Documentos comprovam política deliberada de assassinatos na ditadura militar

Sônia e Osvaldão
 
Jornal GGN – Documentos do acervo da Câmara dos Deputados, mantidos como confidenciais até 2010, revelam que o Comando da Marinha determinou previamente a morte dos integrantes da Guerrilha do Araguaia. Os papéis, de setembro de 1972, são os primeiros registros encontrados da política deliberada de assassinatos, nunca admitida pelos governos do regime militar.
 
Na lista de mortos na Guerrilha do Araguaia está Osvaldo Orlando da Costa, o famoso Osvaldão. Líder carismático, o negro de 1,98m era ex-campeão carioca de boxe. Os militares o executaram em janeiro de 1974 e penduraram seu corpo em um helicóptero para mostrá-lo aos povoados da região. O corpo foi enterrado em local desconhecido. Outra desaparecida é Lúcia Maria de Souza, conhecida como Sônia. A jovem largou os estudos na Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, no 4º ano, para aderir a luta armada. Em outubro de 1973 caiu em uma emboscada na região entre Marabá e Xambioá. Antes de atirarem nela os militares perguntaram seu nome e como resposta escutaram a frase que tornou sua morte célebre: “Guerrilheira não tem nome, seu filho da puta, eu luto pela liberdade!”. 
 
Marinha ordenou a morte de militantes no Araguaia em 1972
 
Repórteres MARIA CLARA CABRAL; RANIER BRAGON; JOÃO CARLOS MAGALHÃES; MATHEUS LEITÃO – DE BRASÍLIA
 
Documentos escritos pelo Comando da Marinha revelam que havia a determinação prévia de matar os integrantes da Guerrilha do Araguaia, e não apenas derrotar o maior foco da luta armada contra a ditadura militar.
 
Os papéis, de setembro de 1972, relatam a preparação da Operação Papagaio, uma das principais ofensivas das Forças Armadas contra o grupo criado pelo PC do B entre Pará, Maranhão e a região norte de Goiás, que hoje é o Estado do Tocantins.
 
A documentação a que a Folha teve acesso faz parte do acervo da Câmara dos Deputados. Era confidencial até 2010, mas foi liberado para consulta pública.
 
“A FFE [Força dos Fuzileiros da Esquadra] empenhará um grupamento operativo na região entre Marabá e Araguaína para, em ação conjunta com as demais forças amigas, eliminar os terroristas que atuam naquela região”, afirmam duas “diretivas de planejamento”.
 
Uma delas é assinada por Edmundo Drummond Bittencourt, comandante-geral do Corpo de Fuzileiros Navais. A outra foi escrita pelo contra-almirante Paulo Gonçalves Paiva. Nas duas, a ordem de “eliminar” os guerrilheiros surge no item “conceito das operações”.
 
Os textos também dizem que seriam feitas ações para “impedir os terroristas que atuam na margem daquele rio de transporem-no para a margem leste, eliminando-os ou aprisionando-os”.
 
A oposição entre “eliminar” e “aprisionar” confirma que o primeiro se refere à morte dos militantes, disse o historiador Jean Rodrigues Sales, autor de “A Luta Armada Contra a Ditadura Militar” (ed. Perseu Abramo).
 
“No episódio de repressão à militância armada, a política deliberada de assassinatos jamais foi admitida de forma oficial”, disse Sales.
 
Segundo Criméia Schmidt de Almeida, ex-guerrilheira e estudiosa do conflito, “realmente [ainda] não havia registro disso [determinação prévia para matar]”.
 
Relatório do Exército de 1974, quando quase todos os militantes do PC do B na região haviam sido mortos, fala na “eliminação” das “forças guerrilheiras”, mas não de seus integrantes.
 
Para Taís Morais, coautora com Eumano Silva de “Operação Araguaia” (Geração Editorial), “militar não escreve ordem que não deve ser cumprida”.
 
As “diretivas” corroboram relatos de testemunhas do conflito, segundo as quais, nos anos seguintes, comunistas foram mortos mesmo depois de serem presos.
 
Em um dos papéis a que a Folha teve acesso, a Marinha fala em oito guerrilheiros mortos “em combate” durante a Operação Papagaio –argumento que sempre foi usado pelas Forças Armadas para justificar mortes de resistentes na região.
 
Ainda não foi produzida uma narrativa oficial sobre a luta armada durante a ditadura –um dos objetivos da Comissão da Verdade, que o governo quer instituir.
 
Procurado na terça-feira, o Ministério da Defesa afirmou que, por não ter tempo de encontrar os documentos, não os comentaria.
Redação

7 Comentários

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  1. “Lei da Selva”

       O livro Lei da Selva, e as teses de mestrado e doutorado * do Prof. Hugo Studart , deixam bem claro que as operações levadas a cabo no Araguaia, eram de exterminio, até mesmo guerrilheiros capturados, mesmo após interrogados e torturados foram executados, como Tobias Pereira Junior ( “Josias” ) capturado em 18/12/73, interrogado e torturado, chegou a “colaborar” com os militares, mas foi executado na selva, dois meses após sua captura.

         Assim como tb. está claro, que na “Chacina da Lapa “, a ordem foi de não deixar sobreviventes.

  2. E lá venho eu com minhas

    E lá venho eu com minhas manias… almirante cérebro do programa nuclear brasileiro preso “por corrupção” nas celas do neo-Doi-Codi de Curitiba; e essas notícias sobre a Marinha, por parte de quem ajudou aos torturadores na época… sei não! Às vezes eu fico vendo visagem!

  3. Que essa experiência fracassada de guerrilha

    Sirva de lição. Se as forças que tentaram resistir à ditadura, tivesse se focado em eliminar os civis que colaboravam com ela, teria sido muito mais proveitoso. Não dá pra imaginar o Brasil hoje, sem aqueles que colaboraram no Senado (biônicos), Poder Judiciário, governos de estado, prefeitos de áreas de segurança nacional, ministros, e membros do 1º escalão das empresas públicas. Mas o país estaria bem melhor. Se houver um golpe contra o governo Dilma, fica a dica para a reação.

  4. Será que o Exército

    Será que o Exército Brasileiro não deu conta do recado? Pelo que eu me lembro em 1969/1970 e EB efetuou diversas operações no Bico do Papagaio, então pertencente a Goiás. Eu estava lá.

    .

  5. assalto terrorita na casa de saude dr eiras

    meu pai cardenio jayme dolce,delegado aposentado,foi morto,por terroristas num assalto a casa de saude dr eiras,no rj,em 1971.

    1. A morte do seu pai é um fato

      A morte do seu pai é um fato extremamente lamntável. Entretanto ele não foi morto por terroristas. Pode chamá-los de subversivos, assassinos ou o que desejar, menos de terroristas. Homens  e mulheres que lutam de armas na mão contra um governo que se apossou do poder ilegitimamente através de um golpe militar, de armas na mão, são tudo, menos terroristas. Saudações e meus pêsames.

  6. Esses caras queriam instituir um regime cubano no Brasil. Tirando a miséria geral em que estaríamos mergulhados, será que haveria espaço até pra mesmo pra um Blog desse fazer proselitismo contra os militares? Não sejamos ingênuos. No comunismo todos tem de ter pensamento único ou “paredón”.

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