Glenn Greenwald, Sérgio Moro e o paradoxo do tempo, por Fábio de Oliveira Ribeiro

No auge da novela judiciária Lava Jato, qualquer ministro do STF que ousasse desafiar o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba era imediatamente ridicularizado pelos jornalistas.

Glenn Greenwald, Sérgio Moro e o paradoxo do tempo

por Fábio de Oliveira Ribeiro

Durante vários anos o herói lavajateiro usou a imprensa para construir um poder sem paralelo na história do Brasil. Juiz de primeira instância, Sérgio Moro conseguiu inverter a pirâmide judiciária. Na prática, ele passou a quase controlar o funcionamento das instâncias superiores. Isso ficou especialmente evidente quando um membro do TRF-4 concedeu um HC a Lula, oportunidade em que mesmo de férias o juiz da Lava Jato praticou atos processuais em detrimento do réu até que a ordem fosse revogada pelo presidente daquele Tribunal.

No auge da novela judiciária Lava Jato, qualquer ministro do STF que ousasse desafiar o juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba era imediatamente ridicularizado pelos jornalistas. Em algumas oportunidades, o próprio Sérgio Moro teve a petulância de enfrentar alguns ministros do STF. Quando elaborou um Projeto de Lei de combate à corrupção de acordo com sua ideologia autoritária, ele chegou a fazer ameaças veladas ao Parlamento.

O blogueiro Eduardo Guimarães, que publicou informações que o juiz lavajateiro não queria que fossem divulgadas, sofreu uma condução coercitiva da PF determinada por Sérgio Moro. Esse abuso de autoridade, entretanto, não resultou em qualquer punição para o juiz.

Por razões diferentes, eu mesmo já fui perseguido pela polícia por causa de um blogue. Na oportunidade, o servidor em que ele estava hospedado o tirou de circulação atendendo o e-mail enviado por uma Delegada de Polícia do Estado de São Paulo. A denúncia ofertada contra mim pelo Ministério Público foi rejeitada. O juiz considerou que minha conduta era atípica. A rejeição da denúncia foi confirmada pelo TJSP.

Algum tempo depois entrei com uma Ação de Indenização contra o Estado de São Paulo. Meu pedido foi julgado improcedente na primeira e na segunda instância. O TJSP considerou legítima a ordem policial dada ao servidor para tirar meu blogue da internet.

“Com efeito, não se vislumbra nenhum excesso na conduta da autoridade policial. Em verdade, a decisão de deixar de veicular todo o conteúdo do site do autor foi tomada pelo IG. Conforme consta da cópia da mensagem enviada pela delegada coordenadora do Gradi ao IG, a fls. 162, foi solicitada a remoção apenas do texto que supostamente tinha cunho discriminatório. A atividade policial cingiu-se às normas vigentes, inexistindo excesso ou ilícito.”

Quando o The Intercept finalmente furou a bolha de conforto jornalístico em que o herói Sérgio Moro existia o Ministro da Justiça ficou desesperado. Não pertencendo mais ao judiciário, ele não poderia simplesmente mandar conduzir coercitivamente o jornalista norte-americano como fez no caso de Eduardo Guimarães. O Ministro da Justiça poderia ter sugerido a um dos Delegados da PF a fazer com o The Intercept o que a Delegada paulista havia feito comigo. O abuso nesse caso não teria sido tão evidente, pois a decisão poderia ser lastreada na jurisprudência excepcional que TJSP criou para resolver meu caso.

Em vez de mandar um subordinado pedir para o servidor derrubar o The Intercept, o Ministro da Justiça preferiu resolver o problema de maneira indireta. Ao que parece, ele usou o COAF para fazer uma devassa na vida financeira do norte-americano. A agressão à liberdade jornalística de Glenn Greenwald foi imediatamente repudiada dentro e fora do Brasil.

O capital simbólico que transformou Sérgio Moro num dos homens mais poderosos do país está se esgotando rapidamente. Aplica-se aqui o paradoxo do tempo.

O tempo é uma mercadoria curiosa. Ele se oferece a todos gratuitamente, mas ninguém sabe exatamente qual o quinhão que recebeu. Nesse caso, o que é válido para os homens também vale para as instituições que eles criam. Quando alguém tenta interromper o tempo alheio ou comprar mais tempo para si depois que seu tempo terminou o resultado é quase sempre uma tragédia.

Tudo indica que o tempo de glória de Sérgio Moro terminou. O desespero dele para comprar mais tempo atacando o The Intercept é evidente. Mas isso vai apenas apressar e aprofundar o tamanho do tombo que o herói lavajateiro está fadado a levar.

Lula permanece. A reabilitação dele prova que o tempo do “sapo barbudo” não terminou. Tentar interrompê-lo foi uma estupidez.

PS: Para se ter apenas uma noção do tamanho e da importância de Glenn Greenwald basta lembrar que no caso dele a OEA e a ONU reagiram imediatamente às intimidações de Sérgio Moro. A representação feita por mim contra o Brasil na OEA foi simplesmente esquecida numa gaveta. Desde o final de 2013 aguardo uma resposta da Comissão de Direitos Humanos da OEA. Ao que tudo indica meu caso ficará algumas décadas sem solução.

Fábio de Oliveira Ribeiro

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