A grande apologia do capitalismo de Umberto Eco no livro sobre o Ur Fascismo, por Rogério Maestri

Umberto Eco traça um fascismo atemporal e moral que poderia existir em qualquer época da história depois do início do Neolítico.

A grande apologia do capitalismo de Umberto Eco no livro sobre o Ur Fascismo

por Rogério Maestri

Quase 100% desde os liberais aos marxistas acadêmicos adoram o pequeno livro de Umberto Eco denominado o “Ur fascismo”, um pequeno livro que é um desenvolvimento de uma palestra que o intelectual italiano deu numa universidade norte-americana que virou coqueluche de uma imensa parte da intelectualidade que dá uma definição atemporal e totalmente desvinculada dos tipo de sociedade que pode a grosso modo ser utilizado por qualquer governo autoritário ou totalitário, desde os Mongóis do reinado de Gengis Khan, passando pelo príncipe Vlad Țepeș da Transilavânia (mais conhecido por conde drácula), se fixando no Duce Mussolini, indo terminar no patético ocupante atual da cadeira da presidência da república. As características são tão genéricas que muitos as acham em Stalin, Getúlio Vargas e qualquer outro governante que seja antipático a quem deseja desqualificar regimes políticos e/ou governantes.

A esquerda geralmente abusa tanto da definição, que utiliza essa denominação para policiais violentos com mais características de homicidas psicopatas do que adeptos da ideologia fascista. Ou seja, virou um chavão sem a mínima coerência que serve para substituir palavrões em atos públicos ou privados.

Porém há somente uma ideologia que é poupada desse desaforo pelo texto, pois poderíamos dizer que o livro é uma santificação e congelamento da relação de forças da ideologia capitalista, indo bem longe da luta antifascista daqueles que tombaram na luta contra os fascistas como Antonio Gramsci e milhões de outros comunistas, anarquistas, sociais democratas e até liberais, adotando o antifascismo na ausência do mesmo para uma parte da esquerda abandonar a luta contra o capitalismo e o imperialismo deixando de lutar contra um inimigo vivo em nome de um espantalho.

Umberto Eco e seus admiradores trabalham com uma concepção idealista da existência de um “Fascismo Eterno” o “Ur Fascismo” que fica totalmente descolado de razões históricas sendo somente uma característica inata da natureza humana que pode voltar a qualquer tempo sem nenhuma vinculação a situações objetivas políticas e econômicas. Essa concepção idealista fica claro no seguinte parágrafo.

“Tuttavia, anche se i regimi politici possono venire rovesciati, e le ideologie criticate e delegittimate, dietro un regime e la sua ideologia c’e sempre un modo di pensare e di sentire, una serie di abitudini culturali, una nebulosa di istinti oscuri e di insondabili pulsioni. C’e dunque ancora  un altro fantasma che si aggira per l’Europa (per non parlare di altre parti del mondo)?”

(No entanto, mesmo que os regimes políticos possam ser derrubados e as ideologias criticadas e deslegitimadas, por trás de um regime e sua ideologia há sempre uma forma de pensar e sentir, uma série de hábitos culturais, uma nebulosa de instintos obscuros e impulsos insondáveis. Então, existe outro fantasma vagando pela Europa (para não mencionar outras partes do mundo)?

Ou seja, Umberto Eco trabalha com um conceito de ideologia não algo a serviço das classes dominantes, mas sim de algo misterioso, sombrio e instintivo, como algo atávico da natureza humana.

O texto de Umberto Eco desdobra-se entre uma Ode aos seus libertadores norte-americanos, despreza os partigiani comunistas italianos, comparando as lutas com mortes dos mesmos com a pluralidade que ele notava escutando belas mensagens da BBC e citando uma frase de Roosevelt.

Depois de todo esse introito vem a sua teoria do fascismo atemporal e eterno que ele faz uma lista de características que permite encaixar qualquer ditadura em qualquer período da história da humanidade, não colocando nessa lista algo que ele coloca escondido no texto que o fascismo foi sempre apoiado pelos latifundiários sem citar os industriais, ou seja, que o fascismo que ele enumera era essencialmente uma evolução do capitalismo.

Ou seja, Umberto Eco traça um fascismo atemporal e moral que poderia existir em qualquer época da história depois do início do Neolítico.

Mas o mais interessante é que Eco cai num sabujismo incrível na citação de Roosevelt que diz:

“La vittoria del popolo americano e dei suoi alleati sarà una vittoria contro il fascismo e il vicolo cieco del dispotismo che esso rappresenta”

“A vitória do povo americano e de seus aliados será uma vitória contra o fascismo e o impasse de despotismo que ele representa.”

Ou seja, se os americanos não tivessem entrado na Europa quase no fim da guerra, o fascismo perduraria para sempre, pois somente a democracia burguesa seria capaz de vencer o fascismo, pois essa é a quintessência da libertação que eles levam aos povos de todo o mundo, como os Vietnamitas, os Iraquianos, os Sírios e todas as nossas repúblicas bananeiras.

Redação

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  1. ADVERTÊNCIA: Há meses que diariamente recebo uma média de 3 a 4 ligações telefônicas, alguns dias até mais, identificadas como de um banco ou de outro, por vezes até mais de um, sendo o outro o privado no qual mantenho conta, oferecendo ampliação da margem do empréstimo consignado que realizei há cerca de 5 anos atrás. Todos abrem a conversação informando que o presidente Bolsonaro, ou apenas o presidente concedeu esse benefício em razão da pandemia, mas a cada ligação a tal margem varia com ofertas de mil e poucos até 7 mil e alguma coisa. O que não varia é a evidência da propaganda subliminar do governo Bolsonaro. Isso merece uma análise jornalística.

  2. Rogério Maestri,
    Existe algo na cultura que é transcendental, ainda que seja meramente humano e sendo humano é social. As histórias que nos contam e contamos tem a ver com esta transcendentalidade. Nossa cultura é conservadora porque é religiosa e é competitiva e individualista porque é capitalista.
    Há ainda outros traços que perpassam todas as classes sociais e com qualquer nível de escolaridade embora eu creio que à medida que o nível de conhecimento sobre a nossa realidade aumenta as pessoas adquirem um perfil mais de esquerda e, portanto, menos conservador e mais solidário.
    Vou deixar a indicação de um post antigo que trata de certo modo do caráter fascista de qualquer sociedade. Trata-se do post “O Grande Mal Estar, por Diogo Costa” de quarta-feira, 25/10/2017, publicado no blog de Luis Nassif e com texto de Diogo Costa e que pode ser visto no seguinte endereço:
    https://jornalggn.com.br/opiniao/o-grande-mal-estar/
    Há dois comentários meus em que eu relaciono vários textos que tratam do crescimento ou da permanência do fascismo. Entre as minhas referências há o post “Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno” de sábado, 29/10/2016 às 14:45, publicado aqui no blog de Luis Nassif e consistindo da conferência proferida por Umberto Eco na Universidade Columbia, em abril de 1995, portanto, há mais de vinte anos, e que pode ser visto no seguinte endereço:
    https://jornalggn.com.br/noticia/umberto-eco-14-licoes-para-identificar-o-neofascismo-e-o-fascismo-eterno
    Vale a pena também dar uma olhada nas outras referências que eu faço lá nos meus dois comentários junto ao post “O Grande Mal Estar, por Diogo Costa”
    Por volta do final da década de 70 eu dizia que toda a sociedade tinha 30% de fascistas. Eu desenvolvi depois a ideia do fascismo de pequenas causa (machismo, xenofobia ou chauvinismo, homofobia, antagonismo com outras religiões, etc) e fazia a distinção desse fascismo com o fascismo que eu chamava de fascismo intelectual italiano. E que Umberto Eco repudia implicitamente pois o fascismo para ele não teria uma quintessência.

  3. Claro Clever.
    Há uma clara tentativa de tirar o significado e o poder das palavras, isso é feito por pessoas bem intencionadas e por pessoas que querem simplesmente descontextualizar o que venha a ser o fascismo, pois simplesmente o fascismo é uma arma que o capitalismo utiliza quando perde a capacidade de manobrar politicamente o jogo.
    Por maior que seja a capacidade intelectual e a produção do falecido Umberto Eco, acho que o texto que nós dois nos referimos, que exatamente o mesmo é uma imensa falácia que é utilizada para simplesmente colocar como a Democracia Burguesa representada pela maior república e bananeiras do MUNDO, os USA, como a única saída para a humanidade.
    Em todo o texto de Umberto Eco, ele teve a desonestidade de simplesmente ignorar que quem pagava as contas dos fascistas europeus sempre foi o grande capital, ou seja, essa característica comum ele nem cita de passagem na sua falsa lista de características do fascismo. Ele simplesmente coloca esse regime como se fosse uma característica da má índole humana que deve ser combatida, nas primeiras linhas do texto ele mostra o porquê disso, ele coloca que aos dez anos, apesar de ser uma criança brilhante já era um fascistinha e provavelmente se o sistema político fascista perdurasse por mais tempo ele seria um intelectual orgânico do Partido Fascista, como ele torna o fascismo algo da índole humana, tomo a mesma liberdade de dizer que Umberto Eco fez esse texto porque ele mesmo tinha medo de ter se tornado um fascista.
    Quanto a tua análise que crises econômicas levam ao fascismo (que citas nos teus comentários), sinto muito dizer que está completamente equivocada, pois se assim fosse a cada sete a dez anos em média na história do capitalismo teríamos uma ressurgência do fascismo e isso certamente não ocorre.
    O fascismo é um evento datado, começa em 1922 com a tomada do poder por Mussolini e termina em 1945 com o fim da segunda guerra, movimentos protofascistas que surgem após são simplesmente farsas que a burguesia permite para criar espantalhos e permitir que a população levada por uma esquerda débil e desorientada reagrupe-se em torno de movimentos da direita tradicional que também é truculenta e assassina.
    É importante desmistificar e mostrar o caráter reacionário, pró capitalista e mentiroso de Umberto Eco. Já o li no mínimo umas cinco vezes e todas as vezes que leio vejo claramente a sordidez com que o autor monta a sua bela história utilizando sua imensa capacidade de um fantástico escritor de romances históricos, ele começa se desculpando por ter sido um fascistinha brilhante na sua juventude, porém por mais brilhante que seja uma criança de dez anos ele jamais escreverá um elogio ao fascismo para enganar os leitores e fazê-los pensar que ele era fascista, mas na verdade ele não era. Ou seja, ele no lugar de dizer que era um fascistinha inteligente ele se autodescreve como um farsante de palavras. Mesmo se aceitarmos a sua teoria de estar falseando o seu discurso juvenil para ganhar um prêmio, vem a pergunta: Quando ele deixa de ser um farsante das palavras. Mudou de índole ou simplesmente se especializou.
    Depois desse introito ele passa o tempo todo desprezar os partigiani comunistas italianos e beatificar os norte americanos até fazendo referências que havia negros no exército norte-americano que provavelmente ocupavam a posição de cozinheiros (isso não é uma mera provocação é um fato). Caindo no fim num discurso em que se não fosse os norte-americanos as tropas de Hitler jamais seriam vencidas na segunda guerra e na verdade a ação dos USA no front europeu e principalmente na Itália foi segurada até o fim da guerra por poucas tropas alemães.
    Há dois trechos que se sucedem no trabalho de Eco que mostra a sua montagem mentirosa sobre o fascismo que copiarei aqui.
    “Não adianta dizer que o fascismo continha em si todos os elementos dos totalitarismos sucessivos, por assim dizer, em “estado quintessencial”. Ao contrário, o fascismo não possuía nenhuma quintessência e sequer uma só essência. O fascismo era um totalitarismo fuzzy. O fascismo não era uma ideologia monolítica, mas antes uma colagem de diversas ideais políticas e filosóficas, uma colmeia de contradições…..
    O partido fascista nasceu proclamando sua nova ordem revolucionária, mas era financiado pelos proprietários de terras mais conservadores, que esperavam uma contrarrevolução…..”
    A primeira parte coloca o fascismo como algo quase que “light”, pois simplesmente ele procura esconder que o fascismo é diretamente vinculado ao capitalismo não liberal, mas a segunda parte é uma MENTIRA HISTÓRICA, pois ele coloca o fascismo como algo sendo financiado por proprietários de terras conservadores “esquecendo” o amplo financiamento que a indústria do norte da Itália forneceu ao fascismo, muito mais numerosa e muito mais importante do que “proprietários de terras mais conservadores” esquece a própria Confederação Geral da Indústria Italiana que possuía mais de cinco milhões e meio de empregados apoiou o fascismo e por conta disso obteve a mais agressiva política de privatizações (From public to private: Privatization in 1920’s Facist Italy) e uma lei que comparava uma greve operária a um “crime contra a economia pública” Lei Rocco artigos 502 a 508.
    O cerne do fascismo que Umberto Eco falsamente e descaradamente procura omitir é a repressão as organizações operárias, colocando fora da lei todos os Sindicatos que não fossem DECLARADAMENTE e JURAMENTADOS como Sindicatos Fascistas, ou seja, Umberto Eco no seu opúsculo propagandista do capitalismo esconde o básico e mostra só o acessório que emociona a pequena burguesia.

    1. Rogério D. Maestri (quarta-feira, 02/12/2020),
      Eu cometi um erro repetido duas vezes em meu comentário que o direcionou para um entendimento não muito próximo do que eu queria dizer. Chamo de erro, mas é mais uma questão semântica que o meu português ruim não consegue evitar. Reproduzo as duas frases onde o mesmo erro foi cometido:
      “Vou deixar a indicação de um post antigo que trata de certo modo do caráter fascista de qualquer sociedade.”
      “Há dois comentários meus em que eu relaciono vários textos que tratam do crescimento ou da permanência do fascismo.”
      Eu coloquei para pesquisa duplo expresso clever mendes o grade mal estar por diogo costa e apareceram links desde 28/03/2018 até 12/11/2020. Nos links há comentários meus em que eu recomendo a leitura do post “O Grande Mal Estar, por Diogo Costa” de quarta-feira, 25/10/2017. Eu imagino que as minhas referências para o post “O Grande Mal Estar, por Diogo Costa” em geral são para tratar do crescimento da direita e não do fascismo.
      No post “O Grande Mal Estar, por Diogo Costa” há dois comentários meus. No primeiro, enviado na sexta-feira, 27/10/2017 às 16:16, eu digo o seguinte:
      “Creio que esse assunto do crescimento da direita no mundo após a crise de 2008 de modo semelhante ao que ocorrera em 1930 precisava de mais repercussão.”
      Então estou tratando do crescimento da direita. E não do fascismo.
      É bem verdade que no segundo comentário enviado quase um ano depois na terça-feira, 09/10/2018, eu já menciono o fascismo. Só que o segundo foi um tanto sugestionado pelo caráter fascista do governo Bolsonaro. Então eu uso o termo fascismo em vez de direita como se pode ver em trecho que reproduzo a seguir e retirado do primeiro parágrafo do meu comentário. Disse eu lá para Diogo Costa:
      “Você anda meio sumido e este post “O Grande Mal Estar, por Diogo Costa” de quarta-feira, 25/10/2017, às 07:58, de sua autoria, aqui no blog de Luis Nassif, já está um tanto esquecido, mas frequentemente venho aqui e sinto falta de outro bom post que trate do fascismo e para o qual eu enviei um comentário que complementa o que eu enviei aqui, anteriormente, na sexta-feira, 27/10/2017 às 13:16.”
      Então, ao dizer: “sinto falta de outro bom post que trate do fascismo” é como eu dissesse que Diogo Costa trata no post “O Grande Mal Estar, por Diogo Costa” do fascismo. Só que ele trata do crescimento da direita e que pode ainda se tornar um crescimento ainda mais para a extrema direita. A última frase do texto dele implícito a possibilidade do fascismo. Diz ele:
      “Ou se supera esse impasse oriundo do Crash de 2008 ou nos encaminharemos para um tempo de extremismos ainda maiores. Nunca se esqueçam da década de 30 do século passado.”
      Enfim, o termo fascismo como eu emprego é dentro de um contexto de crescimento da extrema direita e daí a possibilidade de surgimento ou recrudescimento do fascismo. E o termo fascismo se prende mais ao que eu chamo de fascismo das pequenas coisas e que é imanente às almas conservadoras que habitam todos os países. Há que sopesar também que embora tenha aberto este seu post mais cedo só mais tarde é que eu fui fazer o comentário para não perder o artigo no dia seguinte.
      Dito isso eu posso analisar a primeira crítica que você faz ao meu comentário quando você diz:
      “Quanto a tua análise que crises econômicas levam ao fascismo (que citas nos teus comentários), sinto muito dizer que está completamente equivocada, pois se assim fosse a cada sete a dez anos em média na história do capitalismo teríamos uma ressurgência do fascismo e isso certamente não ocorre.”
      O minha insistência em fazer com frequência referência ao post “O Grande Mal Estar, por Diogo Costa” é exatamente para que as pessoas possam ter contato com dois artigos que mostram com dados estatísticos que a direita cresce quando há crise econômica. A direita não só cresce como se torna mais radical. E daí não há uma diferença muito grande do que eu chamo de fascismo das pequenas causas da direita.
      Depois você volta a falar sobre o texto de Umberto Eco. E até avaliei esta sequência da sua análise melhor que o conteúdo do seu próprio post “A grande apologia do capitalismo de Umberto Eco no livro sobre o Ur Fascismo.” Nesse sentido reproduzo aqui o trecho em que você censura o sabujismo de Umberto Eco ao utilizar uma citação de Rossevelt que me pareceu tirada completamente do contexto. No post este trecho está assim:
      Mas o mais interessante é que Eco cai num sabujismo incrível na citação de Roosevelt que diz:
      “La vittoria del popolo americano e dei suoi alleati sarà una vittoria contro il fascismo e il vicolo cieco del dispotismo che esso rappresenta”
      “A vitória do povo americano e de seus aliados será uma vitória contra o fascismo e o impasse de despotismo que ele representa.”
      Na tradução para o português no OperaMundi com o título “Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno” que você indicou, o contexto dessa frase de Roosevelt é o seguinte:
      “Ionesco disse certa vez que “somente as palavras contam, o resto é falatório”. Os hábitos linguísticos são muitas vezes sintomas importantes de sentimentos não expressos.
      Portanto, permitam-me perguntar por que não somente a Resistência mas toda a Segunda Guerra Mundial foram definidas em todo o mundo com uma luta contra o fascismo. Se relerem “Por quem os sinos dobram”, de Hemingway, vão descobrir que Robert Jordan identifica seus inimigos com os fascistas, mesmo quando está pensando nos falangistas espanhóis.
      Permitam-me passar a palavra a Franklin Delano Roosevelt: “A vitória do povo americano e de seus aliados será uma vitória contra o fascismo e o beco sem saída que ele representa” (23 de setembro de 1944).
      Durante os anos de McCarthy, os norte-americanos que tinham participado da guerra civil espanhola eram chamados de “fascistas prematuros” — entendendo com isso que combater Hitler nos anos 1940 era um dever moral de todo bom norte-americano, mas combater Franco cedo demais, nos anos 1930, era suspeito. Por que uma expressão como “fascist pig” era usada pelos radicais norte-americanos até para indicar um policial que não aprovava os que fumavam? Por que não diziam: “Porco Caugolard”, “Porco Falangista”, “Porco Quisling”, “Porco croata”, “Porco Ante Pavelic”, “Porco nazista”?”
      Então, é em torno do questionamento do uso do termo fascista que Umberto Eco menciona a frase Franklin Delano Roosevelt: “A vitória do povo americano e de seus aliados será uma vitória contra o fascismo e o beco sem saída que ele representa” (23 de setembro de 1944).
      No contexto a frase adquire um sentido um tanto diferente do que você assumiu. Primeiro vem a frase de Ionesco, ressaltando a importância do significado das palavras. E então Umberto Eco, dando valor aos hábitos linguísticos, questiona porque a segunda guerra mundial ficou sendo considerado uma guerra contra o fascismo. E ele menciona “”Por quem os sinos dobram”, de Hemingway, em que Robert Jordan luta contra os fascistas, e não contra os falangistas espanhóis. E é assim que ele continua no texto. Ele está questionando porque se usa o termo fascista e não outro que teria razões para ser usado.
      E aqui cabe uma comparação interessante. O mesmo texto do Opera Mundi saiu no The New York Review com o Título “Ur-fascism” e o subtítulo “Freedom and liberation are an unending task”, na edição de 22/06/1995, há, portanto, 25 anos. E o link para o artigo no The New York Review é:
      https://www.nybooks.com/articles/1995/06/22/ur-fascism/?lp_txn_id=996441
      No original em inglês o trecho do artigo que eu reproduzi acima e que tem quatro parágrafos aparece com apenas dois e da seguinte forma:
      “Ionesco once said that “only words count and the rest is mere chattering.” Linguistic habits are frequently important symptoms of underlying feelings. Thus it is worth asking why not only the Resistance but the Second World War was generally defined throughout the world as a struggle against fascism. If you reread Hemingway’s For Whom the Bell Tolls you will discover that Robert Jordan identifies his enemies with Fascists, even when he thinks of the Spanish Falangists. And for FDR, “The victory of the American people and their allies will be a victory against fascism and the dead hand of despotism it represents.
      During World War II, the Americans who took part in the Spanish war were called “premature anti-fascists”—meaning that fighting against Hitler in the Forties was a moral duty for every good American, but fighting against Franco too early, in the Thirties, smelled sour because it was mainly done by Communists and other leftists. … Why was an expression like fascist pig used by American radicals thirty years later to refer to a cop who did not approve of their smoking habits? Why didn’t they say: Cagoulard pig, Falangist pig, Ustashe pig, Quisling pig, Nazi pig?”
      Então no texto em inglês fica mais evidente que no contexto em que a frase de Franklin Delano Roosevelt aparece Umberto Eco está questionando o uso da palavra fascista. Fica mais evidente porque as três frases: a de Ionesco sobre a palavra, com a observação de Umberto Eco de considerar que os hábitos linguísticos são sintomas de sentimentos não expressos, a frase que faz a constatação de que a Segunda Grande Guerra é mencionada como uma luta contra o fascismo e que se faz também a constatação de que no livro “Por quem os sinos dobram” a luta é contra o fascismo e não contra as falanges espanholas e a frase de Franklin Delano Roosevelt estão em um só parágrafo e não em três como na versão do Opera Mundi. Os três pequenos parágrafos são transformados em apenas um em que se questiona o uso do termo fascista.
      E o quarto parágrafo, o segundo na versão em inglês é ainda sobre a questão do uso do termo fascista. E agora há um problema. Os dois textos, o parágrafo em inglês em The New York Review é diferente do parágrafo no OperaMundi, não mais na forma mas no conteúdo. Houve erro no início do parágrafo e o texto em inglês faz mais sentido.
      No Opera Mundi está assim:
      “Durante os anos de McCarthy, os norte-americanos que tinham participado da guerra civil espanhola eram chamados de “fascistas prematuros” ”
      Já em The New York Review o texto é o seguinte:
      “During World War II, the Americans who took part in the Spanish war were called “premature anti-fascists””
      Acho mais razoável que a referência seja à Segunda Guerra Mundial porque não faz sentido colocar o senador Joseph McCarthy na frase. E evidentemente houve erro de tradução porque Umberto Eco claramente se referia aos chamados de “antifascistas prematuros”.
      Assim considero que você por não gostar de Umberto Eco que é um social democrata anti-comunista, tenha visto no texto um sentido que não me parece que Umberto Eco queira dar.
      Em comentário que eu enviei no post “Umberto Eco: 14 lições para identificar o neofascismo e o fascismo eterno” de sábado, 29/10/2016 às 14:45, eu faço referência a comentário meu para Sergio T. no post “As lições de Umberto Eco para identificar o neofascismo” de sábado, 27/02/2016 às 11:04, que apareceu no blog de Luis Nassif por sugestão de Sergio T. No meu comentário eu identifico dois fascismo: o das pequenas causas e o que eu chamo fascismo intelectual italiano e as razões que eu dei para assim denominar o fascismo italiano derivava de nele haver a defesa do estado forte, de ele ser idolatrado por Ezra Pound e por ter lido em uma biografia de Mussolini que ele dizia “eu sou apenas um poeta e um poeta muito louco”.
      E pelo fato de o Estado ser forte no fascismo italiano (e no Nazismo alemão), eu não creio relevante falar do financiamento ao partido fascista pelos capitalistas. É o estado que financia os capitalistas seja reprimindo as organizações operárias seja fornecendo financiamento com juros subsidiado. Essa relação do financista ajudar o fascismo é relevante ser mencionada pelo que aconteceu na Alemanha, onde sem muito exagero pode-se dizer que os capitalistas financiaram os fornos crematórios nazistas.
      Eu ia também comentar no seu post “A destruição da economia dos países não é um acaso, por Rogério Maestri” de sexta-feira, 27/11/2020, aqui no blog de Luis Nassif, e que pode ser visto no seguinte endereço:
      https://jornalggn.com.br/opiniao/a-destruicao-da-economia-dos-paises-nao-e-um-acaso-por-rogerio-maestri/
      Creio que não existe a intenção de destruir a economia brasileira. Pode até existir esta vontade por parte da Europa e dos Estados Unidos, principalmente deste último pois os Estados Unidos têm uma economia puxada pelo mercado interno que prescinde do crescimento da economia das periferias. Só que à medida que a economia chinesa adquire cada vez mais importância no mundo, mais favorável se torna o crescimento econômico dos países de periferia.
      A China é um país que precisa do crescimento dos países de periferia para comprar produtos da China uma vez que a China tem uma economia em muito movida pelo mercado externo. A Nova Rota da Seda foi planejada exatamente para permitir que países que estão bastante atrasados possam crescer em ritmo bem mais rápido que o atual.
      Clever Mendes de Oliveira
      BH, 02/12/2020

  4. Claro Clever.
    Deixei passar a tua finalização do comentário, logo vou rapidamente responder o teu último parágrafo.
    Qual a quintessência do capitalismo? Se não tiver, quer dizer que ele não existe?

    1. Rogerio D. Maestri (quarta-feira, 02/12/2020 às 14:52),
      Eu fiz uma brincadeira, pois desde há muito eu uso o expressão fascismo intelectual italiano para o diferenciar do fascismo que eu chamo fascismo das pequenas causas. A distinção era para mostrar que o fascismo intelectual italiano tinha estrutura, tinha consistência, tinha quintessência enquanto o fascismo das pequenas causas ou coisas não tinha nada disso. Ora se o Umberto Eco que sabia muito mais das coisas do que eu, disse que o fascismo italiano não tinha quintessência então não haveria distinção. Então só existiria o fascismo das pequenas causas.
      De todo modo, bem antes de você deixar a entender que existe o fascismo italiano, eu tenho continuado a reportá-la.
      Agora quanto a sua questão sobre o que seria a quintessência do capitalismo eu diria que é a possibilidade de acumular capital com o trabalho de terceiro. E o capitalismo só deixará de existir se aparecer um sistema econômico que assegure um crescimento da produção superior ao que o acumulo de capital com o trabalho de terceiro assegura.
      E o capitalismo também não existiria se a concentração de capital que a possibilidade de acumular capital com o trabalho de terceiro permite chegar a um ponto máximo absoluto que não haverá como acumular capital com o trabalho de terceiro. E também não existiria o capitalismo se a possibilidade de acumular capital com o trabalho de terceiro embora continuando existindo não assegura o acúmulo de capital.
      Clever Mendes de Oliveira
      BH, 02/12/2020

      1. Clever, meu caro. Poderíamos passar longas horas discutindo traduções e sentido de algumas palavras, entretanto parece que não entendeste a base do meu texto, que é simplesmente a opção liberal de Umberto Eco que ele deixa claro nos seus ranços e elogio aos Yankes como a tabua de salvação da humanidade, desprezando por completo fatos sobre os quais não servem a discussões acadêmicas.
        Umberto Eco IGNORA as opções e alianças do fascismo com a Grande Burguesia Liberal, coisa que além da sustentação econômica com a posterior retribuição aos grandes industriais italianos reforça a falsidade intelectual de Eco, pois nas características do fascismo ele somente cita o apoio de uma oligarquia rural atrasada italiana, como se a imensa maioria de todos os Grandes Burgueses no MUNDO INTEIRO não aplaudisse com vigor a chegada do fascismo para DOMINAR e continuar a exploração do proletariado.
        As coisas são simples, o fascismo Italiano, Espanhol, Português e Alemão, uns sendo imperialistas outros sendo imperialistas falidos (imperialistas no sentido de terem no passado um grande Império -Portugal e Espanha). A única diferença desses dois grupos é que os últimos tinham noção perfeita que não recuperariam império nenhum) e os segundos tinham pretensões para tanto.
        Essa realidade mostra o quanto O Ur Fascismo é uma imensa besteira, que foi aceito por todo o Mainstream mediático e intelectual pois retiravam de suas costas o protofascismo que muitos tentaram.
        insisto, o trabalho sobre o Ur Fascismo é uma falsificação histórica, pois se ele retira do fascismo o seu fator principal, fica somente fatores secundários que muitos se encaixam em qualquer ditadura em qualquer época.
        O mal uso da palavra fascismo é um erro tanto de intelectuais de direita como de esquerda, sendo que os primeiros pretendem livrar a sua consciência e os segundos querem assustar uma parte da pequena burguesia que cada vez mais se acomoda em discursos neofascistas, simplesmente por objetivos utilitários de manter suas migalhas que recebem da queda dessas da mesa da grande Burguesia.
        Já tive discussões com excelentes intelectuais de esquerda (reformista e revolucionária) pelo uso utilitário da denominação fascista para qualquer regime de direita autoritária, mas acho por exemplo que definir o governo Bolsonaro como um governo fascista, ou mesmo com pretensões ao fascismo acho uma leviandade imensa.
        Quanto a quintessência do capitalismo acho a tua definição correta, porém dela deriva a quintessência do fascismo, que é o capitalismo sem com partido único e controle total da violência do Estado (executivo, legislativo, judiciário e forças armadas). Talvez aí esteja a diferenciação do Fascismo Italiano do Nazismo, Mussolini nunca controlou as forças armadas, logo quando o filha da Pizza (não é um desaforo, se souberes a origem do nome Pizza Margherita vai entenderes a referência), e Hitler por razões históricas montou a SS que após o atentado dos oficiais contra Hitler, ele realmente assumiu o poder total.
        Vamos fazer uma pequena digressão sobre fatos históricos que podem parecer detalhes, mas como diz a expressão alemã: Der Teufel steckt im Detail. que as pessoas não ligam os pontos.
        A indústria alemã de guerra, segundo o próprio Albert Speer, o ministro do armamento alemão que substituiu Fritz Todt após sua morte, não trabalhava em três turnos para não perder a lucratividade, Speer entra no ministério e obriga que essa indústria trabalhe no seu limite superior, que levou o descontentamento da Burguesia industrial alemã (ele entra em 8 February 1942), em 18 de fevereiro de 1943, Joseph Goebbels, faz seu discurso no Sportpalastrede onde ele faz seu discurso pela Totaler Krieger (guerra total). Essas duas atitudes levaram que a produção de equipamentos militares nos anos de 1942-43 1943 1944 fosse muito maior do que os anos anteriores, mesmo sofrendo bombardeios. Veja somente em meados de 1943 que os oficiais alemães começam a traçar planos para matar Hitler, ou seja, quando o esforço de guerra começava a prejudicar a economia.
        Hitler perdura até o fim porque o exército alemão era fraco devido ao tratado de Versailles enquanto as SA e posteriormente as SS eram numerosas e fortes, já na Itália, Mussolini sempre se subordinou ao Rei.
        Só para terminar, a melhor definição de fascismo é dada por um autor brasileiro, Serrano Ferreira, onde ele define fascismo como:
        “o fascismo é o regime dos setores mais reacionários da burguesia, que se utiliza de métodos de guerra civil para destruir a democracia operária e os organismos da classe trabalhadora”é sempre irracionalista, pois enquanto movimento é incapaz de gerar um programa coerente, misturando elementos contraditórios do programa burguês e proletário, e enquanto regime é necessariamente violento, e por isso, “rejeita os valores racionalistas, iluministas e humanistas, que foram característicos do capitalismo em ascensão e dos períodos de crescimento”. Por isso, o fascismo não tem uma forma definida, mas ” assume a forma e se apropria de partes das tendências de uma sociedade em uma dada época, inclusive o ódio a setores que já são tendencialmente oprimidos em cada momento”. O único elemento comum a todos os fascismos é seu anticomunismo, antiesquerdismo e antidemocracia operária.

  5. O homem é bom (Rousseau) ou é lobo (Hobbes) ?
    Até a 2GM a maioria estava em dúvida não?
    A bipolaridade faz bem aos normais.
    Tudo é devir.
    O rio não é o mesmo e quem entra nele sempre muda. Sociedade líquida homem também…

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