Paulo Henrique Amorim, a televisão brasileira e suas mortes, por Laurindo Lalo Leal Filho

A decadência do telejornalismo e da televisão é um drama ao qual se soma a triste despedida de PHA, um dos poucos profissionais que ainda dava a ela uma certa dignidade.

Paulo Henrique Amorim, a televisão brasileira e suas mortes

por Laurindo Lalo Leal Filho

A decadência do telejornalismo e da televisão é um drama ao qual se soma a triste despedida de PHA, um dos poucos profissionais que ainda dava a ela uma certa dignidade.

“A televisão é uma máquina de fazer doidos” dizia Sérgio Porto, o inesquecível Stanislaw Ponte Preta, lá pelos anos 60 do século passado.  Autor do Febeapá, o Festival de Besteiras que Assola o Pais, cutucava com o seu humor a ditadura da época e percebia na TV um instrumento que, ao contribuir para a burrice e alienação, dava ampla sustentação ao arbítrio.

Morto precocemente, Stanislaw não viu o crescimento da máquina fazendo e promovendo doidos, não apenas no público mas dentro de sua própria engrenagem. Entregues como concessões pelos sucessivos governos federais a aventureiros como Silvio Santos ou a políticos travestidos de empresários como Roberto Marinho, a TV foi se aviltando até chegar no lodaçal em que se encontra atualmente.

Nele acham-se figuras menores, mas não menos danosas, como os concessionários da Rede TV!, especialista em vulgaridades. Ou de um auto-proclamado bispo, fazendo da fé mercadoria. Pretensos milagres num canal, detalhes da vida íntima de pretendentes à fama em outro, entrevistas “chapa-branca” com políticos de extrema-direita, censura de informações relevantes, defesa de medidas antipopulares vão se sucedendo a cada toque no controle remoto. Esse é o quadro atual.

São quase 70 anos de decadência. Exceções existiram mas não sobreviveram. Aqueles que viram na TV a possibilidade de expandir conhecimento e sensibilidade sucumbiram. Nada sobrou, na dramaturgia, dos teatros de Comédia ou de Vanguarda da pioneira TV Tupi. Nem do bom momento das novelas escritas por autores como Dias Gomes ou Lauro Cesar Muniz, entre outros. Os grandes musicais da extinta TV Excelsior são uma lembrança que dói diante do que se vê hoje por ai.

No jornalismo a situação ganha contornos de tragédia. “Toda unanimidade é burra”, dizia Nelson Rodrigues, cada vez mais citado nestes tristes tempos. Se dermos razão a ele, mesmo lembrando o seu conservadorismo, o telejornalismo brasileiro é burro. Para as emissoras de TV das Organizações Globo, TV Globo e Globonews, a verdade é uma só. A defesa incondicional que fazem da destruição da Previdência pública é o exemplo mais atual e mais bem acabado dessa burrice. Para não falar da vergonhosa censura imposta ao noticiário produzido pelo The Intercept Brasil, revelador por meio da série Vazajato dos crimes cometidos pelos integrantes da operação policial, jurídica e midiática denominada LavaJato. 

Diante desse quadro sufocante, capaz de organizar amplas camadas da população segundo seus interesses, poucas vozes críticas conseguem ser ouvidas. No interior da máquina muitos tentaram, poucos conseguiram resistir. A inteligência critica não combina com a informação na TV.  

Voltando aos exemplos históricos, a referência jornalistica é o Jornal de Vanguarda da extinta TV Excelsior, criado e dirigido por Fernando Barbosa Lima. Bem feito, bem humorado e sério ao mesmo tempo, não deixou resquícios, só saudade para quem o conheceu. Como Barbosa Lima outros profissionais ainda tentaram trazer conteúdo de qualidade ao telejornalismo. Um deles acaba de nos deixar e serve como exemplo da incompatibilidade perversa criada ao longo do tempo entre inteligência e televisão: Paulo Henrique Amorim.

O jornalista carioca trouxe para a TV um conhecimento acumulado na academia e nas redações de jornais e revistas, sabendo-se que nem sempre foi fácil a adaptação à televisão dos profissionais formados nos meios impressos. Muitos sucumbiram. A busca da informação, a apuração precisa e o texto elegante, suficientes para o papel exigiam na TV a aproximação com arte de interpretar. Poucos transpuseram essa barreira. Paulo Henrique Amorim, PHA, como se identificava, foi um deles. 

Mostrou isso nas emissoras por onde passou mas a decadência do telejornalismo brasileiro não combinava com a sua competência. Seu derradeiro empregador, a Record do bispo, empenhada em adular o atual governo de extrema-direita, e pressionada por ele, o tirou no ar pouco antes de sua morte. 

Há nesse drama um simbolismo que, por certo, marcará a atual etapa da história da televisão brasileira. Sua decadência, a partir de agora, não se reduz apenas a mediocridade do conteúdo exibido. Marca também o desaparecimento físico de um dos poucos profissionais que ainda dava a ela uma certa dignidade.    

6 Comentários

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  1. A tal “DEMOCRACIA AMERICANA” com partido ÚNICO com DOIS NOMES, é o sonho das zélites FINANCEIRAS Brasileiras. Política SEM oposição, SEM ideologia, SEM discussão e SÓ COM DIVISÃO DE BENEFÍCIOS ENTRE ELES, os mesmos de sempre, o PODER REAL, está se instalando.

    Não vai sobrar nada,NEM para os descendentes deles. Inacredirtável tanta burrice.

    Doaram UM TRILHÃO em IMPOSTOS às petroleiras estrangeiras e agora vão RECUPERAR nas costas de 180 milhões de TRABALHADORES E POBRES E MISERÁVEIS, que estavam se tornando CONSUMIDORES e agora serão pedintes, esmoleiros, ou, assaltantes, predadores, etc.

    1. Desculpe, caro Ângelo, pelo breve reparo mas.. “sem ideologia”?

      Discordo frontalmente. Vejo com muita clareza a ideologia do capitalismo, com mais realce ainda pela ação desprovida de disfarces levada a efeito pelo que se convencionou chamar de Liberalismo. Vejo seus dogmas, suas mentiras, seus mantras, sua retórica e sua ação, sempre tentando empobrecer a quase todos para que muito poucos enriqueçam, sempre em busca da concentração e não da distribuição.

      E quando falo em pobreza ou riqueza penso não só em dinheiro mas muito mais em conquistas civilizatórias, em evolução da humanidade que há em cada um de nós, na realização de nossos potenciais sistematicamente sabotados pelos outros ou, mais grave – pelo outro admirado e introjetado por nós em nós mesmos. A auto-sabotagem daqueles que preferem achar que os outros são melhores.

      Não é bonito de ver a comparação entre o que cada um de nós poderia se tornar – civilizados e auto-confiantes – e o que nos permitimos tornar, bárbaros, vândalos e dependentes do que nos é estrangeiro.

      Ah, se pudéssemos nos livrar da ideologia que permitimos nos pautar… Só que podemos, sim. Podemos começar por evitar naturalizar esse ideologia, chamando-a de uma não-ideologia.

  2. Cada vez que leio as matérias do GGN, enriqueço de informação. Se já andava, desde minha adolescência longe da alienação, no auge dos meus cinquenta, mais feliz ainda por encontrar, um jornalismo fiel a realidade, que sempre esteve aqui e teima em não mudar. Como o citado aventureiro, que sempre o chamo de “camelô das ilusões”, que no contexto do seculo passado, amealhou fortuna justamente numa conjuntura, de recessão econômica, onde os incautos, para ser mais preciso as incautas,contribuíram para encher o baú do aventureiro. Não é a toa o seu saudosismo com a ditadura militar, foi a época que enriqueceu vendendo suas “ilusões”, é justamente neste contexto, de atraso e de desalento da população que surgem aventureiros. E agora o “Velho das Estatuas, prefiro atribuir-lhe este apelido, o outro, ele já esta usando como marketing. Não é uma charada, nem adivinhação, mas alguém sabe de quem estou falando, agora mais uma pitada de mediocridade na Tv.

  3. Na chamada era do conhecimento, quando os canais (ou marcas) de informação são desejados até pelos grandes investidores, mas as mídias (como TV, jornais e revistas) estão em franco declínio perdendo espaço para os dispositivos pessoais/digitais. Os condutores (empresas de telecomunicações) estão consolidando mundialmente sua força e os donos de mensagens é que precisam se situar neste mercado. Os profissionais da mídia agora tem de criar e cuidar de seu próprio público, já que nos novos dispositivos o controle não é mais remoto e está conectado às escolhas diretas dos utilizadores através dos aplicativos. É uma situação delicada, pois além de ter seu próprio canal, o ideal é que os jornalistas sejam empresários e tenham à mão as suas próprias ferramentas e aplicações para fidelizar e atender seu público. Goste-se ou não, é o mundo que está em voga.

  4. Esse comentário deveria estar no rodapé do artigo de Fernando Horta sobre o “chapeiro das Rochosas que acabou como embaixador em Washington”, mas, como não abriram o necessário espaço vai por aqui mesmo.
    ….
    Cazzo!!! como diria um amigo italiano, vocês estão de marcação com o homem.
    Em um lugar que: Menina Veneno pode ser ministra da agricultura: Damares bicho-da- goiaba pode cuidar da Mulher, da Família e Direitos Humanos mesmo tendo “roubado” uma criança de seus pais legítimos; Paulo Beato Salú Guedes é ministro da Economia, mesmo acusado de ter metido a mão no baleiro e não ter sequer um resquício de noção sobre como tratar o buraco recessivo em que enfiaram o Brasil; Salles, o ministro do Meio-Ambiente é um defensor do desmatamento que nega o aquecimento global; Weintraub, além de ter um problema mental sério, não saca nada de aritmética, nem de história ou geografia, mas cuida da educação de milhões; Araújo, a pedra-de-toque em meio a essa tripulação de insensatos, é o terraplanista para quem o nazismo é de direita e Bozossauro é o Messias reencarnado cuida das relações exteriores a qual, suponho, eu ele imagina ser sexo ao relento. Isso tudo sem contar a inteligência de Heleno, o Napoleão da Esplanada ou levar-se em conta o perfil de hospício da base do governo no Congresso. O menos doido por lá baba na gravata.
    Então por quê, raios que os partam, não pode o 03 ser embaixador? Ser capaz de montar um Big Mac e sabe falar the book is on the table é muito mais currículo que ostenta a maioria. Isso é pura implicância com o pimpolho!

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