Velha questão Vol. 3: a complicada relação PT x PSOL, por Romulus

– Post originalmente publicado em 15/8/2016.

Velha questão: direita unida, esquerda estilhaçada. Vol. 3: a complicada relação PT x PSOL

Por Romulus

– A esquerda “pura”: “não fazer política” é também “fazer política”, ora.

– Nicho nanico mas certo: o conforto do pequeno, mas seguro, quartinho na casa dos pais.

– Minorias relevantes da sociedade a quem o “petismo” não apela: esquerda “pura”, anti-petistas e “centristas”.

– Perspectivas temporais diferentes: (i) a “Guerra” e (ii) as “batalhas”. Ou seja, a luta de 10 mil anos entre proprietários e despossuídos; e a luta de cada geração em particular dentro desse conflito (eterno).

– Da metáfora à realidade: PT, lesa ao Estado e fim do Estado do bem-estar.

– Exemplos concretos: diferença entre exceções e avessos. As atuações de Jean Wyllys, Paulo Pimenta, Tarso & Luciana Genro.

– Bônus (de peso): Delfim Netto, a cabeça por trás do fim do Estado social da Constituição de 88. Resisto e não usarei a expressão “gênio do mal” (bem… não usarei de novo, né?).

*   *   *

(a) Minorias relevantes no cenário político partidário fora do “petismo”: esquerda “pura”, anti-petistas e “centristas”

(i) Esquerda “pura”

Metáfora:

– De um lado, o conforto do pequeno, mas seguro, quartinho na casa dos pais, onde a mãe não exige muitas concessões do rebento querido.

– Do outro, o desafio de “crescer”, sair e ter de “comprar a casa própria”, “fazendo o que tiver de fazer” para consegui-lo. Ou, falhando, ficar pelo caminho. Sem nada.

Os dois tem vantagens e desvantagens, não?

Como muitos analistas constatam, a esquerda “pura”, por definição, renega a política “como ela é” (“suja”).

Mas notem bem: negar a “política como ela é ” também é fazer política!

[Hmmm… será aqui também fazer política “como ela é?”]

Por quê?

Ora, porque a esquerda “pura” ocupa, com esse posicionamento, o nicho político-eleitoral dos idealistas da esquerda “não pragmáticos”. Assim, toca-lhe conduzir politicamente o nicho correspondente no todo da sociedade. Ou seja, dá representação político-partidária às franjas mais à esquerda da sociedade.

Dessa forma, constitui – e mantém seguramente, longe da cobiça dos “não puros” – um feudo cativo para cada rodada eleitoral. Com esse expediente mantém – sem um grande esforço – um coeficiente eleitoral que não é grande, mas que é seguro e estável em tamanho. Tal estabilidade – e a decorrente previsibilidade – possibilitam carreiras políticas e seus planejamentos anos adiante.

– Calma, esquerda “pura” político-partidária! Não me xingue (ainda). Nada contra… é da natureza humana buscar, em alguma medida, segurança, não?

Isso, evidentemente, casado – em maior ou menor grau, como em qualquer campo político –  com apego a ideais e convicções.

Notem: esse coeficiente eleitoral, como disse, não é grande.

E é infinitamente menor que:

*

(ii) Anti-petistas

Bem sabemos, inclusive, que a esquerda “pura” dificilmente (nunca?) será majoritária. Isto é, provavelmente jamais ganhará “eleição para Presidente” enquanto se mantiver como tal. Isso porque a sociedade brasileira tem um bloco minoritário relevante – antigo e consolidado – de conservadores + reacionários.

Hoje essa banda da sociedade é facilmente identificável: trata-se do 1/3 de anti-petistas ferrenhos. Aqueles que chegam a ser hidrófobos em alguns casos. Bem… como sabemos, cada vez mais casos, não é?

*

Para completar o todo, a essas duas minorias relevantes – esquerda radical e anti-petistas – deve ser somada ainda um outro “1/3” da sociedade: o dos “centristas”:

*

(iii) “Centristas”

Escrevo a palavra “centristas” entre aspas de caso (bem) pensado. Isso porque, em geral, seus membros tendem a pertencer à parcela despolitizada da população. Parcela essa a priori aberta à sedução – seguindo considerações pragmáticas. É, portanto, objeto de disputa e conquista pelos dois polos antagônicos da política. De novo e de novo. A cada rodada eleitoral.

É o fiel da balança, que pende ora para um lado, ora para outro. E o faz muito mais pela conjuntura – aquilo que indicam “os ventos” e as “nuvens no céu” – do que propriamente por convicções político-ideológicas “centristas” (em sentido estrito). Ou seja, não têm nada a ver, por exemplo, com o ideário sintético de uma democracia cristã europeia.

A seu respeito, faço uma provocação:

 Como disse, trata-se de uma “parcela despolitizada, pragmática, aberta à disputa e conquista pelos dois polos antagônicos a cada rodada eleitoral. Fiel da balança, decide-se muito mais pela conjuntura – “ventos e nuvens” – do que propriamente por convicções políticas”.

Soa familiar?

Lógico que sim!

 São os “PMDBistas da sociedade!

[hehehe]

*   *   *

(b) A (grande) “Guerra da História”

– E mais um bônus de peso: Delfim Netto

O PT um dia já abrigou a tal esquerda “pura”. De si saíram PCO, PSTU, PSOL, etc., conforme o partido se moveu para uma posição de centro mezzo esquizofrênica:

– Ideário socialdemocrata combinado com prática econômico-liberal.

A contradição em termos dessa posição é flagrante, não?

E bem reflete o fio da navalha sobre o qual o lulismo sambou nesses 13 anos de “petismo” (qual?) na presidência.

Como na brilhante síntese de Felipe Gonzalez, ex-chefe de governo espanhol, falando sobre o governo do PSOE na Espanha, o PT “governou como se tocasse um violino: pegou e segurou com a esquerda, mas tocou com a direita!”

*

Vale discussão e a crítica sobre essa contradição, certo?

Certo.

Mas isso foi ontem.

Limito esta análise ao momento atual.

*

E hoje, fora do governo, o que é o PT (da “conciliação social” lulista)?

(Bem, o que tiver sobrevivido dele…)

Pela capilaridade do PT / CUT / Movimentos sociais alinhados, é difícil que surja, no curto e médio prazo, força política capaz de canalizar o mesmo potencial político e/ou eleitoral do PT. Isso é certo. Mesmo hoje quando, por circunstancias que todos conhecemos, esse potencial foi reduzido a uma sombra daquilo que fora.

Diante dessa (inexorável) realidade, na ação política, o campo da esquerda deve seguir – concomitantemente – dois horizontes distintos, que obedecem, cada um, a uma perspectiva temporal diferente.

(i) A primeira, a grande “Guerra da Historia“. Ou seja, a luta sem fim – sim… sem fim, meus caros! – que começou no dia em que, mais ou menos 10 mil anos atrás, um agricultor pioneiro teve a ideia de colocar uma cerquinha no pedaço de chão que arava e de dizer, depois, que era (apenas) seu.

Essa luta, como disse, é sem fim.

Ou melhor:

Terminará apenas no dia em que o animal homem, “o terceiro chimpanzé” – expressão cunhada pelo genial biólogo evolucionista e polímata Jared Diamond em livro homônimo – for extinto do planeta em um grande “Colapso” – titulo de outro livro do autor, de quem sou fã.

*

Pois bem.

Ficamos então em grande “Guerra da Historia” e “luta sem fim”.

E o que é que anima o “nosso campo” nessa grande guerra?

“Solidariedade e combate às injustiças”

Grosso modo, a luta pela:

(i) eliminação, tanto quanto possível, dos privilégios (“meritocráticos”??) na saída, de forma a não perpetuar aquilo que Delfim Netto chamou de “loteria do nascimento”. Nessa perspectiva, tornam-se capitais acesso a moradia, saúde – com boa comida, é claro – e educação de qualidade.

Isto é: saúde, educação e moradia dignas para todas as crianças – seja “do morro”, seja “do asfalto”. Se isso é um ideal distante, cumpre pautar todas as ações do presente pela busca – incessante – desse ideal;

(ii) mitigação das desigualdades “na chegada”: políticas sociais compensatórias à la Bolsa Família, mas não apenas. Ou seja: a garantia de um mínimo existencial, englobando acesso a moradia, saúde, educação (continuada ao longo da vida, por que não?), cultura, segurança, etc.

Isso porque o acesso a direitos básicos como esses não decorrem – ou não deveriam decorrer – nem do nascimento nem da trajetória individual pela vida.

Decorrem da dignidade da pessoa humana.

São direitos inerentes à condição de ser humano. Sem qualificações do ser humano em questão ou outros senões.

Ponto.

Ao que parece, não estou só nesse entendimento. Todo o planeta concorda.

Bem, pelo menos de boca…

Não está tudo isso consagrado na Declaração Universal dos Direitos Humanos, da ONU, de 1948?

Novamente: se isso é um ideal distante, cumpre pautar todas as ações do presente pela busca – incessante – desse ideal.

*

Bônus (de peso): Delfim Netto

Mencionei aí em cima Delfim Netto.

Sim… aquele que, para minha grande decepção, mostrou que a ele também faltou, em relação à sua biografia, a tal autocrítica que hoje se cobra tanto do PT. Sua adesão (de novo!) a um golpe e o embasamento intelectual que dá à chacina do incipiente Estado do bem-estar social, criado pela Constituição de 88, doem em quem, apesar de estar em campo oposto, admira seu intelecto, sua língua ferina e sua perspicácia. Três elementos que, combinados, nos renderam tantas tiradas memoráveis. Mordazes e geniais.

Inesquecível também sua trajetória na Administração Pública – malgrado a mancha autoritária que sobre ela pesa. Mancha essa, inclusive, que hoje está ainda mais escura.

Escura?

Sim: foi da lama para o piche quando um senhor – de quase 90 anos! – mostra não ter aprendido tanto quanto se supunha – e fazia-nos crer – no último meio século. Isto é, grosso modo, de 1964 para cá: o último meio século da sua vida. E também da do Brasil!

E olha que se trata de testemunha privilegiadíssima da História desse Brasil, hein?

Prefiro não reproduzir aqui trechos de incontáveis artigos seus dos últimos anos – leituras sempre prazerosas e enriquecedoras. Textos nos quais defendia que “mercado” e “democracia” funcionariam um como freio aos excessos do outro, numa dialética rumo ao progresso geral. E onde se insurgiu, diversas vezes, contra reacionários que pontificavam contra o aumento do “custo” da mão-de-obra, quando vivíamos o pleno emprego. “É inflacionário!”, queixavam-se. Delfim então os desnudava: “lutam contra o avanço da civilização!”.

Mas me permito, aqui, retorquir, Professor Delfim:

– Não é isso que o Sr. faz agora?

– Onde está aquela tal democracia (“urnas”, lembra?), que freava os excessos do mercado?

– Mudou de ideia?

– Ou melhor, voltou às antigas?

– Ou, na verdade, nunca as tinha deixado, lá no seu âmago?

Juro que não são perguntas retóricas!

Gostaria de verdade de ter respostas para essas indagações. Como já disse aqui, o drama humano me fascina. Mesmo quando me choca. Curiosidade de observador, Professor Delfim. Não de juiz.

*

Mas, deixando o drama de Delfim e decepções de lado, voltemos às duas perspectivas na ação política que proponho.

O (re?) nascimento de “um novo PT” (com esse nome ou outro), a se levantar da carcaça daquele que hoje é derrotado e, em verdade, escorraçado para fora da luta político-eleitoral-institucional, é desejável!

Diria até imprescindível para seguirmos lutando na tal grande “Guerra da História”. Caso contrário, periga de, em breve, ser imposto longo armistício, com termos muuuuuuito favoráveis ao campo adversário – o campo inaugurado pelo sujeito da cerquinha de 10 mil anos atrás.

Isso porque a degradação da representação político-eleitoral-institucional da esquerda levará a uma vitória por W.O. do outro lado.

Sim, eu sei: vitória feia.

Mas, ainda assim, vitória. E sairá derrotado, “sem luta”, o campo inaugurado por todos aqueles que, naquele fatídico dia – milênios atrás – ficaram do lado de fora da tal cerquinha.

*

Pois bem.

Coberta a grande “Guerra da História”, qual seria a outra perspectiva temporal?

*   *   *

(c) A “Batalha”: o golpe de 2016

(ou: a perspectiva da luta desta geração em particular)

Trata-se da perspectiva dos que – hoje – estão na “idade de combate” e escrevem o seu “capitulozinho” no interminável livro da guerra ancestral – a da História.

No meu esquema, há, pois, a “Guerra” e as suas “batalhas”.

Uma advertência (também a mim):

Temos de ter humildade para aceitar que a guerra nunca será vencida. Pelo menos não pelo lado que não é dono dos meios.

Para nosso horror, vemos agora – chocados – que não há sequer trincheira garantida. O avanço para frente não é inexorável. Pelo contrário: nosso exército pode, como hoje, ser forçado para trás, perdendo territórios que conquistara havia décadas.

Sim, muitos estamos chocados… e tal choque decorre de tratar-se da primeira vez que esta geração – a que cresceu da redemocratização para cá – testemunha um retrocesso. Sempre andáramos para frente ou, na pior das hipóteses, ficáramos parados no mesmo lugar.

Não mais. Hoje nos empurram bem para trás. E o objetivo é claro: seguir empurrando até nos arremessarem para dentro do abismo que conseguem enxergar ao longe. Veem esse abismo já com um sorriso discreto no rosto, que não chega a nublar a sua determinação. Fica mais adiante, no limite do campo de batalha.

*

Queixo de vidro

Passando da metáfora militar para a esportiva, nos toca debelar definitivamente esse choque, decorrente do retrocesso até então inédito, e fechar a guarda para depois partir, sem muita demora, para um contra-ataque.

Ou seja, cabe-nos mostrar que não temos “queixo de vidro”.

Sim, levamos um gancho arrasador nesse queixo.

É fato.

E ainda estamos atordoados.

Talvez com lesões importantes…

Cientes disso, temos de lutar da maneira mais esperta e eficiente possível.

Aceitemos: a força bruta está com o outro lado agora.

*

Muito bem.

Ficamos então em “Batalha de 2016” e “luta de uma geração”.

E o que é que anima o “nosso campo” nesta batalha?

Grosso modo, a luta pela mitigação das perdas de território, aumentando, ainda, tanto quanto possível, o custo da vitória para o outro lado.

Como na terrível Batalha de Verdun, na 1a Guerra Mundial, da mesma forma que os Alemães, mesmo perdendo nominalmente, temos de causar tantas baixas quanto for possível ao outro lado.

E isso inclui – nós sabemos e eles também – a disputa da narrativa histórica do golpe. A luta – no mercado de opinião – entre, de um lado, o golpe e os seus áulicos da velha mídia familiar, e, do outro, as novas plataformas de comunicação e os pensadores críticos aos quais essas plataformas dão voz.

O objetivo central da batalha é deixar o maior “território” possível – com o máximo de buffer zones (“gordura territorial” para queimar) – para a próxima geração.

Isso porque as armas “da direita” são hereditárias – e só se acumulam no passar de cada geração.

Até mesmo os braços que as empunham permanecem: ora, empresas – pessoas jurídicas – não morrem de velhice!

Já o “exército da esquerda” é quase que sazonal. Como nas estações do ano, ele nasce, cresce, floresce, frutifica e… morre.

A cada geração, tudo de novo…

Em vista disso, temos de deixar, tanto quanto possível, mais e melhores recursos para o próximo exército.

Para que possa se formar vigoroso e construir, a seu turno, as armas, as estratégias e as táticas de que disporá na luta do seu dia.

E, oxalá, consiga vencer algumas das batalhas que travarão contra “o outro lado”.

Lado que, pela hereditariedade e pela petrificação da estratificação social, está nos nossos dias mais para feudal do que propriamente capitalista.

*   *   *

(d) Da metáfora à realidade: PT, lesa ao Estado e fim do Estado do bem-estar

Da “guerra” já tratamos, ao dizer ser necessário um “novo PT para o amanhã”.

E na batalha?

– O PT “velho” (mais CUT e movimentos sociais alinhados) é “o que tem para o jantar” nesta noite escura e fria.

Ponto.

Sem perder de vista o longo prazo e a necessária autocritica para a sobrevivência de um núcleo forte de centro-esquerda – com potencial eleitoral majoritário – é preciso não perder nunca de vista que esse PT “velho”, “obeso”, “corcunda” e “caolho” – agora, além de tudo, “coxo”!* – é a arma mais eficiente de que o nosso campo dispõe para (i) aumentar o custo do golpe e (ii) mitigar ao máximo a “perda de território” que entregaremos à próxima geração.

[*Peço perdão pelas metáforas politicamente incorretas]

E que perda é essa?

(i) A inédita lesa ao patrimônio do Estado, com a alienação dos seus ativos artificialmente depreciados.

Essa ocorre, agora, em circunstancias ainda mais descaradas e ambiciosas que as da “privataria” dos anos 90.

E aqui “ambição” tem dois sentidos distintos:

– O primeiro refere-se à gigantesca escala da lesa que planejam; e

– O segundo, ao custo de “operação” dessa lesa. Ou seja, a quantidade de “graxa” requerida pelos “operadores” das máquinas para fazer as engrenagens rodarem para o “lado certo”.

– Salve o “Programa de Parceria de Investimentos” do golpe, não é?

– Salve o Ministro Moreira Franco!

(ii) o sacrifício (completo) – no altar de Mamon – do nosso incipiente Estado do bem-estar social.

Notem:

Somando os itens (i) e (ii) atende-se “ao Mercado”.

Mas há aí dois “mercados” distintos.

Como assim?

Ora, também ele – o mercado – não é um bloco monolítico.

Portanto, com o item (i) – a nova “privataria”, atende-se ao interesse das forças “produtivas” do capitalismo. Ou seja, aquelas que desenvolvem, de fato, atividade econômica.

Mas um mercado com sotaque

Até onde se vê – em virtude da concomitante implosão das empreiteiras (terá sido coincidência?) – atende-se a interesses “de mercado” exclusivamente estrangeiros – privados e/ou de Estado.

Já com o item (ii) – o sacrifício da saúde, da educação, dos investimentos públicos e da seguridade social – atende-se ao interesse das forças do capitalismo financeiro – os famosos rentistas. No caso, tanto as domésticas – FEBRABAN e as tais “10 mil famílias” credoras da dívida pública –  como as estrangeiras. Grosso modo, grandes fundos de investimento operados de Nova York ou de Londres.

É seguro afirmar que os interesses estrangeiros – que existem! – do bloco rentista são quase exclusivamente privados. Não enxergo ganho estratégico (direto) para Estado estrangeiro em agir comissivamente para permitir ganhos financeiros – diferente de ganhos econômicos – de particulares sob a sua jurisdição.

Esses particulares pagam tão pouco imposto sobre seus ganhos que nem sócio deles o Estado estrangeiro acaba sendo.

E o que querem os vorazes rentistas brasileiros e estrangeiros?

– Arrancar peito, coxa e sobrecoxa do “peru gordo” que é o orçamento brasileiro.

Sim… peito, coxa e sobrecoxa.

E o que sobra para o campo da sociedade que a esquerda defende?

– Pescoço, tripas, pele e osso.

E, ainda assim, com peso limitado a um máximo pré-estabelecido!

(a tal fixação de teto nominal para gasto público não financeiro de Henrique Meirelles / Temer)

Mesmo porque pele, osso, pescoço e tripas, diferentemente da suculenta carne e da densa gordura, não mudam de tamanho em diferentes conjunturas econômicas, não é mesmo?

Pelo menos não tanto quanto carne e gordura, que incham sem igual em tempos de “vacas gordas”.

Ou seria “peru gordo”?.

*   *   *

(e) Diferença entre exceções e avessos (do avesso): Jean Wyllys, Paulo Pimenta, Tarso & Luciana Genro

Assim como o PT não é monolítico, também não o são as demais forças de esquerda.

Nem mesmo o PSOL!

E isso já sem contar a primeira dissidência: Heloisa Helena.

Não há como comparar, por exemplo, a atuação e a postura de um Jean Wyllys – bendito Big Brother Brasil? Bendita Rede Blogo?! – com as de uma Luciana Genro.

E isso vindo lá de trás… desde as marchas de junho de 2013, passando pela exploração político-eleitoral da Lavajato, pelo posicionamento no segundo turno de 2014 e chegando, finalmente, à tramitação: (i) do impeachment, patrocinado por Eduardo Cunha; e (ii) da cassação da chapa Dilma/Temer no TSE, patrocinada – em estratégico “banho-maria” – por Gilmar Mendes.

E olha que Luciana cresceu na política. Testemunhou – na própria casa! – a frustração com os limites impostos pela – “maldita” mas inexorável – realidade político-administrativo-eleitoral.

E – coisa rara – tem um pai que conseguiu passar razoavelmente bem pela (“maldita”) realidade das urnas e da Administraçao Pública, mantendo-se como uma referência de coerência política, responsabilidade, equilíbrio e integridade.

É, né, Luciana…

Como ensina o Evangelho, “ninguém é profeta na sua própria terra”.

Se nem o messias o foi, não haveria de sê-lo o Tarso Genro, não é mesmo?

*   *   *

(d) E então?

Assim, “na Batalha de 2016”, a única esperança para o “povão” – com o peru já a caminho do abatedouro – é, necessariamente, a articulação e união de todas as forças da resistência democrática. Das mais “sujas” às mais “limpinhas”.

Isso inclui, na dimensão político-partidária, um Jean Wyllys, do PSOL, mas também um Paulo Pimenta, do PT, e um Alessandro Molon, da Rede, por exemplo.

E é justamente essa frente a tal “última trincheira da cidadania”. E não o STF, como propunha, com sinceridade, o Min. Marco Aurélio Mello meses atrás, no alvorecer do golpe.

*

Desfalque

Com pesar constato, contudo, que haverá desfalques nas fileiras de combatentes.

Na dimensão político-partidária dessa frente – desesperada! – não vejo o engajamento sincero de uma Luciana Genro – que cada hora diz uma coisa – ou de um Rui Falcão – que ainda não decidiu se é malandro ou mané.

*

No pasarán

Gosto de História.

Às vezes alguns episódios me vêm à mente…

Decidam vocês se o relato abaixo tem algo a ver com o que se discute aqui ou não.

Na Espanha, precedendo em um par de anos a vitória final de Franco, houve uma (pequena) “guerra civil” dentro da (grande) “Guerra Civil Espanhola”.

Refiro-me ao sangrento conflito – dentro do território da “República”! – entre anarquistas e comunistas. Deixou centenas de mortos, desfalcando em muito as milícias republicanas, que nunca mais contaram com os anarquistas.

E pior (1):

Plantou-se, para sempre, a desconfiança entre companheiros de trincheira.

E pior (2):

Havia ainda a famosa “Quinta Coluna” de Franco – também dentro da “República”! Que papel terá desempenhado de fato no assalto a Madri? Nunca se soube ao certo quem eram – na clandestinidade do sabotador – seus membros, certo?

*

É, “Seu” Marx… concordo com o Sr.:

– Quando não como farsa, a História se repete como tragédia mesmo.

*   *   *

Epílogo:

Os volumes anteriores desta série de 3 posts, o “Vol. 1: Por quê?” e o “Vol. 2: cláusula de barreira, permitiram trocas muito ricas com os leitores – de esquerda e também de direita. Aqui no GGN e também nas redes sociais.

– Um “diálogo”, afinal?

Seguem algumas ilustrações. Tanto de “obstáculos” como de “soluções“, passando por um grave alerta e chegando, finalmente, a uma improvável “viagem culinária”:

Alerta de quem entende (muito) do riscado

Quando você fala em “centrismo” e descreve quem dele faz parte – apolíticos, pendem para um lado ou outro segundo as circunstâncias, mas são o fiel da balança – você vai certeiramente pro PMDB. E tem razão, porque está falando de perfis partidários. Mas o problema é que a sua descrição, não em termos de partido, mas do eleitorado que vota nele, é exatamente aquela do grosso da população que, manipulada pela mídia, sequer percebe o que está acontecendo hoje com o golpe em curso. Por isso não sai à rua pra apoiar o “nosso lado” nas manifestações, mas são os que, embalados pelo moralismo anti-corrupção e a aura mediática da Lava-Jato, correm em defesa da destituição da Dilma e da extinção do PT. No limite, são os que pedem intervenção “constitucional” das FFAA ou são eleitores certos de Bolsonaro ou qualquer outro salvador da pátria estilo Berlusconi que se apresente como candidato.

*

*

*

*   *   *

Nota: a trilha sonora é um bis de um post anterior.

“O canto das três raças”, na voz de Clara Nunes. Ilustra tanto a “Guerra da História” (a atemporal “agonia [do] canto do trabalhador”), como algumas “batalhas” (o índio subjugado, o negro feito cativo e o grito – abafado – de liberdade dos inconfidentes):

Atenção à letra:

[(i) Batalhas]

Ninguém ouviu / Um soluçar de dor /No canto do Brasil

Um lamento triste / Sempre ecoou / Desde que o índio guerreiro / Foi pro cativeiro / E de lá cantou

Negro entoou / Um canto de revolta pelos ares / No Quilombo dos Palmares / Onde se refugiou

Fora a luta dos Inconfidentes / Pela quebra das correntes / Nada adiantou

[“Inconfidentes”. Da Inconfidência Mineira (apenas)? Se sim, é liberdade poética. Um movimento muito mais de tentativa frustrada de ruptura entre a elite colonial e a metropolitana do que, propriamente “quebra de correntes”. Ou seja, emancipação popular. Exemplo efetivo de luta por “quebra de correntes – e por essa razão menos presente no imaginário e na cultura brasileira – seria a Conjuração Baiana, influenciada tanto pela Revolução Francesa quanto – escândalo! – pela Revolução Haitiana]

[(ii) A grande “Guerra da História”]

E de guerra em paz / De paz em guerra / Todo o povo dessa terra / Quando pode cantar / Canta de dor

[Da minha perspectiva temporal mais para batalhas de “gerações” – e grupos – diferentes do que propriamente “guerra, paz, paz e guerra”]

E ecoa noite e dia / É ensurdecedor / Ai, mas que agonia / O canto do trabalhador

Esse canto que devia / Ser um canto de alegria / Soa apenas / Como um soluçar de dor

[Mais liberdade poética. E retórica. Todos sabemos – e os sambas cantados pela talentosa e bela mulata Clara Nunes são exemplos eternizados disso – que, malgrado toda a espoliação de que é vítima há 5 séculos, o povo brasileiro – paradoxalmente ou justamente por causa disso? – canta é alegria. “Também” ou até “principalmente”, não é mesmo?

“Ópio do povo”?

Droga que anestesia as chibatadas levadas?

Se sim, então digo:

Viva esse “ópio”!

Viva Clara Nunes e o “canto das três raças” fundadoras do Brasil! Canto depois enriquecido pelas tantas outras que chegaram à nossa terra]

*

Leia mais:

Vol. 1: Por quê?

Vol. 2: cláusula de barreira

*   *   *

(i) Acompanhe-me no Facebook:

Maya Vermelha, a Chihuahua socialista

(perfil da minha brava e fiel escudeirinha)

*

(ii) No Twitter:

@rommulus_

*

(iii) E, claro, aqui no GGN: Blog de Romulus

*

Quando perguntei, uma deputada suíça se definiu em um jantar como “uma esquerdista que sabe fazer conta”. Poucas palavras que dizem bastante coisa. Adotei para mim também.

Redação

25 Comentários

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  1. Perdi 2 minutos

    Perdi 2 minutos da minha vida com essa porcaria mal escrita. Lenga lenga pelegão sem graça, sem nexo, sem lógica. Difícil discernir algo além de maniqueísmo infantil: Dilma pode fazer o que quiser, inclusive enganar eleitores com discurso socialdemocrata e impor o neoliberalismo brutal logo depois das eleições. Os “praguimaticus” não percebem que foi exatamente a facada nas costas do eleitorado que enfraqueceu o governo Dilma, não as manifestações de 2013 (que atingiram todos os partidos). Em 2014 Dilma ainda se elegeu, inclusive com votos de muitos dos que protestaram pelo transporte coletivo de qualidade. Em 2016 Dilma foi golpeada pelos próprios aliados de direita. Eu diria “bem feito”, se isso não tivesse ajudado a aniquilar direitos trabalhistas, previdenciários e constitucionais de milhões, na prática desmantelando os programas de redução da pobreza que foram promovidos pelo próprio PT.

    Da mesma forma que o antipetismo é formado por moralistas sem moral, o neopetismo parece formado por pragmatistas sem prática, acostumados a gabinetes e com verdadeira fobia das ruas. Vide a fraqueza até para defender o mínimo de continuidade constitucional.

    Também falta aos “realistas” a capacidade de encarar a realidade e identificar os próprios erros. Pelo contrário, a regra é procurar bodes expiatórios, encontrar culpados. Afinal, se Lula é um gênio, como poderia orientado a Dilma uma estratégia que terminou em fracasso?

    1. Abraços canhotos – mesmo que vc não o aceite

      Caro,

      Devo ter um quê de masoquista, pois gosto de receber críticas, imagine vc. Mesmo que discorde delas.

      Obrigado pelo comentário!

      >> Perdi 2 minutos da minha vida…

      2 minutos??

      Litura dinâmica ou vc. parou lá em cima na metáfora?

      De qualquer forma, fico aliviado de saber que não perdeu mais tempo de vida!

      >> com essa porcaria mal escrita. Lenga lenga pelegão sem graça, sem nexo, sem lógica.

      Ainda bem que tem gosto para tudo, não é mesmo? Viva a diversidade de visões, ideias e de estilos de escrita!

      Já eu achei a sua crítica bem escrita. Parabéns.

      >> Difícil discernir algo além de maniqueísmo infantil: Dilma pode fazer o que quiser, inclusive enganar eleitores com discurso socialdemocrata e impor o neoliberalismo brutal logo depois das eleições. Os “praguimaticus” não percebem que foi exatamente a facada nas costas do eleitorado que enfraqueceu o governo Dilma

      Por afirmar isso aí, fico convencido de que não foi mesmo leitura dinâmica não. Vc. parou lá na metáfora mesmo.

      E outra: certamente é o primeiro texto meu que vc. lê. Nada poderia estar mais distante do que o que eu penso e do que eu escrevo neste blog.

      De qualquer forma bem-vindo. Pena que ficou só 2 minutos.

      Adoro conversar e dialogar com gente que pensa diferente!

      >> Eu diria “bem feito”, se isso não tivesse ajudado a aniquilar direitos trabalhistas, previdenciários e constitucionais de milhões, na prática desmantelando os programas de redução da pobreza que foram promovidos pelo próprio PT.

      BINGO!!

      Façamos o seguinte: fiquemos especulando sobre causa e efeito enquanto o lado de lá termina o serviço, certo?

      >> Afinal, se Lula é um gênio, como poderia orientado a Dilma uma estratégia que terminou em fracasso?

      Gênio também é infalível? Ou isso é só com o papa?

      Abraços canhotos – mesmo que vc não o aceite. Nem os abraços nem que eu diga que são canhotos.

  2. Afinal, porque ainda

    Afinal, porque ainda pretendemos uma democracia, objetivo secundário, mas imediato: formar maioria ampla nos legislativos federal, estadual e municipal. A conquista dos cargos majoritários, mas do que meta, é consequência.  Faltam, porém, ainda definir qual o melhor discurso de conquista do povão, bem como os canais. Esta é a grande luta.

    1. “povão”

      Exato.

      Olha o comentario que acrescentei no final, na parte dos leitores, ha pouco (o “alerta”).

      É uma luta desigual, por ser o povao despolitizado e mais suscetivel à manipulaçao da velha midia familiar.

      Tenho fe nas novas plataformas de comunicaçao.

      Mas temos que ser mais efetivos nas disputas de narrativas.

      A fraqueza de uma açao articulada e ousada de comunicaçao foi uma das grandes falhas do governo Dilma.

      O resultado esta ai.

  3. Muito bom

    Gosto sempre de ler o Romulus, pois deixo de ser o único doido que faz análises fora da ótica moral “imanente” da esquerda “pura” e institucional (acuma?). 

    Tem gente “boa” te lendo, e mesmo que aproveitem as ideias sem te dar o crédito, (penso em  Gramsci no Avanti!) essa abnegação é a marca do verdadeiro intelectual.

    Podem aproveitar o produto, mas a fábrica de ideias e a capacidade criativa e inovadora é o que fazem de você um bom autor, meio desorganizado, mas não vou pedir ao halterofilista que faça regime para ficar bonitinho. 

    1. Valeu!

      Valeu pelo feedback.

      *

      >> “Gente boa” me lendo e usando as minhas ideias?

      Ótimo!

      Sem dar crédito?

      Faz diferença? Para mim nenhuma.

      E outra… dariam crédito a quem? Quem quer crédito usa pseudônimo para escrever?

      Mas poxa…

      Fala pra essa “gente boa” me adicionar nas redes sociais! Adoraria conversar com elas também!

      *

      Foi um desafio escrever esta série.

      Os 3 eram um post só – gigante – escrito na semana passada.

      Achei melhor dividir em 3 por razões óbvias.

      Talvez daí a tal “desorganização”.

      Certamente em termos de estilo – até pela pressa – esse está longe de ser um dos favoritos do “criador”.

      O que importava para mim era a mensagem. E que ela saísse logo.

      Em contrapartida, coloco aqui um dos meus posts de que gosto mais.

      E que tem tudo a ver!

      Só não o reproduzi como “anexo” à série porque ela já estava enorme.

      Se o Brasil atual permitisse, estaria escrevendo – com muito gosto – ficção.

      Penso, de repente, em republicar amanhã como um verdadeiro epílogo.

      Por enquanto vou coloca-lo aqui como comentário a este.

  4. Quem poderá nos ajudar?

    Fiz um comentáro ao posta nterior e terminei com a frase da música de Cazuza: A burguesia fede, a burguesia quer ficar rica. a burguesia ( classe média) é o termometro. Sempre foi e sempre , pelo menos aqui em Pindorama, tendeu a direita, já que sempre preconceituosa e egoista. O exército que precisamos , depende dela. Mas sabemos que nunca desejarão sentir o cheiro da plebe , como não a desejam nos shoppings, nas casas da moda, ou no aeroportos. Estes nichos os separam dos mal acabados e garantem uma falsa superioridade sobre eles. Sendo assim, só nos restará o Chapolim Colorado.

  5. Diferentes e interessantes as análise do Romulus.

    Tem sido muito interessantes as análises do Romulus, publicadas aqui no GGN, sobretudo porque ele tem mostrado com clareza, simplicidade, bom humor, conhecimento de história, política e socilogia, que o puritanismo e o sectarismo de alas que fazem da Esquerda não uma, mas várias esquerdas, termina por enfraquecer esse espectro político – representante das parcelas secularmente exploradas e alijadas das riquezas e benefícios produzidos pela força de trabalho – beneficiando a direita olgárquica e plutocrática, detentora do capital e dos meios de produção.

  6. “Parábola multi-sincrética de duas tribos em guerra, porRomulus”

    Parábola multi-sincrética de duas tribos em guerra, por Romulus          

     

    O Jornal de todos Brasis

    Parábola multi-sincrética de duas tribos em guerra, por RomulusAddThis Sharing Buttons48ROMULUS          TER, 12/04/2016 – 09:18

    Por Romulus

    Ao ler o “Xadrez” de hoje de Luis Nassif, lembrei-me de algo que aconteceu comigo algum tempo atrás. Ainda não consegui determinar exatamente a relação entre as duas coisas. Talvez os leitores do blog possam me ajudar. Se estiverem dispostos e sentindo-se generosos para comigo, após lerem o post “O xadrez da segunda rodada do impeachment”, por favor passem ao relato que segue.

    *********

    Um índio velho, “aculturado” desde que veio para a “civilização” na meia idade, decidiu permitir-se um capricho na senioridade: pegar um avião para vir conhecer, in loco, o chocolate suíço. Ouvira dizer que o cacau a 100% dos Alpes era o que mais lembrava a bebida sagrada dos primos Astecas de outrora.

    Sabia que haveria de ter nessa terra estranha alguém que falasse a sua língua. Resolveu procura-lo então nas redes sociais e em blogs (eta, índio antenado!). O destino fez com que de todos os muitos lusófonos vivendo nestas paragens, ele viesse a encontrar não outro que a mim, imaginem vocês. Ficamos amigos e tivemos longas conversas depois que ele aqui chegou em sua busca pelo chocolate.

    Vendo minha angústia atual, acendeu o inseparável cachimbo e contou-me uma parábola, uma dessas histórias cheias de simbologias e significados ocultos. Histórias das quais extraímos metáforas e extrapolamos algumas conclusões. Talvez para a vida. Ou quem sabe não. Como quem me contou é índio sim mas também brasileiro – e aculturado – a parábola está banhada no sincretismo, esse dom do nosso povo de sintetizar a tese e a antítese e criar algo novo, que não é nem uma coisa nem outra. Não estranhem: por sincrética, a parábola tem floresta, índio, cruzada santa, cemitério indígena amaldiçoado, almas penadas, exorcismos neopentecostais de TV e outros encontros fortuitos que só se dão no Brasil.

    Ainda interessados? Então vamos à história que me contou o sábio índio, vovô Jararaca-sentada:

    Duas tribos lutavam com unhas e dentes por uma mesma floresta. Os dois povos se odiavam desde tempos imemoriais. Mas, temendo a mútua aniquilação, os respectivos caciques e xamãs encontravam-se secretamente na cachoeira, onde o barulho das águas abafava as conversas que não deviam dali escapar. Formulavam versões sucessivas de um pacto de sangue que finalmente pudesse ser aceito pelos dois caciques.

    A guerra era “santa”. Uma cruzada do “bem contra o mal”. Mas poderia trazer também a aniquilação total. Com o pacto de sangue que propunham, a guerra poderia ser evitada. Guerra de extermínio, bem entendido, mas um extermínio em uma gloriosa causa. Os mártires haveriam de ir todos para o céu, cria a maioria.

    A partir do tal pacto, as perdas humanas das tribos dali por diante seriam limitadas a pequenas rusgas na mata fechada. Somente quando houvesse encontros fortuitos entre os respectivos grupos de caçadores. Mas isso era algo do jogo desde que Tupã Krishina criara o mundo.

    A (re-)”pactuação” entre caciques e xamãs não seria vitória nem derrota total. Era meia vitória / meia derrota – para ambos os lados. Ninguém sairia com o que queria. Ao contrário, todos sairiam meio vencedores e meio perdedores. Mas sairiam. Ponto.

    O prêmio por lutar exclusivamente pela “vitória total” – causa justa e permitida pelas regras e costumes das tribos – poderia (disse-me o índio: “poderia”… no condicional…) ser a vitória naquela “cruzada”… mas vitória de Pirro. Quem viesse a ser a reencarnação amazônica desse antigo general continuaria cacique, caso fosse o único que continuasse de pé ao final. Isto é: depois de lavar o pecado da terra com o sangue dos índios justos naquela luta infernal. Esse seria o sacrifício supremo a Tupã Krishina, que criara seu povo num porre de cauim.

    – Sim, continuaria cacique. Mas agora de um silencioso cemitério – e cemitério indígena, vejam bem.

    Nota: Para que eu compreendesse melhor as implicações de morar em um “antigo cemitério indígena”, o velho índio recomendou que assistisse ao filme “Poltergeist” no Netflix (eta, índio antenado! (2))

    Voltando à história, havia mais um detalhe: o “cacicado” tinha tempo marcado para terminar: dali a dois anos e meio. Em tal data o próprio Tupã Krishina ameaçava voltar, desgostoso com o conflito que se arrastava e não saia do impasse.

    Em tom solene o meu amigo índio proclamou: “aos homens não é dado conhecer o que Tupã Krishina fará”. Dessa forma, não havia xamã que pudesse afirmar com tanta antecedência o que o severo deus faria dali a dois anos e meio.

    Para dificultar ainda mais a decisão, havia riscos mesmo na vitória total na tal guerra santa. Os xamãs dos dois lados mandavam avisar que depois da guerra, independentemente de qual cacique fosse o último a ficar de pé, as almas penadas daqueles que caíssem ao longo dos dias de batalha voraz voltariam para atormentar o cemitério.

    O cacique tinha grandes planos para o local. Sonhava vê-lo coberto de verde novamente. Mas a assombração das almas penadas não permitiria que um vasto pomar, sonhado pelo cacique, crescesse no local. Em vingança, essas almas malditas fariam tudo gorar e secar… todas as mudinhas de árvore.

    Os caciques sabiam por relatos da oralidade que a oferta de frutos tinha o condão de pacificar muitas almas em tribos conflagradas. Dos dois lados. De forma que os índios a quem não faltassem frutas costumavam voltar ao seu juízo habitual. Não se esperava desses índios que apelassem para alternativas amalucadas diante do desespero da ausência de frutos.

    Os caciques imaginavam que, comendo apenas milho velho naqueles anos até o fim do cacicado, não havia pajelança ou tele-exorcismo neopentecostal capaz de impedir as almas penadas de voltarem com tudo, incorporarem nos índios sobreviventes e exilarem o cacique e sua família por 20 anos no mínimo. O tempo de uma geração.

    Assaltavam o cacique grandes dúvidas: o que seria melhor para ele? E para sua família? E para toda a tribo? O cacique teria de escolher entre: (1) a “cruzada”, justíssima e moralíssima, ou (2) aquele pacto que faria até sua mãe cuspir em seu rosto quando voltasse com a “boa” nova. Escolheria entre a bendita “vitória total”, de Pirro, ou uma meia vitória / meia derrota, desde logo alcunhada de “A Grande Covardia” ou “A Vergonha”.

    Não pensem que a decisão do cacique era fácil. Muito pelo contrário. Anos e anos de imbróglio já se somavam, com perda gradual de sangue de lado a lado.

    Antes de decidir, ele procurou filósofos na “civilização” para aconselhar-se. Ao ouvir o relato do cacique, vieram eles com nomes estranhos para encaixar nas opções, mas cujos significados o cacique estranhamente compreendia. Enunciava um dos filósofos: “a Política, goste-se ou não, é terreno para considerações alheias à Lei e à moral – com limites, bem entendido. É para os fortes de estômago e de fígado leve, com pele grossa e memória fraca, que facilmente esquecem estocadas dos que até ontem eram tidos como inimigos”.

    O cacique compreendeu, mas disse que seria difícil explicar isso aos seus na tribo. O filósofo ofereceu então uma tradução metafórica para aquela tal de política: “é a arte de intuir – olhando tudo em volta – quando se está cacifado para meter o dedo no olho do adversário e ganhar terreno e quando se está cacifado apenas para levar dedada no próprio olho e recolher-se ao seu canto. E em silêncio. Inclusive momentos há em que não se furam os olhos de ninguém, porque ambos concordam em amarrar as próprias mãos e a ficar parados no mesmo lugar.

    E, de repente, sem me contar o final daquele conflito, o índio partiu para os finalmentes. Arrematou ele o relato com uma “moral” da história: “quem tem dificuldade de aceitar essa realidade, que não se aventure nessa tal política. Que não peça para ser cacique. Preserve a liberdade de se limitar a jogar o jogo de acordo com o que os seus filósofos chamam de moral e Lei”.

    Ao ouvir o fim do relato do velho Jararaca-sentada, já com os lábios e a língua enegrecidos pelo cacau amargo a 100%, cheguei a uma conclusão. Disse-lhe: “olha, ‘seu’ Jararaca-sentada, o chocolate fica por minha conta. Foi mais do que pago por esse seu relato tão cheio de peso. Não consigo nem sorrir nem chorar ao ouvi-lo. Mas ele me traz uma conclusão: essa tal de política não é mesmo para mim. Odeio injustiças. Não consigo vê-las e aceitá-las calado. Para mim a escolha sempre seria fazer o que ‘é certo’, não o que é ‘necessário’. Aliás, ‘seu’ Jararaca-sentada, concluo nossa conversa dizendo que a sua narrativa me fez lembrar do nosso país natal no momento atual. Não sei por que, mas enquanto o Sr. falava eu sonhava acordado e via a floresta como o Brasil. Que loucura, não? Deve ter sido esse vinho branco de Valais que pedimos para acompanhar o chocolate”.

     

    Fim?

    1. Chocolate ?????

         Meu filho, com certeza a indigestão, nem comento sobre a falta de paladar e educação, seria a causa deste racha, aliás impossivel de ser corrigido, pois combinar na mesma frase um “Fendant du Valais”, mesmo com “muito amor no coração”, com qualquer tipo de chocolate, nem um com framboesas, seria uma opção válida.

          O gauche revoltado da UFRJ, um proficuo futuro condutor das “massas”, que deleita seu exiguo publico nos bares da Lapa, depois vai de Uber para a Vieira Souto ou para a Rainha Elizabeth ( propos ao Freixo alterar o nome da rua para Rua Cheguevara , ou Alameda do Tche ), trouxe para a reunião o seu ‘Du Valais” , mais uma embalagem de 6 escargots “au beurre”, mas o petista – veio lá de Cascadura pela Central – aparece com um chocolate Lacta e um galeto.

            Nunca vão se entender, a não ser que se dirijam, sem preconceitos a um sambão de um amigo meu, lá no Largo do Bicão, perto de Braz de Pina, região da Penha, e todos, até o Zé Maria (PSTU ) aceitem que para a esquerda, é melhor todos encararem um tremoço, com angú do Gomes, acompanhado de cerveja e umas caipirinhas ( sem Seleta que é coisa de burguês, na “51” mesmo ), todos “remando” juntos.

      1. Pois é… e é um “mistério” o

        Pois é… e é um “mistério” o Freixo perder de 80% a 20% justamente na Penha que vc menciona.

        E eles dizem que nao podem ser acusados de desprezar a regiao porque agora, nos 15 dias de segundo turno, “foram lá”.

        Ah, bom!

        *

        Sobre a “hamonização”, a culpa é minha: em podendo sempre escolho vinho branco.

        Além do que, os próprios suíços me dizem que sóo branco é digno de nota do lado de cá do Maciço do Jura.

        Não se pode ter tudo, não é?

        Bordeaux…

        Bons tintos:

        *

        Mas que quem mora lá, no chamado “corredor da pobreza”, não tem grana pra comprar:

        *

        Quem sabe agora, com o atual Prefeito de Bordeaux como favorito na corrida presidencial, a coisa não melhore por aquelas bandas…

        Bem… talvez não…

        Ele é da direita e a proposta dele para a reforma tributária é diminuir o IR das empresas e aumentar o TVA, o imposto sobre valor agregado (o nosso “IVA” hipotético, hoje ICMS/IPI).

        *

        P.S.: Impressionado com o seu conhecimento do meu Rio! Como se diz por lá: caraca!

  7. Romulus, enquanto você

    Romulus, enquanto você mantiver esse entusiasmo didático não nos deixe; a maneira de apresentar seus posts me dão a impressão de uma conversarada em uma sala com um montão de gente falando ao mesmo tempo e, paulatinamente, as pessoas vão parando de falar e começam a ouvi-lo com atenção, surgindo ali e aqui uns belos arremates e complementos. A sua existência é boa!

    1. “Texto maldito” – direto pro index dos mts Vaticanos da esquerda

      Obrigado, meu caro.

      Em geral levo porrada nos comentários (e nas “estrelinhas”) apenas da direita rasteira.

      A direita sofisticada – aqui representada, por exemplo, por André Araujo e junior50 – vem para o debate e (pelo menos esses dois) sempre trazem perspectivas interessantes e contribuições de valor para um pensamento crítico. Mesmo – principalmente? – de esquerda.

      Minha formação — em casa, com pais politizados e opostos políticos + escola publica de qualidade (federal) e humanista + faculdade publica de excelência + a vida — me fez apreciar a perspectiva crítica e tentar passar longe de maniqueísmos.

      Assim, nesta serie de 3 posts sobre a divisão da esquerda pisei no calo de muita gente. De esquerdistas radicais e “puros” e de petistas autistas incapazes de fazerem uma auto-critica – nem hoje, com o garrote que a direita conseguiu colocar no seu pescoço, e para o qual contribuíram sim.

      Resultado?

      Estou levando porrada nos comentários. E nas “estrelinhas”. Mas não apenas da direita rasa – minha “fã” cativa. Agora também de “petistas autistas” e de psolistas da torre de marfim.

      Mais interessante?

      Um monte de gente me adicionando no Facebook (a partir do link no artigo) e tantos outros comentando o texto em >>grupos secretos<< nas redes sociais.

      Mas note bem:

      Poucos compartilhamentos para os padrões do blog.

      Por quê?

      Suponho que a serie de 3 posts possa ter “informação maldita”, “proibida”, a que “pega mal compartilhar”.

      Nada parecido, por exemplo, com o meu post sobre a abertura da Olimpíada, em que, com a ajuda da TV suíça, denudei a covardia de Temer, temoroso (aliteração é destino?) das vaias.

      Com aquele post o público foi à loucura em júbilo: quase 15 mil compartilhamentos só no Facebook.

      “Unanimidade!”

      ¬¬

      Já neste, critico…

      Nem 100 compartilhamentos ainda.

      Mas te conto um “segredo”:

      Que tem gente lendo, tem. 😉

      Rs

  8. A unidade possivel e a impossivel.

    Me sinto esclarecido em várias dúvidas e objeções que coloquei no primeiro post da série. O que ficou esclarecido para mim,  é que as ideias de esquerda tal como você as vê são as ideias da falecida social democracia européia dos anos 1970-1980(socia democracia 2 digamos). Falecida porque fracassou retumbantemente cedendo ao neliberalismo, a mesma história repetida aqui com o PT segundo sua narrativa a qual tendo a concordar. Mas discordo talvez dos motivos disso, pois acho que é totalmente coerente a social democracia 2 ceder ao neoliberalismo, parcial ou totalmente, dependendo da ocasião.

    Ideias social democratas com práticas neoliberias é algo coerente porque o ponto de partida de ambos é o mesmo: a propriedade privada dos meios de produção é insuperável porque está na ‘natureza humana’. A social democracia tal como existe hoje só se diferencia da direita neoliberal por sua história, renunciou ao objetivo do ‘socialismo’. Compartilha com a direita neoliberal a premissa de que a ‘grande batalha da História’ já está acabada, com o discurso do ‘fim da história’ propalado pelos Think Thanks liberais na década de 1990. Talvez só se diferencie nisso por um aspecto subjetivo: a direita vê o fim da grande batalha da história como seu triunfo, a social democracia o ve como um lamento trágico: “Não há alternativa” dizia a neoliberal Margareth Tatcher…

    Se a propriedade privada dos meios de produção e consequentemente o mercado é a única forma de organização da economia e da vida posto que é algo ‘natural’, seus efeitos perversos só podem ser mitigados pelo Estado da mesma forma que ele faz com os efeitos de um furacão ou de um terremoto. Dai que os objetivos – ‘igualdade de oportunidades’ e ‘mitigar diferenças de resultados’ possam ser defendidos por liberais como Sen, Rawls ou até por um Milton Friedman. Para alguns são necessários politicas, para outros a igualdade do direito a propriedade privada é o suficiente para ‘igualdade de oportunidades’. A diferença aqui é só de como como gerar igualdade de oportunidades ou mitigar diferenças de resultados, mas todos dentro da premissa de que a propriedade privada dos meios de produção e o mercado são instituições ‘naturais’.

    O ideal da Esquerda me parece,é uma transformação radical da sociedade. Radical porque vai a raiz do problema – a perspectiva temporal longa, a grande batalha da História como voce chamou. Parte de que ‘aquilo que o ser humano faz ele pode mudar’, se existe uma natureza humana é que ela é historica – o homem muda inclusive a natureza que ele não criou – e portanto não há batalha sobre a organização da sociedade que esteja perdida ou ganha para sempre. Me parece que o que caracteriza o objeitvo da esquerda é a revolução, no sentido amplo de transformação radical da sociedade. A esquerda que não é hibridada  – ou no vulgar, ‘cruzada’ – com a direita discorda em como alcançar essa transformação radical da sociedade. Se por uma ruptura completa, se por uma mundaça gradual – o que propunha a social democracia original que tinha como objetivo o socialsmo (social democracia1) -ou se por uma mistura dos dois.

    Dai que a esquerda pode apoiar determinadas politicas ‘social democratas’ (ou reformistas) – posição a qual eu tendo a concordar, embora ache cada vez mais dificil delas serem implementadas e terem eficácia – , mas vendo-as como meios para continuar a grande batalha da História,,mas não como fins em si mesmo, sem perder o objetivo. Só nesse sentido é possivel uma aliança meramente tática da esquerda  – ou seja aquela que não compartilha ideias com a direita e por isso é pura no sentido literal da palavra e não no ‘moralista’ – com a social democracia  – a ‘esquerda’ hibridada com a direita. Com essa esquerda hibridada com a direita não há unidade possivel além disso, pois ela está do outro lado da ‘grande batalha da Historia’.

    1. Homem: do chimpanzé ao exterminador do futuro

      Muitas coisas para comentar.

      Muito obrigado pelo excelente – e longo sim! – comentário.

      Tem gente que tem alergia a texto grande – vira e mexe apanho pelo tamanho dos posts.

      Eu não tenho!

      *

      Alguns pontos:

      >> Dai que os objetivos – ‘igualdade de oportunidades’ e ‘mitigar diferenças de resultados’ possam ser defendidos por liberais como Sen, Rawls ou até por um Milton Friedman.

      Quando vc coloca Sen e Rawls como “liberais”, é preciso esclarecer para os demais que não os tenham lido: são ideólogos do liberalismo político. Não necessariamente do liberalismo econômico. Aliás, parte das proposições de ambos são totalmente incompatíveis com o laissez-faire.

      Sobre Friedman, discordo. O que ele defende é uma “renda mínima universal”.

      Isso seria maravilhoso!!

      E, aliás, era bom que aqueles que acham (kkkkk) que defendem os ideais de Friedman soubessem que, “no fundo”, em escritos “esquecidos”, ele tinha ideias como essa. Ideias que – Oh, Deus! – poderiam ser classificadas como “vemelhas”.

      Imagine!!

      Mas…

      Uma renda mínima não elimina privilégios da loteria do nascimento. Pode, isto sim – caso seja elevada o suficiente – garantir a tal mitigação das diferenças na chegada.

      Dessa forma, para mim a renda mínima friedmaniana não basta.

      A “Guerra” continuaria – embora muito mais civilizada.

      Ainda haveria proprietários (hereditários) e despossuídos (hereditários).

      Em sua defesa:

      Digamos que a “Guerra”, de suja, passaria a ser disciplinada por “Convenções de Genebra”.

      Mais civilizada, como disse.

      *

      “Naturalidade do mercado e da propriedade”

      Muito pano para manga.

      E antropólogos – há alguns aqui – tem muito mais competência para comentar do que eu.

      Mas…

      Um amigo ai em cima contou que também é fã do Jared Diamond, assim como eu.

      Pois bem.

      No seu livro de estreia, Jared nos chama de “o terceiro chimpanzé” (livro homônimo).

      Quais são os outros dois?

      os chimpanzés propriamente ditos; eos bonobos – que por muito tempo foram – erroneamente – considerados apenas uma subespécie.

      As duas espécies são completamente diferentes e tem vida social totalmente distinta.

      Chimpanzés são violentos, territoriais, competitivos e xenófobos. Ao ponto de prepararem emboscadas para matar membros de clãs rivais e roubar suas “mulheres”, cometendo inclusive esganaduras como meio de assassinato e “estupros públicos” para fins “pedagógicos”

      *.

      Soa familiar?

      *

      Já os bonobos…

      Ah, os bonobos…

      Resolvem todos os conflitos e tensões sociais com SEXO! Muito sexo!

      Os bichos passam o dia inteiro trepando! Numa promiscuidade generalizada!

      Homem x mulher

      Mulher x mulher

      Homem x homem

      Velho x jovem

      Já assisti documentários, inclusive, em que um bonobo macho começa a se engraçar para cima da apresentadora (humana)!

      Antes que ela ficasse convencida, pouco depois ele começou a dar em cima do cameraman (homem) também.

      Ou seja, são “devassos”!

      Totalmente hippies: só fazem amor (literalmente) e não a guerra (nem sabem o que é isso).

      *

      E por que essa digressão?

      Bem, tenho de confessar que o “terceiro chimpanzé” me parece, para o bem e para o mal, muito mais próximo do Chimpanzé stricto senso do que do Bonobo.

      E daí?

      Ora, quem sabe ao certo o que é “natural” e o que não é no “bicho homem”?

      Recomendo fortemente que todos leiam o(s) livro(s) do Jared – que incluem até um premio Pulitzer.

      Mudam paradigmas de pensamento.

      *

      Mas o seu post me leva para uma preocupação atual da minha mente, que vc não chega exatamente a abordar diretamente, mas tangencia:

      Não acredito na fraude do “fim da história” proposto por Fukuyama tampouco.

      Contudo, parece-me certo que nos aproximamos sim do fim de um dos “tomos” da coleção “História da Humanidade”.

      E qual o capítulo final desse tomo?

      O momento em que a tecnologia tornará – e isso é inexorável – o trabalho físico (e em parte intelectual) humano irrelevante. Ou, ao menos, diminuirá muito a sua importância, a ponto de se tornar marginal para a geração de riqueza.

      Dessa forma, não se precisará mais de “alugar o trabalho da mão de obra” humana.

      O capital será, finalmente, auto-suficiente.

      Prometeu quebrará as últimas correntes.

      Mas só “um” Prometeu sozinho…

      *

      E aí?

      Bem, excluindo o cenário “Exterminador do Futuro”, em que as maquinas se rebelam e nos exterminam,* sobram duas opções:

      Ou a coletividade “se revolta” e se apropria – por meio do Estado – desse capital autônomo e distribui a riqueza; ouViveremos em um mundo “privatizado”, com ricos “declarando independência” dos seus territórios murados e todos os despossuídos rastejando do lado de fora. Para continuar na ficção científica, algo parecido com o cenário do filme “Elysium”, com Jodie Foster, Matt Damon e os brasileiros Alice Braga e Wagner Moura. Trailer aqui.

      Ou uma coisa ou outra.

      Porque crer, ainda, na civilidade e generosidade dos atuais donos do capital é impossível.

      No dia em que eles conseguirem, finalmente, “declarar independência” dos Estados, será o “juízo final”.

      E desse julgamento supremo saem, necessariamente:

      –  ou os “Campos Elísios” (um “Elysium” sim, mas para todos);

      – ou um inferno de Dante para o 99% da população mundial fora do “Elysium”.

      O que pensa disso?

      Eu, de mim, penso que do final deste século o “juízo final” não passa.

      E o que virá então?

      *O cenário “Exterminador do Futuro” não é apenas tema de filme blockbuster. Gente bem “esperta”, como o físico Stephen Hawking, acredita realmente na sua possibilidade. Ou, até mesmo, probabilidade. E, por isso, tem sérias restrições ao curso dado a pesquisas sobre inteligência artificial.

       

      1. Vamos por partes:
        1) A

        Vamos por partes:

        1) A relação liberalismo politico e economico é muito complicada, daria varios posts para discutir isso. Mas hoje o ‘liberalismo economico’ é erroneamente identificado com a retórica que ve como unica funçao do Estado a policial.  Erroneamente porque isso é pura retórica, todo liberal com senso minimante prático, admite e advoga algumas formas de intervençao do Estado. O liberalismo economico tem como núcleo a ideia de que o livre mercado e a propriedade privada são essenciais para o bem comum e o crescimento da riqueza, são insubstituiveis. O mercado pode ser corrigido ou completado pela ação estatal se reconhecem falhas de mercado, isso não é negar nem o liberalismo e muito menos o capitalismo. Essa premisa é compartilhada por Rawls e por Sen, que aliás parte do liberalismo economico de Adam Smith – e não de outras correntes do liberalismo economico, que e tão diversificado nos detalhes quanto as teorias socialistas. Se tem uma coisa que eu concordo com os austriacos é que não há meio termo entre liberalismo e socialismo, só estou do lado diferente deles.

        2) Posso argumentar pelo campo da filosofia: tomar o comportamento de animais, mesmo próximos na escala evolutiva, para explicar a natureza humana é uma falha lógica, é igualar coisas diferentes. O que torna a nossa natureza humana é o que nos diferencia de todos os outros animais e não que nos iguala, senão seria natureza ‘simea’. Não li o Jared, mas o titulo do livro fala por si. Sempre precisaremos nos reproduzir biologicamente, isso é  a parte ‘natureza’ na natureza humana. Mas nos reproduzimos biologicamente de formas criativas, variadas, inovadoras – históricas- e nunca de uma forma fixa. Isso não nos torna nem bonomos nem chimpazés, nem anjos, só humanos. E ai entra o mercado – é uma forma de nos reproduzirmos biologicamente, uma forma de organização economica para produzir o que necessitamos para sobrevivencia fisica e social. e como todas as outras formas de reprodução humana é histórica, suas caracteristicas variam, tem um começo e pode ter um fim como tiveram as organizações tribais, os estados tributários, a escravidão e a servidão.

        4) Concordo no ponto que voce tocou: o trabalho assalariado está no fim. Concordo ai sim que estamos caminhando para uma encruzilhada social. É não há capital autosuficente, sem trabalho assalariado,  a encruzilhada é o que vem depois da sociedade capitalista. Concodo que as alternativas ou são o socialismo ou algo muito parecido com o nazi-fascismo em escala talvez maior, com outras formas de apropriação de riqueza que não a capitalista, mas nem por isso melhor do ela. Mas o fim do trabalho assalariado pode ser uma grande libertação, não o fim mas o começo da historia. O fim daquela guerra secular. Acedito que a humanidade nunca perde o que conquistou, só modifica, pode passar por tempos caóticos –  acho que já estamos em um – mas no final sempre caminha para frente.

        1. Bobobo faz amor. Chimpanze, guerra. E nós? Quem sabe?

          Caro,

          Não peguei o comportamento de animais para explicar o humano. Apenas quis mostrar que animais, por seleção natural + seleção sexual, desenvolvem pulsões “naturais”… “instintos”, digamos assim. A isso se soma o que aprendem com as gerações anteriores (“proto-cultura”?).

          Como, por exemplo, usar “esganadura” como método de assassinato entre Chimpanzés. Uma “descoberta” que depois foi “ensinada” a outros.

          O homem é sim um animal e – se vc olhar a taxonomia sem o especismo humano – não terá como negar que somos o tal “terceiro chimpanzé”.

          “O bonobo faz o amor, o chimpanzé faz a guerra”.

          Quais as nossas “pulsões naturais”?

          O que é reflexo do caráter “natural”, herdado, dos indivíduos da espécie humana, selecionado naturalmente + sexualmente?

          E, por outro lado, o que foi (“apenas”) aprendido “dos pais”, que por sua vez aprenderam “empiricamente” (e.g., esganadura nos Chimpanzés)?

          Ou seja, o que é parte da nossa natureza por seleção natural + sexual e o que é “apenas” cultural?

          Pergunte aos antropólogos se há resposta. E, se houver, se é única.

          Meu ponto era: é complicado fazer afirmação sobre o que é ou não “natural” no homem.

          Pergunta fundamental para o nosso debate: é natural ao homem “dividir” ou “competir”?

          “Socialismo” ou “mercado”?

          Argumentar com base no “comunismo primitivo” de caçadores-coletores e povos semi-nômades com agricultura incipiente não vale!

          Vc . não tem como demonstrar que, diante dos meios ali disponíveis, aquela não foi a estrutura social que teve mais êxito e foi “selecionada”. E, depois, ensinada e passada adiante (como a esganadura nos Chimpanzés).

          Instinto de competir ou não, minha opinião é:

          Dane-se “pulsão natural” e/ou “cultura aprendida” – o processo civilizatório impõe (ou deveria impor) uma sociedade justa.

          Mas reconheço que a minha posição não deixa de ser um tanto arbitrária, resultando das minhas convicções morais, éticas, políticas…

          Até onde vejo, todas as argumentações sobre “como a sociedade deve ser” o são.

          O meu problema com a sua argumentação é, para negar o “mercado”, pretender que o socialismo é “natural”.

          Compreende?

          Para mim, nem uma coisa nem outra.

          Com a palavra os antropólogos.

  9. Curti.Sou viciado em Jared

    Curti.

    Sou viciado em Jared Diamond, creio que a elite mundial (e nisso a brasileira é campeã) segue o caminho apontado em vários exemplos por ele em “Colapso” de levar a sociedade inteira a auto aniquilação. O que antes ficava restrito a ambientes isolados, hoje está mundialmente interligado, o que me dá uma perspectiva bem sombria pra humanidade (sou pessimista).

    Que o colapso generalizado virá para a humanidade eu não tenho muita dúvida. Penso que veremos (pelo menos) seu início muito em breve (daqui uns 15, 20 anos). O que você acha?

    Abs.

    P.S.: acho o sistema de comentários desse site bem ruim.

    1. Segredo

      Promete que nao conta pra ninguem?

      Tambem sou bem pessimista quanto ao inexoravel colapso.

      Eu tento fazer a minha parte: vegetariano. Emito 1/3 de gases de efeito estufa dos onivoros. Reciclo meu lixo. E luto por uma sociedade justa.

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