Inovar é reduzir a jornada para 40 horas, por Clemente Ganz Lúcio

do Brasil Debate

Inovar é reduzir a jornada para 40 horas

por Clemente Ganz Lúcio

Foi somente no início do século 20 que a jornada de 8 horas diárias ou 48 por semana começou a ser instituída onde, hoje, os países são desenvolvidos. A proposta da CNI de aumento da jornada, de maneira dialética, nos faz relembrar nossa história e nos provoca e convoca a protagonizar novos avanços

A história mostra que as lutas dos trabalhadores são longas e difíceis. O processo civilizatório que eleva o padrão de vida da sociedade como um todo conta com a participação determinante dos trabalhadores. Eles inovaram, por meio dos sindicatos, em bandeiras de interesse geral, como a democracia, a liberdade, a igualdade, os direitos sociais em geral, criaram partidos e contribuíram para a construção do Estado moderno. Fizeram muito.

Para os trabalhadores, lutar é a condição para viver. Por isso, criam os sindicatos, um solidário instrumento de luta. Reduzir a jornada de trabalho é uma dessas lutas que nos acompanha desde a origem do sindicalismo. Exemplos não faltam. Entre 1850 e 1870, a jornada média na Alemanha era de 75 horas (se uma pessoa trabalha 60 e outra, 90 horas, a média dá 75). A média encobre muitas desigualdades! Na Inglaterra, foi o Factory Act que, em 1844, reduziu a jornada feminina de mais de 18 para 12 horas diárias.

Um anúncio publicado em 1813 por um fabricante de algodão nos Estados Unidos dizia: “Cotton Factory procura algumas famílias sóbrias e industriosas, que tenham pelo menos cinco filhos maiores de oito anos”. Estima-se que, em 1900, havia 1,7 milhão de crianças com menos de 16 anos trabalhando nos Estados Unidos, mais do que a totalidade dos membros da AFL (American Federation of Labour), o maior sindicato do país.

Na Suécia, podia-se empregar meninos a partir de cinco anos, procedimento generalizado nos países da Europa no século XIX. Os exemplos e fatos se multiplicam e estão documentados por inúmeros cientistas sociais, economistas e historiadores.

A luta é longa! Foi somente no início do século XX que a jornada de 8 horas diárias ou 48 horas por semana começou a ser instituída onde, hoje, os países são desenvolvidos.

Educação, qualificação e tecnologia, reunidas nas indústrias nas cidades nascentes, fizeram a produtividade do trabalho crescer espetacularmente. No último século, a produtividade cresceu, enquanto a jornada de trabalho era reduzida!

Mas as máquinas passaram a queimar os postos de trabalho e a luta para que todos tenham emprego ganhou vigor, renovando ainda mais as ações pela redução da jornada de trabalho. Trabalhar menos para que todos tenham empregos. Trabalhar menos para ganhar qualidade de vida, para conviver com a família e os amigos, estudar, praticar esportes, ver um filme, ir ao teatro, cantar, dançar, brincar ou, simplesmente, não fazer nada, ganhou centralidade na vida sindical e na luta dos trabalhadores.

O recente ato falho do presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), propondo jornada de 80 horas semanais, em uma reunião que tratava de inovação, atropela a história e achincalha a utopia de uma sociedade justa. Mas, de maneira dialética, nos faz relembrar nossa história e nos provoca e convoca a protagonizar novos avanços.

Inovar hoje é promover um tipo de dinâmica econômica na qual todos tenham empregos de qualidade e bons salários, para produzir o que a sociedade precisa para ter bem-estar e qualidade de vida.

Inovar hoje é distribuir o produto social, promovendo igualdade de oportunidades e condições.

Inovar hoje é reduzir a jornada de trabalho para 40 horas.

Os trabalhadores veem longe e lutam sempre. Está na hora de tentar novamente!

 

 

Redação

3 Comentários

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  1. É mais uma vergonha no nosso

    É mais uma vergonha no nosso país que certos políticos do congresso, para efetuar o golpe de Estado normalmente consentido pela justiça, ponham em jogo o antigo estado de coisas, status quo, à uma quantidade de votos que se expressam como mera relação de produtos abstratos dos meios de imagem – que nada criam na economia e alienam o sujeito e o objeto.

    Quando chegam nos ajustes de contas, cujos números prevalecerá a maneira de inferir do meio de trocas (a mídia dos retardados e coxinhas, e, por sua conversão, a decrepitude); sistematizam a sociedade em um centro privado de esterilizar a igualação trabalhista, porque permitem ao interino e seus corruptos governar mas, vexa-me, o capital financeiro passa a equivaler o mesmo preço que a sociedade paga de aprendizado para se quantificar a produção: o déficit público girando a tomada de consciência – porque é o motor da história.

    Ironicamente, os pobres brasileiros afligidos com tantos sintomas da sua espontânea e incontestável morte no capital, são as pessoas necessárias para socializar as reservas de valor interna e externamente. Todavia não tratam deste problema teórico de serem a forma e a intensidade da escrita no dinheiro; enquanto isso, das suas mãos, os conduzem a resultados totalmente diversos – pagar o uso de dinheiro estrangeiro para produzirem mercadorias.

    Se o país, porém, não evoluir ao ponto de ter uma consciência de fato (possível herdada do passado) para fazer no dinheiro o movimento corretivo da sociedade, ou seja, se não construir para o povo o meio histórico em que cada trabalhador possa incluir os seus valores no sistema, em si e para si, nunca irá levar a lugar comum as próprias riquezas.

  2. Comentário ao post Inovar é reduzir a jornada para 40 horas.

    Para mim, qualquer debate sobre criar um ambiente para que as empresas brasileiras sejam mais competitivas e inovadoras que não analise amplamente os modelos de negócio adotados por cada setor da economia é perda de tempo, conversa fiada. Infelizmente a mentalidade da maioria dos investidores e representantes dos setores da economia é produzir com o mínimo. Investem o mínimo em planejamento, em recursos materiais e humanos mas querem que seus empreendimentos produzam produtos e serviços que sejam competitivos e inovadores. A questão não é a jornada de trabalho, a questão é o modelo de negócio e sua gestão. Por exemplo, o modelo do agronegócio brasileiro frequentemente provoca instabilidade na oferta de produtos no mercado interno para priorizar a exportação. Já ouviu falar em rei da soja? Provavelmente sim. Mas já ouviu falar em rei do alface? Rei do tomate? E rei do alho? Provavelmente não. Porque os médios e grandes produtores do agronegócio preferem exportar grãos (por exemplo, soja e milho), aproveitando o período de alta no dólar e vendendo seus produtos também em dólar, ao invés de investir em hortifrútis (hortaliças, legumes e frutas) para abastecer o mercado interno. Este modelo preferido pelos investidores do agronegócio brasileiro é mais rentável mas prejudica o mercado interno (por exemplo, a repentina alta no preço do feijão) pois a maior parte dos investimentos está com os médios e grandes produtores, que podem recorrer a técnicas e ferramentas de cultivo mais sofisticadas e produtivas (inclusive automação de processos), enquanto que o pequeno produtor somente tem acesso a técnicas e ferramentas rudimentares, fragilizando a produção e a oferta. Infelizmente a maior parte dos hortifrútis consumidos pelos brasileiros são produzidos por pequenos produtores e pela agricultura familiar, principalmente por que é um mercado menos rentável e mais trabalhoso devido a diversidade de produtos. É muito mais rentável e fácil investir em um único tipo de soja transgênica, que é mais resistente alterações no clima e a pragas, do que em dezenas de variedades de hortifrútis, cada um com características específicas para ser cultivado. Então, de que adianta debater isoladamente a alteração na jornada de trabalho em um cenário tão complexo como o mercado brasileiro? Não há jornada de trabalho capaz de compensar certos desequilíbrios causados pela escolha de certos modelos de negócio em setores diversos da economia. Estou certo que o autor deste artigo (Inovar é reduzir a jornada para 40 horas) e o presidente da CNI sabem melhor que eu que promover desenvolvimento econômico não é tão simples e fácil assim, são muitas as variáveis que precisam ser consideradas. Mas até esse momento o que aparentemente tem prevalecido é a cultura do menor esforço (e do maior lucro, independente das consequências). Cada um faz somente o necessário para resolver o seu problema. Para a CNI, é muito mais fácil culpar o proletário pela falta de competitividade das indústrias, sugerindo um mero aumento da carga horária como solução, do que assumir a responsabilidade de propor alterações na gestão da economia e nos modelos de negócio de cada setor, alterações que sejam mais coerentes com as necessidades da sociedade brasileira e não apenas aquelas que favorecem somente os investidores. Analisando por outro ângulo, uma afirmação simplista como esta, em um momento em que o país está vivendo crise em suas instituições políticas e com graves consequências econômicas, também pode ser interpretada como uma resposta puramente evasiva. Pode ser que o presidente da CNI não acredite de fato que debater o aumento da jornada de trabalho seja solução. Pode ser que ele intencionalmente criou esta polêmica para desviar o foco dos problemas reais e desencorajar qualquer debate, sinalizando de forma discreta que a CNI não está disposta, neste momento de crise, a ter iniciativa de propor soluções e assumir responsabilidades.

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