A COLUNA – SÃO LUIZ – BRASIL

Por Flávio José Bettanin

Hoje, 29 de outubro, 90 anos do levante de quartéis do RGS, que resultou na formação da Coluna Prestes em São Luiz Gonzaga.

Foi no dia 29 de outubro de 1924, no mesmo dia, as guarnições do Exército Nacional de São Luiz Gonzaga, Santo Ângelo e São Borja, lançaram proclamações declarando-se em estado de revolução contra o governo federal. Assinam as proclamações, pelo 3º Regimento de Cavalaria Independente de São Luiz Gonzaga, o Comandante, 1º tenente João Pedro Gay, pelo 1º Batalhão Ferroviário de Santo Ângelo o seu comandante, capitão Luiz Carlos Prestes. O 2º Regimento de Cavalaria Independente de São Borja divulga proclamação assinada pelos Generais Isidoro Dias Lopes , Honório Lemos, João Francisco, Zeca Neto, Olinto Mesquita, Felipe Portinho, Bernardo Padilha, Leonel Rocha e Miguel Costa.

A leitura dos manifestos e, de modo especial, as assinaturas do de São Borja revelam que o ato de rebeldia obedecia um plano que vinha sendo elaborado pelos militares de todos, ou quase todos, os quartéis do Rio Grande do Sul, em conjunto com os militares que se rebelaram em São Paulo, em julho daquele ano, comandados pelo generais Isidoro Dias Lopes de Miguel Costa e que se encontravam acantonados, após reveses naquele Estado, no oeste do Paraná. E, importante, as assinaturas revelam que as lideranças civis de oposição aos governos estadual e federal, os maragatos rio-grandenses, estavam articuladas com os militares. É de lembrar que os maragatos estiveram em luta contra o governo de Borges de Medeiros em 1923, encerrando a luta pelo Pacto de Pedras Altas. Pelo visto, as lideranças maragatas não se conformaram com o acordo, pois já em 1924 estavam na articulação contra os governos estadual e federal e, seu principal líder, Assis Brasil veio a ser considerado Chefe Civil da Revolução de 1924. Saliento este fato porque ele explica, por ser um forte reduto maragato, a grande adesão de civis à Coluna em São Luiz Gonzaga.

Não aconteceu o esperado levante de grande parte dos quartéis, participantes do plano. Houve adesão parcial, dias após, dos quartéis de Alegrete, comandado pelo tenente João Alberto Lins e Barros, do quartel de Uruguaiana com o capitação Juarez Távora e de um batalhão sediado em Cachoeira, comandado por Fernando Távora. Na região de Alegrete travaram-se combates entre os revolucionários e forças militares fiéis ao governo. Neles participou com seus legionários Honório Lemos. Derrotados, Honório internou-se no Uruguai. Houve tentativa frustrada, pelos revolucionários comandados por Aníbal Benévolo e Siqueira Campos, de ocupar Itaquí, considerado ponto estratégico, sendo morto o primeiro.

Com esses reveses poder-se-ia entender e, assim era noticiado pela imprensa, que a revolução acabara e os comandantes revoltosos seriam presos. Começa revelar-se, então, a personalidade resoluta, firme e de inigualável capacidade de comando do cap. Luiz Carlos Prestes. As forças revolucionárias paulistas estavam no Paraná e aguardavam os gaúchos para prosseguir na revolução. Para ele a missão era levar os gaúchos até lá.

Entendeu, como estratégico, que todas as forças esparsas que ainda restavam se deslocassem para São Luiz Gonzaga para que, reagrupados, formassem uma Coluna, e assim cumprissem a missão de irem até o oeste do Paraná e de lá dessem continuidade à revolução. Prestes com o Batalhão Ferroviário veio unir-se ao 3 RCI que estava intacto com seu efetivo de 500 homens. Para cá dirigiram-se João Alberto, Cordeiro de Farias., Siqueira Campos, Mario Portela. Formava-se a Coluna. A ela aderiram, segundo pesquisas, em torno de 300 civis maragatos. Levando-se em conta que 1500 foram os revolucionários que daqui partiram com a Coluna há de se dizer que grande parte era formada de são-luisenses. Nos registros da coluna o nome de muitos são lembrados. Assim, o de Arcelino cujos feitos são referidos por Jorge Amado no livro O Cavaleiro da Esperança.

Em 11 de abril de 1925 houve o encontro de gaúchos e paulistas e Prestes escreve carta para o Gal. Isidoro, ainda considerado chefe da insurreição, O comandante da coluna missioneira diz “ Infelizmente, não pude aqui chegar com os 1.500 homens que saí de São Luís. Tivemos que lutar mais com a fraqueza e o declínio de certos companheiros do que com o próprio inimigo….”.(A Coluna Prestes, Nelson Werneck Sodré).. É certo que Prestes não conseguiu convencer alguns comandados de atravessar o Rio Uruguai, pois estes consideravam que sair do Rio Grande era exilar-se.

Dos feitos da Coluna muito já se tem escrito, mas, para nós são-luizenses um é especial e deve ser sempre exaltado. Convergiam em direção à São Luiz importantes tropas do Exército e da Brigada Militar para aniquilar os revolucionários. Aproximavam-se formando um cerco e prenunciava-se batalha de proporções e consequência desastrosas. Então, Prestes, já no comando, em manobra extraordinária, rompe o cerco e parte para sua missão de unir-se às tropas paulistas no Paraná. Livrou São Luiz de ser palco de uma batalha sangrenta. Registre-se, igual conduta teve Prestes quando a Coluna aproximava-se de Terezina, Piauí. A situação era inversa, a Coluna faria o ataque. Recebeu na ocasião, das mãos do Bispo D. Severiano Vieira de Melo, carta de Juarez Távora, que estava preso, ponderando as consequências aflitivas para os moradores, se o ataque à Capital do Piauí fosse desfechado. Prestes respondeu: “….Sabes perfeitamente que a nossa campanha tem sido encaminhada de maneira a poupar o mais possível a vida dos nossos patrícios, limitando-nos a combater, quando as necessidades da vitória nos impõem esse meio de ação”. O ataque à Terezina foi suspenso.

A Coluna Prestes percorreu em 3 anos e 3 meses cerca de 30.000 quilometros, Conforme o Prof. Neil Mc Cowley, apud Nelson Werneck Sodré, em A Coluna Prestes: “ Uma das mais empolgantes marchas já efetuadas na história da humanidade, maior e mais extenuante do que a campanha de Aníbal sobre Roma “.

Fazendo restrita síntese das causas, objetivos e resultados. A Coluna Prestes foi um dos episódios dentro do que a história pátria registra como O TENENTISMO. Naquele período as Escolas Militares, forte na pensamento do sociólogo Alberto Torres, de tendências positivista e nacionalista, formaram nos cadetes e oficiais a convicção de que a eles cabia a missão de ser vanguarda das transformações da estrutura arcaica e feudal da República Velha. Imbuídos de idealismo iniciaram as lutas contra o governo que representava a oligarquia mais atrasada e que se opunha às transformações. A Revolta do Forte de Copacabana, em 1922 foi a primeira insurgência. Em julho de 1924 a Revolta dos quartéis de São Paulo sob o comando de Isidoro Dias Lopes, depois, a revolta da oficialidade do Cruzador São Paulo e, o ato culminante, a Coluna Prestes.

O Tenentismo constituiu , efetivamente, força importante da derrocada da República Velha e da oligarquia que ela representava. A Revolução de 1930 foi a desembocadura onde os efeitos políticos do tenentismo fez-se sentir. Entretanto, suas lideranças mais importantes, Luiz Carlos Prestes, João Alberto, Juarez Távora , Cordeiro de Farias seguiram caminhos políticos diversos. Prestes, tomando consciência das limitações dos propósitos que até então orientavam o movimento, procurou avançar com programa que não foi aceito pelos demais. João Alberto, Juarez e Cordeiro, depois de 1930, assumiram cargos importantes do governo Vargas e tornaram-se figuras laudadas pelos poderes dominantes. Inclusive Juarez e Cordeiro têm seus nomes como partícipes importantes do Golpe Militar de 1964. Todas as lideranças tiveram seguidores. Luiz Carlos Prestes tornando-se líder de esquerda radical, reconhecido mundialmente, sofreu 10 anos de prisão. Solto, foi eleito senador da República pelo Partido Comunista. Logo, teve seu mandato cassado, passando longos anos na clandestinidade.

Do líder da Coluna Prestes, mesmo aqueles que discordam de suas ideias, pela firmeza como as defendeu, pela correção de conduta, pelos sofrimentos de suas prisões e morte de sua companheira Olga nos cárceres do nazismo, sofrimentos que não quebrantaram suas convicções pois certo de serem as melhores para o povo brasileiro, é lembrado com respeito, tal como fizeram os remanescentes da Coluna quando em 1984 Prestes aqui em São Luiz esteve, ao saudá-lo afetuosamente, Meu Comandante !

Flávio José Bettanin é advogado e fundador do Instituto Histórico e Geográfico de São Luiz Gonzaga

Redação

0 Comentário

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador