Wilson Ferreira
Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.
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Esquerda desarmada diante das operações psicológicas “alt-right”, por Wilson Ferreira

por Wilson Ferreira

Fotos de Bolsonaro e do futuro ministro da Casa Civi, Onix Lorenzoni, cuja angulação e recorte sugerem ao fundo expressões como “anta” ou “traição governa”; vídeo do capitão reformado lavando roupas no tanque; outro vídeo do presidente eleito com a faca na mão em um churrasco debochando do próprio atentado que sofreu. Tudo material distribuído pela assessoria do presidente, pautando a grande mídia e a indignação da esquerda, como matéria-prima para os protestos que acabam virando apenas “metamemes”. Continua em ação uma estratégia muito mais de comunicação do que de propaganda. Uma operação psicológica baseada nos mecanismos de dissonância e ambiguidade diante da qual a esquerda está paralisada e desarmada, incapaz de compreender a linguagem “alt-right”, a ultradireita alternativa, surgida diretamente de sites como o “4chan” (EUA) ou do “Corrupção Brasileira Memes”(CBM, Brasil).  Uma linguagem cuja mão de obra criadora é farta: a geração NEET (Not currently engaged in Employment, Education or Training) ou “Nem-Nem”, cuja desesperança e niilismo ganharam expressão política depois de anos de animações politicamente incorretas como Os Simpsons, Beavis and Butt-head, South Park, American Dad e o Rei do Pedaço.

“Por que a ultradireita está ganhando espaço no mundo todo? Porque são metódicos, são militares, têm disciplina. Por que nós da esquerda somos todos fodidos? Porque é todo mundo desorganizado, tudo muito ‘hare hare’ demais”. 

(Sabrina Bittencourt, ativista por trás das denúncias do guru Prem Baba e do médium João de Deus, Carta Capital, 26/12/2018)

 

Desde que o ator britânico Hugh Grant foi flagrado pela polícia, na famosa Sunset Boulevard, fazendo sexo oral em plena luz do dia com uma prostituta chamada Divine Brown, em uma BMW branca conversível, a gestão de Relações Públicas de crise e de imagem não foi mais a mesma.

Em 1995, Grant estava em Hollywood (graças ao sucesso do filme anterior Quatro Casamentos e um Funeral) para atuar em uma comédia piegas romântica chamada Nove Meses, com Julianne Moore. E a sua famosa foto da ficha policial com ombros retraídos, sorriso tímido e óculos casualmente pendurados na gola da camisa polo foi a “redenção divina” (desculpe o trocadilho…) para Grant em Hollywood – sem arranhão posterior na carreira, criou uma dissonância politicamente incorreta: o britânico fleumático e tímido, ator de comédias românticas, preso por atos obscenos em local público.

A alta audiência do pedido de desculpas ao vivo na TV feito no talk showde Jay Leno, fez o programa ultrapassar o “Late Show With David Latterman”, virando o principal atração do gênero nos EUA; a fama do escândalo fez Divine Brown ficar rica e comprar uma mansão em Beverly Hills; e até a então esposa de Hugh Grant, Elizabeth Hurley, virar estrela de cinema, separando-se do ator só em 2000.

Evento proposital ou involuntário, mas a verdade é que a foto do tímido galã britânico fichado pela polícia ao lado da foto de uma prostituta teve dois elementos repercussivos, muito mais do que o escândalo em si: ambiguidadedissonância.

1995: ainda a tática de ambiguidade e dissonância estava restrito ao Marketing e Relações Públicas

 

Armas semióticas

Mas isso foi em tempos em que estratégias de Relações Públicas como essas se limitavam ao chamado “marketing de guerrilha” de marcas como Benetton ou táticas do “falem bem, falem mal, mas falem de mim” que impulsionavam carreiras de atores e artistas pop.

Hoje fazem parte do arsenal das armas semióticas das guerras híbridas colocado em prática nas diversas “primaveras” do Leste Europeu, Oriente Médio e Brasil, a partir de 2013. O paradoxal é que a tática de criação de ambiguidades e dissonância não é propriamente uma estratégia de propaganda.

Como afirma o antropólogo Piero Leiner, professor da Universidade Federal de São Carlos/SP e estudioso das estratégias militares, “é muito mais uma estratégia de criptografia e controle de categorias, através de um conjunto de informações dissonantes” – clique aqui.

Desde o início, a campanha de Bolsonaro à presidência foi considerada tosca e amadora, com recursos escassos, uma estética pobre do material de divulgação e dona de um discurso limítrofe, incapaz de articular três frases sem um erro de concordância. 

Nunca foi uma campanha clássica de propaganda – sob a aparência de cacos de conceitos ideológicos (meritocracia, Estado Mínimo, menos imposto, etc.), a parte da comunicação se resumiu a memes, vlogs, a ridicularização de qualquer um que se opunha, e uma postura geral “ensaboada” – provocar, xingar e sair correndo. 

Mas, principalmente, provocações que causavam dissonâncias, confundiam a opinião pública e pareciam descoordenados, fazendo os opositores (principalmente a esquerda) reagirem como estivesse diante de uma turba de fascistas hidrófobos, alucinados e cheios de ódio. Mas são disciplinados, cuja tática está fundamentada nas operações psicológicas das estratégias militares da Guerra Híbrida.

 

Loucos do “Brasil Profundo” ou organizada Operação Psicológica?

 

“Caneladas” e expressões subliminares

Um exemplo foram as famosas “caneladas” a qual Bolsonaro se referia sobre as supostas divergências de opinião entre ele e as figuras de comando da campanha – p. ex., divergências sobre a questão do 13o salário e a CPMF com o vice General Mourão e o economista Paulo Guedes. Resultado: uma blitzkrieg de ocupação da pauta da grande mídia e da “secada” da esquerda contra seu rival. Enquanto isso, o também suposto programa de governo do candidato era colocado entre parêntesis no debate.

Após a vitória eleitoral e nesse momento de governo de transição, ainda continua a todo vapor a criação de dissonâncias e ambiguidades com o propósito de gerar uma verdadeira cortina de fumaça para a opinião pública.

É o caso das fotos divulgadas pela assessoria de comunicação do futuro governo, feitas durante as reuniões do governo de transição, que criaram mensagens inusitadas que dão margem a duplo sentido. Em pelo menos três imagens, o termo “transição governamental” inscrito no cenário de fundo ganhou novas configurações em fotos com as presenças de Bolsonaro e do futuro ministro da Casa Civil, Onix Lorenzoni (DEM-RS).

O recorte das fotos sugere a palavra “anta” atrás de Bolsonaro; e atrás de Onix, surge “transão” e “traição governa”. Tudo por conta do ângulo tomado pela lente e pelo recorte do plano. O detalhe é que as fotos foram feitas pela própria equipe do governo, em ambiente em que a imprensa não tem acesso.

Imagens que fizeram a delícia da oposição e viralizaram nas redes sociais. Um fotógrafo espera uma carreira inteira para clicar imagens com poder simbólico como essas… Mas a assessoria de comunicação consegue divulgar no atacado fotos que nada mais que ilustram as próprias críticas da oposição: subliminarmente, um fotógrafo denuncia um governo promíscuo, traiçoeiro e liderado por uma anta…

Uma variação dessa estratégia foi a divulgação de um vídeo do “mito” lavando roupa suja no tanque no Natal em Marambaia, RJ. 

Ou ainda o vídeo (também divulgado pela assessoria do presidente) em que Bolsonaro, com uma faca na mão em um churrasco, brincando aponta para um dos atendentes e debocha: “Olha aqui. Se eu fizer um corte desse aqui em você, você vai ser presidente da ONU”, disse Bolsonaro aos risos em meio às gargalhadas dos apoiadores ao redor. Provocativamente, o capitão da reserva faz escárnio do próprio atentado que o catapultou à presidência.

 

 

Alimentando o inimigo

É como se a estratégia de comunicação do clã Bolsonaro fosse alimentar continuamente a oposição com matéria-prima para memes (como por exemplo, a apropriação da foto de Marambaia em tom laranja para ironizar o Caso Queiroz que “tinge de laranja a posse da presidência”) e para o wishful thinking das esquerdas sobre supostas fissuras internas na equipe do governo ou auto sabotagem subliminar de profissionais na assessoria do presidente.

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Wilson Ferreira

Wilson Roberto Vieira Ferreira - Mestre em Comunição Contemporânea (Análises em Imagem e Som) pela Universidade Anhembi Morumbi.Doutorando em Meios e Processos Audiovisuais na ECA/USP. Jornalista e professor na Universidade Anhembi Morumbi nas áreas de Estudos da Semiótica e Comunicação Visual. Pesquisador e escritor, autor de verbetes no "Dicionário de Comunicação" pela editora Paulus, e dos livros "O Caos Semiótico" e "Cinegnose" pela Editora Livrus.

7 Comentários

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  1. A esquerda costuma ter

    A esquerda costuma ter escrúpulos, limites. A direita já os mandou para o espaço faz tempo. Por isso eles ganham o jogo, porque eles compram o juiz (as vezes, literalmente).

    Alguém aqui teria coragem de usar um adesivo da esposa do Bolsonaro na boca do tanque de combustível, como fizeram com a Dilma?

    Alguém aqui espalharia fake news extremamente ofensivas, tendo absoluta consciência de que é tudo mentira?

    Alguém aqui defende abertamente que o judiciário aplique tratamentos absolutamente opostos em situações idênticas, dependendo apenas da filiação partidária do acusado?

    1. Tem toda razão. Aí está o

      Tem toda razão. Aí está o cerne da questão: a direita sempre jogou sujo.

      Ou a esquerda decide definitivamente sujar as mãos (e a alma) ou seremos o eterno Cavaleiro da Triste Figura, nobre e justo, mas sempre derrotado.

      Para mim esse é o maior dilema que a esquerda deve resolver antes de partir para cima.

    2. Dinheiro pelo dinheiro é algo

      Dinheiro pelo dinheiro é algo sujo, mesmo, relacionado ao que de mais primitivo e bárbaro há na gente: temor, violência, egoísmo, desejo de me impor sobre o outro ou pelo menos que haja quem se imponha, ainda que sobre mim.

      Pode levar um tempo ainda mas a civilidade vai se impor sobre essa barbárie, fazê-la sumir sem brigar contra ela, apenas desprezando-a, adotando-se um jeito, ué… civilizado de ser.

  2. Pq Bolsonaro usa as redes
    Pq Bolsonaro usa as redes manipulacionais ops quer dizer sociais?Ora pq o seu público foi moldado nela e sendo assim precisa ser alimentado com conteúdos no perfil deles,por isso ele não tira o PT/Lula/Cuba/Venezuela da boca, são palavras chave q são acionadas no subconsciente dos Bolsominions q geralmente são pessoas vulneráveis emocionalmente e facilmente identificáveis nas redes manipulacionais,com isso são direcionados material publicitário p eles e bingooo,formados Bolsominions legítimos é uma espécie de novela q a própria pessoa quer ver,a esquerda precisa aprender a fazer associação das coisas com as palavras,até as pessoas fixarem na mente,é repetição mesmo,o brasileiro tem o entendimento limitado, não pode passar informação complexas,ele não assimila muito(tiro por mim)a informação sendo simples passa fácil pelo primeiro filtro da nossa mente,aqui no ggn vejo um jornalismo muito bom, matérias diferentes,mas na terceira matéria lida já esquecemos a primeira q lemos,tudo bem a variação,só q têm q repetir outras vezes a matéria q foi postada primeiro com outras nuances, visões pq só assim o leitor médio fraco irá entender,vejam o Bolsonaro,escolhe dois três temas e páá manda bala,isso funciona bem p o seu público,olhem se a esquerda não fazer associações vão ficar mais p trás ainda !!

  3. Só sei que a ingenuidade da

    Só sei que a ingenuidade da esquerda brasileira é pavorosa. Nunca leram Maquiavel, nem tem a mínima ideia de como se faz política.. 

  4. Viagem na maionese
    Sinceramente,eu acho que tem muita “viagem na maionese” no artigo acima !
    Eu acho muita teorização em cima de algo muito simples : uma sociedade como a nossa , brasileira , historicamente e culturalmente atrasada , bitolada , idiotizada , bipolar , elegeu um idiota, boçal , ignorante , na maioria das vezes sem noção do que está falando, além de rodeado de gente do mesmo naipe .
    E o PT foi muito parceiro desta tragédia , pois , em 18 anos no Poder , perdeu oportunidades de ouro para REALMENTE transformar a nossa sociedade, preferindo colocar “dinheiro no bolso” das pessoas , a investir maciçamente em uma Educação Publica Fundamental revolucionária , onde as crianças desde os primeiros anos de Escola fossem instigados profundamente à reflexão , ao humanismo e não à robotização e alienação de uma sociedade voltada unicamente para o consumo e “resultados materiais ” .
    Além disso para “coroar” a referida tragédia , por questões provavelmente de vaidade , apego cego ao poder , egocentrismo ou mesmo deficiência de avaliação do ambiente sócio-politico , o partido , mesmo sabendo que a única chance de Bolsonaro era justamente o anti-petismo cevado anos na sociedade pela mídia , poder financeiro-corporativo , além do Judiciario , não teve a grandeza de pensar no país e evitar o mal maior (o que estará posto aí a partir de 1o de Janeiro) apoiando uma chapa Ciro/Haddad que certamente teria evitado tal tragédia que , com quase toda certeza , fará o nosso país retroceder na história.
    O resto são elocubrações , teorizações, “viagens” , meio que fora da realidade e cansativas , meio sem objetividade , como o artigo acima .

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