Só deu tempo de salvar meu filho e pegar uma mochila, conta morador de Eldorado do Sul ao GGN

Camila Bezerra
Jornalista

Em Eldorado do Sul, a sociedade civil por responsável por realocar 80% das famílias, mas há quem resista em deixar a cidade por medo de roubos e furtos

Crédito: Diego Vara/ Agência Brasil

O programa TVGGN da última sexta-feira (12) contou com a participação do ativista e membro da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) Neil Naif, que deu seu relato sobre o trabalho voluntário para salvar vítimas da enchente em Eldorado do Sul, no Rio Grande do Sul, e até compartilhar o próprio drama pessoal.

Naif conta que é militante na área ambiental há mais de 11 anos, além de lutar também por mais moradias populares no estado. Devido à proximidade com a temática, na terça-feira (30 de abril), ele deu início ao trabalho de transferência das famílias. 

“O que a gente viu durante todo esse processo, até a sexta-feira (3), foi quase 80% a sociedade civil, a comunidade eldoradense fazendo a logística pela realocação de famílias”, observa o entrevistado, que atua como motoboy.

Neil Naif conta que foi à casa do filho, na Cohab no bairro de Santa Rita, para tirá-lo da casa da ex-companheira. “Descanso um pouco, acordo de manhã com a água já dentro da casa da minha ex-esposa, tudo debaixo d’água. O bairro inteiro em 30 minutos ficou debaixo d’água só sai com a mochila e meu filho no colo.”

Drama

Localizada na região metropolitana de Porto Alegre, Eldorado do Sul foi a cidade que ficou com, pelo menos, 90% da área submersa. Segundo dados da prefeitura, são mais de 120 óbitos até o momento e quem ainda resiste em permanecer nas casas está sem serviços básicos como água e luz. 

“Grande parte da população de Eldorado do Sul está sendo abrigada em Guaíba, Mariana, Pimentel e Barra do Ribeiro e Tapes, na costa doce. Alguns foram para alojamentos em Porto Alegre e para Canoas. A cidade ainda tem pessoas que mesmo sabendo da evacuação, têm medo de roubos e furtos, o que dificulta a própria atuação dos voluntários”, continua Naif. 

O próprio entrevistado está na casa de amigos em Guaíba, depois de conseguir salvar o filho e os familiares. “A gente sofre enchente quase cotidianamente.” 

Contramão

Eldorado do Sul, segundo Neil Naif, não existe mais. Isso porque a cidade fica em um território de planície costeira, entre os rios Jacuí e Guaíba. “Questões de monocultura, focada sempre no plantio de arroz, o que facilitou muito a enchente pelo rio Jacuí e que descarregou na cidade inteira porque a cidade é rodeada pela monocultura e pelos arrozeiros, que é um debate que a gente já vem fazendo há muito tempo dentro da cidade.”

O entrevistado chama atenção ainda para outro fato ambiental que prejudica não só o estado, mas o aquecimento global em todo o mundo. A aprovação da mina carvoeira em Eldorado do Sul, que é a terceira maior empresa de mineração de carvão a céu aberto do mundo, voltada tanto para commodities, quanto para exportação para a China e outros países. 

Apesar da luta de diversos movimentos sociais para barrar o projeto, entre eles a Agapan, o MST, grupos de pescadores e comunidades indígenas, o projeto teve o aval dos parlamentares. “Esse projeto é aprovado em 2017, deputados tanto do campo progressista quanto de direita aprovam na Assembleia Legislativa o polo carbonífero no Rio Grande do Sul. Enquanto o mundo já estava falando sobre mudanças climáticas, nossos deputados gaúchos aprovam um retrocesso ambiental”, continua Naif.

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