Os relógios e o tempo no Museu Mariano Procópio, por Jorge Sanglard

O passado aparece com tudo de bom, com tudo de ruim, com tudo que nos agrada e desagrada quando é reescrito

Relógio do acervo do Museu Mariano Procópio

Os relógios e o tempo no Museu Mariano Procópio

por Jorge Sanglard

Ao reunir peças do século XVIII ao início do século XX, o Museu Mariano Procópio guarda relógios de grande importância histórica. Entre os relógios, um que pertenceu ao Imperador Dom Pedro I e ficava originalmente no Palácio de São Cristóvão, residência da família Real no Rio de Janeiro.

Relógio do acervo do Museu Mariano Procópio

“O tempo não mata o passado”

O passado, segundo o memorialista Pedro Nava (5 de junho de 1903 – Juiz de Fora – 13 de maio de 1984 – Rio de Janeiro), fica computado, fica gravado dentro de nós absolutamente intacto. O passado aparece com tudo de bom, com tudo de ruim, com tudo que nos agrada e desagrada quando é reescrito. E, usando um argumento forte, revelou que, quando o passado é reescrito é que ele é um pouco anulado. E explicou: “nós aniquilamos um pouco o passado com esse aspecto catártico que tem a escrita. Mas para fazer isso é preciso sofrê-lo de novo. É retomar a vida outra vez e padecê-la outra vez”.

E Nava revelou como fez as pazes com certas pessoas através de sua literatura: “Eu tenho esquecido certas coisas que eu tinha completamente vivas dentro de minha memória depois que as pus por escrito. Depois delas escritas, desapareceram certas datas, certas pessoas. Certos aborrecimentos que eu tinha com determinadas pessoas desapareceram completamente. Eu fiz uma espécie de pazes com muita gente através da minha literatura um pouco vingativa sobre algumas pessoas que me desagradaram”.

Ao ser questionado, em entrevista, sobre o que constaria no último volume de suas memórias, Pedro Nava revelou irônico: “será quando eu morrer, é o que vão contar: “Faleceu na data de hoje o autor dessas memórias deixando-as nesse ponto”. E não deixou dúvidas quanto ao assunto: “Eu vejo isso da seguinte maneira: a memória é uma coisa inextinguível. Nós acabamos, mas a memória acaba conosco também, e acaba interrompida, porque tudo é interrompido, a vida é interrompida também. São coisas que estão fora de mim. O que está dentro de mim acaba comigo. O fim das minhas memórias é o fim da minha atividade material. O meu ciclo se encerra, acaba. A minha vida acaba naquele momento, de modo que um relato de memória não tem fim. Qual foi a memória que teve fim? Foi o livro do Proust, por exemplo, porque ele acabou, ele fez um ciclo de uma sociedade. Ele tinha como plano aquilo, e não escrever memórias. Ele foi um memorialista, mas fez principalmente o romance dele onde há 70% de memória. Mas tinha um fecho, ele tinha de acabar aquilo de uma maneira… e acaba terrivelmente, ele acaba sem acabar, ele solta o indivíduo no tempo. A última palavra que ele usa é Tempo, com ‘tê’ maiúsculo”.

*Jorge Sanglard é jornalista e pesquisador. Escreve em jornais no Brasil, Portugal e EUA.

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Redação

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