Pirataria, TJSP e a política externa

Ao aderir ao sistema internacional de proteção da propriedade industrial e aprovar Leis para garantir a mesma dentro do país, o Brasil se comprometeu com combate a pirataria em seu território. Apesar disto tem sido pressionado pelos EUA, fato que o fez reafirmar este compromisso publicamente:

“A defesa dos direitos autorais é objetivo consolidado na atividade do Poder Público brasileiro, que tem sistematicamente produzido resultados concretos, a despeito das carências de recursos humanos e materiais”, reconhece o Ministério das Relações Exteriores. “Em razão do interesse nacional, o Governo brasileiro continuará a tomar medidas para combater a pirataria no Brasil.” http://idgnow.com.br/mercado/2005/04/05/idgnoticia.2006-03-12.0432300999/

Em decisão inédita recente, porém, o TJSP absolveu uma pessoa acusada de pirataria com o seguinte fundamento:

“Verifique-se, a propósito, que o acusado é pessoa simples e que retira o sustento próprio e da família do ariscado comércio clandestino que exerce, auferindo parcos rendimentos mensais.

E certamente, não por ser essa a sua vontade, mas por ter sido a única forma que encontrou, em nossa sociedade capitalista e preconceituosa, para trabalhar, prover suas necessidades elementares, e sustentar sua casa.

De mais a mais, as autoridades competentes deveriam combater e prender, para fazer processar e condenar, os verdadeiros mantenedores da “pirataria”, cujos nomes e endereços, com pequeno empenho investigatório, certamente descobririam.

Enquanto tal não ocorre,  não é justo que se queira responsabilizar e punir o pobre vendedor ambulante que, sem outra opção de trabalho, expõe à venda, em sua banca improvisada, alguns produtos “pirateados”, sabidamente, com margem de lucro irrisória, suficiente apenas para a subsistência.” http://s.conjur.com.br/dl/decisao-mortari-pirataria.pdf

A decisão parece ser justa e atender ao princípio da equidade, pois a violação da propriedade industrial foi equiparada ao furto famélico. Furtar algo para comer quando se tem fome não é considerado crime há mais de um século pela jurisprudência brasileira.

Justiça e realidade, porém, não se ajustaram bem nesta decisão. Ao legitimar a pirataria o TJSP pode afetar, mesmo que de maneira não intencional, a política externa do Brasil. O Tribunal paulista não tem, entretanto, competência para tratar de política externa. Ao decidir os processos sob sua jurisdição o TJSP deveria ter feito cumprir a legislação que assegura a propriedade industrial e reprime a pirataria, mas optou por fazer exatamente o oposto. A decisão acima transcrita pode e deve ser objeto de recurso. Não só isto, a rebeldia contra a Lei Federal manifestada na decisão, o fato do TJSP ter invadido por vias transversas a competência do Itamaraty para comprometer a política externa do país pode até mesmo ser o fundamento para uma intervenção federal em São Paulo.

Quem aplica o Direito nos Estados não pode brincar de fazer justiça, não tem o direito de legislar e de invadir a esfera de competência dos órgãos do Executivo Federal. Ordem não se alcança com rebelião. Progresso não há quando o Tribunal paulista rejeita implicitamente a política externa adotada soberanamente pela Federação.

Fábio de Oliveira Ribeiro

23 Comentários

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  1. Enfim TJSP deu uma dentro

    Pessoal, uma vez na vida que o TJSP acerta não é pra gente criticar 🙂

    O fato da decisão ter descriminalizado a conduta não implica que ela foi legitimada ou legalizada.

    Continua sendo uma atividade ilícita, estando a mercadoria sujeita a sanções administrativas, como o seu perdimento.

    Apenas entendeu o Tribunal, com muito bom senso, que não é razão pra alguém ser encarcerado num presídio por conta dessa conduta. Isso não revoga tacitamente nenhum tratado internacional.

    1. Toda decisão judicial

      Toda decisão judicial proferida por um Tribunal pode virar jurisprudência. Se a jurisprudência inocentar a violação da propriedade industrial a pirataria terá sim sido legitimada apesar de ser proibida por Lei. 

  2. Acredito que o Brasil também
    Acredito que o Brasil também seja signatário de algum tratado ou algo do gênero para combater as drogas o que não impede o judiciário de proferir decisões absolutórias reconhecendo a insignificância da conduta ou até a inconstitucionslidade do artigo que trata do porte para consumo. Decisão justa e atenta à realidade social do nosso país.

  3. O TJ-SP invadiu competência

    O TJ-SP invadiu competência do Itamaraty? Por acaso o Itamaty tem competência para julgar? 

    Uma coisa é o compromisso de combater a pirataria. Como esse combate se dará é critério do Brasil.

    Penso que a decisão contraria por parte do juiz seria equivalente a politica de encarceramento de pequenos traficantes, que muito pouco contribui para reprimir o trafico e desvia a atenção de quem realmente lucra com o ilícito.

    Uma politica que vise combater a pirataria deve buscar os Law Kin Chongs e não os Robsons. Especialmente enquanto nossa sociedade for um repositório tão grande dos últimos.

    1. O Itamaraty tem competência

      O Itamaraty tem competência para fazer a política externa e a decisão proferida pelo TJSP pode produzir estragos na mesma. A invasão de competência ocorreu, mesmo que você não consiga entender o por que (para falar a verdade duvido muito que você entenda muita coisa do sistema constitucional brasileiro). 

      1. Há algum tratado

        Há algum tratado internacional firmado pelo Brasil e internalizado pelo Congresso que disponha expessamente de como deve ser combatida a violação de propriedade intelectual?

        Consegue ver algum país entrando com uma representação contra o Brasil na OMC por conta de casos como esse? (A menos que Marine Le Pen se eleja Presidente nos próximos anos)

        O fato de a violação de propriedade intelectual, no caso concreto, ter sido equiparada ao furto famélico não quer dizer que toda e qualquer violação dessa natureza terá o mesmo destino ou que o Brasil abriu mão de combater a pirataria. Só não me parece razoavel que todos os vendedores ambulantes da 25 de março cumpram de 3 meses a 1 ano de cadeia.

        Quando se trata de uma pessoa que, como diz a sentença, aufere parcos rendimentos com a atividade e portanto não teria optado por ela por usura, creio que há uma questão relativa a direitos humanos que fala mais alto. 

        E já que estamos no campo dos tratados, creio que o fato de o Supremo conferir carater suprelegal aos relativos a direitos humanos dá uma boa pista de como a questão não deve ser colocada em segundo plano.

  4. Direitos Autorais e Patentes, relação “caracú”

    BRASIL: Pago pelo seu, mas não recebo pelo meu. EUA: Recebo pelo meu e não pago pelo seu

    Acontece em diversos assuntos. Na compensação do Banco do Brasil é muito maior o fluxo de dinheiro por conta de Brasileiro que paga por usar ou ouvir “coisas” dos EUA, de modo que, o pouco que os EUA usam ou escutam desde aqui, fica negativo em términos de dinheiro. Por isso, os maiores talentos musicais e patentes (até de ervas da Amazônia), correm para ser registradas nos EUA. Tom Jobim tem a sua obra registrada em Nova Iorque e nunca pagou um único centavo de imposto no Brasil. Nós, tupiniquins, pagamos aos EUA pela nossa melhor música, cada vez que a ouvimos, e pelas nossas ervas, cada vez que cheiramos. 

  5. Pirataria
    Que tal falar em cobrar um preço justo pelo produto ao invés de extorquir o cliente?
    E se adaptar aos novos tempos (como itunes e netflix) ao invés de perseguir quem ousa querer fugir do monopólio de distribuição?
    Não esquecer também que Hollywood foi fundada na Califórnia para escapar das patentes do cinema de Tomas Edson, o que caracteriza também pirataria. “Ladrão que rouba ladrão…”

    1. Concordo que o preço dos

      Concordo que o preço dos produtos é abusivo, mas as regras existem para serem cumpridas. Não se pode permitir ao Poder Judiciário escolher cumprir ou não a Lei (é por isto, aliás, que a Lei Orgânica da Magistratura estabelece como primeira obrigação funcional do Juiz cumprir e fazer cumprir fielmente a Lei). Quanto maior for o arbítrio concedido ao Juiz para julgar, maior será também a possibilidade de abusos. Um país que não cumpre os compromissos internacionais que assume não tem credibilidade. 

    1. Há a justiça e há a Lei. O

      Há a justiça e há a Lei. O cidadão pode invocar a justiça, sempre e inclusive contra a própria Lei. Mas o Estado e seus servidores tem obrigação de cumprir e fazer cumprir a Lei. Se ao Estado e aos seus servidores for facultado cumprir a Lei ou não, o abuso se torna a regra e a perseguição judiciária se transforma num poderoso instrumento político. 

  6. Windows

    Um software como o Windows 8 custa em torno de 400 reais. Não importan quantos 800 milhões de cópias sejam vendidas mundialmente que o preço não baixa, e sem direito a up grade, você terá sempre que comprar o novo programa.

    Um Windows pirata vale em torno de 90 reais, com direito a antivirus, Microsoft Word etc.

    Acho que se não fosse a pirataria, talvez uns 50 milhões de brasileiros, que compram PCs mais baratos com Linux e fazem a reconfiguração, não teriam acesso à Internet e as vantagens da tecnologia.

    Se a Microsoft não baixa seu produto e se 60% dos usuários não podem pagar aquele preço, então vamos reconhecer:

    A PIRATARIA FAZ BEM AO POVO BRASILEIRO!

    Note que estou me referindo à tecnologia da informática.

    Não estou questionando os direitos atorais no caso de pesquisa em farmacologia, direitos autorais em músicas e filmes e muito menos de sinal de tv a cabo.

    1. O principal ponto não é o
      O principal ponto não é o preço em si.
      A questão é que o SO não pode ter preço muito relevante em relação ao hardware.

      E o hardware baixou de preço exponencialmente enquanto que o Windows passou de 50 para 200 dólares.

    2. Saia da pirataria. Use Linux.

      Saia da pirataria. Use Linux.  

      É um sistema muito melhor que o Windows.  Faz tudo o que o da Mirosoft faz, e com vantagens:

      Quase não existem vírus para Linux.

      É um sistema que não trava.

      Tem softwares para fazer textos, planilhas de cálculo, apresentações, edição de imagens, vídeos, áudio, navegar na internet, e-mails e muitas outras coisas que eu ainda estou descobrindo.

      É de código aberto. Você mesmo pode alterar o sistema se quiser (e se tiver competência).

      E o melhor:  É totalmente de graça!

      Não é preciso nem pagar os 60 reais do camelô.  Você só dá dinheiro para o Bill Gates se você quiser. 

  7. A decisão foi acertada, e

    A decisão foi acertada, e temos mais um inacreditável artigo do Fábio Oliveira!

    A competência para definir a política externa brasileira é da Presidência da República, não do Itamaraty.

    O juiz não desrespeitou a lei, apenas a interpretou segundo a condição de necessidade extrema do camelô.

    Esse é um artigo padrão Argolo de conhecimentos jurídicos.

  8. O Procurador que não deveria
    O Procurador que não deveria ter oferecido denúncia.
    O cara ganha o TETO pra ficar perdendo tempo com camelo?

    Ele oferece denúncia porque não tem opção de não faze lo!
    Querem ganhar o TETO sem se arriscar. Não querem correr o risco de responder por nada. Aliás nem admitem a possibilidade de responder por seus atos.

    Isso tudo foi antes da decisão do juiz.
    A decisão é coisa de analfabeto funcional. De uma pessoa que não tem a.mínima noção de seu papel na sociedade.
    Ele confundiu o princípio da insignificância a associando a uma.pratica ilícita.
    Diz.ele que este ato ilícito é insignificante. Mas se.o é porque tem lei dizendo o contrário?

    Ele não pode desqualificar a lei. Poderia dizer que era um crime irrelevante mas não diz ele que a Lei é. Um analfa!

    PS. Sou.promotor da pirataria no.mundo.

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