Na última terça-feira (27), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) visitou o Centro de Operações Espaciais Principal (Cope-P) da Telebras, em Brasília, e reiterou que o papel do Estado na gestão de áreas estratégicas para o país.
“Tem coisas que têm que ser, inexoravelmente, do Estado. É assim na Alemanha, na França e nos Estados Unidos. Muita gente foi levada, neste país, pela tese de que tem que abrir o mercado para todo mundo, que o importante é o livre acesso ao comércio”, afirmou o presidente.
Para explicar a importância da estatal e o potencial de garantia dos serviços ao povo brasileiro e ao poder público, o programa Nova Economia da última quinta-feira (30) contou com a participação do professor Luiz Carlos Delorme Prado, do Instituto de Economia da UFRJ e coordenador do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas, Estratégia e Desenvolvimento do IE-UFRJ.
O professor iniciou o debate resgatando o histórico da estatal, quando se fazia telefonia tradicional no país e a proposta era universalizar o acesso à telefonia em todo o território nacional, ainda que as classes mais baixas tivessem condições apenas de receber chamadas em orelhões públicos.
Ainda assim, a universalização nunca foi alcançada, tanto que a estatal foi privatizada também para que se pudesse atingir tal objetivo.
“Só para lembrar como a política pública teve um papel muito importante nisso. Quando o celular entra, os primeiros estudos mostravam que a população de renda mais baixa não tinha dinheiro para comprar um celular. Ou seja, para pagar, na verdade, não era nem para comprar, era para pagar o serviço. Então, você cria um sistema em que você usa o celular para receber o telefone mesmo e os telefones, os orelhões, para ligar”, relembra Prado.
Assim, Prado chama a atenção para o fato de que “é um equívoco muito grande se colocar nesse tipo de mercado complexo algum tipo de situação mercado versus Estado”. “Na verdade, só existe mercado porque o Estado cria, são mercados organizados pelo Estado.”
Novo papel
Diante de tantas transformações realizadas no mercado de comunicação, em que o serviço de telefonia se transformou, majoritariamente, em um serviço de dados e que chamadas telefônicas hoje são feitas até pelo WhatsApp, Luiz Prado comenta que a Telebrás agora tem como desafio propor políticas e regras para big techs e soluções associadas à inteligência artificial.
Isso porque entre as empresas que têm têm capitalização superior a US$ 1 trilhão, cinco são big techs e, para elas, o governo tem de desenvolver uma agenda de regulação e deve incentivar pesquisas na área de comunicação para propor novas soluções.
“Hoje, a Telebrás tem um papel que é gerir basicamente essas redes de cabos de fibra ótica, tem as questões de segurança vinculadas à questão de satélite, mas, na verdade, isso é um instrumento na mão do Estado que pode ser usado para outros fins na medida em que houver necessidade. Vejo a Telebrás como um instrumento cujo papel vai depender das estratégias de desenvolvimento que nós queremos colocar aí, como é que o Estado brasileiro vai lidar com essas questões emergentes que estão surgindo e que tipo de instrumento pode ser usado para esse fim”, continua o entrevistado.
Miopia
Outro ponto relevante nesta discussão são as três funções da Telebrás definidas por lei: a função social, a implementação de políticas de acessibilidade para a população por meio de projetos de inclusão digital, como programa de serviço, e atendimento ao cidadão no Ministério de Ciência e Tecnologia.
“Isso é uma função de segurança, que tem a ver com a questão de soberania nacional, defesa, essas questões todas. Uma função estratégica, que é a capacidade de conectar o governo em qualquer situação nacional”, continua Luiz Prado.
Porém, mesmo que a causa seja plausível, empresários do setor se mostram contrários à atuação estatal, mesmo que esta possa garantir a evolução que o mercado tanto demanda.
Um dos exemplos é a agricultura, em que muitos produtores atuam em áreas que não contam com cobertura de internet e, consequentemente, enfrentam dificuldades para utilizar maquinários que hoje já estão integrados com a inteligência artificial.
“Você se vincular a uma política de Estado para desenvolver tecnologia para a agricultura, ganha um de todos. Ganha a sociedade brasileira, porque gera emprego. Ganha a agroindústria, porque gera negócios para eles. Eu não consigo ver perdas ligadas a isso. Mas você encontra em imensa dificuldade uma visão muitas vezes muito simplória e algumas vezes o contrário é o interesse deles mesmos, o que me parece muito estranho.”
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