Porque anistiar o caixa 2 é mais fácil, por Helena Chagas

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – É justo punir um político que recebeu doação de uma empreiteira sem saber que o recurso recebido foi, possivelmente, extraído de desvios da Petrobras, por exemplo? Criar uma lei que separe o caixa oficial de campanha do caixa dois, para anistiar os políticos que usaram a contabilidade paralela apenas na eleição, não para enriquecimento pessoal, vai funcionar, ou cabe à Justiça decidir caso a caso?

As dúvidas em torno desse assunto são tantas que, por isso mesmo, os políticos de Brasília estão considerando anistiar tudo que já passou em relação ao caixa dois e fazer a lei valer para o que ocorrer daqui para frente.

É o que conta Helena Chagas em artigo publicado nesta sexta (28), que esclarece que, ao contrário do que pensa a opinião pública, o Congresso ainda não desistiu de aprovar a medida.

Por Helena Chagas

Câmara quebra cabeça para diferenciar caixas 1, 2 e 3

Em Os Divergentes

Caixa 2 não é propina – esse é o principal argumento de defesa de quase uma centena de deputados e senadores que serão citados nas delações que vem por aí, sobretudo a dos executivos da Odebrecht. Seu problema, agora, é aprovar a toque de caixa uma legislação que deixe isso claro, embutida no relatório do deputado Onyx Lorenzoni sobre o texto das dez medidas anticorrupção ou por emenda em plenário.

Ao principais lideranças do Congresso e suas assessorias estão quebrando a cabeça para encontrar esta fórmula sem usar a palavra anistia – que já ficou queimada em tentativa anterior e sofre bombardeio da mídia e da opinião pública.

Lorenzoni e seus colegas querem diferenciar o caixa 2 abastecido com recursos lícitos daquele que recebeu recursos ilícitos, que seria punido com pena maior. É como se fossem criar mais uma categoria de caixa, o 3.

Só que não será fácil distingui-los. Caberá à Justiça ou ao Ministério Público definir se os recursos tem origem lícita ou não, mas nem assim há garantia de que a norma vai funcionar e evitar abusos ou injustiças.

Afinal, dinheiro não tem carimbo nem carteira de identidade. O candidato que recebe uma doação, no caixa 1 ou 2, raramente tem condições de saber a origem do recurso, que pode ser resultado de desvios da corrupção ou de lucros lícitos. Será ele então punido por atos do doador anteriores à doação, e que ele desconhecia?

Estamos cansados de ver, na Lava Jato, doações legais usando dinheiro de corrupção. Os políticos que as receberam, descontados aqueles que estavam no poder para fazer favores aos doadores, têm responsabilidade sobre a origem ilícita de suas doações legais? Por exemplo: todos os que receberam doações das empreiteiras da Lava Jato oriundas de desvios da Petrobras participaram dos atos de corrupção?

Como se vê, não vai ser fácil separar o joio do trigo numa lei. É por isso que, nos bastidores, dez entre dez políticos ainda preferem a velha fórmula de criminalizar o caixa 2 e anistiar tudo o que veio antes – o joio, o trigo e o lixo.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

3 Comentários

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  1. Ninguém prestou atenção para a sentença do STF na AP 470

     

    Helena Chagas,

    Ao ler o seu artigo, eu lembrei de “Helena, Helena, Helena” de Alberto Land e cantada por Taiguara e que ganhou o primeiro lugar no “I Festival Universitário da Música Popular Brasileira”, promovido pela TV Tupi e pela Secretaria De Turismo da Guanabara em 1968. No entanto, não era bem essa canção que eu queria lembrar. A canção que eu queria lembrar era “Stella”, para perguntar “em que estrela você se escondeu”. Será que você não acompanhou o que aconteceu no Brasil no final de 2012 e início de 2013, mais particularmente no STF.

    Vou tentar mais bem explicar minha dúvida, transcrevendo aqui o comentário que eu enviei segunda-feira, 23/05/2016 às 00:38, para JB Costa junto ao comentário dele de domingo, 22/05/2016 às 15:43, enviado para junto de comentário meu enviado sábado, 21/05/2016 às 21:21, para junto do post “Aragão acredita em inteligência clandestina por trás da queda de Dilma” de sábado, 21/05/2016 às 11:29, aqui no blog de Luis Nassif e contendo a fala do ex-ministro da Justiça, Eugênio Aragão, em Ato pela Democracia e pela Legalidade, na Universidade de Brasília. O endereço do post “Aragão acredita em inteligência clandestina por trás da queda de Dilma” é:

    https://jornalggn.com.br/noticia/aragao-questiona-inteligencia-clandestina-por-tras-da-queda-de-dilma

    Em meu comentário enviado sábado, 21/05/2016 às 21:21, e que eu direcionei para VioMundo, de onde o vídeo da fala do ex-ministro da Justiça, Eugênio Aragão, parece foi obtido, eu deixei o link para a declaração do voto do ministro Enrique Ricardo Lewandowski proferido na sessão de 20/09/2012, na Ação Penal 470. Como em meu comentário para JB Costa eu faço menção a esta declaração sem indicar o acesso ao vídeo e assim, deixo a seguir o link no Youtube em que a declaração é apresentada e que é o seguinte:

    http://www.youtube.com/watch?v=m6uyOzTG2T8

    E o meu comentário para JB Costa e para o qual eu dei o título de “Vale a pena entender o lado bom do julgamento da AP 470 no STF” é o seguinte:

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    “JB Costa (domingo, 22/05/2016 às 15:43),

    Talvez depois da referência à queda dos investimentos no terceiro trimestre de 2013, o assunto que eu mais abordei aqui no blog de Luis Nassif foi certamente o novo entendimento do STF sobre o crime de corrupção que se verificou no julgamento da Ação Penal 470. Talvez você não tenha tido conhecimento sobre nenhum dos dois assuntos. Agora se você não tem conhecimento sobre esses dois assuntos qual seria o percentual de brasileiros que também o ignoram? E será possível que algum dia a grande maioria que ignora esses dois aspectos relevantes da história brasileira recente: o novo entendimento sobre o crime de corrupção no esteio do julgamento no STF da Ação Penal 470 e a grande reversão dos investimentos que ocorrera no terceiro trimestre de 2013, possa-os conhecer e os venha entender?

    Ainda que eu me tivesse enganado em dizer que houve um novo entendimento, uma grande discussão sobre esse tema seria necessária. E o Partido dos Trabalhadores deveria ter discutido isso mediante debates com participação de juristas e aberto ao público e apresentados em todo território nacional. Esclarecer, esclarecer, esclarecer é uma tarefa que a esquerda deveria assumir na integridade e a realizar diuturnamente.

    Não creio, entretanto, que eu esteja equivocado sobre esse novo entendimento. Aliás, se você perguntar a qualquer jornalista mais informado do PIG se o julgamento da Ação Penal 470 trouxe um novo entendimento sobre o crime de corrupção e equiparou o crime de caixa dois quando cometido por funcionário público que possuir ou vai possuir na sua área de competência uma gama muito grande de poderes, eles todos dirão que sim. O fato do PIG saber desse entendimento e pessoas como você não terem conhecimento dele foi uma das grandes falhas da esquerda.

    Enfurecemos a tal ponto com o comportamento do ex-ministro Joaquim Benedito Barbosa Gomes que acabamos esquecendo de um grande avanço para o combate da corrupção, em especial, quando a corrupção sé dá com políticos junto as empresas que os financiam na forma de caixa dois. Agora eles só poderiam financiar de modo legal e não de forma indevida, ou seja, mediante caixa dois.

    Se você tiver formação em Direito, basta assistir toda exposição do revisor da Ação Penal 470 no STF, ministro Enrique Ricardo Lewandowski, na sessão do dia 20/09/2012, e para a qual eu deixei um link no comentário anterior, para que seja aceito esse entendimento de o crime de caixa dois, quando tipificado por funcionário público com uma gama grande de poderes na função que ele exerce, configurar crime de corrupção.

    Disse que culpava o PT por não ter feito mais divulgação desse entendimento, mas considero que houve culpa dos blogs de esquerda por não detalhar com mais cuidado a decisão do STF. Ainda assim lembro que desde o primeiro momento em que ficou configurado esse novo entendimento e a esse novo entendimento foi dado o arcabouço jurídico na exposição do revisor ministro Enrique Ricardo Lewandowski do dia 20/09/2012, houve posts aqui no blog de Luis Nassif alertando para esse novo entendimento.

    Se não me engano, o primeiro post aqui no blog de Luis Nassif apresentando esse novo entendimento foi de Jotavê, ou JV, ou João Vergílio Gallerani Cutter. O post foi “Lewandowski expõe hipocrisia dos “garantistas” do STF” de sexta-feira, 21/09/2012 às 19:44, e pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/blog/luisnassif/lewandowski-expoe-hipocrisia-dos-garantistas-do-stf?page=1

    Logo de imediato eu não concordei com João Vergilio Gallerani Cutter. Minha internet era discada e eu não assistir a exposição do revisor na ação Penal 470, o ministro Enrique Ricardo Lewandowski. Só uma ou duas semanas após ver o vídeo é que eu passei a entender o novo posicionamento do STF. João Vergilio Gallerani Cutter é filósofo e sendo professor na USP tinha bons contatos na área do direito que o devem ter esclarecido todo o imbróglio.

    Uma das últimas vezes que eu comentei sobre esse assunto foi junto do post “A questão da escolha de Barbosa, por J. Roberto Militão” de quinta-feira, 19/06/2014 às 11:10, com texto de J. Roberto Militão, aqui no blog Luis Nassif, e que pode ser visto no seguinte endereço:

    https://jornalggn.com.br/noticia/a-questao-da-escolha-de-barbosa-por-j-roberto-militao

    Atualmente o post é encabeçado por comentário meu enviado sábado, 21/06/2014 às 13:42, para J. Roberto Militão e com resposta dele e réplica minha e uma tréplica a réplica dele. Do meu comentário eu retiro o seguinte trecho que ajuda a compreender o que foi decidido na Ação Penal 470 e porque a decisão correspondeu a equiparar o crime de caixa dois ao crime de corrupção quando quem recebe o recurso indevido exerce função pública com uma gama grande de poderes. Disse eu lá:

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    “E o segundo aspecto diz respeito ao fato de que você e Luis Nassif não mencionaram uma só vez o grande legado que o ministro Joaquim Benedito Barbosa Gomes deixou na sua passagem pelo STF e que consistiu em fazer prevalecer o sentido do Código Penal na tipificação do crime de corrupção passiva segundo o disposto no caput do Art. 317. Diz o Art. 317 no seu caput:

    “Art. 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:

    Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa”

    E assim, após o julgamento da Ação 470 no STF, o previsto no § 1º do Art. 317 do Código Penal é um crime complementar que não precisa ocorrer para que se tenha tipificado o crime de corrupção passiva. Diz lá o § 1º do Art. 317:

    “§ 1º – A pena é aumentada de um terço, se, em conseqüência da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou deixa de praticar qualquer ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional”.

    E que se diga na Ação Penal 470 no STF, ninguém foi condenado por retardar ou deixar de praticar qualquer ato de ofício ou o praticar infringindo dever funcional.”

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    Minha redação não é de jurista, apesar de ter formação em Direito, assim, antes, ao contrário do que eu disse, não era preciso que o ato fosse praticado ou a omissão constatada para se ter o crime de corrupção. Só que antes não se entendia o crime do caput do art 317 do Código Penal como um crime de mera conduta que se completa com a solicitação ou o recebimento de vantagem indevida. Foi isso que caracterizou a exposição do revisor da Ação Penal 470, Enrique Ricardo Lewandowski, apresentada no dia 20/09/2012. No crime de mera conduta o dolo é decorrente da própria conduta. Se se mostra que quem recebeu tinha algum poder para beneficiar quem entregou a vantagem indevida, a corrupção fica tipificada.

    E o importante é ressaltar que ninguém foi condenado pela prática de ato ou omissão de ato, crime previsto no § 1º do artigo 317 do Código Penal. Essa decisão foi um avanço da jurisprudência brasileira. Um avanço praticado pelo STF que na sua maioria era composto por membros indicados pelo PT. Apesar de o PT ter sofrido na carne pela decisão, havia um resultado benéfico para o avanço da justiça brasileira na decisão do STF sobre a Ação Penal 470 que o PT não poderia abrir mão como uma conquista do partido.

    ecomendo para mais bem entender o que eu disse acima não só assistir a exposição do revisor da Ação Penal 470, Enrique Ricardo Lewandowski, apresentada na sessão do dia 20/09/2012, como também ler os diversos links que eu deixo indicado nos meus comentários. Agora é muito tarde, mas ainda é melhor do que nunca.

    Tudo isso não quer dizer que eu não reconheça que a nossa justiça ainda está distante de ser justa. Aliás, o José Dirceu poderia escrever um livro cujo título seria “Minha condenação prova meu caso”. Nele ele diria que sem precisar de corromper o juiz Sergio Moro, ele mostrou que justiça brasileira trata com muita desigualdade os brasileiros. O caso dele seria mostrar que a justiça brasileira é injusta. E se saber de antemão para quem ela é injusta.

    Seria importante reforçar que o juiz Sergio Moro não agiu em conluio com Jose Dirceu, nem o juiz recebeu vantagem indevida para o condenar a 23 anos de prisão. A condenação dele é decorrência natural desse tratamento desigual da justiça brasileira. José Dirceu diria que ele teve que se corromper para que os empresários pudessem financiar o PT, pois se ele não se corrompesse os empresários não se sentiriam seguros de que depois eles fossem acusados por José Dirceu. E a situação só ficou ruim para o PT quando a presidenta Dilma Rousseff resolveu acabar com os procedimentos que garantiam o financiamento de campanha para os partidos do governo.

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    Há uns dois posts posteriores em que eu chego a tentar lembrar a minha resposta acima para JB Costa, se eu os conseguir encontrar, eu volto aqui para deixar o endereço deles.

    Clever Mendes de Oliveira

    BH, 28/10/2016

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