Quem tem medo da CPI do MEC?, por Alexandre Filordi

Uma investigação séria, profunda, isenta e com lisura é fundamental no MEC, detentor de um orçamento bilionário e cobiçado.

Future(less) – Aalia Rahman)

Quem tem medo da CPI do MEC?

por Alexandre Filordi

No Brasil, a história da consolidação de uma educação gratuita de qualidade, democrática, de acesso universal e honrando a res publica, além de inclusiva e devotada à transformação da sociedade pela justiça social, não pode ser contata sem o que representa a função do Ministério da Educação (MEC).

No entanto, para o assombro e o horror de toda comunidade de pesquisadores/as e professores/as da área educacional, desde que comprometidos/as com as bases científicas, democráticas e públicas da educação, desde a chegada da extrema direita ao comando da Nação, a história do MEC vem sendo reescrita pela tutela paroquial de destruição ou desvirtuamento de seus princípios e de suas finalidades.

Em menos de 4 anos, o MEC passa, doravante, a acolher seu quinto ministro, conforme as sanhas da capitania dos poderes, reduzindo-o à moeda clientelista, interesses sazonais e conveniências performáticas.  Recentemente, como fartamente a mídia tem divulgado, passou a pairar sobre o MEC nuvens carregadas de suspeitas de corrupção. O prenúncio do dilúvio vê-se nos raios catastróficos: aquisição de ônibus escolares e de kits de robótica superfaturadas; construção de novas escolas em redutos políticos, enquanto tantas outras não são terminadas Brasil afora; tráfego de influência religioso que, em nome de Mamon, termo derivado da Bíblia e usado para descrever riqueza material ou cobiça, revela pastores buscando suas moedas de prata, ainda que o maior traído seja o povo para quem jactam suas moralinas rançosas.

Este último caso é muito peculiar. De um lado, por que a porta de entrada do baluarte da moral, em nome de Deus, Pátria e Família vem minando e sabotando políticas públicas para a educação inclusiva, crítica, emancipada e afeita às diferenças democráticas, combatendo a formação voltada para temas como os da sexualidade, do gênero, dos povos negros, das minorias étnico-raciais, da leitura crítica da história etc. Ou seja, os que se empreendem a ditar a moral não saberiam sequer honrá-la, quanto mais ensiná-la. De outro lado, por que se comprovados os mandamentos e as doutrinas da corrupção no MEC, é o próprio alcance da transformação social pela educação o maior prejudicado. No país mais desigual do planeta, a educação estaria sendo atacada em sua base distributiva como função de justiça social e estratégia de superação de desigualdade. Não podemos esquecer que os endinheirados não precisam e nem defendem a educação pública.

Aqui, no entanto, vale perguntar: mas quem teria medo de uma CPI no MEC? Por que nesta situação não se prevalece o bordão tão consumido neste governo: “conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”? Por que não colocar “a cara no fogo” pelo que se passa nas penumbras dos corredores do MEC? Quem ganha com este silenciamento; quem perde?

Uma investigação séria, profunda, isenta e com lisura é fundamental no MEC, detentor de um orçamento bilionário e cobiçado. A destinação correta de seu orçamento é fundamental para os propósitos do desenvolvimento socioeconômico cujo papel da educação é incontestável. Sem uma CPI objetivando sanar as suspeitas que rondam o MEC, continuaremos na repetição, de cima para baixo, das engrenagens de ataques e de destruição à educação brasileira como bem e interesse públicos.

Sabotar as condições econômicas pelas quais a educação pode fazer o seu papel científico, democrático, inclusivo, dialógico e salutar à formação humana também é aniquilar um projeto de nação desenvolvida. Se a democracia é feita pelo povo, a educação pode destiná-lo à formação emancipadora e resistente aos guizos doutrinários da ignorância e dos tacões de ferro. Sem o esteio da educação não há firmeza e propósito democráticos. Por isso mesmo, é preciso passar a limpo as suspeitas de corrupção que recaem no MEC, afinal, a didática da corrupção interessa apenas aos seus beneficiários.

Alexandre Filordi – Departamento de Educação – DED – UNIVERSIDADE FEDERAL DE LAVRAS. Professor Permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação – UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO PAULO. Coordenador do GT de Filosofia da Educação – ANPEd – ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM EDUCAÇÃO

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