GGN na China: Como a estrutura do Estado e do Partido Comunista Chinês ajudam a explicar o progresso socioeconômico

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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China convida a mídia brasileira a conhecer o país sem as lentes viciadas do Ocidente. Aqui está a 1ª reportagem da viagem

Monumento no Parque do Povo, na província de Sichuan, que carrega palavras preciosas para a cultura chinesa: socialismo, integridade, patriotismo, dedicação, "mestre forte, pessoas ricas", harmonia, "nova era, novo pensamento", etc. Foto: Cintia Alves/GGN
Monumento no Parque do Povo, na província de Sichuan, que carrega palavras preciosas para a cultura chinesa: socialismo, integridade, patriotismo, dedicação, “mestre forte, pessoas ricas”, harmonia, “nova era, novo pensamento”, etc. Foto: Cintia Alves/GGN

Era manhã de uma quarta-feira, 21 de agosto de 2024, quando nossa delegação formada exclusivamente por jornalistas e comunicadores brasileiros, a primeira do gênero, aterrissou na China para uma viagem de 10 dias pelas cidades de Beijing, Wuhan (Hubei) e Mianyang e Chengdu (Sichuan), a convite do governo chinês.

O intercâmbio faz parte de uma investida chinesa sobretudo pelo Sul Global para lançar holofotes sobre a Iniciativa do Cinturão e Rota e outros investimentos em tecnologia e sustentabilidade, além de tentar ampliar a cobertura midiática e desmistificar parte da cultura e da sociedade chinesa para os ocidentais.

Organizada pelo Departamento de Relações Internacionais do Partido Comunista Chinês (PCCh) com auxílio do PT, a visita jornalística envolveu o GGN e outros veículos do ecossistema progressistas, emissoras de TV, youtubers e assessores de comunicação do PT.

Os interesses da China no Brasil e na América Latina, o socialismo com características chinesas, os rumos econômicos dos próximos anos e o complexo sistema de governança que mistura Estado e Partido Comunista Chinês estiveram na nossa mira durante toda a jornada.

“Existem muitos mal entendimentos em relação ao povo chinês. Quando se fala em China, se fala em comunismo. Para muitos brasileiros, esse termo tem sido demonizado. Mas será que todo mundo entende realmente o que é comunismo e o que é o socialismo com características chinesas? Só com intercâmbio e contatos pessoais poderemos tirar esses preconceitos”, disse Qu Yuhui, vice-diretor-geral do Departamento para América Latina e Caribe do Ministério de Relações Exteriores e ex-porta-voz da embaixada da China no Brasil. Ele nos recebeu em Beijing no dia 22 de agosto.

BEIJING, 23 de agosto de 2024Da esquerda para a direita: André Barrocal (CartaCapital), Haroldo Ceravolo (Opera Mundi), Kennedy Alencar (RedeTV), Luís Marcelo Marcondes (PT), Cintia Alves (GGN), Agnes Franco (RBA), Felipe Durante (canal Felipe Durante), Pedro Teixeira (CNN Brasil), Paulo Salvador (TVT), João Batista Tavares (freelancer), Ma Hui (ministro-adjunto do Departamento Internacional do Comitê Central do PCCh), Mario Victor Santos (TV247), Ricardo Amaral (PT), Heloísa Villela (ICL), Luiz Fernando Sá (Agfeed), Tainá Farfan (Record), Pedro Zambarda (DCM), Renato Rovai (Revista Fórum), Miguel do Rosário (Cafézinho), Bartolomeu Silva (Record), Aquiles Coelho Lins (Brasil 247) e Lucas Brandinho (canal Pula Muralha).

Beijing, nossa primeira parada, impactou pelas avenidas imponentes, vias arborizadas, edifícios monumentais de arquitetura moderna, as reverências à história do Partido Comunista Chinês, além do calor implacável e do céu azul — sem a severa poluição que um dia protagonizou reportagens com críticas ambientais que os chineses ainda não foram capazes de esquecer. Para virar o jogo, China fez em 7 anos o que os EUA levaram 30 anos para fazer: descarbonizou as cidades e investiu em energia limpa.

Os arranha-céus de Pequim. As duas últimas imagens foram captadas através das janelas da CGTN (China Global Television Network), cuja sede está na primeira foto: é o edifício à direita, em formato de “bermuda”. Fotos: Cintia Alves/GGN

No translado até o primeiro hotel em que ficamos hospedados por três dias em Beijing, um rio que cortava a cidade chamou atenção pela qualidade de suas águas. Yan Dong, um dos quatro chineses do Departamento Internacional do PCCh que nos acompanharam durante a viagem, me explicou que a cerca de dez anos atrás aquele mesmo afluente estava tão poluído quanto o nosso Tietê ou Pinheiros, mas a China tratou de recuperá-lo. A tecnologia, no caso, soou menos importante do que a determinação política em fazer a mudança necessária acontecer.

Não menos impactante foi compartilhar as calçadas de Wuhan, na província de Hubei, com motos elétricas tão silenciosas quanto as bicicletas comuns. São meios de transporte acessíveis que estão proliferando, usados até mesmo por adultos com crianças. Pontos para a recarga das baterias estão espalhados pela cidade. A locação dos dois tipos de veículos é facilitada: com poucos cliques no celular, você passeia sobre duas rodas.

Na cidade de Wuhan, um ponto de recarga de bateria para motos elétricas. Foto: Cintia Alves/GGN

Praticamente tudo na China — transporte coletivo, lojas, supermercados, farmácias, restaurantes, serviços de saúde, ingressos culturais e até o Didi, que é a versão chinesa da Uber — pode ser pago por meio de aplicativos multifuncionais como WeChat e AliPay, dispensando o uso de papel moeda e cartões físicos.

Os chineses têm soluções digitais para tudo. No cotidiano, diferentemente de nós estrangeiros, eles não parecem sentir falta de Google ou Meta — que são “bloqueados” (há formas de burlar) no país, segundo os chineses, por não se submeterem à legislação local para o combate à desinformação. A população em geral desfruta da versão doméstica para aplicativos de conversação, redes sociais e buscadores. Quase a totalidade do país está conectada à internet. Os chineses negam a alcunha de nação fechada ou repressora das liberdades individuais. Os relatos sobre outras tecnologias desenvolvidas pelas empresas chinesas — de carros autônomos, metrô suspenso a dispositivos com aplicação de “internet das coisas” — ficarão para uma próxima matéria.


Como cidadã natural de um país emergente, conhecer a China quase no apagar das luzes deste primeiro quarto do século XXI, no mesmo ano e mês em que as relações comerciais entre Brasil e China completaram 50 anos, foi como pisar no futuro e visualizar as muitas possibilidades.


É claro que apenas duas semanas mergulhadas numa intensa agenda de trabalho — entrevistamos autoridades chinesas de várias instâncias administrativas e visitamos alguns pontos turísticos; conhecemos empresas privadas e estatais, grupos de mídia, institutos de pesquisa e tecnologia, a Universidade de Hubei, além da participação na abertura do Fórum Internacional de Cooperação de Mídia do Cinturão e Rota — proporcionaram um recorte pequeno de uma realidade infinitamente maior acerca de um país com proporções continentais e civilização milenar.

Mas a oportunidade e o estímulo para ver e tentar compreender por nós mesmos a China Continental, sem as lentes viciadas do Ocidente, certamente rendeu aprendizados. E o país asiático tem muito a ensinar.

A Cidade Proibida, antigo palácio imperial. Por milênios, a China foi governada por dinastias responsáveis pela expansão e unificação do território que hoje abriga a 2ª maior população do mundo, com 1,4 bilhão de pessoas. Foto: Cintia Alves/GGN

Em 75 anos, a China partiu de uma economia agrária e planificada para se transformar em uma super potencia tecnológica obcecada pelas palavras “modernização” e “reforma”. Segundo dados recentes do FMI, em 2023 o país ocupou novamente o 1º lugar no ranking de economias mundiais sob o critério da paridade de poder de compra x PIB em dólar. Se considerado apenas o volume do PIB, de 18 trilhões de dólares, China só perde status para os EUA, mas isso deve se inverter dentro de nove anos, estimam.

“Desde 1978 a China conseguiu desenvolvimento econômico significativo e acelerado, e estabilidade social de maneira geral. O país inteiro cresceu de forma significativa. Em 2021, conseguimos acabar com a pobreza extrema e, em 2023, a China se tornou a segunda maior economia mundial”, frisou Ma Hui, chefe do Departamento de Relações Internacionais do Comitê Central do Partido Comunista Chinês, que fica em Beijing.  

Ver o produto interno bruto crescer dois dígitos ao ano não é mais ambição nos tempos atuais. Hoje, com a economia em outro patamar, os chineses não falam em metas numéricas para o PIB, mas sim em “crescimento de alta qualidade” voltado aos investimentos em inovação com sustentabilidade, mesmo que isso signifique retardar a colheita desses frutos na economia. É um investimento no futuro, eles disseram.


Perguntei aos chineses como eles explicam o crescimento econômico meteórico, capaz de erradicar a extrema-pobreza em poucas décadas desde a fundação da República, embora ainda existam desigualdades sociais. Um denominador comum nas respostas foi a “reforma e abertura” de Deng Xiaoping, a partir de 1978, quando a China pavimentou o caminho para o que chamamos hoje de “economia socialista de mercado”.


Contaram os chineses que nos anos anteriores a 1978 — liderados por Mao Zedong desde a fundação da República em 1949 — o país ergueu uma sólida base industrial que impulsionou o crescimento econômico. Com a reforma e abertura de Deng, a “nova China” então germinou, diversificou as áreas de investimentos e suas relações com o mundo exterior, permitiu a entrada (supervisionada) da iniciativa privada na economia e aprendeu a surfar nas ondas da globalização. Para os chineses, o diferencial — e a chave de tudo — está na mão forte do Estado e na busca pelo bem-estar comum, o “sonho chinês”: o comunismo.

Conversando em Beijing com Qu Yuhui, do MRE, e Ma Hui, chefe de Relações Internacionais do Comitê Central do Partido Comunista Chinês, eles repetiram a mesma sentença: para entender onde a China chegou e aonde pretende chegar, é preciso entender antes a história do partido.

Qu Yuhui, vice-diretor-geral do Departamento para América Latina e Caribe do Ministério de Relações Exteriores. Foto: Cintia Alves/GGN

“O Partido Comunista Chinês é um dos maiores partidos do mundo. Temos 98 milhões de membros, mas apenas a quantidade de militantes não explica sua importância. Todo o processo de desenvolvimento da China está diretamente ligado à história do partido: a vida econômica, a vida social, onde a China está. Tudo pode ser explicado pela história do PCCh”, disse Qu Yuhui.

Embora ainda bebam das clássicas teses marxistas-leninistas, os membros do PCCh têm sua própria visão do que é socialismo e comunismo. No conceito chinês, o estágio desejado do socialismo será alcançado quando o governo garantir a todo o povo o direito a uma vida com “dignidade” e “prosperidade” — mas isso não significa, por exemplo, que haverá isonomia salarial entre as classes. Comunismo à moda chinesa não é “igualitarismo”.

Um dos membros do PCCh assim resumiu a questão: o que importa não é a conta bancária, mas a “euforia” — a satisfação ou felicidade — do povo chinês. “O comunismo é o nosso objetivo final. Para chegar nele, temos que passar por várias etapas. Sim, existe desigualdade social e exploração ainda, mas isso é uma tendência inevitável. Vamos passar por isso.”

A China segue desde a reforma e abertura os “princípios básicos do mercado” na economia. Quando confrontados com o fato de que a marca “socialismo de mercado” não vacina o país contra a concentração de renda e dos meios de produção nem contra a exploração do proletariado, os chineses do PCCh responderam que estão cientes das consequências e dos desafios a enfrentar pegando esse caminho com características capitalistas, mas acreditam que a desigualdade é “uma fase que vai passar”.

Arte em Panhai Youli, na Vila de Hongqi, em Sichuan. A aldeia é o modelo de revitalização rural proposta pelo PCCh para atrair mais turistas e diversificar as fontes de renda da região. Foto: Cintia Alves

“Nosso objetivo não é fazer todo mundo rico de uma vez só. A gente ‘permite’ diferença social. Decidimos por trabalhar para que uma parte da sociedade seja ‘rica’ primeiro para, então, ajudar os ‘atrasados’. É assim porque, em nossa história, já cometemos erros. No Grande Salto da década de 1970 tivemos objetivos [de crescimento] não realistas“, comentou um dos assessores chineses.

É possível ver no olhar e sentir no tom de voz dos nossos interlocutores que o trauma do Grande Salto — que matou milhões de chineses de fome com um plano fracassado para acelerar a chegada ao comunismo — ainda paira como uma sombra sobre os elementos do Partido Comunista Chinês. “Infelizmente tivemos falhas e erros também”, admitiu Ma Hui ao referir-se à cicatriz deixada pelo período maoísta. A impressão é que, agora, a China caminha com planos e sem pressa.


No esforço para decifrar o enigma proposto pelos chineses — “para entender a China, é preciso entender a história do PCCh” — aprofundei as conversas com membros do partido sobre as complexas estruturas de governança e partidária. O objetivo era entender como funciona o poder na maior parte da China Continental. O que significa, afinal, a tal “democracia de base”? E por que eles usam a política para explicar, em parte, o progresso socioeconômico?


A Constituição da China diz que o país é um “Estado socialista subordinado à ditadura democrático-popular da classe operária e assente na aliança dos operários e camponeses”. “Os órgãos através dos quais o povo exerce o poder político são o Congresso Nacional Popular e os congressos populares locais dos vários níveis”.

Diferentemente do que ocorre nas democracias liberais, os governantes na China são escolhidos por meio de eleições indiretas para ocupar cargos do Poder Executivo, e trabalham em paralelo com gestores equivalentes eleitos pelos delegados do Partido Comunista Chinês. A estrutura de governo e partido são distintas, mas se entrelaçam. São como uma pirâmide com uma base maior que vai elegendo grupos menores pela hierarquia acima. O partido está acima do governo, dando as diretrizes para serem executadas pelos governantes. Para os chineses, essa é a “democracia que funciona”.

Sede local do Partido Comunista Chinês na Vila de Shiyi Qiang, em Sichuan, no centro da China Continental. Foto: Cintia Alves/GGN

Os governantes eleitos para administrar as províncias e municípios raramente são o “número 1” na sua própria instância: acima deles estão um secretário-geral do comitê provincial do PCCh e também um secretário-geral do comitê municipal do partido, respectivamente. Estes últimos são escolhidos pelos delegados do PCCh, que levam em conta, dizem os chineses, a chamada “meritocracia”.

Na prática, significa que ninguém ascende dentro da hierarquia governamental ou mesmo partidária sem antes passar pelo crivo do PCCh. Existe todo um departamento dedicado a recrutar e avaliar anualmente os filiados que trabalham no governo. Subir os degraus exige anos e anos de comprovada capacidade técnica e pessoal. Xi Jinping, por exemplo, levou cerca de três décadas para chegar à presidência da República e ao comando do PCCh. É um sistema que barra aventureiros e outsiders que infelizmente são comuns nas democracias liberais. A filiação ao partido tampouco é um processo fácil: são pelo menos dois anos de provas teóricas e avaliações pessoais até um membro novo ser efetivado.

Usualmente, o governador da província e o prefeito, por exemplo, acumulam o cargo de vice-secretário-geral provincial e vice-secretário-geral municipal do PCCh, o que reforça o caráter de “número 2” dentro dessa estrutura imbricada de governança na qual prevalece sempre a visão do partido. Todos têm mandatos de 5 anos com poucos meses de diferença. Xi Jinping, por exemplo, foi eleito secretário-geral nacional do PCCh no final de 2012 e presidente da República em março de 2013.


A liderança unificada do PCCh, que se impõe sobre os representantes eleitos, é recorrentemente apresentada à delegação brasileira como um trunfo. Como a China é muito grande em termos de população, territórios e etnias, os chineses do partido sustentaram que sem um comando forte e central, o país estaria perdido como “areia solta”. Eles também alegaram ser impraticável uma eleição direta para todos os cargos do Executivo num país com 1,4 bilhão de habitantes.


A estrutura governamental da China obedece à seguinte ordem hierárquica: governo central, governo provincial, governo municipal e distritos, seguidos de vilas e aldeias. O partido permite e estimula a criação de comitês com militantes não só nessas pequenas regiões administrativas, mas também dentro de outras instituições, como universidades e empresas estatais ou privadas.

Chinesa da Vila de Hongqi, em Sichuan, no centro da China Continental. A vila foi apresentada à delegação de jornalistas brasileiros como modelo de democracia de base e de integração agrícola e rural.
Foto: Cintia Alves/GGN

Já no Legislativo, o sistema eleitoral é misto, ou seja, parte dos representantes ou parlamentares são eleitos diretamente pelo povo, enquanto outra parte é definida no voto indireto. A “democracia de base” começa nas vilas, aldeias e condados, onde os moradores se reúnem e elegem representantes com mandatos de cinco anos, que vão levar suas demandas adiante.

O povo também elege os deputados distritais. A partir daí, começa a votação indireta: deputados distritais consultam seu eleitorado e elegem os vereadores; os vereadores consultam sua base e elegem os deputados provinciais, e assim sucessivamente.

Os deputados “nacionais” se reúnem uma vez por ano na Assembleia Nacional Popular e trabalham diariamente nas comissões permanentes. Simultaneamente também ocorre a Conferência Consultiva Política do Povo Chinês, que na definição do site Dondsheng News é “um órgão consultivo e de assessoramento político sem poder legislativo ou executivo, composto por representantes do PCCh, oito partidos democráticos, organizações de massa, minorias étnicas, outros setores da sociedade e pessoas convidadas“, todos aprovados pelo PCCh — mas os chineses disseram que é uma conferência “aberta para quem quiser participar”. A Assembleia e a Conferência Consultiva são conhecidas como “Duas Sessões”.

É ouvindo os anseios do povo, de um lado, e mantendo mão forte sobre os rumos da economia, de outro, que a China mantém-se nos trilhos do progresso e em “harmonia”, outra palavra cara aos chineses. Para quem influencia de fato o destino da nação, o país tem sua própria forma de democracia e está pacificado sob esse regime, embora o partido ainda trabalhe para aperfeiçoar a consulta popular, segundo apontou Qu Yuhui. Indiretamente, ele também criticou a insistência do mundo ocidental em querer impor a democracia liberal a todos.

“Não existem conceitos universais aplicáveis a todo mundo. Cada país pode ter seu próprio sistema. Nós chamamos a democracia chinesa de democracia de todo o processo. Na nossa hierarquia, o sistema administrativo é dividido em governo central, governo provincial, governo municipal e aldeias, condados, etc. E cada uma dessas denominações tem seu sistema de coletar opiniões públicas e interação com o governo. O objetivo é evitar que o povo seja lembrado somente nas eleições, mas sim consultado durante todo o processo de governança“, explicou.

Salão nobre com escadaria de mármore da Cidade Proibida, em Beijing, na China Continental. Foto: Cintia Alves/GGN
Salão nobre com escadaria de mármore na Cidade Proibida, em Beijing. Foto: Cintia Alves/GGN

O planejamento econômico das próximas décadas

Quanto ao futuro da China em termos econômicos e políticos, tirar dos asiáticos uma síntese sobre o que significa o “pensamento de Xi Jinping para uma nova era” não foi tarefa fácil. Dos membros com status ministerial até os dirigentes que nos acompanharam durante a viagem, parecia haver uma certa dificuldade em simplificar conceitos tão caros para a política chinesa. “Isso levaria uma palestra”, me disse um jovem diplomata.

Para talvez começar a traduzir o planejamento político e econômico chinês para as próximas décadas, é preciso lançar um olhar atento sobre a 3ª Sessão Plenária realizada em julho passado pelo 20º Comitê Central do PCCh.


O partido estabeleceu como meta para os próximos anos o “aprofundamento” da reforma e abertura. A palavra de ordem é “modernização”. O objetivo é chegar ao centenário do aniversário da República Popular da China, em 2049, consolidado como um país “socialista moderno, forte e belo”.


De acordo com Ma Hui, mais de 200 iniciativas de reforma na economia e política foram levantadas na 3ª Sessão, abrangendo temas inéditos como “ministério do povo e estado de direito”.

Até 2035, segundo um comunicado oficial do Comitê Central sobre a 3ª Sessão, a China espera concluir o “estabelecimento integral do sistema da economia de mercado socialista de alto nível” e modernizar sua governança.

“Com essa resolução em busca da modernização chinesa, acreditamos que vamos injetar mais um impulso para o desenvolvimento. E isso vai beneficiar não só o povo chinês, mas também os países emergentes como o Brasil”, afirmou Ma Hui.

Entrada da sede do Departamento de Relações Internacionais do Comitê Central do Partido Comunista Chinês em Pequim, na China. Foto: Cintia Alves

O que a China quer do Brasil

Qu Yuhui acrescentou que não é possível prever o volume de investimentos que a China poderia despejar no Brasil caso a relação venha a se estreitar ainda mais com, por exemplo, a entrada do país na Nova Rota da Seda. Mas ressaltou que a China tem interesse em “aumentar nossa cooperação na área de infraestrutura, agricultura, ciência e tecnologia e inteligência artificial”, que “talvez seja um dos maiores catalisadores de desenvolvimento econômico do futuro entre Brasil e China“.

O ex-ministro-conselheiro também apontou desejo de cooperação na área de transição energética (energias renováveis, carros elétricos, baterias, energia verde, etc) e economia digital.

“E com o novo plano de neoindustrialização do Brasil, a China pode colaborar. Estamos cooperando com mais de 120 países do mundo na construção da iniciativa do Cinturão e Rota. Uma das ideias é aumentar cooperação produtiva e industrial, e isso pode ser aproveitado entre China e Brasil. Temos um potencial enorme, mas temos que promover nossa cooperação passo a passo, sabendo quais os nossos interesses respectivos e interesses em comum”, finalizou.

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  1. “Os chineses têm soluções digitais para tudo. No cotidiano, diferentemente de nós estrangeiros, eles não sentem falta de Google e Meta — que são bloqueados no país, segundo os chineses, por não se submeterem à legislação local para o combate à desinformação.”

    Vouacreditar que os buscadores deles informem tudo sem censuras.

  2. Na Europa Ocidentaal nasceu um projeto de sociedade autõnoma, democrática. Esse projeto nasceu na Grécia antiga, ficou eclipsado durante a Idade Média pelo cristianismo/religião, renasceu na Modernidade. Mas continua um projeto inacabado. Não temos “democracias liberais”, a rigor a democracia como tal não existe, existem “oligarquias liberais”, no capitalismo dominador e explorador que admite algumasliberdades sob seu controle, enquanto interessar.
    O caso do Brasil é exemplar: os golpes de Estado, com militares e associados, mostra isso.
    Lula é o maior exemplo: ele pode ir até certo ponto, o Congresso burguês a serviço das oligarquias burguesas o controla o mais que pode. E a tutela militar está sempre posta.
    Vejo na China uma sociedade “autônoma”: que cria suas proprioas leis (nomoi) e assim vem evoluindo. Está atualmente oara a democracia/autonomia como a Grécia esteve no século VIII antes de Cristo. Acompanhemos..

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