Serra distorce números sobre gastos na Saúde, por Conceição Lemes

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Enviado por MiriamL

do Viomundo

Na propaganda eleitoral, Serra distorce números sobre gastos na Saúde

de Conceição Lemes

Serra se pronuncia após a derrota para Dilma Rousseff

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Adib Jatene, Lair Guerra de Macedo e Jamil Haddad, vítimas de apropriações indébitas de José Serra

por Conceição Lemes

Até a eleição de 2010, quando postulava a presidência da República, o tucano José Serra se apresentava sempre como o pai dos remédios genéricos e do Programa Nacional de DST/Aids.

Não era nenhum nem outro. Foram apropriações indevidas.

verdadeiro pai dos genéricos é o médico Jamil Haddad, ex-deputado federal, ex-prefeito do Rio Janeiro e ex-ministro da Saúde, falecido em 2009. Foi o próprio Jamil que denunciou Serra e o PSDB.

Quanto ao Programa Nacional de DST/Aids, os seus criadores são o ex-ministro da Saúde, Adib Jatene, e Lair Guerra de Macedo.

Agora, em 2014, Serra é candidato ao Senado pelo PSDB paulista. Talvez se aproveitando da complexidade do tema financiamento público da Saúde, ele inova. Como? “Torturando” os números.

Na propaganda eleitoral na TV, ele afirma:

Vira e mexe tem notícia sobre a péssima situação das santas casas e do SUS no Brasil inteiro. Sabem por que isso acontece?

Quando eu era ministro, o governo federal cobria 53% dos gastos com saúde. O resto ficava por conta dos estados e municípios. Mas hoje ele cobre apenas 44%. Isso gerou um rombo enorme no orçamento. 28 bilhões de reais por ano. Estados e municípios não têm como bancar isso.

Serra fala a verdade? Ou falta com a verdade? Toda ou em parte? “Síndrome do esquecimento” ou “alergia” à verdade factual?

Serra foi ministro da Saúde durante o segundo governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Mais precisamente de 31 de março 1998 a 20 de fevereiro de 2002.

Resolvi investigar toda essa história para colocá-la em pratos limpos. Afinal, as informações até então disponíveis não respondiam todas as minhas dúvidas.

Debruçamos sobre os dados do Siafi –Sistema Integrado de Administração Financeira, para levantar as despesas federais. E sobre os do Siops – Sistema de Informação sobre Orçamento Público em Saúde, em busca das despesas de Estados e Municípios.

O primeiro passo: saber quanto o governo federal investiu em Ações e Serviços Públicos em Saúde (ASPS), de 2000 a 2013.

Atentem à tabela abaixo.

Saúde -- tabelas 1

Traduzindo a tabela. Valores correntes são os da época. Valores constantes, os corrigidos pela inflação.

Atualizamos todos os dados para agosto de 2014, para que fosse possível comparar os governos Fernando Henrique e Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff (PT). A correção foi feita pelo IPCA (Índice oficial de inflação).

Em valores atualizados, o governo federal investiu em 2000 R$ 48,2 bilhões. Em 2001, R$ 49,5 bilhões. Em 2002, R$ 49,1 bilhões.

De 2002 (último ano em que Serra foi ministro) a 2013, os investimentos do governo federal subiram (em valores corrigidos) de R$ 49,1 bilhões para R$ 87,1 bilhões.

Crescimento no período de R$ 38 bilhões, ou seja, 77,4%.

Conclusão 1: Diferentemente do que Serra diz na propaganda, os governos do PT (Lula e Dilma) aumentaram o volume total dos recursos.

– Por que então Serra diz que diminuiu? – muitos devem estar perguntando.

Aproveitando a deixa, outros acrescentam:

– Por que pegar o governo FHC a partir de 2000 e não desde 1998, quando Serra se tornou ministro da Saúde?

Vamos por partes.

Sempre se batalhou para que o financiamento da saúde pública fosse tripartite: União, Estados e Municípios.

Porém, antes de 2000, não havia regras.

Foi só a partir de setembro de 2000 que elas passaram a existir.

O Congresso Nacional aprovou e o ex-presidente Fernando Henrique promulgou a Emenda Constitucional 29 (EC 29). Uma importante conquista da sociedade para a construção do SUS (Sistema Único de Saúde).

A EC 29, entre outras medidas, estabeleceu a vinculação de recursos nas três esferas de governo para um processo de financiamento mais estável do SUS.

Ela entrou em vigor no mesmo ano, ou seja, 2000.

A regra para União: em 2000, o Ministério da Saúde tinha que aplicar o valor que investiu em 1999 mais 5%, no mínimo. De 2001 em diante, seria utilizado o valor do ano anterior mais a variação nominal do PIB no período.

Aos Estados, Municípios e Distrito Federal a EC 29 determinou para 2000 a aplicação de, no mínimo, 7% das receitas de seus impostos na Saúde.

Nos anos seguintes, houve aumento gradativo até que, em 2004, atingissem a meta estabelecida na EC 29: Estados 12% e Municípios 15%, no mínimo.

Para facilitar, imagine uma pizza dividida em três pedaços.

Antes de 2000, como os gastos eram muito concentrados na União, o “pedaço” de pizza do governo federal era maior. Já as “fatias” de pizza dos Estados e Municípios, como haviam contribuído menos, eram menores.

Consequência: com entrada em vigência da EC 29, era natural que, comparativamente, a parcela relativa dos gastos de Estados/Municípios fosse ampliada, já que elas eram baixas

Resultado: queda relativa da participação da União e aumento da participação dos Estados e Municípios.

Atentem a esta outra tabela abaixo. Ela contém em valores correntes, portanto não corrigidos pela inflação, os gastos públicos em Saúde nas três esferas de poder.

saúde - tabela 2 nova

Em 2000, primeiro ano de vigência da EC 29, o governo federal arcava com 59,8% dos gastos públicos em Saúde, os Estados investiam 18,5%, e os Municípios, 21,7%

Em 2002, último ano do governo FHC, a União destinou 52%, os Estados 22,6% e os Municípios 25,4%.

Em 2003 (primeiro ano do governo Lula, orçamento feito na gestão FHC), por sua vez, foram destinados 50,1% pela União, 24,5% pelos Estados e 25,4% pelos Municípios.

Conclusão 2: A queda de participação da União durante o período Serra, 2000 a 2002, foi de 7,8 pontos percentuais. Já a queda da participação da União durante os 11 anos de governo do PT (2003 a 2013) foi de 9,3 pontos percentuais.

E, se desconsiderarmos 2003, já que o orçamento foi feito por FHC, a queda foi de 7,4 pontos percentuais. Ou seja, menor do que na era Serra.

E se fosse para forçar mais a barra, Dilma Rousseff, Alexandre Padilha e Eduardo Suplicy, atuais candidatos do PT à Presidência, ao governo do Estado de São Paulo e ao Senado, poderiam remontar a 1980, quando a União arcava sozinha com 80% dos gastos públicos com a Saúde do Brasil.

– Se nos governos Lula e Dilma os gastos com saúde do governo federal subiram R$ 38 bilhões, ou 77,4%, por que Serra diz que diminuiu? – alguém mais atento já deve ter-se perguntado.

Serra juntou os Estados e Municípios em um único “pedaço” de pizza para comparar com a fatia da União.

Em 2013, os gastos públicos com a Saúde no Brasil totalizaram, em valores atualizados até agosto de 2014, R$ 207,39 bilhões.

O governo federal arcou com 42,7% da pizza, ou seja, R$ 87,18 bilhões.

Os Estados (R$ 54,58 bilhões) e os Municípios (RS 65,63 bilhões) juntos contribuíram com 57,3%, ou seja, R$120 bilhões.

Resultado: com a EC 29 os gastos da União com a Saúde cresceram. Mas os gastos de Estados e dos Municípios aumentaram de forma mais intensa, pois eles investiam em patamares bem inferiores ao que exigia a EC 29, quando ela entrou em vigor, em 2000.

– Por que então o Serra diz que há um rombo de R$ 28 bilhões por ano? – alguém talvez insista em questionar.

Não consegui ainda identificar de onde saiu esse valor.

De qualquer forma, nos 11 anos dos governos Lula e Dilma, vale repetir, os recursos federais aplicados na Saúde cresceram R$ 38 bilhões – 77,4% em termos reais.

E eles teriam subido mais se, em dezembro de 2007, o Congresso Nacional não tivesse derrubado a CPMF, retirando uma fonte de receita de R$ 40 bilhões da Saúde.

Mas é bom lembrar que a CPMF foi criada no governo Fernando Henrique e vigorou de 1997 a 2007. Sobre qualquer operação financeira era cobrado 0,38%.

Naqueles tempos de PSDB, essa cobrança era considerada “legítima e essencial”. Depois deixou de ser pelas mãos do próprio PSDB e seus aliados, para prejudicar politicamente o governo Lula e “proteger o povo do imposto”.

Conclusão 3: Na propaganda eleitoral, Serra “esqueceu-se” de que contava com a receita da CPMF durante todo o seu período no Ministério da Saúde. Assim como “se esqueceu” de que a derrubada da CPMF, retirando R$ 40 bilhões da Saúde, foi liderada pelos tucanos.

Conclusão 4: Apesar de Serra contar com os recursos da CPMF, na sua gestão houve queda da participação da União nos gastos públicos em Saúde.

Além disso, havia um entendimento maroto sobre a aplicação mínima da EC29, fazendo com que a legislação não fosse cumprida.

Lembram-se de que dissemos que, em 2000, a União tinha de aplicar o valor que investiu em 1999 mais 5%, no mínimo?

E que, de 2001 em diante, seria utilizado o valor do ano anterior mais a variação nominal do PIB no período?

Pois Serra usava sempre o valor fixado no ano 2000 como base para reajustar.

Resultado: em 2001, o valor empenhado foi o de 2000 mais variação nominal do PIB em 2000. Em 2002, o valor de 2000 mais a variação nominal do PIB em 2001.

O Tribunal de Contas da União (TCU) julgou essa interpretação equivocada, alterando-a. Determinou o entendimento posto em prática em 2004, quando era ministro da Saúde o senador Humberto Costa (PT-PE). O reajuste deve ser feito em cima do ano imediatamente anterior mais a variação nominal do PIB.

Conclusão 5: Se prevalecesse até hoje, 2014, o entendimento da gestão Serra sobre a aplicação da EC 29, o orçamento da União para a Saúde seria muito menor do que o atual, pois ele seria sempre igual ao valor aplicado em 2000, apenas acrescentando a variação do PIB nominal do ano sobre a mesma base.

Conclusão 6: Apesar do sumiço da CPMF (que representava cerca de 30% da receita da Saúde), os recursos aplicados pelo governo federal, na época do presidente Lula, não foram reduzidos. Ao contrário. Continuaram crescendo.

A propósito. São Paulo, dirigido pelo PSDB de Serra há 20 anos, é um dos Estados que menos gastam com Saúde em relação ao seu orçamento total.

Estudo divulgado pelo Estadão, em março de 2014, revela que, entre as 27 Unidades da Federação, oEstado de São Paulo disputa com o Piauí o 20º lugar.

De 2001 a 2012, o governo paulista deixou de aplicar na Saúde R$ 7,9 bilhões. Só na gestão José Serra foram R$ 2,4 bilhões.

Em tempo: os movimentos sociais defendem a aplicação na Saúde de 10% da receita bruta da União.

Eu, como usuária do SUS, também. Assim como todo usuário do SUS deveria fazê-lo.

Os 10% da receita bruta da União significariam um aumento no orçamento da Saúde de cerca de R$ 40 bilhões. Exatamente o que foi perdido com a derrubada da CPMF pelos tucanos e seus aliados.

Com a palavra, José Serra. E aí?

 

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

14 Comentários

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  1.  
    Não faça isso,Nassa.Por

     

    Não faça isso,Nassa.Por pior que Serra seja, ainda ganha de 1 000 a zero do manso e fora de órbitra Suplicy.

            Deixe suas picuinhas de lado e pense em SP;

                Durante 24 anos o esquisito Suplicy não fez absolutamente nada por SP. Só show.

                        Tenha dó ,né?

  2. O que é que o Serra nao

    O que é que o Serra nao distorce? Distorce numeros, distorce a biografia dele, o curricula acadêmico, a opinião dele e dos outros. É um distorcedor

  3. Ao PSDB tudo é

    Ao PSDB tudo é permitido.

    Quer cometer o crime perfeito? Filie-se ao PSDB. A “justiça” arquiva qualquer denúncia contra os tucanos. A eles é concedido o direito de mentir, roubar, todo e qualquer tipo de falcatruas. A Privataria Tucana é a prova de que nem com provas eles serão investigados. Trensalão? Nem pensar. Mentir em campanha eleitoral? Completamente liberado (para tucanos, é claro). O governador não faz o dever de casa de prevenção à falta de água, faz os paulistanos tomarem o volume morto inteirinho, o Serra mente decaradamente? Não importa, os paulistas os elegem e reelegem, a “justiça” os perdoam de tudo.

    1. Compartilho o caso da Varig e

      Compartilho o caso da Varig e seus Funcionários!

      Me parece que o tucanato atrapalhou o resgate da companhia!

      O Lula deu encaminhamento, mas foi sabotado pelos tucanos!

      tempo 16:40 minutos

      [video:https://www.youtube.com/watch?v=Jpu_H_2ZrKA%5D

       

      A Varig foi uma empresa pioneira na relação com  os funcionários e Clientes

      Reconhecida lá fora! 

      [video:http://www.youtube.com/watch?v=YuVJ0V22jsM%5D

       

  4. Pode comparar?

    Desvalorizada no Brasil, saúde básica é chave do sucesso de sistema britânico

    O Sistema Único de Saúde (SUS) foi criado no Brasil com a redemocratização do país e a promulgação da Constituição de 1988, tendo como uma de suas inspirações o sistema de saúde pública britânico, o NHS (National Health Service). A forma como cada sistema opera, porém, apresenta profundas diferenças.

    http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2014/09/140923_nhs_sus_ms

    1. Sr. José Adailton, o sr. me

      Sr. José Adailton, o sr. me desculpe, mas o modelo do SUS foi inspirado no modelo Cubano. Eu inclusive fiz parte de um grupo que foi em um Congresso de Saúde Pública em Cuba,para melhor conhecer  o sistema de lá. Naquela época ainda não havia esta “guerra” contra Cuba, como existe atualmente. Tive oportunidade de conhecer os Postos de saúde, que são bem pequenos, funcionando apenas com 1 médico de família, 1 enfermeira e um técnico. Na parte da manhã atendem os pacientes e na parte da tarde  a equipe vai em visitas às famílias onde tem acamados, ou verificar alguma criança ou adulto que faltou à vacinação ou consulta. Atendendo a alguns postos , que não me recordo mais os números, há uma policlínica e entre várias policlínicas há um Hospital para onde são encaminhados os pacientes que necessitam dos serviços do mesmo. Todos os funcionários trabalham o dia todo.

      PS: O Fidel Castro não faltou a nenhum dia do congresso e nos proporcionou um jantar no Palácio, onde tb estava presente.

       

  5. Serra não sabe fazer conta

    Discutir números de Serra periga em “pagar o mico”.  Serra demonstrou em uma escola primária, frente aos pequenos alunos, que não domina as quatro operações básicas de matemática. 

    E dizer que este cara queria ser presidente do Brasil!!!!!

  6. Não à-toa Adib Jatene saiu do

    Não à-toa Adib Jatene saiu do Governo FHC, decepcionado com os destinos do programa que criou com a CPMF, que tinha outro nome (esqueci qual). Vale dizer que em entrevistas Adib Jatene tem muito zelo sobre o SUS, dizendo, inclusive que hospitais de ponta de SP atendem pelo programa do governo. Esse Serra é um camarada completamente moleque, que jamais deveria ser político, porque não faz nenum bem ao Brasil.

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