Xadrez da Lava Jato e a corrupção em Angola. Capítulo 2 – a demora em pegar a Trafigura

Essa demora foi suficiente para afastar a Petrobras da exploração do petróleo em Angola, deixando o campo livre para a Trafigura, pelo menos até a queda do presidente Santos.

17.08.2014 – Lava Jato fecha acordo de delação premiada com Paulo Roberto Costa.

Em sua delação, Paulo Roberto Costa admite que recebeu mais de US$ 800 mil de Marcondes Ferraz. Informa que Marcondes Ferraz o procurou em nome da Trafigura, pagando inicialmente US$ US$ 600 mil em propinas através de uma conta em nome da off-shore OST Invest & Finance Inc., em um banco em Genebra, Suíça.

21.01.2016 – delação de Nestor Cerveró implica a Trafigura.

Segundo Cerveró, Glencor e Trafigura tinham esquemas junto à Diretoria de Comercialização da Petrobras. Explicou que havia negocociações diárias em volumes muito grandes nos quais centavos de diferença nas negociações diárias podiam render milhões no final do mês. Disse conhecer Mariano Marcondes Ferraz, e que ele atuava como operador de trading.

22.02.2016 – delação de Delcídio do Amaral aumenta suspeitas sobre Trafigura

Na página 80 da delação de Delcídio do Amaral, se lê:

DELCIDIO DO AMARAL tem conhecimento que uma das áreas mais cobiçadas da PETROBRAS e a de Abastecimento, principalmente, em razão da comercialização de petróleo no exterior, na medida em que são comercializados 300.000 barris diários de petróleo leve, em números atuais, isso representaria em media quase US$ 10 milhões por dia.

DELCIDIO sabe que as operações financeiras são todas feitas em Londres através de “brokers”, tal modo de comercialização permite que pequenas variações no preço do petróleo representem altos ganhos aos seus principais operadores, dando azo a um terreno fértil para várias ilicitudes, vez que os preços podem ser alterados artificialmente.

26.10.2016 – despacho de Sérgio Moro, autorizando a prisão preventiva de Mariano Marcondes Ferraz.

No despacho, a Trafigura era diretamente implicada na corrupção da Petrobras.

Diz o despacho: “Envolve o pagamento de propinas pelo Grupo Trafigura ou pela DECAL do Brasil, por intermédio de Mariano Marcondes Ferraz, ao então Diretor de Abastecimento da Petrobrás, Paulo Roberto Costa, em decorrência de contratos com a estatal brasileira”.

Mariano Marcondes Ferraz, de nacionalidade brasileira, é um dos diretores executivos do Grupo Trafigura.

Paulo Roberto Costa, ex-­Diretor de Abastecimento da Petrobrás, revelou, após ter celebrado acordo de colaboração premiada, que a empresa Trafigura, representada por Mariano Marcondes Ferraz, ofereceu e pagou vantagem indevida em contratos da Petrobrás (termo de colaboração no 38, evento 1, anexo3).

Diz mais: Por ocasião da busca e apreensão realizada na residência de Paulo Roberto Costa (autorizada pela decisão de 24/02/2014, evento 22, processo 5001446­62.2014.404.7000), foi apreendido manuscrito de autoria de Humberto Sampaio Mesquita que contem informação sobre pagamento, no ano de 2013, de USD 446.840,00 e de 52.800,00 euros a Paulo Roberto Costa por Mariano Marcondes Ferraz, junto à anotação “Prefigura ­ Alugue do Terminal de Tancagem (Suape)”, conforme pode ser visualizado na cópia juntada no evento 1, anexo16, p. 4).

07.11.2017 – na série com o DCM, o GGN mostrava que a demora em indiciar a Trafigura beneficiava o principal concorrente da Petrobras na África.

“Entre 2004 e 2015, a Trafigura firmou contratos de afretamento de navios para a Petrobras no valor de US$ 169 milhões; entre 2003 e 2015, contratos de compra e venda de derivados no valor de US$ 8,7 bilhões, ou de US$ 580 milhões/ano. O último contrato da Decal com a Petrobras envolveu valores de R$ 56 milhões, ou US$ 18,7 milhões/ano, 31 vezes menor que os da Trafigura”.

05.03.2018 – Moro condena Mariano Marcondes Ferraz mas livra a Trafigura.

Segundo a sentença de Moro, “a referência à Trafigura decorre de equívoco decorrente do fato de que Mariano Marcondes Ferraz representava tanto a Decal como a Trafigura, como esclarecido por Paulo Roberto Costa em audiência: “Juiz Federal:- Alguns esclarecimentos do juízo aqui muito rapidamente, senhor Paulo. Senhor Paulo, quando o senhor prestou esse depoimento na polícia, o senhor não falou na Decal, o senhor falou na Trafigura. O senhor pode me esclarecer o que houve aí, um equivoco, por que essa diferença? Paulo Roberto Costa:- É, na realidade, o Mariano ele representava a Trafigura e representava a Decal. Então deve ter sido algum equivoco meu, porque ele representava as duas empresas aqui no Brasil. Eu me recordo. Então, deve ter sido um equivoco, porque o contrato realmente foi assinado com a Decal, que era dona das instalações de tancagem lá na Suape. Deve ter sido um equivoco mesmo, excelência”.

24.02.2018 – ONGs inglesas, contra a corrupção, começam a investigar a Trafigura na Lava Jato

Conforme reportagem do GGN, “esta semana fui procurado por um jornalista inglês que veio ao Brasil com uma missão especial: investigar os motivos que levaram a Lava Jato a ignorar as operações da área internacional da Petrobras, poupando das investigações dois dos mais notórios corruptores corporativos do planeta: a Trafigura e a Glencore, tradings de comercialização de petróleo que negociam com a Petrobras.

É um trabalho ao qual dedicará seis meses. Já teve acesso a documentos internos da Petrobras, nos quais se vê Jorge Zelada, ex-diretor da área internacional defendendo propostas da Trafigura, e o presidente José Gabrielli e Almir Barbassa negando.

Não apenas isso.

Sabia-se desde sempre que a área de comercialização de petróleo e derivados é aquela onde corre mais dinheiro.

10.2018 – a Global Witnes revela as investigações da Lava Jato com a Trafigura

  • Uma subsidiária da Glencore pagou pelo menos US $ 2,1 milhões a uma equipe de pai e filho de supostos suborno. A Glencore diz que contratou o par como corretores legítimos e nega impropriedade. Mas um relatório financeiro preparado para um dos principais diretores da Petrobras lista milhares de dólares devidos como pagamento de suborno de um acordo “Trading Glencore”, supostamente pago pelos fixadores.
  • Trafigura é objeto de uma investigação policial atual no Brasil, disse a Petrobras à Global Witness. Trafigura e a Polícia Federal do Brasil se recusaram a comentar.
  • Duas das figuras mais centrais do escândalo da lavagem de carros – incluindo o “Diácono de Suborno” do Brasil – trocaram mensagens sobre como distribuir pagamentos de suborno de um acordo de petróleo Trafigura de US $ 2 bilhões proposto, mostram documentos judiciais. A Trafigura admite ter proposto o abortado acordo de petróleo à Petrobras, mas disse que não “reteve” o diácono, cumprindo agora uma sentença de suborno de 13 anos.

14.12.2018 – finalmente, a Lava Jato denuncia executivos da Trafigura

Sérgio Moro já tinha abandonado a Lava Jato para se tornar Ministro de Bolsonaro. A denúncia foi contra Mariano Marcondes Ferraz e Marcio Pinto de Magalhães, ex-executivos do grupo Trafigura, o operador financeiro Carlos Henrique Nogueira Herz e Marcus Antonio Pacheco Alcoforado, ex-gerente de Comércio Externo de Óleos Combustíveis da Petrobras. Foram acusados de envolvimento em esquema de corrupção e lavagem de ativos em 31 operações de trading de óleo combustível entre a empresa internacional e a estatal petrolífera.

21.11.2019 – a pedido da Lava Jato, o Ministério Público da Suiça faz busca e apreensão nos escritórios da Trafgura e da Vitol.

De acordo com o procurador de Curitiba Athayde Ribeiro Costa, “as principais revelações na Lava Jato até o momento eram voltadas a crimes relacionados à construção de refinarias, área-meio da Petrobras. Agora, as investigações indicam que esquemas de corrupção de valores milionários também se instalaram nos negócios relativos à área-fim da estatal, compreendendo atividades rotineiras, como a comercialização de petróleo e derivados.” Essa demora foi suficiente para afastar a Petrobras da exploração do petróleo em Angola, deixando o campo livre para a Trafigura, pelo menos até a queda do presidente Santos.

Segundo a assessoria do MP brasileiro, a “Vitol e Trafigura realizam transações de modo maciço e recorrente com a estatal brasileira no mercado internacional. A Vitol, entre 2004 e 2015, fez negócios com a Petrobras, sobretudo operações de compra e venda de petróleo e derivados, em valor total superior a US$ 14 bilhões. Por sua vez, a Trafigura, no mesmo período, realizou negócios com a Petrobras, em valor superior a US$ 9 bilhões, também com foco em operações de compra e venda de petróleo e derivados.”

Leia também: Capítulo 1 – o caso Isabel Santos

Luis Nassif

3 Comentários

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  1. A Trafigura é famosa como pagadora de propinas…..será que rolou um por fora para as impolutas otoridades lavajatistas.
    Por isso correram do Tacla Duran com o diabo foge da cruz

  2. A Lava Jato nunca pretendeu de fato combater a corrupçao e sim tirar o PT do poder mesmo que as custas de delacoes compradas ao custo de milhoes de reais:

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