Por Sergio Medeiros Rodrigues
Venham ver o povo nas ruas, venham ver…
No Supremo Tribunal Federal, no campo das vaidades pessoais, apesar de grave, o principal problema não são as atitudes grosseiras do Ministro Joaquim Barbosa, a questão central é que o referido Ministro, não pauta seus atos por nenhum critério, apenas busca sobrepor/impor sua delirante idéia de poder absoluto (a despeito das demais pessoas), e isso, até mesmo quando sua intenção é apenas midiática, ou, nos momentos em que se prende apenas a caprichos de uma retórica de bar, onde, a provocação e a ridicularização, são mais importantes que o conteúdo.
Ora, num bar, isso é possível, no máximo, após algumas altercações, e mais outras cervejas ou vinhos, todos irão curar sua ressaca em casa, sem prejuízos outros que não o de seus bolsos e fígados.
Mas, num tribunal, na Corte Constitucional de um país, numa ação penal, com toda a carga político ideológica que permeia esta demanda, onde a sede de justiça de todo um povo foi direcionada como se o tribunal fosse um novo Coliseu, e os não tão cristãos fossem jogados as feras (o estraçalhamento é inevitável).
Pois bem, eis que neste espetáculo surge um novo Nero*, ou um arremedo deste, e isto para nós, pessoas simples do povo… é algo mais que lamentável, significa que, nossa humanidade, florescerá num período mais distante na história…
Pão e circo. Que não falte o pão…
Infelizmente não haverá catarse, não nasceremos limpos após os debates irem ao fundo de nossas almas.
Porém, aos poucos, as pessoas estão compreendendo que, ao contrário do que se dizia, estas pessoas não carregavam toda a maldade do país nas costas, mesmo que se tente diuturnamente impingir essa imagem… a realidade é dura.. e logo ali cobra seu preço… recém saídos das ruas, dos protestos, das passeatas… muitas das vestais… tiveram retirados seus mantos..e o que se viu… nos deixou cheios de espanto e repulsa…. revelaram-se, desnudaram-se… e assim foram vistos … com as mãos cheias da mentira que diziam combater…
É isso.
Não busquemos, neste teatro, respostas claras… a verdade ainda esta por ser desvendada e, certamente não o será por meio destes… que se mostram a frente da mídia, porque a mídia os escolheu…eles não foram escolhidos, não ungidos,… não são homens de Deus, escolhidos (no sentido de que todas as pessoas que respeitam e tratam os outros com dignidade podem ser assim chamados)… só são escolhas do poder… para exercê-lo paras seus pares, não para democratizá-lo e dirigi-lo ao povo.
Pablo Neruda, um grande poeta chileno, que vivia a vida simples do povo e até o fim de seus dias compartilhou com eles sua ventura impar de ser humano, nos deixou um legado imenso de amor, ternura, mas principalmente de compaixão dignidade solidariedade … e de algo mais… de luta contra todo o tipo de tirania ….escreveu as seguintes palavras… frente aos fascistas de Frederico Franco na Espanha…
EXPLICO-LHES ALGUMAS COISAS
Vocês vão me perguntar: e onde estão os lírios?
E a metafísica coberta de papoulas?
E a chuva que sempre golpeava
suas palavras cobrindo-as
de frestas e pássaros?
Vou contar a vocês o que está acontecendo.
Eu morava num bairro
de Madrid, cheio de sinos,
de relógios e árvores.
Dali era possível ver
o rosto seco de Castela
como um oceano de couro.
Minha casa era chamada
a casa das flores, porque em todos os cantos
irrompiam gerânios: era
uma bela casa
com cães e crianças.
Raúl, você se lembra?
Você se lembra Rafael?
Federico, lembra
debaixo da terra,
você se lembra da minha casa com sacadas onde
a luz de junho afogava flores em sua boca?
Irmão, irmão!
Tudo
era um vozerio, sal de mercadorias,
aglomerações de pão palpitante,
mercados do meu bairro de Argüelles com sua estátua
como um tinteiro pálido entre as merluzas:
o azeite chegava às colheradas,
um profundo latejo
de pés e mãos enchia as ruas,
metros, litros, essência
aguda da vida,
peixes amontoados,
contextura de tetos com sol frio no qual
a flecha se cansa,
delirante marfim fino das batatas,
tomates em profusão até o mar.
E numa certa manhã tudo estava ardendo
e numa manhã as fogueiras
saíam da terra
devorando seres,
e desde então fogo,
pólvora desde então,
e desde então sangue.
Bandidos com aviões e com mouros,
bandidos com duquesas e anéis,
bandidos com monges negros bendizendo
vinham pelo céu para matar crianças,
e pelas ruas o sangue das crianças
corria simplesmente, como sangue de crianças.
Chacais que o próprio chacal desprezaria,
pedras que o cardo seco morderia cuspindo,
víboras que as próprias víboras odiariam!
Diante de vocês eu vi o sangue
da Espanha levantar-se
para afogá-los numa só onda
de orgulho e de facadas!
Generais
traidores:
vejam minha casa morta,
vejam a Espanha destroçada:
e de cada casa morta emerge metal ardendo
em vez de flores,
e de cada vão da Espanha
sai a própria Espanha,
e de cada criança morta sai um fuzil com olhos,
e de cada crime nascem balas
que encontrarão um dia o coração de vocês
Vocês vão me perguntar por que sua poesia
não nos fala do sonho, das folhas,
dos grandes vulcões do seu país natal?
Venham ver o sangue pelas ruas,
venham ver
o sangue pelas ruas,
venham ver o sangue
pelas ruas!
Que desta vez, a história não se repita, e que, de forma diferente, nós possamos dizer, parafraseando Neruda…
Venham ver o povo nas ruas
Venham ver…
Venham ver o povo nas ruas…
*Nero não é contemporâneo aos espetáculos do Coliseu,por isso, a licença para um novo Nero.
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