Câmara, Senado e STF enquadram Bolsonaro, por Luis Nassif

Bolsonaro admitiu a montagem de uma comissão de alto nível para conduzir a política de saúde. Mas só da boca para fora. Na reuniões que precedeu o anúncio público do pacto, Bolsonaro insistiu em todas as suas teses - sem lockdown, com tratamento alternativo.

O quadro político atual é o seguinte:

A pandemia bateu nas 300.685 mortes.

Bolsonaro está preso ao seguinte dilema. Os desastres na condução da pandemia o isolaram em relação a todos os poderes – do Supremo ao empresarial, das Forças Armadas ao Congresso. Seu único trunfo são os seguidores.

Segundo seu filho Eduardo Bolsonaro, as tentativas de induzi-lo a ser minimamente racional, no fundo, seria uma forma de afastá-lo de suas bases e esvazia-lo de qualquer trunfo político. Essa é a razão principal para manter a defesa dos tratamentos alternativos e de combater o lockdown – apesar das principais instituições científicas brasileiras recomendaram lockdown total de 14 dias, para enfrentar a crise hospitalar gigantesca.

Pressionado por todos os lados,  Bolsonaro admitiu a montagem de uma comissão de alto nível para conduzir a política de saúde. Mas só da boca para fora. Na reuniões que precedeu o anúncio público do pacto, Bolsonaro insistiu em todas as suas teses – sem lockdown, com tratamento alternativo.

Fez mais. Deixou de fora governadores de Estado, passando para o presidente do Senado, Rodrigo a incumbência de ser o porta-voz dos estados. Esqueceu a Frente Nacional dos Prefeitos. Comprometeu, de saída, o novo Ministro da Saúde, ao exigir dele declarações contra lockdowns. O dia terminou com uma conversa patética entre o desastrado ex-ministro Eduardo Pazuello e o novo Ministro, Marcelo Queiroga. Nela, Pazuello atribui os desastres de sua gestão ao fato do ex-Ministro Nelson Teich ter renunciado e ele ficado com a batata quente. O correto, disse ele, seria um médico como Ministro e ele cuidando da gestão.

Foi um desastre igualmente na gestão. Basta conferir os erros na aquisição de produtos básicos de vacinação, como agulhas e seringas.

De qualquer modo, sua passagem pelo governo escancara de vez a incapacidade dos militares de assumirem funções civis.

Depois desses bastidores, o anúncio público, com a presença de todos os poderes da República, pareceu apenas um jogo de cena, uma pose para o retrato. Tanto assim que, no final do dia – segundo setoristas de Brasilia – assessores de Bolsonaro comemoravam o esvaziamento da crise contra ele.

Tem sido assim desde o início de sua gestão. Primeiro, comete todas as extravagâncias e abusos. Quando a corda está esticada ao máximo, simula um recuo, balbucia algumas desculpas e considera o jogo zerado. Não se dá conta de que cada rodada de blefes vai desgatando ainda mais sua escassa credibilidade.

O fato político mais relevante ocorreu no momento seguinte, e da forma mais inesperada. Presidente da Câmara, um dos líderes do Centrão, o deputado Arthur Lira fez um duro discurso, alertando claramente: se Bolsonaro não se enquadrar, daqui para a frente, a Câmara saberá adotar medidas amargas. Não precisa ser bom entendedor para saber que ameaça diretamente com o impeachment.

Bolsonaro não tem mais o menor espaço para extravagâncias. Ficou claro para o Centrão que a insistência nas extravagâncias inviabilizará totalmente o governo e, com ele, os trunfos políticos da aliança;

Assim, a construção do pacto, que Bolsonaro imaginara ser apenas um jogo, transformou em um personagem concreto. Agora há um fórum, controlado pela Câmara, Senado, Supremo, ao qual Bolsonaro terá que se curvar. As ameaças de impeachment ganham nova consistência, com STF e Câmara na mesma frente.

Com a pandemia em primeiro plano, acaba de vez o jogo de cena de Paulo Guedes, de anunciar reformas a toque de caixa.

Luis Nassif

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