Michel Aires
Graduação em filosofia pela UNESP. Mestre em filosofia pela UFSCAR. Doutor em educação pela USP. Tem experiência nas áreas de Filosofia e Educação, com ênfase na Teoria Crítica, em particular, nos pensamentos de Herbert Marcuse e Theodor Adorno. Possui artigos publicados nas áreas de educação, filosofia e ciências sociais.
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Educação política e os objetivos do desenvolvimento sustentável da ONU, por Michel Aires de Souza Dias

As metas do desenvolvimento sustentável só podem ser de fato cumpridas com uma população consciente e esclarecida.

Ilustração: Agência de Notícias da Indústria

Educação política e os objetivos do desenvolvimento sustentável da ONU

por Michel Aires de Souza Dias

A educação política é o principal caminho para o desenvolvimento sustentável, uma vez que procura conscientizar os indivíduos de que é necessário reconciliar o progresso e o crescimento econômico com a preservação do meio ambiente. No século XXI, para atender a demanda da população de mais de 7 bilhões de habitantes, tornou-se necessário gerenciar a produção de alimentos, a energia, a água e o meio ambiente de modo racional. Nesse sentido, é fundamental fazer esforços para colocar o mundo no caminho da sustentabilidade. Caso essa premissa não seja colocada em prática de forma urgente, é bem possível que a humanidade desapareça em um futuro bem próximo. Foi por causa disso que a Assembleia das Nações Unidas (ONU) desenvolveu 169 metas globais a serem alcançadas até 2030, para atingir os 17 ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

 Essas ODS de modo geral buscam erradicar a pobreza e a fome; acabar com as epidemias e os problemas de saúde pública; eliminar todas as formas de discriminação; garantir a água potável e saneamento básico para todos; garantir energia limpa, sustentável e renovável; reduzir as desigualdades sociais; garantir a todos moradia digna; desenvolver consumo e produção sustentáveis; criar ações contra o aquecimento global; proteger o ecossistema e gerir de forma sustentável as florestas; conservar e fazer uso sustentável dos oceanos, mares e recursos marinos; promover a paz e reduzir todas as formas de violência e as taxas de mortalidade.

Por exemplo, uma das metas da ODS 3 é erradicar até 2030 as epidemias de AIDS, tuberculose, malária e doenças tropicais negligenciadas, e combater a hepatite, doenças transmitidas pela água, e outras doenças transmissíveis. Outra meta dessa ODS é reduzir em um terço a mortalidade prematura por doenças não transmissíveis via prevenção e tratamento, e promover a saúde mental e o bem-estar. Outra meta, é a cobertura universal de saúde, o acesso a serviços de saúde essenciais de qualidade e o acesso a medicamentos e vacinas essenciais seguros, eficazes, de qualidade e a preços acessíveis para todos.

Se ainda enfrentamos problemas como esses no Brasil, de saúde e bem-estar, em pleno século XXI, isso decorre da captura do Estado pelos interesses privados. Com o desenvolvimento das políticas neoliberais e o fim das políticas de bem-estar social, o Estado tornou-se presa dos interesses do mercado. As políticas neoliberais no governo Bolsonaro, por exemplo, levaram 30 milhões de pessoas a passar fome. Se o governo Lula, com políticas de bem-estar, conseguiu erradicar a fome, fazendo o Produto Interno Bruto (PIB) crescer de 509,8 bilhões de dólares (2002) para 2,6 trilhões de dólares (2011), esse valor decaiu no governo Bolsonaro, em 2021, para 1,6 trilhões de dólares, produzindo uma grande taxa de desemprego e levando o Brasil ao mapa da fome.

Se a população tivesse um maior esclarecimento político e pudesse analisar o orçamento do Governo Federal em 2022, ela ficaria perplexa ao saber que quase metade da arrecadação, pago em impostos, foi para os banqueiros e rentistas.  O orçamento de 2022 no Brasil foi de 4,060 trilhões de reais. Desse valor, o Governo Federal gastou com saúde apenas 3,37%, com educação 2,70% e com assistência social 4,77%. Por sua vez, os milionários abocanharam quase metade do orçamento, 1,8 trilhões, ou seja, 46,30% do orçamento pago na forma de juros. Mas não é só isso, o mais irracional e estarrecedor é que os títulos públicos, adquiridos pelos bancos e rentistas, que deveriam financiar investimentos sociais e possibilitar o progresso econômico, são usados integralmente nos gastos da própria dívida. É um poço sem fundo. Essa é a principal causa dos nossos problemas de fome, miséria e subdesenvolvimento.

 Para que as metas da ODS sejam cumpridas é de extrema importância mudar essa equação. É necessário gastar mais com saúde, com educação e com assistência social. O novo governo que se estabeleceu em 2023 tem feito esforços para baixar as taxas de juros e tem dado prioridades as políticas de saúde, educação e bem-estar social. Mas com um Banco Central independente do governo, mas ligado ao mercado, cumprir as metas do desenvolvimento sustentável tornou-se uma missão impossível.

Acreditamos que a educação política nas escolas é fundamental para salvarmos o planeta. As metas do desenvolvimento sustentável só podem ser de fato cumpridas com uma população consciente e esclarecida. A ideia de uma educação política almeja que todos compreendam que são os homens mesmos que são os protagonistas de sua própria história. É necessário que todos compreendam que a democracia é parte da experiência dos indivíduos, que são eles mesmos que são sujeitos do processo político. Segundo o filósofo alemão Theodor Adorno (1995), o que existe em nossa atualidade é uma cisão entre os indivíduos e a política, como se suas ações não fossem responsáveis pelo que acontece no mundo. O que as pessoas deveriam refletir e compreender, por meio da educação, é que a política deve ser identificada ao próprio povo, que ela é expressão de suas próprias ações. Por esta razão, é necessária uma educação que fomente a reflexão nos indivíduos de seu papel como agente político, que contribua para o seu próprio destino e para a organização da sociedade. É somente pela educação política que essa conscientização pode surgir, fortalecendo a resistência dos indivíduos contra toda forma de opressão.

Referências

ADORNO, Theodor. Educação e Emancipação. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995

FATTORELLI, M. L. & AVILA, R. Gastos com dívida consumiram 46,3% do orçamento federal em 2022. Auditoria Cidadã da Dívida: 2023. Disponível em < https://auditoriacidada.org.br/conteudo/gastos-com-a-divida-consumiram-463-do-orcamento-federal-em-2022/>


Michel Aires de Souza Dias – Doutor em educação pela Universidade de São Paulo (USP).

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