Gilmar cogita que procuradores de Curitiba tenham “manipulado delações”

"Fico imaginando quantas pessoas tiveram de delatar a partir da indução dessa gente. Podem ter manipulado as delações premiadas", disse o ministro do STF em entrevista à Rádio Gaúcha

Jornal GGN – Sergio Moro em conluio com os procuradores de Curitiba praticamente construíram uma “verdadeira organização criminosa”. É o que afirma o ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes.

Em entrevista divulgada pela Rádio Gaúcha, Gilmar frisou que há tempos vem fazendo as análises corretas sobre a Lava Jato em Curitiba. A força-tarefa, ali, atuo articulada com o Juízo e extrapolou suas prerrogativas. Mesmo sabendo que algumas condutas, se descobertas, seriam vistas como erráticas ou ilegais, os procuradores perseguiram seus anseios políticos mesmo usando, usando o cargo no Ministério Público Federal e o apoio da mídia e da sociedade como instrumento e escudo.

O ministro destacou especial o “negócio lucrativo” da Lava Jato, que envolve não só as palestras que Moro e procuradores deram a empresas – inclusive algumas citadas em delações – mas também a fundação de direito privado que seria criada com uma multa bilionária que a Petrobras foi obrigada a pagar nos Estados Unidos.

Para Gilmar, afastado ou não do MP, certo é que Dallagnol (mas serve para os demais procuradores citados na série da Vaza Jato) perdeu as condições de tocar a investigação. Qualquer medida que venha a tomar no âmbito da operação será vista, a partir de agora, com desconfiança.

O GGN reproduz, abaixo, os principais trechos das respostas de Gilmar Mendes à Rádio Gaúcha.

***

Eu tinha feito essa advertência há muito tempo. Quando saiu essa história da fundação do Dallagnol, eu ponderei que estávamos diante de uma agente buscando dinheiro, que o negócio do combate à corrupção é extremamente lucrativo, e é o que se viu com as palestras.

O dinheiro que foi devolvido [por causa da multa nos EUA] é da Petrobras, é da União, ninguém pode se apropriar disso, mas eles estavam atrás de dinheiro.

Essa colaboração de procurador e juiz é extremamente grave.

É a maior crise que se abateu sobre o Judiciário brasileiro desde a redemocratização. Esse consórcio entre procuradores e juiz construiu uma verdadeira organização criminosa.

Eu não me surpreenderia se, por exemplo, amanhã, eles inventassem uma conta minha no exterior.

Essa coisa [Lava Jato] se tornou muito lucrativa para todos. Extremamente lucrativa, e de forma irregular. Me parece que isso é extremamente grave e disso tudo pouco que se sabe.

Fico imaginando quantas pessoas tiveram de delatar a partir da indução dessa gente. Podem ter manipulado as delações premiadas.

É uma anomia, porque os órgãos correicionais do Ministério Público não estão funcionando [contra Dallagnol, apesar das diversas ações movidas contra os abusos do procurador].

Afastado ou não, ele [Dallagnol] não tem mais condições de permanecer. Qualquer ação será vista com suspeita. Já não exercem [os procuradores que caíram na Vaza Jato] mais a função.

O triste é que se organize uma força-tarefa para combater crime e ela comece a cometer crime.

O que tem validade [ao longo da investigação, em termos de sentenças], que tenha validade. Mas isso não diminui a gravidade do fato [revelado pelo dossiê Intercept].

[Nas instâncias superiores] Ninguém analisa fatos quando analisa essas matérias [as sentenças que vieram da primeira instância]. Ninguém sabia que o juiz se articulou com o procurador. É preciso analisar caso a caso e dar a gravidade devida à matéria.

É linguagem de criminoso [a que é usada pelos procuradores nos chats de Telegram]. ‘Estamos fazendo algo ilegal, mas ninguém vai saber’. Que outros crimes eles teriam praticado? Isso é linguagem de procurador?

Estavam vendendo palestras até para empresas investigadas por ele. Se outras pessoas tivessem feito isso, eles teriam pedido prisão preventiva.

Juiz não pode ser chefe de força-tarefa.

As corregedorias têm que começar a atuar.

Redação

11 Comentários

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  1. Fico pensando…como é possível que uma pessoa com tão pouco conhecimento de história e que tenha participado tão ativamente da destruição da ordem democrática seja juiz no STF? É difícil crer que o Min. Gilmar Mendes e outros golpistas não tenham visto o que está rolando desde o famigerado Mensalão: toda sorte de ruptura às instituições, à ordem democrática, ao estado de direito! Quiseram destruir o PT para assumirem, eles, o seu lugar, acabaram por destruir as próprias instituições.

    (***)

    Eu assistia ao julgamento de Dirceu, pela TV… prá começar a firma “Globo” tinha conseguido transformar o STF num programa de auditório em formato parecidíssimo com outros programas que essa firma já fazia: o apresentador, Aires Brito, à época, destacando as caravanas antes de começar o show, virando o rosto para a câmera para falar (conscientemente ou não), e o mais pândego: a figura de Gurgel remetia à de Jô Soares: baixinho, gordinho. de óculos e barba…

    Mas o que me marcou fortemente foi que, dado o voto, se não me engano, da Min. Rosa Weber, o presidente do STF pediu um intervalo (comercial?) e o programa “Globo News” cortou para o estúdio, onde estavam a âncora Leila Sterenberg e a professora de Direito Constitucional Margarida Lacombe. A jornalista então, vendo a luz vermelha acesa, virou-se para a professora e, entusiasmada, pediu seus comentários. E a professora paralisada e atônita, sem conseguir descolar o olhar do telão do estúdio, onde segundos antes havia a imagem do plenário do STF, respondeu baixinho, quase como se falasse para si mesma:

    – “Eu, err… eu não sei o que vou dizer aos meus alunos, daqui por diante…”

    Fora o verdadeiro festival de bizarrices que marcou aquele julgamento: Min. Barbosa sem conseguir deixar o papel de acusador e posando para a revista “Veja” com um envelope em que se lia “bribery” (suborno, corrupção) assim mesmo, em inglês! Um ministro do STF escrevendo documento brasileiro em inglês!

    É difícil crer em ingenuidade quando se pensa em pessoas ocupando cargos como esse. Já cheguei até a pensar que Barbosão, naquela manifestação, fez como um aprisionado que não podendo gritar escreve “S.O.S.” no vidro embaçado da janela: estava avisando que o golpe estava em curso e que vinha dos E.U.A… Não sei, isso são só elucubrações. Mas o que era fato, perceptível tanto pela Lacombe quanto por qualquer pessoa atenta é que ali estava nascendo um golpe (que vinha sendo gestado há alguns anos). Quantas pessoas falaram, na época, no filme do Bergman, “O ovo da serpente”?

    De ambos os lados, dos que estavam no poder democraticamente e dos que tramavam para derrubá-los, todos perceberam que ali estava se rompendo miserável e definitivamente a ordem constitucional. E vão dizer que os ministros do STF não perceberam?

    Mais tarde, depois da julgamento do impedimento pelo senado, um senador da oposição (Alvaro Dias, será?) chegou a dizer para uma repórter à saída do Senado algo como: “É verdade, não há crime de responsabilidade. Mas nós vencemos assim mesmo.”

    Que sirva de lição: abortado o golpe (de preferência antes que nosso país vire terra arrasada em soberania, orgulho e prosperidade), que nunca mais tanto as pessoas do STF quanto as de todas as instituições públicas deixem de defender nosso país, nossas instituições, as pessoas do nosso povo, enfim, como disse Lula, que nunca mais se “acovardem” sob o risco de tornarem-se, para além delas mesmas, um país todo de vítimas de golpes.

    (***)

    “Ah, mas os EUA já tinha até reativado a 4a. frota…”

    Pois é, desculpem mas a força do inimigo é sempre a desculpa dos covardes. Naquele momento não estávamos indefesos perante o inimigo, não estávamos sozinhos, ridicularizados, achacados e explorados no mundo, como estamos agora.

    1. A mim, não parece que Gilmar Mendes tenha pouco conhecimento sobre a História. Pelo contrário. Os julgamentos dele podem ser políticos, porém, ao contrário da maioria, sempre teve boa argumentação, inclusive lançando mão de fatos históricos.

      1. Talvez Gilmar Mendes conheça História, saiba citar e narrar fatos, datas, até relacionar acontecimentos, cara Maria Luisa. Mas tenho a impressão de que ele não se enxerga como participante dela. Prá mim, ele só enxerga seu mundo individual, seus interesses pessoais e imediatos… é como se a História fosse algo externo a ele. Vai ver andou lendo muito Fukuyama.

        A tentação pela opção ego-centrada é difícil de ser enfrentada, ainda mais em tempos como os nossos. Mas é o que seria bom no caso de pessoas a quem outras atribuem responsabilidades e poderes.

  2. Agora está esperneando mas a tempos a defesa de Lula avisa dos desmandos e nada fizeram. Quando a água bate na bunda correm mas é para salvar a sua reputação, nada vão fazer para mudar a situação de Lula que permanecerá como um troféu na mão desse governo ainda que venha a ganhar o Nobel da paz. O caminho da mudança passará necessariamente por um processo mais traumático e demorado.

  3. Pensamento igual a eles, é o Procurador da República empregar a prática da “rachadinha” no gabinete
    da PGR? Igual eles fazem no poder legislativo? É isso o pensamento igual?

  4. Sinceramente. Eu como muita gente acredito na Lava Jato. Tambem acredito que com tudo o que foi divulgado, alem do excesso houve desvio daqueles que comandam a operação com fortes intransigencia. Opino em mudar esss gente e que a força tarefa da lava jato continue a todo vapor.

  5. Caro Renato,
    Você traçou o liame entre o Brasil e hoje e o que se iniciou com a AP 470. Para muitos, é claro e cristalino que o golpe contra a Democracia teve seu pontapé inicial naquele momento. Nasceu de um projeto espúrio de poder com os mesmos agentes de hoje: corporações; media, com Globo à frente; representantes do capital financeiro no Congresso (por interesses intrínsecos e/ou comprados e pagos) e o aparato judicial (STF; MPF e PF). O objetivo era e é destruir o programa de governo popular – pelos seus méritos, apesar dos seus muitos defeitos – colocando no lugar esse plano de destruição que, ora, assistimos em pleno curso.
    Não irei estender-me em discorrer sobre isso, somente irei aproveitar sua deixa sobre Gilmar e o STF para externar uma questão que incomoda-me e me intriga ao longo de todo esse tempo, para a qual minha compreensão encontra limite e não me permite resposta.
    Nos últimos 34 anos, desde a redemocratização, foram nomeados 24 ministros para o STF. Destes, 11 pelos governos petistas e, destes, 7 ainda compõem o atual corpo de ministros do STF. Celso de Mello, o decano, foi nomeado por Sarney, Marco Aurélio por Collor, Gilmar Mendes por FHC e Alexandre de Moraes foi nomeado por Temer. Isto implica que o PT, Lula e Dilma, seriam os principais responsáveis pela qualidade jurídica e pela ideologia desse STF. Nisso, falharam miseravelmente.
    Olhando para o Tribunal o que vemos é, com talvez à exceção de Levandowsky, que os demais “petistas” são os sustentáculos do golpe. Dentre os demais, alinhado e aliado de primeira hora à construção da ruptura, temos Gilmar, apesar de sua recente mudança de atitude. Celso de Mello e Marco Aurélio, não podem ser enquadrados nessa categoria, já que uma coisa é decidir por alinhamento, outra por convicção jurídica, certa ou errada não importa. Alexandre, dado o pouco tempo no cargo e em que pese sua indicação polêmica, ainda permanece uma incógnita.
    Desde a proclamação da República o STF, instalado em 1891, teve em seus quadros algo como 160 ministros. Somente esse fato já assegura o registro histórico a seus integrantes e potencialmente traz a condição de ocuparem um lugar na história do País. Acredito que nenhum ministro, conscientemente, consegue quedar-se inerte frente à possibilidade que traz a oportunidade de fazer diferença e marcar a vida da sociedade brasileira, de sua democracia e do seus marcos constitucional e civilizatório, mas, que, também, traz o risco de reduzir a memória desse ministro a uma nulidade, reputá-lo como uma iniquidade, ou pior, de marcá-lo como um pária na história do STF e do judiciário.
    Esse é o quadro, então vamos à pergunta: por que vemos ministros do STF, postos perante a possibilidade histórica de poderem fazer a diferença, de poderem ser lembrados como esteios do estado democráticos de direito, das instituições e da defesa dos valores humanitários e civilizados contra o arbítrio e a barbárie que o acompanha, escolherem omitir-se covardemente ou aderir às hordas bárbaras que assolam o Brasil?
    A questão, não respondida, leva a outras: que tipo de percepção da própria condição essas pessoas têm? Qual os valores e princípios que as movem e orientam? como podem abdicar do respeito que a história poderia conferir-lhes? em troca de nada? de uma notoriedade efêmera? de uma paz fugaz e covarde ao serem poupados de ataques pessoais vindos de uma mídia atrofiada, cooptada e medíocre?
    Eu não os entendo. Espero que alguém o consiga.

    1. É fogo, caro Beotorum… a impressão que tenho é que esse pessoal do STF devia ser mais esperto, mais patriota. E o PT, que não vejo como partido de esquerda, tem que repensar o que tem sido, a meu ver, sua mais definitiva posição: a de conciliador. Acho que se a gente quer viver a democracia, pode admitir qualquer posição menos a de destruir a própria democracia. O pessoal que tomou o estado nesse golpe se valeu dessa confusão:

      “Ah, se pode tudo, porque não pode alguém como eu? Me tolher seria anti-democrático e autoritário!”

      Esse negócio de dar lugar a privatista no estado é um absurdo, acho eu. Por mais que a pessoa seja esclarecida, sendo da iniciativa privada ela só se mantém porque tem relações com outros privatistas. E muitas vezes esse outros não são tão esclarecidos mas não podem ser desprezados pelos esclarecidos porque, em comum, eles têm poder sobre o dinheiro. O clube que eles frequentam não admite que um sócio dê preferência a alguém de fora e não a outro sócio. E estadistas, bem como o cidadão comum e a sociedade em geral, são, em relação a esse clube, gente de fora. Aliás nenhum clube já que a definição de clube é exatamente restringir, cercar… se qualquer um pode entrar deixa de ser clube, né? Passa a ser democracia.

      Na minha desimportante opinião, o certo era ouvir, sim, todos os setores inclusive o clube, mas jamais se deixar levar pela ilusão de que estadista faz parte do clube, jamais dar a privatista direito de comandar o estado.

      – “Ah”, poderia argumentar o Lula, por exemplo, “quer dizer que eu não posso ser amigo desinteressado de Leo Pinheiro?”

      Bom… a história já responde, né?

  6. Verifico o quanto esse ministro se procupa com a legalidade ou seja um legalista de plantão mais esquece de seus ganhos poupados que os códigos de ética da própria OAB e MAGISTRUTA proíbem

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