A saída da Ford do Brasil, por André Nassif

Os países asiáticos (China, em especial) vetam os setores estratégicos ao capital estrangeiro e, nos demais casos, negociam (quando não exigem) transferência de tecnologia, seja via contrato, seja via joint ventures.

A saída da Ford do Brasil

por André Nassif

em seu blog

A saída definitiva das operações da Ford no Brasil (ver link no final do texto) mostra, pelo menos, três lições, que podem ser estendidas aos mecanismos com que o governo brasileiro trata o capital estrangeiro, desde JK:
1) É um erro histórico tratar o investimento externo direto, especialmente o efetivado por multinacionais, apenas do ponto de vista quantitativo, sem negociar (exigir é demais, porque pode causar problemas na Organização Mundial do Comércio) qualquer tipo de contrapartida em termos de compromissos de transferência de tecnologia para empresas locais. O Brasil é uma espécie de casa da mãe Joana, para onde as multinacionais podem ir para qualquer setor, região etc, sem qualquer compromisso de longo prazo com spillovers tecnológicos. Os países asiáticos (China, em especial) vetam os setores estratégicos ao capital estrangeiro e, nos demais casos, negociam (quando não exigem) transferência de tecnologia, seja via contrato, seja via joint ventures.
2) Não adianta imaginar que multinacionais cuja produção dependa de gigantescas economias de escala (como é caso da indústria automobilística) ficarão no país à custa de incentivos fiscais ou subsídios diretos. Elas dependem de vendas, seja para os mercados interno, externo ou ambos! Dada a enorme rivalidade oligopolística em nível global, só o mercado interno, por maior que seja potencialmente o mercado brasileiro, não segura todas as empresas em operação no Brasil, posto que, tendo que fracionar o mercado, muitas acabarão operando com custos médios de longo prazo acima dos compatíveis com a escala mínima eficiente, de tal sorte que, numa crise mais prolongada, vão-se embora sem qualquer piedade. Aliás, a pergunta que não quer calar: como é possível explicar tantas empresas operando no Brasil (VW, Fiat, Honda, GM, etc etc etc), onde o crescimento da demanda ficou estacionado (em média) desde o início dos anos 2000? Simples assim: como todas mantêm preços muito elevados (em setor em que a competição não depende de preços, mas de diferenciação de produtos, podem-se dar a esse luxo, mas só até certo ponto), as mais eficientes operam com lucros mais altos que as menos eficientes. Só que essa festa tem um limite. Numa crise prolongada em que a demanda cai demasiadamente, algumas têm de sair do mercado. Foi o que aconteceu com a Ford. E outras poderão ir pelo menos caminho.
3) E, last, but not the least, o Congresso Nacional nunca, nunquinha deveria ter efetivado a mudança (se não me engano, sob FHC) que permitiu que o BNDES passasse a conceder linhas de financiamento a empresas de capital estrangeiro (não confundir com obras no exterior em que são financiadas empresas de capital nacional). Não se trata aqui de xenofobia, mas de realismo: tais empresas têm acesso direto a financiamento externo e, se o país oferecer perspectiva de crescimento econômico, elas farão das tripas coração para conseguir recursos para financiar seus investimentos.
Em suma: crescimento econômico potencial (logo oportunidades de lucro futuro) é o melhor subsídio para reter empresas estrangeiras que já estão aqui, e atrair empresas que não estão. Mas o governo deveria rever com cuidado a questão histórica não resolvida, e criar mecanismos para transferência de tecnologia.
Redação

1 Comentário

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  1. “…estendidas aos mecanismos com que o governo brasileiro trata o capital estrangeiro, desde JK:
    É um erro histórico tratar o investimento externo direto, especialmente o efetivado por multinacionais, apenas do ponto de vista quantitativo,…O Brasil é uma espécie de casa da mãe Joana,..” Me perdoe, mas desde JK é nada !!! Desde GV. ‘Baixamos as calças’ para interesses e empresas norteamericanas, abrimos nossos Aeroportos para o Pato Donald e a Floresta Amazônica para a BioPirataria desta mesma FORD. Inventamos MultiNacionais Européías de Pneus e Borracha a partir dos nossos Biomas e Politicas Medíocres pós 1930. E inacreditavelmente ainda endeusamos tanto o Fascista quanto seu Lacaio até os dias de hoje. É a Pátria da Surrealidade !! Industrialização Tardia com “Indústrias são para a Bélgica” e 50 em 5. Realmente 50 anos de lucros e parasitismo em apenas 5 anos de governo lacaio de JK. Estava certo. O resultado? Esta FORD e todos outros Parasitas MultiNacionais que nos assolam nestes 90 anos. Parabéns a todos Nós Brasileiros. Incrível. Pobre país rico. Por que será? Como conseguimos? Mas de muito fácil explicação.

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