Capitalismo Bem-sucedido na Irlanda e Socialismo Malsucedido em Cuba
por Fernando Nogueira da Costa
A Irlanda é uma república constitucional governada como uma democracia parlamentar, com um presidente eleito para servir como chefe de Estado. Considerada um país desenvolvido, tem o terceiro maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do mundo, além de ótimas classificações em índices de medição do grau de democracia e liberdades como a de imprensa, econômica e política.
Desde os anos 1980, a economia irlandesa deixou de ser predominantemente agrícola e transformou-se em uma economia focada em indústrias de alta tecnologia e serviços. O país adotou o euro, em 2002, juntamente com onze outros Estados-membros da UE.
É fortemente dependente de investimento estrangeiro direto. Tem atraído várias empresas multinacionais, devido a uma força de trabalho qualificada e uma taxa de impostos baixa.
Algumas empresas, como a Intel, seguida pela Microsoft e pelo Google, investiram na Irlanda desde o fim dos anos 1980. A Irlanda é classificada como a sétima economia mais livre no mundo, segundo o Índice de Liberdade Econômica. Em termos de PIB per capita, a Irlanda é um dos países mais ricos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e da União Europeia (UE).
No entanto, o país está abaixo da média da OCDE em termos de PNB per capita. O PIB (Produto Interno Bruto) é significativamente maior diante o PNB (Produto Nacional Bruto), devido à grande quantidade de empresas multinacionais com sede instalada na Irlanda. Quando o PNB é inferior ao PIB, o país remete para o exterior mais renda líquida diante da recebida.
A Irlanda é um destino atraente para empresas multinacionais por várias razões. Destaca-se a baixa tributação corporativa.
Oferece uma das taxas de imposto corporativo mais baixas da Europa, atualmente em 12,5%, altamente atraente para empresas em busca de minimizar seus encargos fiscais. Existem vários incentivos fiscais para Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) de empresas com estabelecimento de suas operações lá.
Ela é conhecida por sua estabilidade política e pelo ambiente regulatório previsível, capazes de proporcionar segurança e previsibilidade para os negócios. O governo irlandês adota políticas favoráveis ao investimento estrangeiro, com regulamentações de modo a facilitar a criação e operação de empresas.
Como membro da União Europeia, a Irlanda oferece acesso ao mercado único europeu. Inclui livre circulação de bens, serviços, capital e pessoas. Isso é valioso para empresas em busca de acesso fácil a um grande mercado.
Após o Brexit, isto é, a saída da vizinha Inglaterra, a Irlanda se tornou ainda mais atrativa como porta de entrada para o mercado europeu, especialmente, para empresas anteriormente operando através do Reino Unido.
A Irlanda possui uma força de trabalho altamente qualificada e educada, com várias universidades e instituições de Ensino Superior renomadas. Fornecem um fluxo constante de talentos. A língua inglesa como língua principal do país facilita as operações de empresas multinacionais e atrai talentos de todo o mundo.
Ela investe bastante em infraestrutura de tecnologia da informação, telecomunicações, transporte e logística, criando um ambiente propício para negócios de alta tecnologia. Abriga vários clusters tecnológicos e de inovação, especialmente em Dublin, um importante hub para empresas de tecnologia.
O governo irlandês apoia a inovação e o empreendedorismo, oferecendo subsídios, programas de apoio e infraestrutura para startups e empresas de alta tecnologia. Oferece créditos fiscais atraentes para atividades de Pesquisa e Desenvolvimento.
Essa combinação de baixa tributação, estabilidade política, acesso ao mercado europeu, mão de obra qualificada, infraestrutura avançada e incentivos para inovação torna a Irlanda um destino muito atraente para empresas multinacionais. Esses fatores ajudam a explicar por qual razão tantas empresas escolhem estabelecer suas sedes e operações na Irlanda.
Comparativamente, Cuba e Irlanda, apesar de suas semelhanças geográficas e demográficas, seguiram caminhos econômicos muito distintos, devido a uma combinação de fatores históricos, políticos e sociais. Exploro, em seguida, essas semelhanças e as razões históricas para seus destinos econômicos divergentes.
A geografia comum é a localização insular. Ambos são ilhas, influenciando aspectos como comércio, defesa e cultura. Mas uma é vizinha da potência econômica e moral decadente dos Estados Unidos, outra da potência econômica anterior, a Inglaterra. A América faz um embargo genocida sobre a população cubana, a outra saiu da União Europeia, beneficiando “a ponte irlandesa”.
Cuba tem um clima tropical, enquanto a Irlanda tem um clima temperado marítimo. Ambas possuem terras férteis e condições propícias para a agricultura.
A população de Cuba é, aproximadamente, 11 milhões de pessoas, mais do dobro da Irlanda com cerca de 5 milhões de habitantes. Ambos os países têm populações relativamente pequenas diante outras nações economicamente poderosas.
Têm uma história de emigração devido a dificuldades econômicas e políticas. Influenciou suas demografias ao longo do tempo.
As razões históricas para os destinos econômicos divergentes têm raízes na história colonial de cada qual. Cuba foi colônia espanhola até o fim do século XIX, quando se tornou um protetorado dos Estados Unidos após a Guerra Hispano-Americana. A economia cubana durante o período colonial e pós-colonial foi fortemente baseada na monocultura da cana-de-açúcar e no trabalho escravo.
Irlanda foi dominada pela Inglaterra por séculos. Durante o domínio britânico, sofreu com políticas econômicas favoráveis apenas aos interesses ingleses, como a exportação de alimentos durante a Grande Fome de 1845-1852. Resultou na morte de cerca de um milhão de pessoas e a emigração de muitos mais.
Após a Revolução Cubana de 1959, Cuba adotou um modelo econômico imaginado socialista sob a liderança de Fidel Castro. Resultou na nacionalização de empresas e propriedades privadas e na implementação de uma economia centralmente planejada, com forte dependência da União Soviética até seu colapso em 1991.
A Irlanda obteve independência do Reino Unido em 1922 e adotou um modelo econômico capitalista. Inicialmente, enfrentou dificuldades econômicas, mas a partir das décadas de 1980 e 1990, implementou políticas de liberalização econômica, atraindo investimentos estrangeiros e se tornando um centro de alta tecnologia e serviços financeiros.
As relações internacionais de Cuba, especialmente com os Estados Unidos, foram marcadas por hostilidade e boicote desde a Revolução de 1959. O embargo econômico imposto pelos EUA ainda tem um impacto significativo na economia cubana, limitando seu acesso a mercados e investimentos estrangeiros.
Irlanda beneficiou-se de sua relação com a União Europeia (UE). A adesão à UE em 1973 trouxe acesso a um grande mercado comum e a fundos. Ajudaram a modernizar a infraestrutura e impulsionar o desenvolvimento econômico.
A economia cubana continuou fortemente dependente do setor agrícola e do turismo, com pouca diversificação industrial. O colapso da União Soviética levou a uma grave crise econômica nos anos 1990, conhecida como Período Especial.
Enquanto isso, a Irlanda investiu em educação e infraestrutura, atraindo empresas multinacionais, especialmente no setor de tecnologia e farmacêutico. O “Tigre Celta”, como ficou conhecida a economia irlandesa, experimentou um rápido crescimento econômico a partir da década de 1990.
Embora Cuba e Irlanda compartilhem algumas semelhanças geográficas e demográficas, seus destinos econômicos divergiram, devido a fatores históricos e políticos distintos. A história colonial, as políticas econômicas adotadas após a independência, as relações internacionais e as estratégias de desenvolvimento econômico foram determinantes para moldar os caminhos únicos de cada país.
Enquanto Cuba seguiu um caminho socialista com impacto significativo de embargos e crises, a Irlanda adotou um modelo capitalista, aproveitando a integração europeia e investimentos estrangeiros para impulsionar seu crescimento econômico.
Fernando Nogueira da Costa – Professor Titular do IE-UNICAMP. Obras (Quase) Completas em livros digitais para download em http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/). E-mail: [email protected].
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Será que o que pesou de fato, não foi a proximidade dos EUA, maestro do capitalismo selvagem.
Quero saber sobre a qualidade de vida da população e os motivos reais de serem o que são. Parece que elegeu ser livre mercado, baixos impostos e essa coisas neo liberais bom em si.Quem não se enquadra ruim em si.
A mesma Irlanda em que os páteos de estacionamento dos aeroportos ficavam abarrotados de BMW e Mercedes Benz abandonadas pelos ratos que fugiam quando o navio fazia água em 2008?
A mesma Irlanda que tem um número sem-teto tão elevado que ultrapassa os números da “Grande Fome” entre 1845–1849?
E em tempo, a agricultura ainda é o maior setor da ilha com aproximadamente 38% do PIB, cerca de 80% das exportações e que emprega 28% da força de trabalho. Lá como cá o Fazendão não compensa…
Agora com Cuba o problema é que Miami é muito próxima!
Sobre os sem teto.
https://www.edublin.com.br/sem-tetos-na-irlanda/
https://istoe.com.br/imigrantes-dormem-na-rua-em-meio-a-crise-na-irlanda/
E quanto aos 38% o PIB, se tirou daWikipedia, acho melhor ver outras fontes. Me pareceram menores.
https://pt.tradingeconomics.com/ireland/gdp-from-agriculture
https://pt.tradingeconomics.com/ireland/gdp-from-manufacturing
Como será que estaria a situação da Irlanda se fosse ela a realizar uma revolução socialista, buscando romper radicalmente com o seu passado colonial e neocolonial, estando em uma posição geográfica e política de grande conflito com a Inglaterra (a segunda grande liderança capitalista do mundo) e em um período de guerra fria? Ah! Lembremos que no caso de Cuba não se tratou da Inglaterra e da possibilidade de mediação por um grupo de nações (em um período histórico em que ainda havia governos ou lideranças políticas de esquerda de peso na Europa), tratou-se dos EUA e sem mediação alguma (a não ser a URSS à bastante distância).
“Quando, em Cuba, os plantadores espanhóis queimavam os bosques nas encostas das montanhas para obter com a cinza um adubo que só lhes permitia fertilizar uma geração de cafeeiros de alto rendimento pouco lhes importava que as chuvas torrenciais dos trópicos varressem a camada vegetal do solo, privada da proteção das árvores, e não deixassem depois de si senão rochas desnudas! Com o atual modo de produção e no que se refere tanto às conseqüências naturais como às conseqüências sociais dos atos realizados pelos homens, o que interessa prioritariamente são apenas os primeiros resultados, os mais palpáveis. E logo até se manifesta estranheza pelo fato de as consequências remotas das ações que perseguiam esses fins serem muito diferentes e, na maioria dos casos, até diametralmente opostas; de a harmonia entre a oferta e a procura converter-se em seu antípoda, como nos demonstra o curso de cada um desses ciclos industriais de dez anos, e como puderam convencer-se disso os que com o “crack” viveram na Alemanha um pequeno prelúdio; de a propriedade privada baseada no trabalho próprio converter-se necessariamente, ao desenvolver-se, na ausência de posse de toda propriedade pelos trabalhadores, enquanto toda a riqueza se concentra mais e mais nas mãos dos que não trabalham”.
Engels
O ANALISTA não trata a questão do embargo e das pressões e ações americanas. Um país isolado não se compara a Irlanda. Cuba tem uma economia sitiada a décadas.