Armando Coelho Neto
Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.
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De férias, Moro desmonta barraca na praia só pra fazer barraco, por Armando Coelho Neto

De férias, Moro desmonta barraca na praia só pra fazer barraco

por Armando Rodrigues Coelho Neto

Não sei bem onde andava Sejumoro, até por que não costumo me inteirar onde juízes passam férias. Oficialmente, pelos controles internos do Poder Judiciário, ele está de férias. É normal entre magistrados, procuradores da República, delegados da PF usarem féria para participar de seminário-convescote fora do País e caçar um diplominha de “Curso Walita”. Para quem não sabe, a fabricante de eletromésticos Walita costuma fazer cursinhos rápidos, e o termo passou a ser usado para desqualificar cursos com diplomas de valor chinfrim, que só servem para enfeitar paredes de gabinete de servidores pavões dos três poderes.

Sejumoro não estava fazendo cursinho Walita no exterior, mas abandonou muito rápido seu descanso, não se sabe se cansado por viagens ou de trabalho. Largou tudo para se intrometer onde não fora chamado. Não sei como funciona o controle de férias no Poder Judiciário. Aliás, como as salsichas e as leis – melhor não sabe como são feitas. Mas, é improvável e reprovável que um juiz saia e entre de férias a hora que quiser, sobretudo para satisfazer caprichos pessoais. Afinal de contas, sua carga de trabalho deve ficar sob a responsabilidade de um substituto qualquer, que com certeza toma decisões, sem qualquer interferência do juiz titular.

Ontem, caíram de vez as máscaras do Poder Judiciário. Foi um dia de trevas pra satanás algum botar defeito. Foi um cheque mate na ópera bufa do golpe, que tem como suporte a Justiça, que tenta dar ares de legalidade à estupidez. Perplexo, o consagrado jurista Lênio Streck disse: “o único que pode de fato despachar é o plantonista… Ninguém que está de férias pode desautorizar um plantonista, se a moda pega, não haveria mais necessidade de haver plantonista, seria inútil”, disse ele, sobre o fato de Sejumoro abandonar as férias para peitar uma decisão superior, no caso, a ordem de liberdade expedida pelo desembargador do TRF 4 Rogério Favreto, para que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fosse posto em liberdade.

Rogério Favreto fundamentou sua decisão diante de um fato novo, ou seja, um pedido de liberdade para Lula suportado no fato de que, enquanto pré-candadato à Presidência da República, estaria impedido de exercer em condições de igualdade com os demais concorrentes suas prerrogativas constitucionais. Afinal, o pretenso réu não está com seus direitos políticos cassados. É claro que a prisão diz respeito a outro processo e toda vez que é expedido um alvará de soltura, qualquer juiz manda soltar se por outro motivo não estiver preso. Só que, no caso, o motivo era convergente sob outro enfoque, com ameaça a um direito concorrente. Os demais candidatos estão praticando atos de campanha e Lula não. No caso, a prisão discutível deveria ser relaxada, sem entrar no mérito da discutível condenação.

Mas, ontem, Sejumoro derrubou o brocardo jurídico “decisão judicial se cumpre, não se discute”. Mas como para ele tudo pode, usou sua hermenêutica onipresente para não só descumprir, mas afrontar, numa sanha pessoal inusitada que o desqualifica de uma vez por todas a atuar em processos contra Lula. Criado o impasse, parte da imprensa vibrou com a ousadia daquele barnabé. Segundo Favreto, Sejumoro sequer era a autoridade coatora, mas, sim a juíza da 12ª Vara, que responde pela execução penal. Conforme a ação impetrada, seria ela quem estava criando restrições ao exercício de direito fundamental, ferindo preceito constitucional, ao impedir os direitos de Lula inerentes à sua pré-candidatura. Portanto, sua decisão em momento algum afetaria o mérito das decisões da Farsa Jato.

Desse modo, a prisão de Lula estava sendo discutida sob outra perspectiva, outro foco. Ser corrupto, dono ou não do tríplex, etc e tal não tinha ligação não estava em jogo, portanto nada a ver com Sejumoro. Além disso, juiz não é dono de preso e prisão é consequência processual e não vingança do julgador. Não existe essa de “o preso é meu”, aulinha fundamental fora do currículo dos capitães do mato do golpe. Desse modo, nesse episódio, Favreto era a única autoridade apta a falar no caso, pois agiu dentro da esfera de suas atribuições de plantonista. O resto dos falantes foram todos intrusos, sobretudo os que estavam de férias. Sequer o Presidente do TRF 4, Carlos Eduardo Thompson Flores, não teria competência para avocar e decidir. Sua entrada em cena foi para enganar o povão, naquele de que “presidente pode tudo” e satisfazer a ira da onda fascista que quer Lula morto e não na cadeia.

O correto era a soltura e se tivesse que ser revertida que o fosse, mas percorrendo os caminhos legais. No dia do fato, o único juiz apto a falar e rigorosamente dentro da lei era o desembargador Favreto, ainda que, encerrado o plantão sua atividade também se encerrasse. O excesso de zelo configuraria em tese crimes de desobediência e prevaricação dos envolvidos, sem prejuízo de infrações disciplinares.

Mas, a preocupação de grande parte da mídia golpista não era com a lei, mas sim com soltura de Lula em si, o culto ao ídolo de barro Sejumoro e também o fato de Favreto ter trabalhado para o Partido dos Trabalhadores no passado. E aqui, eu me permito ser cínico: os advogados de Lula iriam esperar um inimigo de Lula no plantão para requerer alguma coisa? Como que as ações de Aécio Neves caem no colo do ministro Gilmar Mendes? Por que Fachin desviou processos para não serem decididos em turmas legalistas do STF que são contra prisões como as do Lula? Se houve interesse de Favreto o que dizer dos que abandonaram as férias?

Meu cinismo estanca na decisão perfeita do desembargador Favreto, pois agiu dentro das suas atribuições e fundamentou dentro da legalidade. Lula não está com direitos políticos cassados e a medida impetrada tinha como foco essa questão. A menos que os aliados de Moro nas demais instâncias queiram solapar mais esse direito de Lula.

De resto, os capitães do mato do golpe conseguiram dar mais visibilidade ainda a Lula, anteciparam debates que maliciosamente não estão sendo pautados por Poder Judiciário sob aparente chantagem. Afinal, se o pautarem, ou soltam Lula ou serão obrigados a sepultar suas respectivas biografias e o mundo terá que saber que somos uma republiqueta de juizecos.

Sejumoro estava de férias. Não sei se na praia. Se a resposta for positiva, desmontou a barraca e chamou coleguinhas férias para armar barraco.

Armando Rodrigues Coelho Neto – jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-integrante da Interpol em São Paulo

 

Armando Coelho Neto

Armando Rodrigues Coelho Neto é jornalista, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo.

8 Comentários

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  1. Ratoeira
    A estratégia da defesa de Damous ontem foi claramente uma arapuca para expor a podridão do Lawfare da Lava Jato à luz do sol.

    Moro caiu na ratoeira e todos se expuseram: Gebran, Flores, o comando da PF, a Rede Globo e até o jornalista fascista da Jovem Pan.

    Lembra um pouco o filme “A última fortaleza”, com Robert Redford, em que os detentos de uma prisão militar armam uma rebelião fake para conhecer os pontos fracos do esquema de repressão do presídio para depois lançarem um ataque fulminante. Ficção, óbvio.

  2. Excelente descrição.

    Só para lembrar um filme do passado, o evento de ontem lembrou-me do filme o “Homem de Kiev”, inspirado num fato real, a história de Mendel Beilis, onde um judeu que simplesmente foi pego injustamente pela feroz polícia política do Czar da Rússia, a Okhrana, e armaram um caso para condená-lo, nas idas e vindas do processo e de três anos de tortura, onde Mendel resistiu, chegaram a conclusão que o melhor era não julgá-lo, para isto um pouco antes da retirada do homem para o julgamento, o carcereiro puxa a sua arma para executar antes do julgamento. Neste momento, quem já estava responsável pela sua guarda era um oficial do exército Russo, ele sem pestanejar retira o seu sabre da bainha e atinge o braço do carcereiro, impedindo a execução e permitindo o julgamento, que seria ganho pelo réu na medida que durante a longa investigação o caso perdeu totalmente a razão.

    Qual a ligação? O inverso do que ocorre no Brasil. Na Rússia czarista haviam ainda homens que cumpriam suas funções dentro da lei injusta, mas existente na época. Hoje no Brasil, há leis injustas que nem elas são cumpridas.

     

  3. Moro

    Que juiz esse eim? Passa por cima de desembargador até em férias!!! Esse é o sistema judicial brasileiro. Espelha a bagunça que o governo e estado brasileiro se tornaram após o golpe de 2016. Abrir essa caixa de pandora continuará custando caro ao país por muitos anos.

  4. Lula vai continuar preso, até…

    Gosto do texto do Armando também por causa de sua objetividade em nomear as coisas de acordo com o que elas são: FarsaJato, Golpe etc.

    Mas tem colunistas que se mostram inocentes ou tolos. Li alguém afirmando que o comportamento de Moro era inaceitável em nossa Democracia !!! Que sua atitude conspurca o judiciário !!!

    Qual Democracia ? Como conspurcar o que já é podre ?

    Estamos sob um golpe, rasgaram a Constituição e o direito é o de quem tem mais força pra impor sua vontade.

  5. Eu, apesar de nunca ser

    Eu, apesar de nunca ser otimista com essa elite que temos, sinceramente achava que Lula ia ser solto ontem. Mas que seria preso novamente, hoje, ou no máximo amanhã.

    Pelo que me foi explicado o STJ, STF, ou o pleno do TRF cassariam o habeas corpus. Lula ficaria solto apenas um dia, algumas horas talvez. A fachada “legal” seria mantida com o tal “cumprir o rito” que regeu o cinismo do STF no impeachment.

    Estava até me preparando para comemorar com minha prima na esquerda da praça, São Salvador no Rio. Mas já tinha alertado ela que Lula não ficaria livre muito tempo. Ok, mas veríamos ele junto com o povo, dando uma entrevista coletiva e quem sabe um comício em São Bernardo. Para lavar a alma

    Mas o golpe não quis ter o desgosto de engolir isso. Nem sabendo que a chance de viabilização da candidatura continuaria remota. Optaram pelo motim, como disse o professor Aldo, e quem decidiu não foi o delegado, foram as “instâncias superiores”.

    Para mim esse domingo colocou o golpe num novo patamar. É a força bruta, a propriedade da “opinião pública e filiação ideológica dos juizes que manda, e fim de papo.

    Judiciário e Globo são os mandantes e a PF sua milícia armada.

  6. “Coup de théâtre”

    Para o jornal Le Monde, o Brasil teria o costume de fazer jogos de cena. E ontem o que se viveu no Pais foi mais um jogo de cena por parte do Judiciario brasileiro…  Mas como sempre, argumentam no sentido de que Lula mereceria a condenação imposta pelo barraqueiro Sergio Moro. Até hoje o jornal Le Monde trata essa questão como se Lula tivesse sido corrompido quando presidente ou deixado o PT se locupletar. 

    Lula precisa que a ONU delibere em cima do processo da Lava Jato/ Sergio Moro contra ele para que Lula possa provar sua inocência nessa armação que fizeram para retira-lo do pleito eleitoral. Isso é muito importante nesse processo todo.

  7. Qualificação
     

    Que o moro seja um servidor concursado e aprovado, não resta a menor dúvida.

    Que ele tenha perfil para servir à justiça – não resta a menor dúvida, ele tem, é só dar uma olhadinha no seu terno russo  e na sua  camisa preta.

    Ele é sim, vocacionado para servir no âmbito judiciário, só houve um engano do serviço público na hora da sua  posse e atribuições do cargo.

    Sejumoro deveria  ser carcereiro.

    Um carcereiro que lê apostila e decora textos, passa num concurso pra juiz mas nunca vai ser um juiz.

  8. justiça sem moral

    kkkkkkk…..decisão judicial se cumpre….ta bom…deixa algum oficial de justiça bater aqui no morro de agora em diante para ver se ele nao vai levar côcô no ombro….e o vale tudo da justiça…perdeu a moral…vem trazer mandado aqui no morro seus merdas pra ver uma coisa…

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