelerar o processo de democratização, que só se completaria, cerca de dez anos depois, com a nova Constituição e as eleições diretas para presidente”, comentou o acadêmico, em sua coluna no UOL.

Em seguida, ele afirma que “aquele acordo, hoje em dia, está rompido. Quando o então deputado federal Jair Bolsonaro declarou seu voto pelo impeachment de Dilma Rousseff, homenageando o animal que a torturara, ficou nítido que o país entrava em nova fase”.

Os comentários recentes do vice-presidente Hamilton Mourão, justificando e ironizando a relevância dos áudios, também foram parte da argumentação de Coelho.

“Os militares e seus capachos, até então, tinham vergonha do que fizeram; ou, pelo menos, fingiam ter. Quando se falava em tortura, negavam que tivessem algo a ver com o que acontecera; fizeram de tudo para impedir e atrapalhar os trabalhos da Comissão da Verdade (…) Bolsonaro e seus seguidores mudaram completamente o modo de tratar esse assunto. Eles próprios elogiam os torturadores, enaltecem os assassinos. O país passou a ouvir frases como a de que a ditadura devia ter matado 30 mil, e não só 3.000 pessoas. Brilhante Ustra foi chamado ‘herói nacional’”, analisou o colunista.

Ao concluir, Coelho defendeu que “a divulgação das fitas com as conversas do STM sobre tortura a presos políticos só se fez depois de vencida uma luta de anos contra a desobediência da própria instituição. Espero que represente o início de uma fase de resistência ativa aos que pretendem impor, não mais o esquecimento, mas a ressurreição de um passado de selvageria”.

“Quem não se arrepende não merece perdão. Quem se vangloria dos próprios crimes não pode contar com a impunidade que é, hoje, um convite a repeti-los. Revogar a Lei da Anistia não é mais uma questão de remexer o passado. É uma imposição, com vistas ao futuro que desejamos ter”, completou.

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Redação

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