Por Henrique Marques Porto
Ida Miccolis (1920-2015)
Numa certa noite no início de 1978 o telefone tocou em minha casa. Ao atender ouvi a voz de Ida Miccolis. Naquele dia o “Jornal do Brasil” publicara na íntegra longa carta minha na sessão dos leitores. Era assim naqueles tempos: os jornais respeitavam seus leitores e não cortavam ou editavam a opinião dos outros. Na carta eu denunciava o que vinha acontecendo no Theatro Municipal –o afastamento dos nossos melhores cantores, regentes e até técnicos para favorecer artistas de outros países, entre outras tolices que estavam cometendo. O saco de maldades praticamente encerrou algumas carreiras.
Entre os exemplos que citei na carta estava Ida Miccolis. Carinhosa e atenta, ela conseguiu meu número de telefone e ligou para agradecer, falando de um jeito que lhe era característico –elegante, sensível e musical, como quem canta um recitativo. Se despediu dizendo que antes de dormir iria rezar pelo meu bem estar. Coloquei o telefone no gancho e, comovido, fiquei pensando na fragilidade e grandeza daquela grande artista, que naqueles dias estava sendo desrespeitada e negligenciada.
Ida foi uma cantora fantástica. Na conversa que tivemos ela falou um pouco sobre a carreira. Confessou que tinha dificuldade para ler partituras, mas que era aplicada e aprendera muitos papéis ouvindo as óperas em gravações de referência, entre elas a dificílima “Tosca”, de Giacomo Puccini. Essa informação basta para se ter noção do tamanho do talento e da musicalidade de Ida Miccolis.
A propósito, lembrou que ficara muito tensa em 1972, quando cantou a “Tosca”, no Municipal do Rio, com Carlo Bergonzi e Gian Piero Mastromei. “-Tivemos apenas um ensaio no palco, com orquestra! – lembrou ela. Ela conhecia bem a ópera. A ansiedade ficava por conta de ter que contracenar com dois grandes nomes de fama internacional, a começar por Bergonzi, que era a grande estrela do espetáculo. Pois cantou lindamente, e se impôs como protagonista da ópera. Ficou feliz com os aplausos do público e com os elogios que ouviu de Carlo Bergonzi.
Por mais de vinte anos a bela Ida Miccolis marcou época nas temporadas líricas do Rio, São Paulo e outras capitais. Poderia ter tentado a carreira internacional. Voz e beleza de timbre ela tinha para ser reconhecida em outros países. Em montagem de ópera, apresentou-se em público pela última vez em 1985, no Theatro Municipal, numa sensível homenagem organizada por Fernando Bicudo, que era diretor da Divisão de Ópera do TMRJ. Homenagem a ela e ao tenor Assis Pacheco, seu par em tantas e tantas récitas memoráveis.
Ida Miccolis faleceu hoje aos 95 anos. Não mereceu dos jornais e da autodenominada “crítica especializada” sequer uma breve notícia ou nota de rodapé. Mas o público que teve o privilégio de conhecê-la não a esquecerá.
Tosca -Final do último ato. Ida Miccolis e Carlo Bergonzi.
Theatro Municipal do Rio de Janeiro, 1972.
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Realmente a gente não pode
Realmente a gente não pode deixar de se sentir muito aquém do que realmente somos quando vemos pessoas iportantes, em todas as áreas do conhecimento, da cultura, enfim, serem relegadas a planos menores, mesmo tendo capacidade, qualificação e envolvimento profissional com o que fazem. Este é o grande mal de um paíz, que dizem ter complexo de vira-latas. Aqui, as pessoas ilustres, que deram tanto de si, envelhecem e morrem num verdadeiro esquecimento.
Pena que o post não traz nenhum vídeo apresentando a cantora.
Perda
Mais uma perda para a música lírica, e para a cultura de uma forma geral, e para a nossa em especial.
Vídeos e Áudios com Ida Miccolis
Nassif e amigos,
Na postagem eu coloquei o código errado e o vídeo não apareceu. Corrijo agora, espero que em tempo.
abraços,
Henrique Marques Porto
“Tosca”, Giacomo Puccini – Final do último ato. Rio, 1972. Com Carlo Bergonzi.
https://www.youtube.com/watch?v=DgSO8lxaypE
Cena do 2o. ato da “Fosca”, de Carlos Gomes. Vídeo gravado em São Paulo, 1973.
Com a participação do barítono Costanzo Mascitti.
https://www.youtube.com/watch?v=iGMlZWQdAIA
Parabéns!
Querido amigo Henrique,
Parabéns pelo excelente texto. Você sabe que não entendo muito de Óperas, como você e o nosso querido e saudoso amigo Oscar Peixoto, mas aprecio.
Incorporando seus videos para falicilar o acesso dos seus leitores.
Beijos.
“Tosca”, Giacomo Puccini – Final do último ato. Rio, 1972. Com Carlo Bergonzi.
[video:https://www.youtube.com/watch?v=DgSO8lxaypE%5D
Cena do 2o. ato da “Fosca”, de Carlos Gomes. Vídeo gravado em São Paulo, 1973. Com a participação do barítono Costanzo Mascitti. Cena do 2o. ato da “Fosca”, de Carlos Gomes. Vídeo gravado em São Paulo, 1973.
[video:https://www.youtube.com/watch?v=iGMlZWQdAIA%5D
Obrigado, Laurinha.
E não é
Obrigado, Laurinha.
E não é que eu me atrapalhei todo para incorporar os vídeos? Segui os comandos de sempre e não deu certo. Achei que o Nassif ia editar direitinho, como já fez em outras vezes. Mas, ele anda muito ocupado.
Ida Miccolis foi grande. Na tessitura dela, soprano lírico-dramático, foi a melhor que tivemos.
Beijão
Henrique