A dificuldade de medir a produtividade da mão de obra, por Delfim Netto

Da Folha

Produtividade

Antonio Delfim Netto

Em 1947, aprovado em concurso público, trabalhei no Departamento de Estradas de Rodagens (DER). Tive a sorte de ser alocado à Secção de Controle de Custos, na oficina central que controlava e providenciava a reparação de milhares de tratores, motoniveladoras, caminhões etc. No tempo em que fiquei no DER, cursava economia na FEA/USP.

Buscar o “máximo de produtividade” era o objetivo do engenheiro-chefe da oficina. Mas como medir a “produtividade” para, depois, tentar “maximizá-la”? A atividade era sazonal (as máquinas vinham para reparação na época chuvosa). Parecia intuitivo medir a produtividade pelo tempo necessário para uma “revisão que a devolvesse ao campo em estado capaz de suportar mais um período de trabalho intenso”.

A dificuldade de medida era imensa pela diversidade de equipamentos, sem falar de problemas criados pela “situação geral da administração”: absenteísmo, nível de estoque de peças de substituição, concorrência para serviços especializados de terceiros etc. A solução final que a rigor não media nada, mas impressionava os incautos, foi calcular o “tempo médio de revisão”.

Comparando-o com o número do ano anterior, aproveitava-se a oportunidade para louvar a “boa qualidade da administração” ou apresentar uma boa desculpa: problemas incontornáveis prejudicaram a “boa qualidade da administração”. Aprendi, então, que os membros de qualquer organização (mesmo das empresas privadas) não maximizam nada: acomodam-se conveniente e discretamente num nível de conforto aceitável.

Quando vejo a facilidade com que se afirma a platitude que “a causa básica da queda da taxa de crescimento do PIB é a redução da produtividade do trabalho”, lembro aquela experiência.

A “produtividade da mão de obra” era muito alta na época chuvosa, quando chegavam as máquinas do campo (a demanda na oficina era alta porque elas não estavam trabalhando) e era menor na época seca (as máquinas estavam trabalhando no campo e não havia demanda na oficina). A “produtividade” do trabalho dos operadores das máquinas era, naturalmente, o inverso da “produtividade” do trabalho dos mecânicos da oficina, o que tirava qualquer sentido físico à ideia de “produtividade média do trabalho no DER”.

A observação reforça no nível microeconômico, que a demanda é uma causa da “produtividade do trabalho”, mas que esta não é causa da demanda. No nível macroeconômico, há problema semântico, não de causalidade. Por definição, o crescimento do PIB é identicamente igual (é só outro nome) do aumento da “produtividade do trabalho” somado à taxa de crescimento do número de trabalhadores… 

Redação

4 Comentários

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  1. É Simples

    Medir produtividade, é como medir a eficiência. Um exemplo:

    Para trocar o silencioso de escapamento trazeiro de um celta, um mecânico trabalha em uma oficina sem recursos, e dispõe de marreta, talhadeira e arco de serra. Com a talhadeira e marreta ele leva uma hora para trocar o silencioso. O trabalho é lento, porque não pode danificar a peça do silencioso intermediária, que está presa no silencioso trazeiro. Em casos mais difíceis costuma levar uma hora mesmo. E a grande maioria das oficinas do país trabalha assim, na idade da pedra, com marreta. Não é de se admirar porque um trabalhador americano produz cinco vezes mais do que um brasileiro.

    Agora imaginem o mesmo mecânico em uma oficina com tecnologia de ponta. Ele tem uma lixadeira de corte, e corta o silencioso trazeiro em dois minutos. Instala o novo em mais cinco minutos. O trabalho de uma hora feito em sete minutos, porque o patrão resolveu comprar uma ferramenta que custa 300 reais. O mecânico sofre muito menos e produz muito mais.

    No caso do Delfim, na época em que as máquinas não estavam na oficina, e os mecânicos estavam parados, deviam ser realocados, para não ficarem com produtividade zero, nos meses de seca. Aí a eficácia se une a eficiência.

    1. Composição Orgãnica

      “…deviam ser realocados…”

      Mas…. realocados pra onde? Pra “sua” oficina?

      Você acha mesmo que o Delfim – mesmo em 47 – não sabia a diferença entre custo fixo e custo variável?

      Foi nessa época que ele começou a entender isso; não foi na USP, não! É essa a mensagem!

  2. … E ainda tem o problema de

    … E ainda tem o problema de que, para muitos, mandar gente embora, achatar os salários ou aumentar hora extra não paga é suficiente para “demonstrar'” aumento de produtividade.

    A moda pega e voltamos para a década de 90 …

    Por isso que foi a importante a clareza e a convicção de Dilma no primeiro trimestre assegurando a regra de aumento do salário mínimo.

    … Lembro que o próprio Nassif chamou de “pití”.

    Se as medidas que integraram o tal ajuste tivessem sido aprovadas no primeiro trimestre como um remédio moderadamente amargo no final do ano de 2014 já veríamos sinais de recupareção no cenário.

    … Mas, não, a chacrinha política prevaleceu sobre o incrível mutismo do governo, que acreditou no “bom senso” dos atores políticos…

    Ao passo em que moucamente se defrontavam com o que o resultado de décadas de pregação antissocial fazia emergir nas relações sociais….

    Ora, já dava pra ver o desespero da oposição no período eleitoral – desde 2012, aliás, ano em que as medidas no setor energético foram anunciadas e os juros chegaram a 7,5%; tudo com a infraestrutura já contratada…

    … A oposição tinha bem claro em outubro de 2014: “é agora ou nunca”…

    … Mas os “cavalheiros” do PT….

     

  3. Interessante o artigo de Delfim Neto. . ,

    Interessante o artigo de Delfim Neto, que sempre escreve didaticamente e com muita inteligência. A propósito, é difícil aceitar as afirmações de diversos economistas que não vem crescendo a produtividade na indústria brasileira nos últimos anos, não justificando a política de valorização do salário mínimo. É difícil  de acreditar que com tanta tecnologia e com a melhora do ensino, tanto no nível superior, quanto no nível técnico, que não venha tendo aumento de produtividade na indústria do Brasil.

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