New York Times: Democracia do Brasil é empurrada para o Abismo

Economista americano Mark Weisbrot aponta evidências de que julgamento de Lula fere princípios democráticos e coloca em risco segurança regional  

lula_justica.jpg

 
Jornal GGN – O economista americano e co-diretor do Centro para Pesquisas Econômicas e de Políticas Públicas, Mark Weisbrot, avalia que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva sofre perseguição política dentro do sistema judiciário brasileiro e que o processo montado para impedir sua candidatura fragiliza ainda mais a democracia no Brasil, com impactos na região e no mundo. 
 
Em artigo publicado nesta terça-feira (23) no New York Times, ele disse que as decisões do juiz da Lava Jato, Sérgio Moro colocam a “democracia brasileira à beira do abismo” e ainda levanta uma série de evidências de que barrar a candidatura de Lula em 2018 enfraquecerá social-democracia no país. Acompanhe a seguir o artigo na íntegra:
 
The New York Times 
 
Democracia do Brasil é empurrada para o Abismo
 
Por Mark Weisbrot
 
WASHINGTON – A regra da lei e a independência do judiciário são realizações frágeis em muitos países – e suscetíveis a reversões bruscas.
 
O Brasil, o último país do mundo ocidental a abolir a escravidão, é uma democracia bastante jovem, tendo saído da ditadura há apenas três décadas. Nos últimos dois anos, o que poderia ter sido um avanço histórico – o governo do Partido dos Trabalhadores concedeu autonomia ao judiciário para investigar e processar a corrupção oficial – tornou-se o contrário. Como resultado, a democracia brasileira agora é mais fraca do que aconteceu desde que o governo militar acabou.
 
Esta semana, em que a democracia pode ser mais corroída quando um tribunal de apelação de três juízes decidir se a figura política mais popular do país, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do Partido dos Trabalhadores, será impedido de competir nas eleições presidenciais de 2018 , ou mesmo preso.
 
Não há muita pretensão de que o tribunal seja imparcial. O presidente do painel de apelação já elogiou a decisão do juiz de julgamento de condenar o Sr. da Silva por corrupção como “tecnicamente irrepreensível”, e o chefe de gabinete do juiz postou em sua página no Facebook uma petição pedindo a prisão do Sr. Silva.
 
O juiz de julgamento, Sérgio Moro, demonstrou seu próprio partidarismo em numerosas ocasiões. Ele teve que pedir desculpas ao Supremo Tribunal em 2016 por divulgar conversas telefônicas entre o Sr. da Silva e a presidente Dilma Rousseff, seu advogado e sua esposa e filhos. O juiz Moro organizou um espetáculo para a imprensa em que a polícia apareceu na casa do Sr. da Silva e levou-o para interrogatório – apesar de o Sr. da Silva ter dito que iria denunciar voluntariamente para interrogatório.
 
A evidência contra o Sr. da Silva está muito abaixo dos padrões que seriam levados a sério, por exemplo, no sistema judicial dos Estados Unidos.
 
Ele é acusado de ter aceitado um suborno de uma grande empresa de construção, chamada OAS, que foi processada no esquema de corrupção “Carwash” no Brasil. Esse escândalo de vários bilhões de dólares envolveu empresas que pagam grandes subornos a funcionários da Petrobras, empresa estatal de petróleo, para obter contratos a preços grosseiramente inflacionados.
 
O suborno alegadamente recebido pelo Sr. da Silva é um apartamento de propriedade da OAS. Mas não há provas documentais de que o Sr. da Silva ou sua esposa já tenham recebido títulos, alugados ou mesmo ficaram no apartamento, nem que tentaram aceitar esse presente.
 
A evidência contra o Sr. da Silva baseia-se no testemunho de um executivo da OAS condenado, José Aldemário Pinheiro Filho, que sofreu uma pena de prisão reduzida em troca da evidência do estado de viragem. Segundo o relato do importante jornal brasileiro Folha de São Paulo, o Sr. Pinheiro foi impedido de negociar a súplica quando ele originalmente contou a mesma história que o Sr. da Silva sobre o apartamento. Ele também passou cerca de seis meses na prisão preventiva. (Esta evidência é discutida no documento de sentença de 238 páginas).
 
Mas essa escassa evidência foi suficiente para o juiz Moro. Em algo que os americanos poderiam considerar como um processo de canguru, condenou o Sr. da Silva a nove anos e meio de prisão.
 
O estado de direito no Brasil já havia sido atingido por um golpe devastador em 2016, quando a indicada do Sr. Silva, Sra. Rousseff, eleita em 2010 e reeleita em 2014, foi acusada e demitida do cargo. A maior parte do mundo (e talvez a maioria do Brasil) pode acreditar que ela foi acusada de corrupção. Na verdade, ela foi acusada de uma manobra contábil que temporariamente fez com que o déficit orçamentário federal fosse menor do que seria de outra forma. Era algo que outros presidentes e governadores faziam sem consequências. E o próprio promotor federal do governo concluiu que não era um crime.
 
Embora houvesse funcionários envolvidos na corrupção de partidos em todo o espectro político, incluindo o Partido dos Trabalhadores, não houve acusações de corrupção contra a Sra. Rousseff no processo de impeachment.
 
O Sr. da Silva continua a liderar nas eleições de outubro por causa do sucesso dele e do partido em reverter um longo declínio econômico. De 1980 a 2003, a economia brasileira mal cresceu, cerca de 0,2 por cento anualmente per capita. O Sr. da Silva assumiu o cargo em 2003 e a Sra. Rousseff em 2011. Em 2014, a pobreza foi reduzida em 55% e a pobreza extrema em 65%. O salário mínimo real aumentou 76%, o salário real geral aumentou 35%, o desemprego atingiu níveis recordes e a infame desigualdade do Brasil finalmente caiu.
 
Mas em 2014, uma profunda recessão começou, e a direita brasileira conseguiu aproveitar a desaceleração para classificar o que muitos brasileiros consideram um golpe parlamentar.
 
Se o Sr. da Silva for impedido da eleição presidencial, o resultado poderia ter pouca legitimidade, como nas eleições hondurenhas de novembro, que eram amplamente vistas como roubadas. Uma pesquisa no ano passado descobriu que 42,7% dos brasileiros acreditavam que o Sr. da Silva estava sendo perseguido pelos meios de comunicação e pelo judiciário. Uma eleição não-crivel pode ser politicamente desestabilizadora.
 
Talvez o mais importante, o Brasil se reconstituirá como uma forma de democracia eleitoral muito mais limitada, em que um judiciário politizado pode excluir um líder político popular de se candidatar a cargos. Isso seria uma calamidade para os brasileiros, a região e o mundo.
 
Mark Weisbrot, codiretor do Centro de Pesquisas Econômicas e Políticas em Washington e o presidente da Just Foreign Policy, é o autor de “Failed: What the ‘Experts’ Got Wrong About the Global Economy.” (Falha: onde os ‘especialistas erraram sobre a economia global’).
 
Redação

9 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Esta saindo em muitos jornais no exterior

    Por todos os lados que se olhe não ha como o TRF-4 endossar a sentença de Sergio Moro. So se condena Lula se fecharem os olhos para a realidade do lawfaire que vêm sendo praticado contra Luiz Inacio e todo a questão ideologica por tras disso. 

  2. Curiosamente, quem  empurrou

    Curiosamente, quem  empurrou nossa democracia para o golpe foi a imprensa gringa.

    O primeiro indício de que o governo brasileiro poderia ser deposto por razões petrolíferas foi dado 08/07/2012, quando o Wall Street Journal criticou a lentidão do Brasil em explorar o Pré-Sal https://www.wsj.com/articles/SB10001424052702303684004577510961395608768. Foi por esta razão que considerei aquela data como um marco inicial possível na cronologia do golpe de 2016 https://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/cronologias-do-golpe-de-2016-por-fabio-de-oliveira-ribeiro.

    O golpe contra a candidatura Lula é apenas a evolução natural do golpe de 2016, o qual começou em 2012 por causa do petróleo e se tornou uma realidade porque Aécio Neves foi rejeitado nas urnas. 

  3. Caro Nassif
    Foi dado um

    Caro Nassif

    Foi dado um golpe.

    E ainda falam em democracia que foi empurrada pelo abismo?????

    Falta pouco para completarmos dois anos de golpe.

    54 milhões de votos foram jogados no lixo, o judiciário mentiu para isso, eles tem que seguir o roteiro.

    Mais do que golpistas, são traidores, entreguistas.

    E ainda brincamos de republicanos.

    Saudações

  4. iiiiii, acabou……

    Para a juizada/mpzada/stfzada, essa parada de dar palestrinha em universidades gringas, ja era, finito, never more, kaput………voces estão altamente radioativos….depois desse artigo, justiça e agregados brasucas tem a credibilidade de uma nota de 3 rublos… palestrinha no Brasil. sil, sil ja ta de bom demais….

  5. Hanna Arendt descobriu que Eichmann era mediocre.

     Hanna Arendt descobriu que  Eichmann era mediocre, no  dia do julgamento do mesmo em Jerusalém.  Ficou surpresa com o que chamou depois de banalidade do mal.  Talvez supresa, pois a mediocridade no poder é capaz das maiores atrocidades.  Não sei se jamais veremos Moro no banco dos réus, mas acredito que os dias de palestrante em Harvard e outros que tais acabaram para Moro. Restará apenas  os escombros de uma figura que jamais esteve a altura do próprio ego. Mediocres são isto, uma eterna disfunção com o próprio ego. Inebriado no poder, não se deu conta do tempo nem da história. Quando aqui criticado, deu beijinhos no ombro, mas daria tudo para saber o que sentiu quando viu a notícia no New York Times. Talvez tenha chorado, afinal tem feito tudo para agradar aos gringos. Deve ter se sentido injustiçado. Talvez como  Eichmann, vá dizer que apenas seguiu ordens.

    1. Pois, Frederico

      eu tenho fé, convicção profunda e, por que não dizer, ganas, de que hei de viver pra  ver o moro em maus lencóis, principalmente pelos seus crimes políticos.

      Só quero que ele receba a justiça que está distribuindo.

      Esperei dezenas de anos para ver o justiçamento do maluf.

  6. Quem diria, deu no New York
    Quem diria, deu no New York Times que o judiciário brasileiro é um judiciário “canguru”.
    O DCM esclarece o significado da expressão idiomática. Quem já viu “M”, de Fritz Lang, sabe do que se trata.
    Bom lembrar que Mark Weisbrot não é o NYT. Tem espaço lá, como Jânio de Freitas, na Folha, mas não representa a linha editorial do PIG de lá. De qualquer forma, já ganhou um lugar de honra na história da luta democrática no Brasil. Disse a Sérgio Moro e aos demais próceres da lavajato, com todas as letras, o que o mundo civilizado pensa deles. E NO NEW YORK TIMES!!!!

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador