Merkel e as consequências da crise europeia, por Luis Nassif

O desempenho da economia, no próximo ano, dependerá bastante do que poderá ocorrer com a economia europeia.

Chegou ao fim o reinado de Ângela Merkel e a longa influência da Alemanha sobre o Banco Central europeu, quando implementou políticas amplamente restritivas, antes que houvesse a recuperação econômicaA consequência foram a ampliação das desigualdades, taxas de desemprego colossais, com a destruição de várias economias nacionais. E, principalmente, o espaço aberto para a radicalização mais ameaçadora, com o advento de partidos nacionalistas de ultradireita, entre os quais o alemão Alternative für Deutschland (AfD).

Para impedir o desmanche da solidariedade europeia, Merkel bancou a entrada, na Alemanha, de mais de um milhão de refugiados apenas em 2015, o que ampliou seu desgaste interno.

O fracasso das políticas restritivas, e os bons resultados colhidos pelos Estados Unidos, com sua política monetária expansionista, mudaram o comportamento do BCE. Ele passou a reduzir as taxas de juros até chegar perto de zero, e a recomprar ativos públicos, injetando liquidez na economia.

Esse movimento depreciou o euro frente o dólar, reduzindo a competitividade da economia norte-americana e ampliando a guerra comercial conduzida pela administração Donald Trump.

Agora se chega a uma sinuca, porque encerrou-se o ciclo de crescimento da economia europeia, que permanece em desaceleração desde o quarto trimestre de 2017. Essa queda não poupou sequer a economia alemã que experimentou contração do PIB no terceiro trimestre.

Tem-se, agora, o seguinte quadro europeu:

  1. O voo de galinha do ano passado mostra uma taxa de crescimento potencial de apenas 1%, com uma taxa de desemprego de cerca de 8%.
  2. A crise de 2008 deixou como consequência países com altos níveis de endividamento e bancos com ativos comprometidos.
  3. Esses dois fatores impedem políticas anticíclicas de gastos públicos. E as restrições da União Europeia não abrem espaço para aumento do endividamento.
  4. Além disso, um plano de reativação econômica exigiria um esforço concatenado de políticas monetária e fiscal dos diversos países, em um momento em que os partidos de centro – base da unificação europeia – estão sob fogo cerrado em seus respectivos países.

E, aí, entre em cena novamente Ângela Merkel. Em que pese o desgaste na Alemanha, permanece sendo a mais proeminente líder europeia. Merkel tem mais três anos de mandato. Dificilmente um parlamento dividido, como o alemão, conseguiria maioria para um voto de desconfiança.

Sem o peso da reeleição, há uma torcida para que Merkel ouse passos mais agressivos, visando preservar a unidade do continente e a viabilização de políticas anticíclicas.

Javir Solana, ex-Alto Representante da EU para Polícia Externa, em artigo recente lembrou o papel de Barack Obama que, na fase de maior desgaste de seu governo, restabeleceu relações diplomáticas com Cuba, concluiu o acordo nuclear com o Irã e assinou o acordo do clima em Paris.

É justamente para esses momentos de perplexidade, que países desenvolvidos contam com suas reservas políticas – ex-mandatários, figuras públicas mais velhas e experientes, pessoas com visão de Estado. Já países mais atrasados costumam liquidar com suas personalidades.

18 Comentários

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  1. “Se” não ganha jogo

    Sem o peso da reeleição, há uma torcida para que Merkel ouse passos mais agressivos, visando preservar a unidade do continente e a viabilização de políticas anticíclicas.

    O problema aí é que teria de haver alguém com acesso ao ouvido de Merkel para propor isso. Existe essa pessoa dentro da CDU-CSU?

  2. Aqui eles contam com a propaganda
    Aqui eles contam com a propaganda. Vem aí a campanha 2.0 de desinformaçao, manipulaçao e mentira. E ai de quem se insurgir…

    A globo está encabrestada pelo caso FIFA, e por tudo mais que fez nos verões passados; os demais tentaculos da matrix já se mostraram adesistas de primeira hora…

    Sem falar no uso malicioso das tais “redes sociais”…

    Ja era! Quando estupidez e cinismo se juntam (e com o poder na mão), o resultado é um só: perversidade.

    Noçoes como Democracia, Republica, Estado de Direito, etc., originadas do Iluminismo, pressupõem a Razão e a busca honesta da verdade, excrescências, portanto, em um contexto de crença, guerra e caça às bruxas.

  3. Estamos num momento crucial

    Estamos num momento crucial deste nó econômico de 2008. Além da briga mercado x produção, há, pra ferrar de vez, o fator tecnológico, que vem varrendo empregos numa escala industrial. Acho que nem na academia há algum teórico com algum caminho pra solucionar esses impactos. 

  4. A Alemanha …
    A Alemanha vai continuar na mesma toada da austeridade.
    A Europa terá de seguir isto pois a Alemanha sustenta a Zona do Euro.
    Crise , que crise ?
    Me lembrei de uma capa do Supertramp.

  5. Os iluminados e os

    Os iluminados e os iluministas muito em breve chegarão a conclusão tardia de que só o mercado salva. E,para salvar terá de necessariamente distribuir renda e riqueza..

    Não dá para receber um milhão de refugiados sem provocar uma hecatombe nas relações trabalhistas e sociais do pais.

    Se estes países se interessarem em resolver o problema que é o ressurgimento da extrema direita e da eliminação dos empregos,terão de ter a ousadia de investir nos países menos desenvolvidos,principalmente os grandes fornecedores de refugiados e,também,para de destruir outros paises (ou fingir que não estão vendo a destruição) como a Líbia,o Iraque,o Brasil,entre outros.

    Será preciso que uma nova ordem seja instalada. Não é mais possível não enxergar o estrago que o domínio do império americano está provocando no mundo com consequências que podem levar a aniquilação total da humanidade.

    A  Alemanha,pelo que representa na ordem mundial e,sobretudo,na Europa,tem todas as condições de ser a ponta de lança desta nova ordem onde os interesses da humanidade irão se sobrepor aos dos finacistas mundiais. 

    1. Então o problema não é o capitalismo, mas o imperialismo?

      O mercado salva quem?

      Ora, o mercado é sempre salvo pelo Estado. Em 1929 e em 2008 foi assim.

  6. Em vez de botar a barba de molho, a Europa seguiu os EUA

    O Nassif diz:

    “O fracasso das políticas restritivas, e os bons resultados colhidos pelos Estados Unidos, com sua política monetária expansionista, mudaram o comportamento do BCE. Ele passou a reduzir as taxas de juros até chegar perto de zero, e a recomprar ativos públicos, injetando liquidez na economia”.

     

    Pois bem. A causa da crise nos EUA foi a concessão de crédito a baixas taxas de juro a clientes de alto risco (subprime), a fim de incentivar o consumo. Com o estouro da crise imobiliária, cujo marco inicial foi a quebra do Lehman Brothers, as taxas de juro começaram a subir nos EUA, dificultando a concessçao de crédito e consequentemente provocando a redução da procura (por imóveis) e a conseqüente queda dos seus preços. Com isso, o crédito para empresas e famílias foi reduzido drasticamente, provocando quebras e desemprego.

    Nesse cenário, o governo Obama salvou as grandes corporações, bancos, indústrias automobilísticas, etc. com recursos públicos. A Europa fez justamente o contrário: enquanto os EUA adotavam o quantitative easing, a Europa optava pela austeridade fiscal; enquanto os EUA elevavam as taxas de juros, a Europa as reduzia. Assim, ao seguir os passos dos EUA, a Europa importou a sua crise.

    O crédito tem duas funções essenciais: expandir a produção e elevar o consumo. Segundo a Rosa Luxemburgo:

    “Percebe-se facilmente a influência que exercem essas duas funções essenciais do crédito na formação das crises. Sabe-se que as crises resultam da contradição entre a capacidade de extensão, a tendência expansionista da produção por um lado, e a capacidade restrita de consumo do mercado por outro lado, nesse caso, o crédito é precisamente, vimo-lo já, o meio especifico de destruir essa contradição tantas quantas as vezes possíveis. Em primeiro lugar, aumenta a capacidade de extensão da produção em proporções gigantescas; é a força motriz interna que a leva a ultrapassar constantemente os limites do mercado. Mas é uma faca de dois gumes. Na sua qualidade de fator de produção, contribui para provocar a superprodução, na sua qualidade de fator de troca só pode, durante a crise, ajudar na destruição radical das forças produtivas que por ele foram movimentadas. Desde os primeiros sintomas de estrangulamento do mercado, o crédito funde-se, abandona a sua função de troca precisamente no momento em que seria indispensável; revela a sua ineficácia e inutilidade quando ainda existe, e contribui, no decurso da crise, para reduzir ao mínimo a capacidade de consumo do mercado. Citamos os dois efeitos principais do crédito, actuando diversamente na formação das crises. Não somente oferece aos capitalistas a possibilidade de recorrer aos capitais estrangeiros, mas encoraja-os a utilizarem activamente e sem escrúpulos a propriedade alheia, ou, dito de outra maneira, incita a especulações arrojadas. Assim, na qualidade de fator secreto da troca de mercadorias, não só agrava a crise, mas ainda facilita a sua aparição e extensão, fazendo da troca um mecanismo extremamente complexo e artificial, tendo por base real um mínimo de dinheiro-metal, facto que, na primeira ocasião, provoca perturbações nesse mecanismo. Desta forma, o crédito em vez de contribuir para destruir ou mesmo atenuar as crises é, pelo contrário, um seu agente poderoso. Não pode ser de outra maneira. A função específica do crédito consiste – exposta muito esquematicamente – em corrigir tudo o que o sistema capitalista pode ter de rigidez, introduzindo-lhe a elasticidade possível, em tornar todas as forças capitalistas extensíveis, relativas e sensíveis. Só consegue, evidentemente e por isso mesmo, facilitar e agudizar as crises que se definem como o choque periódico entre as forças contraditórias da economia capitalista”.

  7. Vendo tudo o que acontece nas

    Vendo tudo o que acontece nas últimas décadas, a crise de 2008, o avanço da China e a intervenção do Estado norte americano na economia, a conclusão é que o mercado não resolve nada, somente aumenta a desigualdade social. A única saída para os países soberanos, não é mais o caso do Brasil, é a intervenção do Estado na economia de forma direta e ampla, a partir de um projeto de nação, o que não será o caso do Brasil bolsonariano.

  8. As origens americanas do

    As origens americanas do bolsonarianismo: libertarianismo, tech-conservadorismo, dominionismo e conservadorianismo:

    Homofobia, racismo e os Kochs: A conferência tech-libertarianista “Reboot” é uma fossa – Por Mark Ames   

    https://www.sfgate.com/politics/article/Rand-Paul-coming-to-S-F-for-conservatarian-5626990.php

    Rand Paul está vindo a San Francisco para evento conservatarista  

    https://www.sfgate.com/politics/article/Rand-Paul-coming-to-S-F-for-conservatarian-5626990.php

    Universidade da Califórnia e suas desventuras com os dominionistas

    http://www.talk2action.org/story/2005/11/20/212930/67

    O que é o Dominionismo

    http://www.metodistavilaisabel.org.br/paginicial/noticia.asp?Numero=1805

    O bolsonarismo não é caótico, ele tem orientação segura e forte. Já pode ser entendido como uma corrente de pensamento políico bem definida, com raízes profundamente fincadas nos Estados Unidos, e que ganhou as eleições mas ainda não se revelou inteiramente aos brasileiros. Abaixo, um trecho do artigo de Mark Ames, sobre uma das estrelas do evento neo-conservador de San Francisco, a representante :

    (…)A deputada McMorris Rodgers foi educada em casa pelo pai e obteve seu diploma de ensino superior em uma instituição fundamentalista cristã não-credenciada,Pensacola Christian College (PCC), que proíbe a homossexualidade, a Internet aberta e o uso misto de escadas. Estudantes do sexo masculino e feminino são obrigados a usarem escadas e portas separadas. Recentemente proibiu todo o acesso à Internet. O Christian College de Pensacola é o editor dos livros didáticos dos livros didáticos A Beka (dominionistas, n.n.) para alunos do ensino fundamental e médio, que ensinam às crianças que o Islã é uma “religião falsa”, que hindus são “incapazes de escrever sobre a história”, que o catolicismo é “uma monstruosa distorção do cristianismo”, que “crenças religiosas falsas” liberais e democratas são cripto-marxistas, e que as Nações Unidas são um “poder coletivista que tende a esmagar a liberdade individual e a forçar a vontade de uma pequena elite sobre toda a humanidade”.

    Desde que chegou ao Congresso, ela co-patrocinou uma emenda constitucional que proíbe o casamento gay, votou contra projetos de lei que protegem a comunidade LGBT de crimes de ódio e discriminação no local de trabalho, contra o pagamento igual para mulheres e contra o financiamento federal do projeto de paternidade planejada Planned Parenthood e ela se opõe a abortos legais no caso de estupro ou incesto (a menos que a vida da mãe esteja em perigo). A graduada do Colégio Cristão de Pensacola, no entanto, é co-autora de um projeto de lei “reconhecendo a importância do cristianismo para a civilização ocidental”. (…)

     

  9. O anarco-cyber-rentismo.

    Parece claro, ou deveria, que entramos em uma fase distinta do capitalismo industrial, que via de regra pode ser definido como o ciclo de geração de valor e mais-valor.

    Independentemente das esferas de incidência conhecidas nesse ciclo, como distribuição (comércio), realização antecipada (mercado de títulos) e captação de recursos e equalização desses recursos para evitar a paralisia da equanimidade (mercado de capitais, bancos, etc), as esferas estatais (tributos, investimentos, infraestruturas, etc), o fato é que essas esferas aconteciam como assessórias ao principal, a produção de valor.

    Esse capitalismo elaborou e foi moldado, como relação de causa-e-efeito, as instâncias de organização social que conhecemos como Estados Nacionais e seus estamentos normativos, apesar de sabermos que houve sempre uma permanente confrontação entre tais instâncias de organização e o capital, porque limitavam ou regulavam o capital e sua circulação livre dos capitais, ou pelo menos, tentavam.

    Esses controles se deram na forma de tributos, emissões de moedas, e outros aspectos concernentes àquilo que de forma vulgar chamados de soberanias.

    Esse mundo acabou, ou está prestes a acabar.

    O atual formato do capitalismo presicnde dessas formas de organização, e nem mais as formas autoritárias e/ou autocráticas satisfazem o apetite da acumulação, já que a proidução de valor não mais depende de aspectos reais, mas se expande como valor ficitício, embora atinja a vida real de forma efetiva.

    A presença de fundos corporativos de investimento em setores como o Hortifruti (marca capixaba de comércio de alimentos) ou drogarias, ou até pizzarias (ver aquisição da rede Domino’s, recentemente) não são meros sintomas de diversificação de ativos, mas uma ação objetiva e direcionada a obter o total controle das formas orgânicas.

    Não é mais o capitalista (industrial) que vai ao mercado adquirir dinheiro para investir na sua cadeia, mas o mercado que vai às compras para ter capitalistas (industriais) como ativos de reserva e como garantia de intervenção na vida social sem obedecer aos controles nacionais.

    Se antes havia um centro gravitacional capitalista (os EUA) que atraia tudo ao redor, hoje é possível dizer que o centro gravitacional são os gigantescos fluxos de capitais alavancados que se movem como fakes news em redes digitais.

    O irônico e trágico é percebermos que poderemos sentir saudades das formas até autocráticas de gestão estatais, que ao menos davam a impressão de alguma circularidade quando superadas por períodos tidos como democráticos.

    É o fim do Estado, não como desejou Bakhounin, mas um tipo de lógica irracional, onde só interessa a multilplicação exponencial controlada por algoritmos.

    Tudo pode virar mercado, é certo, desde fluxos migratórios, até mercados de antecipação de indenização de seguros em zonas emergentes, variando a premiação (e seus títulos e recebíveis) pela curva de violência, aposentadorias, sistemas penitenciários, mercado de sentenças judiciais, etc.

  10. Sempre bom lembrar do poder da mídia

    Lucinei falou uma coisa fundamental lá embaixo: “Aqui eles contam com a propaganda”.

    É isso mesmo. É sempre bom lembrar que num país com tão alto grau de analfabetismo político, ignorância esta disseminada por todas as classes sociais e de renda, a mídia oligopolista sempre dá um jeito de tornar palatáveis as medidas dos políticos e partidos cm os quais compartilha algum tipo de interesse.

    Estamos numa República de Bananas. É bom nunca esquecer disso. 

  11. Ô Nassif, só não

    Ô Nassif, só não entendi uma coisa:

    Nunca te vi escrever Vlademiro Putin, Donaldo Trump, Francisco Macron, José Renzi, mas aplicaste esse Ângela pra falar da chanceler alemã. 

  12. o Nassif encerrrou com uma frase emblemática:

    “É justamente para esses momentos de perplexidade, que países desenvolvidos contam com suas reservas políticas – ex-mandatários, figuras públicas mais velhas e experientes, pessoas com visão de Estado. Já países mais atrasados costumam liquidar com suas personalidades.”. É notável como o mesmo que o PT fez com FHC, considerando de nenhum valor qualquer avanço em seu governo, hoje é feito com o PT, chutado como plenamente inútil em seus mandatos. Uma injustiça histórica feita com FHC, assim como com Lula, apesar de esse último nada mais estar que provando de seu próprio veneno de falsificação histórica.

    1. Viúva do FHC?
      Entao o Lula passa por tudo o que o FHC passou? Ele instituiu a corrupcao na Petrobras mas nem sequer foi processado. Tem um instituto, tal wual o Lula, mas so este é processado.

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