Lista de Livros: Os caminhos da reflexão metafísica, de Mauro Cardoso Simões

Lista de LivrosOs caminhos da reflexão metafísica: fundamentação e crítica, de Mauro Cardoso Simões

Editora: InterSaberes

ISBN: 978-85-443-0287-3

Opinião: regular

Páginas: 232

       “O pensamento humano é, essencialmente, filosófico” (Husserl).

       Quer dizer, o espírito humano, desperto e livre de preconceitos, não descansa em suas investigações até que não tenha descoberto as últimas causas do maior número possível de fenômenos. O pensamento deseja ir até as fontes do ser, quer conhecer as relações dos seres entre si e tende a unificar os seus conhecimentos isolados em uma síntese, em uma visão de conjunto. Todo o pensar humano procura refletir, criticamente, sobre o valor daquilo que elabora. Tudo isso é, precisamente, trabalho da filosofia.”

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        “A verdade ontológica de uma coisa não é senão a completa concordância com o que ela deve ser, ou seja, com o plano segundo o qual foi feita. É precisamente esse plano de organização metafísica que, em última análise, a inteligência procura descobrir. Ao descobri-lo, dizemos que a verdade ontológica do objeto causa em nós a verdade lógica, isto é, uma concordância intencional entre a realidade e o nosso intelecto. Dizemos “intencional” em um sentido todo próprio, epistemológico: o conceito, que se espelha em nós (que somos a realidade), aponta ao objeto. Nós entendemos realmente a coisa, não o conceito, que não passa de simples meio de conhecimento. Ou, em outros termos: o que a inteligência vê é o conteúdo objetivo do conceito, não a sua forma (subjetiva).”

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        “Você pode expulsar a natureza com um forcado, mas ela continuará retornando.” (Horácio)

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        “Um sistema científico não é outra coisa senão a concatenação de toda uma série de definições, demonstrações, conclusões, hipóteses e axiomas, segundo determinado “método” e tratando de determinado objeto. É nesse sentido que geralmente se fala hoje em “ciência”.

       Todos os três significados da palavra ciência têm uma coisa em comum: a de que procura sempre exprimir seu conhecimento por meio da relação entre causa e efeito; e a condição indispensável é que seja sempre um conhecimento “certo” e “evidente”, ou seja, que do ponto de vista lógico haja estrita consequência das operações cognoscitivas e que do ponto de vista objetivo ou ontológico seja manifesta a concordância entre o conhecimento e a realidade.”

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        “Para Platão, a procura pela verdade há de se distinguir como tarefa por excelência da filosofia. Só assim o conhecimento torna-se fundamental e dotado de valor.”

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        “É adequado afirmarmos que todos os filósofos gregos concordavam que o homem é algo que sobressai ao resto do universo e que a alma humana é a parte mais importante do composto chamado homem. Parece ser também um consenso que a alma sobrevive após a morte do corpo.

       Nesse panorama, as duas mais importantes visões sobre o homem que tiveram uma influência decisiva na alta escolástica foram as de Platão e Aristóteles. Podemos incluir nessa influência, também, o neoplatonismo e alguns elementos do estoicismo. Para Platão, a alma é o verdadeiro ser do homem; ela é o espirito exilado no mundo material e sua única tarefa é vencer a matéria e retornar ao mundo a que propriamente pertence, qual seja, o mundo das ideias.

       Enquanto na concepção platônica a alma é verdadeiramente o outro-mundo (o mundo das ideias), para Aristóteles ela é primordialmente a substância do corpo. Embora Aristóteles atribua à alma humana certo parentesco com a divina, toda a sua doutrina sobre a alma humana (não “materialista”) revela-se inteiramente assentada e com os “pés no chão”.

       Na filosofia estoica, a alma era concebida como uma participação na alma cósmica ou no logos, algo de caráter monístico. Essa alma, um fragmento ou uma “centelha” da alma divina, é a verdadeira personalidade do homem. Além disso, a verdadeira sabedoria consiste em libertar o pensamento e o querer dos liames das coisas terrenas, empíricas ou particulares e conservar a alma em harmonia com a direção divina e universal do cosmos.

       Quando o neoestoicismo se encaminhava para uma visão de mundo determinista, naturalista e de um materialismo rígido, surge outra filosofia, o neoplatonismo — que aparece como defensora da doutrina da imortalidade e da “redenção” dos grilhões do mundo material. Para Plotino, a alma do homem é uma emanação da Alma Universal, que, por sua vez, provém do noûs (razão), do Uno*, enquanto pensa e quer por si mesmo.”

*: É uma ideia que significa “centro de onde derivam todas as coisas”. Serve como princípio organizador do mundo, que é pura multiplicidade.

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        “Segundo Étienne Gilson (1995), a ética de Agostinho forma uma só com a sua metafísica e a sua religião. O conhecimento ético é um caso particular da iluminação divina, que é, ela própria, um efeito das ideias divinas (justiça, amor, caridade). As definições de círculo e de esfera são verdades eternas e necessárias que julgam o nosso pensamento, e este, por sua vez, julga os círculos e as esferas particulares. Mas as verdades morais são tão imutáveis, necessárias e eternas quanto especulativas. Além disso, todo homem as vê na sua própria mente e elas são comuns a todos. Nesse sentido, todos parecem concordar que a sabedoria consiste no conhecimento pelo qual se obtém a felicidade; daí se infere que é necessário se esforçar para obtê-las.

        “Única razão de filosofar é ser feliz; só aquele que é verdadeiramente feliz é verdadeiramente filósofo, e só o cristão é feliz, porque é o único que possui – e possuirá para sempre – o verdadeiro Bem, fonte de toda felicidade”. (Fonte: Étienne Gilson, A filosofia na Idade Média, 1995, p. 133.)

       Muitas regras de sabedoria são claras, tais como respeitar a justiça, subordinar o inferior ao superior, tratar equitativamente as coisas semelhantes, dar a cada um o que lhe é devido etc. Todas essas regras, e muitas outras mais, constituem em nós as muitas expressões de uma ideia, de uma lei inteligível que é, para a nossa mente, uma luz. Há, portanto, uma iluminação moral das virtudes como há uma iluminação especulativa das cognições científicas. Em outras palavras, a mesma explicação metafísica considera a iluminação física dos corpos pelos números, a iluminação especulativa da mente pela ciência e a sua iluminação moral pela virtude.

       As regras morais, cuja luz brilha em nós, constituem a “lei natural”: e o conhecimento, ou a percepção dessa luminosidade, chama-se consciência. Mas a consciência moral e o conhecimento das virtudes não bastam para consumar a vida moral. O homem não é só intelecto, é também vontade, e enquanto a sua vontade não se conformar com as prescrições da verdade moral, não se pode dizer que haja moralidade. O modelo de ordem que se obteria em nós mesmos se encontra diante de nós, na natureza.

       A sabedoria de Deus colocou tudo em seu próprio lugar e estabeleceu entre as coisas todas as relações que convêm às suas naturezas. A “justiça” física é o modelo ideal com base no qual as nossas ações deveriam se realizar. As quatro virtudes cardeais de prudência, fortaleza, temperança e justiça são expressões particulares da “lei eterna” – e que, vale dizer, funcionam como regras de conduta aplicáveis a problemas particulares da vida moral.

       De modo inverso, a origem comum dos vícios morais é o injusto movimento da vontade que se recusa a conformar-se às prescrições da ordem eterna. Mais especificamente, os vícios são ações desordenadas da vontade, que prefere o deleite dos bens materiais ao gozo da verdade inteligível.”

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        “A maior contribuição que marca a metafísica de São Tomás de Aquino pode ser considerada a doutrina filosófica sobre Deus, sendo mais conhecida pela doutrina das cinco vias para provar a existência divina.

       As cinco vias para provar a existência de Deus

       A primeira prova analisa a realidade do movimento e chega à conclusão da existência de um motor imóvel, sendo que a base para essa prova é a seguinte: nada pode mover-se por si mesmo, mas somente por outro (esse é o principio da causalidade). Além disso, não se pode conceber uma série indefinida de causas. Resumindo: todo movimento tem uma causa, sendo que esta deve ser exterior ao ser que está em movimento. Assim, não se pode ser, ao mesmo tempo, o que é movido e o que é o princípio ou causa do movimento. Aquino foi o primeiro a introduzir esse raciocínio aristotélico na escolástica.

       A segunda prova foi extraída da série das causas eficientes. Isso significa que há um limite na cadeia delas, e esse limite é a causa primeira, que não possui outra causa que seja o fundamento de sua existência – ou seja, nada pode ser causa eficiente de si mesmo. Desse modo, toda causa eficiente supõe outra, a qual supõe outra, sucessivamente. É necessário, portanto, que exista uma primeira causa da série, uma causa intermediária e uma causa última. Essa causa primeira é Deus.

       A terceira prova está fundamentada nas noções de contingência e necessidade e leva à conclusão da existência de um Ser primeiro e necessário. Uma vez que seres contingentes só podem existir pela admissão de um ser necessário que lhe sustente, e sendo que não se pode admitir uma série infinita de seres necessários, Aquino defende ser Deus o Ser primeiro e necessário – ou seja, o Ser necessário por si mesmo e que é causa de todos os seres não pode ser outro a não ser Deus.

       A quarta prova é aquela que se fundamenta nos graus de perfeição das coisas. O conhecimento dos diversos graus de bem e de verdade das coisas leva-nos ao conhecimento de um Ser Supremo perfeitíssimo, que é causa de todo bem e de toda perfeição nas coisas.

       Por último, a quinta prova da existência de Deus – que tem caráter teológico e se inspira nas obras dos santos padres da Igreja. A tese é a seguinte: a ordem e a finalidade que se observa no mundo nos levam ao conhecimento de uma inteligência suprema ordenadora, e essa inteligência primeira e ordenadora da finalidade das coisas é Deus. Essas provas, para Aquino, não são apenas o fundamento de nosso conhecimento da existência de Deus, mas também apontam o caminho das reflexões sobre a essência e os atributos divinos. Em resumo, tais provas contêm a demonstração de Deus como: a) primeiro motor imóvel e ato puro, sendo a mais pura realidade e sem nenhum grau de potencialidade; b) primeira causa (sem nenhuma outra causa) de todos os seres; c) ser eterno, necessário e perfeito.”

Redação

1 Comentário

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  1. um dia deixaremos de lado qualquer identificação temporal…

    a face da alma, e só a face, habita o centro do universo……………………………………………………

    porque em toda verdade conhecida, há um mesmo núcleo desconhecido que habita todas as formas de vida

    em tese, por enquanto, um mesmo sistema nervoso para diferentes informações quânticas

    Deus? talvez só para os casos em que estas informações se dissipam parcialmente, mas não para milagreiros de araque, para um universo próprio, em construção, não necessariamente humano

     

    Doney tem uma capacidade de seleção sem igual ou muito rara. Beleza de trabalho

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