Por que a Lava Jato abandonou o caso Celso Daniel?

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Lava Jato explorou o caso Celso Daniel para atrair mais mídia às vésperas do impeachment de Dilma. Depois considerou "irrelevante" por não encontrar provas de crime político

Publicado originalmente por Cintia Alves, no GGN, em setembro de 2016

Há anos, a imprensa ventila a versão de que Ronan Maria Pinto, empresário do setor de transporte e dono do jornal Diário do Grande ABC, teria extorquido a cúpula do PT – incluindo Lula – com ameaças envolvendo a morte do ex-prefeito de Santo André, Celso Daniel. Em abril, a Lava Jato decidiu surfar publicamente nessa onda e desenterrar o caso na operação Carbono 14, às vésperas da votação do impeachment de Dilma Rousseff na Câmara.

Aquele mês começou com os jornais noticiando que a Lava Jato conseguiu associar a morte de Celso Daniel aos esquemas de corrupção do chamado Petrolão. Os procuradores mostraram determinação em descobrir por que Ronan foi o destinatário final de quase R$ 6 milhões que teriam origem num empréstimo fraudulento que José Carlos Bumlai, o “amigo de Lula”, tomou junto ao Banco Schahin. O grupo, por sua vez, teria sido compensado com um contrato bilionário com a Petrobras.

Para prender Ronan, Sergio Moro escreveu que era “possível que este esquema criminoso [envolvendo o empréstimo] tenha alguma relação com o homicídio, em janeiro de 2002, do então prefeito de Santo André, Celso Daniel, o que é ainda mais grave”.

A notícia estampou capa de jornais e revistas. A Veja publicou que os procuradores da Lava Jato estavam próximos de descobrir que, afinal, matou Celso Daniel. 

Diante de Moro, Marcos Valério, que decidiu colaborar com a Lava Jato, fez uma verdadeira cena. Disse que queria muito colaborar, mas sem dar todos os detalhes que tinha sobre a suposta motivação do PT em pagar pelo silêncio de Ronan Maria Pinto porque temia por sua própria vida.

A força-tarefa, em maio, disse ter feito um “intercâmbio de informações com o Ministério Público Estadual de São Paulo, que investigou o assassinado de Celso Daniel, para auxiliar nas investigações sobre os motivos do pagamento que estão em aberto.”

Passados sete meses, o Ministério Público Federal apresentou as alegações finais do caso pedindo que Ronan, entre outros, seja condenado por ter sido o destinatário final de parte do empréstimo fraudulento. Marcos Valério foi agraciado com um pedido de absolvição, segundo o Estadão desta quinta (17).

SEM PROVAS, NEM CONVICÇÕES

Depois de produzir inúmeras manchetes prometendo esclarecer os mistérios por trás da morte de Celso Daniel, os procuradores, contudo, classificaram o episódio como “irrelevante” para a ação que será julgada em breve por Moro.

O que importa para eles é que Ronan teria recebido, comprovadamente, pouco mais de R$ 5,7 milhões – descontado o custo da operação. O valor não é tratado pelo MPF como empréstimo de fato porque Ronan não conseguiu provar que algum dia pagou de volta qualquer parcela pelo montante recebido.

Quanto à tese de que o pagamento se deu porque o empresário do ABC teria detalhes da morte de Celso Daniel, incômodos ao PT, os procuradores da Lava Jato não acharam provas.

O que consta nos autos são duas delações, uma de Marcos Valério e outra de Alberto Youssef, que não foram corroboradas por outros elementos.

A posição do MP beneficiando Valério e solicitando a condenação dos demais acusados, inclusive deixando o caso Celso Daniel de lado, já era esperada.

Já em maio, passada a votação do impeachment na Câmara, a força-tarefa já havia dado sinais, nos jornais, de que abandonaria o barco.

Poucas semanas após a prisão de Ronan, o Estadão publicou: “Nessa nova investigação, o MPF não conseguiu encontrar indícios que ligassem o empréstimo com a morte de Celso Daniel, ligando o caso da Lava Jato com a morte do prefeito. (…) O MPF deixou, assim, de denunciar extorsão. ‘É prematura se ter uma afirmação conclusiva de que essa extorsão existiu e os motivos dela.’ Quando foi deflagrada em 1.º de abril, o procurador afirmou que ‘até o final da investigação’ a Lava jato pretendia descobrir ‘a razão pela qual Ronan recebeu esses valores’.”

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

4 Comentários

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  1. No início da década de 70, com apenas 16 mil habitantes, devidamente estratificados – quem era classe média, e high society local, quem era matuto, recém-chegado ou cidadão nato – minha cidade era a tipica cidadezinha de interior, suas fofocas, seu partidarismo doentio… e tudo acabava repercutindo como um rastilho de pólvora, imediatamente.
    Foi nesse clima que prosperou o boato de que um sujeito do estrato social médio acabou nele enredado. Em linguagem direta foi acusado de ser pego com outro em situação vexatória para a época; e aí passou a ser também vítima de pessoas de comportamento sádico sem limites. Desse forma, certo dia ao entrar numa alfaiataria deu de cara com um brutamontes que queria porque queria que ele confessasse “o crime”, chegando a espremê-lo contra uma porta e pisando seus dedos até sangrar exigindo que ele apontasse o passivo na dita relação. E ele não disse.
    Semanas depois, desgostoso desapareceu de sua terra natal sem nunca mais dar notícias.
    Esse caso do Celso Daniel é mais um caso de sadismo, e tem servido para que, em não tendo o partido a princípio uma resposta convincente, lá se vão já duas décadas que sádicos e imorais interesseiros o usam para acuar o PT. Ou o partido deixa de cair na armadilha de dar explicações a quem não quer ouvi-las, ou muitas séries a Globo ainda vai fazer sempre que se aproximar uma eleição.
    QUE SACO!

  2. O caso Celso Daniel é um cadáver insepulto, tanto pelo PT quanto por seus inimigos. Agora ele foi mumificado e estará eternamente num sarcófago ao alcance de todos os oportunistas que necessitarem. Incrível que uma investigação dupla e independente, da polícia federal e da polícia civil de São Paulo, que acabaram concluindo a mesma coisa, simplesmente é ignorada somente para que o caso nunca acabe.

  3. Todos sabem que,à época do assassinato do prefeito Celso Daniel, havia um grupo de longo bico e plumas identificação que,assim como o camisa preta do Paraná ,espionava a tudo e a todos que tinham possibilidades de derrota-los,PT a frente, com o intuito de promover emboscadas ou criar factoides.
    Este grupo não deve estar envolvido com o assassinato do prefeito. Isto parece fato fartamente evidenciado em diversas investigações da própria polícia que era comandado por um governo bicudo.
    O que uma investigação séria, portanto ,excluem-se os falangistas do camisa preta do Paraná ,com certeza descobriria é que este grupo bicudo estava envolvido até o último penacho em escutas clandestinas e macomunados com a mídia golpista.
    É por isso que a falange golpista do camisa preta do Paraná não se interessou em aprofundar as investigações. Assim como não se interessou em ninguém que apontasse um nome com foto privilegiado ou que tivesse o bico longo.
    Essa gente,quando iniciou as investigações, acabou constatando que,mesmo sem saber, eram irmãos siameses e,juntos,ajudaram a partir a escória que governa o pais

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