A Visão Adultocêntrica da Infância, por Magali Romboli

De posse dos noticiários deste final de semana, grandes veículos irão faturar em cima da história de quatro crianças

A Visão Adultocêntrica da Infância, por Magali Romboli

A inteligência e a perspicácia de jornalistas que atuavam em veículos de comunicação considerados como “nanicos” pela grande imprensa –  aquela apoiava o estado golpista impetrado em 1964, e alguns outros –  dava um certo conforto e equilíbrio nas audiências nacionais.

Nos dias atuais esses veículos são considerados como imprensa contra-hegemônica, a academia adora criar novas terminologias para os problemas de sempre, no entanto, sabe-se que nessa modalidade de jornalismo, os jornalistas escolhem não ser os marionetes de plantão e, ainda são taxados de forma pejorativa, por certos setores, como “esquerdistas”, mesmo que sejam críticos e analíticos dos governos de esquerda, afinal este é o papel da imprensa. 

 Se seus objetivos eram ou não fazer sucesso, ganhar dinheiro com suas versões do mundo, isto não sei afirmar, mas tinham e ainda tem muito o que dizer sobre a realidade dos fatos, em artigos, reportagens, crônicas e charges de um humor refinado ou bem escrachado. Não escreviam e falavam de forma difícil, então por que não conquistaram a grande massa? 

 Mas houve que era lúcido  para além das penas granjeiras do mercado e, em paralelo à direção de um grande jornal colecionou uma vasta bibliografia, que dentre elas, chamo à atenção para apenas esta frase de Cláudio Abramo: “um homem é feito da infância, aperfeiçoado na adolescência e cristalizado na idade madura”,

No negócio da imprensa negociável, certamente Rubem Alves não teria espaço para publicar verdades que questionem os rumos que o MEC dá para os resultados de baixa escolaridade da maioria dos alunos em processo de aprendizagem. Os milhões que movimentam o mercado da avaliação dos últimos 30 anos, não abre espaço para a leitura do que é infância e adolescência, em um mundo adultocêntrico brilhantemente lembrado por este grande jornalista: “Os técnicos em educação desenvolveram métodos de avaliar a aprendizagem e, a partir dos seus resultados, classificam os alunos. Mas ninguém jamais pensou em avaliar a alegria dos estudantes – mesmo porque não há métodos objetivos para tal. Porque a alegria é uma condição interior, uma experiência de riqueza e de liberdade de pensamentos e sentimentos. A educação, fascinada pelo conhecimento do mundo, esqueceu-se de que sua vocação é despertar o potencial único que jaz adormecido em cada estudante. Daí o paradoxo com que sempre nos defrontamos: quanto maior o conhecimento, menor a sabedoria”.

De posse dos noticiários deste final de semana, grandes veículos irão faturar em cima da história de quatro crianças, das quais uma é um bebê que completou 1 anos, durante o período que sobreviveu a 40 dias na selva amazônica, sendo cuidado por outras três crianças, Lesly Mucutuy, de 13 anos, Soleiny Mucutuy, de 9 anos e Tien Mucutuy.

Este fato histórico é um marco para a civilização ocidental, porque desmonta qualquer currículo de Educação Básica, de ricos ou pobres,  ao não prever o básico para manter-se vivo apesar da tragédia familiar, do poder da união, em uma situação inesperada, como um acidente aéreo e da viabilidade da vida, em ambiente selvagem para qualquer pessoa considerada como “adulta”.

A história destas crianças, que precisarão de muito acolhimento e carinho dado o grau de seus traumas e perdas, já é lendária e relembra um tratado de paz feito por seis Nações ancestrais estadunidenses com os governos dos estados da Virgínia e Maryland:  

“…Nós estamos convencidos, portanto, que os senhores desejam o bem para nós e agradecemos de coração. Mas aqueles que são sábios reconhecem que diferentes nações têm concepções diferentes das coisas e, sendo assim, os senhores não ficarão ofendidos ao saber que a vossa ideia de educação não é a mesma que  a nossa.

…Muitos dos nossos bravos guerreiros foram formados nas escolas do Norte e aprenderam toda a vossa ciência. Mas, quando eles voltavam para nós, eles eram maus corredores, ignorantes da vida da floresta e incapazes de suportar o frio e a fome. Não sabiam como caçar o veado, matar o inimigo ou construir uma cabana, e falavam a nossa língua muito mal. Eles eram, portanto, totalmente inúteis. 

… Para mostrar a nossa gratidão oferecemos aos nobres senhores da Virgínia que nos enviem alguns dos seus jovens que lhes ensinaremos tudo o que sabemos e faremos, deles, homens.”

Na proteção de um modelo de vida insustentável, a grande imprensa procura manter a inculcação de valores morais, que não possui, de mitos históricos e religiosos, aos quais não prática, de regras e códigos de mercado e não humanistas, daí a importância da imprensa “nanica” dialogar mais sobre educação, com a família, porque educação não é uma propriedade individual, é  por essência do pertencimento de toda uma sociedade. Haja visto o sucesso  de um núcleo mirim, que sobreviveu graças à sua educação familiar.

Daí a autocrítica, porque compartilho do pensamento de Confúcio, ao dizer que: “Nada é mais falso do que a verdade estabelecida”, então vamos mudar logo este jogo, porque, segundo Millôr Fernandes, “a história que meu filho estuda eu lia nos jornais do dia”.  

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