O aborto clandestino no Brasil e a dor fetal

STF reabre discussão sobre descriminalização do aborto. Segundo dados oficiais, todos os dias 4 mulheres morrem por complicações do aborto clandestino no Brasil 
 
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Reprodução Facebook
 
Jornal GGN – Entre os dias 03 e 06 de agosto, o Supremo Tribunal Federal (STF) realizará uma série de audiências com 45 expositores para discutir a descriminalização do aborto. O tema foi provocado na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442 ajuizada pelo PSOL, questionando a constitucionalidade de artigos do Código Penal que preveem pena de prisão para mulheres que realizam aborto em casos não autorizados por lei. A relatora do processo é a ministra Rosa Weber, da Primeira Turma, a mesma que, ao julgar um caso concreto em 2016 sobre aborto, decidiu por maioria descriminalizar o aborto entendendo que são inconstitucionais os artigos do CP. 
 
Os casos autorizados de aborto pela lei brasileira são o risco de saúde da mãe, a anencefalia (má formação cerebral) e gravidez fruto de violência sexual. Diariamente, 4 mulheres morrem por complicações de abortos feitos clandestinamente. São registros coletados pelo Ministério da Saúde de vítimas que procuraram os hospitais após os procedimentos, o que significa que o número de mortes é subestimado. A estimativa dos órgãos públicos nacionais é que sejam realizados anualmente 850 mil abortos clandestinos no Brasil. 
 
Em 2013, o Conselho Federal de Medicina se manifestou publicamente afirmando que o aborto até a 12ª semana (3 meses) é “mais seguro”, reduzindo a “taxa de complicações e mortalidade”, completando que o risco de morte relacionada ao aborto feito em condições adequadas (seguindo protocolos de procedimentos e ambientes seguros, com profissionais experientes) é menor do que o risco do parto normal. A discussão em torno da descriminalização abrange, portanto, o combate ao aborto clandestino. 
 
Dor fetal
 
Uma questão frequentemente levantada sobre o tema, de cunho ético, é sobre a sensibilidade do feto a dor. Pesquisadores e cientistas divergem bastante quanto a esse tema. Alguns afirmam que no sexto mês de gravidez a sensação de dor é improvável, outros apontam que, a partir da 18ª semana (4 meses e meio), o feto responde aos estímulos de dor, e alguns falam em 10 semanas de gestação. 
 
Em outubro do ano passado, movimentos norte-americanos antiaborto conseguiram na Câmara dos Representantes dos Estados Unidos aprovar um projeto que impede o aborto quando o feto passa a sentir dor. O passo foi considerado uma vitória para esses ativistas, que tiveram apoio do presidente Donald Trump para colocar a pauta em discussão. Nos Estados Unidos, a interrupção da gravidez é permitida após as 20 semanas de gestação (5 meses), enquanto na maioria dos países onde o procedimento é legalizado, a interrupção é válida até as 12 semanas, com exceção para os casos de estupro, risco de saúde da mãe ou gravidez de anencéfalos. 
 
Em alguns países do Reino Unido (incluindo Inglaterra, Escócia e País de Gales) o aborto é legalizado até a 24ª semana (sexto mês), ainda assim 90% dos procedimentos são feitos até a 13ª semana, segundo os órgãos de saúde locais. 
 
Em 2010, o Royal College of Obstetricians and Gynaecologists, na Grã-Bretanha, divulgou um estudo concluindo que os fetos não sentem dor antes de 24 semanas de gestação, fase em que o corpo do bebê em formação já possui o tálamo e as conexões nervosas do córtex cerebral (áreas que processam respostas e estímulos dolorosos), mas como não estão totalmente desenvolvidos, a sensação que o feto tem é de “sedação”. 
 
“Podemos concluir que o feto não é capaz de sentir dor, em qualquer sentido da palavra, antes desse ponto”, observaram os pesquisadores no relatório, segundo informações da BBC. 
 
Três anos após este estudo, o tema voltou a ser levantado pelo New York Times que consultou três médicos-pesquisadores. Nicholas Fisk, especialista em medicina materno-fetal no Hospital Real Brisbane e Feminino, na Austrália, disse que a dor fetal precoce é remota antes de 24 semanas. Kanwaljeet Anand, do Centro de Ciência da Saúde da Universidade do Tennessee, disse que existe probabilidade de dor nos fetos a partir da 18ª semana, ressaltando que “poucos” abortos são realizados após essa fase, de cerca de quatro meses e meio.
 
Já o obstetra Mark Rosen destacou que ainda existem lacunas neste campo, no entanto, observou que a dor fetal é improvável antes das 27 semanas (7º mês de gestação), isso porque que o córtex começa a surgir por volta da 23ª semana, e o sistema nervoso não está totalmente conectado. 
 
Defensores da lei da dor fetal
 
Setores que defendem a existência de dor fetal antes do sexto mês de gravidez apontam que uma das provas é a aplicação de anestesia e analgésico em operações intra uterinas de fetos. Por outro lado, cirurgiões fetais afirmam que as drogas são usadas não para evitar a dor, mas para relaxar o útero e evitar efeitos prejudiciais por reação hormonal ao estresse do feto.
 
O grupo também aponta que o córtex não é o único responsável pela sensação de dor, indicando que o tálamo se desenvolve por volta do quinto mês gravidez, ou 20ª semana. Uma das porta-vozes do movimento anti-aborto em Portugal, a médica Jerónima Teixeira, que também realiza pesquisas no Royal College of Obstetricians and Gynaecologists, desde 1993, afirma que o feto sente dor a partir da 10ª semana.
 
“O estímulo tem potencialidade de causar mais dor no feto porque as suas fibras inibitórias da dor, que diminuem a atividade neuronal, estão numa fase de desenvolvimento precoce”, disse em entrevista ao jornal português Correio da Manhã, em 2007, na época do referendo do aborto realizado no país que deu vitória para o “Sim”. Teixeira destacou, ainda, que no feto observou-se o aumento da secreção de hormônios do estresse em 500%. 
 
Após a entrevista, o movimento português Médicos Pela Escolha denunciou a pesquisadora por falta de honestidade científica. “O que Jerónima Teixeira esconde, na realidade, ao dizer que às 10 semanas de gestação um feto tem já em desenvolvimento os “receptores de dor” é que nesta fase, apesar do feto ter os referidos receptores, estabelecidamente não tem os mecanismos que lhe permitam a percepção de qualquer dor, nomeadamente as ligações cerebrais necessárias para tal sensibilidade, como foi aliás bastante comprovado, sem qualquer contestação, no recente congresso da Ordem dos Médicos sobre o início da vida”, escreveram no manifesto acrescentando que Jerónima reconheceu em outras falas que “a sensação de dor no feto só está provada a partir das 22 semanas”.
 
O “Sim” que reduziu mortes 
 
Apesar das divergências, Portugal legalizou o aborto até a 10ª semana de gravidez, não seguindo a trajetória da maioria dos países que permitem o procedimento até a 12ª semana, como Uruguai, Cuba e França. Ao mesmo tempo, após a legalização, o país apresentou quedas consistentes no registro de abortos e zero mortes de mulheres submetidas ao procedimento, segundo levantamento realizado pela ONG Associação para o Planejamento da Família.
 
Na década de 1970, Portugal registrava cerca 100 mil abortos, sendo que 2% resultaram  em mortes de mulheres. Um ano após a legalização, 2008, o registro foi de 18 mil abortos com queda constante, ano após ano. 
 
Leia também – Reflexos da Bioética no Direito: autonomia do indivíduo, beneficência do coletivo
 
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Redação

17 Comentários

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  1. Uma coisa é uma coisa
    ..outra coisa é outra coisa

    Pra mim descriminalizar o aborto, assim como o consumo de drogas deve, por questões óbvias,ser aprovado.

    Doutra feita NÃO deveria ser confundido com o Estado fornecer pelo SUS o serviço.

    Buscar fazer o certo dá trabalho mas é o correto a ser feito.

    – correto ė a educação sexual
    – correto é o sexo livre porém, RESPONSÁVEL
    – correto é esclarecer e FORNECER meios e métodos anticoncepcionais

    Liberar o aborto e financiar pelo Estado é uma discussão atrasada, do século passado, antes mesmo da pílula ser usada.

    Claro que entre os extremos há que se tentar buscar um meio termo …termo que NÃO PODE ignorar o direito e responsabilidade do pai e, principalmente, que o tal feto é um ser UNICO, temporariamente dependente.

    Com certeza estimular a ADOÇÃO enquanto a gestante recebe apoio tb deve fazer parte da solução antes que se tomem medidas mais radicais e traumáticas às partes.

    1. Comentário d homem s/ qq respeito pelo sentimento das mulheres

      A mulher deveria seguir uma gravidez inteira, com tudo o que isso representa quando indesejada, para dar o bebê em adoçao depois? E passar por todo o conflito emocional que viria disso? Ora, ora… Queria ver se os homens ficassem grávidos se alguém ousaria propor uma coisa dessas.

      1. Não querida, ela poderia tb
        Não querida, ela poderia tb ser esclarecida a cuidar da sua xoxota, útero e óvulos com respeito, antes de cair na tentação de ceder ao primeiro impulso por busca de prazer

        Hj existem mais de dez métodos anticoncepcionais, muitos gratuitos ..as DSTs são uma realidade indissociável ao tema

        Penso que sexo livre cobra de responsabilidade e, sem dúvida, começar a vitimizar uma das partes que corroborou EXPONTANEAMENTE com a encrenca, penso que não é um bom caminho pra se lidar com este problema

        1. Que gracinha, a ICAR pensa do mesmo jeito

          Ela tb acha que nada de “busca de prazer”, rs.

          Ora, ora, Romanelli. Que planejar (tanto HOMENS quanto mulheres) é melhor que fazer aborto, parece opiniao do Conselheiro Acácio, nao há nada de mais óbvio. Mas acidentes acontecem. E as mulheres nao têm que ser “condenadas” a uma gravidez indesejada + entrega de um bebê já nascido, com todo o conflito que isso implica, por causa desse “pecado”. Mas as consequências nunca recaem sobre os homens, nao é? Assim é fácil achar que as mulheres deveriam fazer isso ou fazer aquilo. 

          1. O q é ICAR ? Iate clube de
            O q é ICAR ? Iate clube de Angra dos Reis ?

            Tudo se resume a direitos e deveres ..leia o q escrevi .. não obrigo ninguém a ter o filho ..digo que TAMBÉM pode fazer parte do equacionamento, a orientação, apoio e adoção

            São dezenas de milhares de casos ..tem de tudo . E ” acidentes” em 2018 devem dar traço nas estatísticas

            É imprevidência na imensa maioria, irresponsabilidade . E não isento o homem do problema

            O que digo é que o ESTADO, o SUS, pode até não apenar pela impraticabilidade e insensatez ..mas, mas JAMAIS bancar da conta ( a não ser pros casos q já estão previsto)

            E desculpe ..acho que a minha defesa valoriza muito mais a mulher, do que os que buscam soluções fáceis que acabam por coisificar mais e mais seu corpo

            Educar dá trabalho, mas um dia alguém tem q fazer

          2. Ah, bom, mulheres ricas podem, mas as pobres nao

            Ora francamente. Isso nem a ICAR (que vc sabe perfeitamente o que é, deixa de bobeira…) defende…

          3. Fica fria .. descriminalizado
            Tréplica a resposta das 18:24

            Fica fria .. descriminalizado tira-se um grande entrave ..clínicas aparecem ..o ágio diminui .. a pobre dinheiro pra isso terá, afinal, será mais barato que criar uma criança

            Não penso ser correto toda a sociedade bancar a imprevidência duns poucos

            Tenho certeza q vc conhece dúzias de mulheres q fizeram mais aborto q comeram alcatra na vida

            Deixa de demagogia anarquista ..assim vc não me comove

          4. È sério isso?

            Se o ” problema ” ou ” feto” é uma indesejada gestação nosso amigo Romanelli deu a solução, não ” ASSASSINA” o ser humano que MESMO NÃO SENTINDO DOR é um ser humano, gera ele e faz uma bela doação para casais que SERÃO imensaente gratos por uma CRIANÇA rescem nascida. Pronto não precisa ter nada de INDESEJADO na vida perfeita que tinha antes de engravidar do Espirito Santo muitas vezes pois homen que não assume uma gravidez e deixa uma mulher cometer uma barbarie dessas tem de ir pra cadeia como cumplice de um ASSASSINATO !!! 

  2. Dinheiro p/ isso terá? É mesmo? Ora, ora…

    Dizer isso é que é demagogia. E achar que psra as mulheres, mesmo ricas, fazer aborto é fácil é nao saber nada da vida. O aborto é sempre um trauma, apenas menor do que uma criança indesejada. Nao consegue ver o ponto de vista de uma mulher…

    1. Tá certo, uma misandrina
      Tá certo, uma misandrina (dilmista) no ataque, falando q um homem não sabe da mulher ..tá bom

      E vc não conhece amigas – diversas – que fizeram 2 3 4 abortos ? Acha raro ? Fruto de acidente ?

      Acha q a pobre não arrumaria grana com o companheiro pra se “livrar” do problema ?

      Vivida vc ? Rsrsrs

      1. 2, 3, 4 abortos? Nao conheço nao

        E acho que pobre tem direito à saúde pública, nao tem que se virar para isso nao. E francamente, falar de misandria? Tá baixando o nível… Quem sabe eu tb tenho racismo contra brancos…

        1. Misandrina ..aquela q se
          Misandrina ..aquela q se caracteriza pelo desprezo ao sexo masculino

          Não busquei ofender ..foi vc q genericamente desmereceu a opinião masculina por entender q este tema diz respeito mais a mulher

          Qto a Multiplos abortos ..existem ..e não são raros como vc pensa ..inclusive há alguns ligados a problemas psicológicos tb ..e como proceder !?

          No caso vc está analisando o tema se projetando, mas nem todos são como vc.. o universo ė pródigo

          E longe de eu querer baixar o nível hein….

          Fazer QQ cidadão correr atrás da solução, penso, é dosar a um mínimo a intromissão sobre este tema ..do tipo,(o Estado) não ajuda, mas tb não atrapalha, se possível orienta ou resgata

          1. Nao tenho desprezo nenhum pelo sexo masculino

            Mas sei que os homens muitas vezes nao conseguem ver o lado das mulheres. Há exceçoes, claro, mas vc está mostrando que nao é uma. E esse tema DIZ REALMENTE MAIS RESPEITO ÀS MULHERES, homens nao abortam, nao pagam o preço dos acidentes que decorrem da falta da proteçao que AMBOS deveriam fazer. E por que o Estado nao deveria “se intrometer”? Quem determina no que ele deve? Quem sabe, parto sim, aborto nao… É o destino das mulheres, né? Que moralismo! De novo parece a ICAR. O Estado nao “se intromete” quando garante direitos.

          2. Há que estabelecermos limites
            Há que estabelecermos limites pra intromissão do Estado na vida dos cidadãos

            Garanta-se direitos sim , Mas cobre-se dos deveres tb

            Pelamordedeus anarquista ..engravidar hj, com a informação, meios e assistência já disponíveis(e providos pelo Estado)em imensa e esmagadora maioria trata de livre arbítrio e não de caso fortuito ou azar do destino

            Saia dos anos 50, estamos em 2018

          3. Proponho limites para partos Afinal custam bem + caro ao Estado

            Isso vc nao toparia, né? Nem eu. Mas por que uma coisa sim e a outra nao? Deixa de moralismo!

            E nao é verdade que tod@s tenham as informaçoes necessárias. E mesmo com contraceptivos gravidezes ocorrem. Tenho uma irmã que ficou grávida usando DIU… Mulher alguma faz aborto sem motivos, abortos sao penosos, sao risco, causam desequilíbrios psíquicos. Se como vc diz algumas desequilibradas fazem por problemas psíquicos, melhor que façam e nao tenham crianças a cuidar… DEIXA DE MORALISMO!

          4. tudo são valores  ..tudo é

            tudo são valores  ..tudo é moral  ..talvez em coma um dia deixe de te-la  ..mas por enquanto, sigamos

            Limitar parto ? tratamento a viciado ? Acidente sem capacete ou cinbto ? BEM QUE MERECIA  ..mas. mas, o que diferencia isso do aborto ?

            Aqueles defedem a manutenção ou resgate pra vida  ..uma pequena e FILOSÓFICA diferença

            ahh sim, fora termos que limitar a intromissão do Estado no livre arbítrio das pessoas e famílias, tb teria concordado com vc se retrucasse me dizendo que há que limitarmos a intromissão da sociedade e religiões na vida das pessoas  ..verdade

            ..de qq forma, doutra feita sempre haverá a necessidade de se fazer um meio de campo pra se proteger valores humanitários, dos fracos frente aos mais fortes tb.

            bom dia 

          5. Ah… Aqueles defendem a manutençao da vida…

            E o aborto feito em segurança, no SUS, nao defende? Vc acha que em nome da nao retirada da “vida” de um embriao ainda sem Sistema Nervoso, deve-se arriscar a vida da mulher sem recursos para fazer um aborto seguro? Quem é o mais fraco, hem, a mae ou “alguém” que nem existe ainda? Defender o direito da mulher, no caso, nao é defender valores humanitários? Como se comprova, vc nao é capaz de ver o ponto de vista das mulheres. Parece que acertei em cheio quando falei da ICAR. Seu discurso é de padre. Sua “moral” (aí nessa questao) se resume à velha repressao à liberdade sexual. 

            E quando o Estado dá recursos para fazer o aborto com segurança nao está se intrometendo no livre-arbítrio de ninguém , está permitindo que a mulher faça o que ELA decidiu, o Estado nao a obriga a isso. Já esse discurso moralista é que pretende determinar o que pode ou nao ser feito, isso é que é intromissao na vida das pessoas.

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