A sociedade dos corpos perfeitos
por Márcia Moussallem
Recentemente assisti ao filme “A Substância”, da diretora francesa Coralie Fargeat e premiado no Festival de Cannes em 2024 como melhor roteiro. O filme tem como destaque a personagem Elisabeth Sparkle (Demi Moore), uma celebridade que foi demitida do Programa Fitness na televisão. A personagem se desespera e decide buscar alternativas, no caso o uso de uma droga que lhe daria temporariamente uma outra versão, de uma mulher jovem, bonita e com o corpo perfeito.
A personagem transita entre a ilusão da promessa de ser “amada por todos eternamente”, na figura perfeita e jovem, e a escolha de ser “abandonada e viver sozinha”. O filme é impactante e extremamente atual.
É lamentável que o Brasil, de acordo com a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, é um dos países que mais realiza procedimentos estéticos (lipoaspiração, prótese para aumentar os seios, cirurgia das pálpebras, abdominoplastia, entre outros), estando em segundo lugar, atrás apenas dos Estados Unidos. Em 2023 foram mais de 2 milhões de procedimentos realizados.
Segundo especialistas e psicólogos, tais questões relacionam-se “ao que gostaria de ser, e o que é exigido pela sociedade”, bem como dificuldades em lidar com o mundo, a busca do corpo perfeito, estilos de vida criados pela cultura contemporânea, padrões de beleza ideais e a eterna juventude.
Por ouro lado, os números culturais no Brasil são vergonhosos. Conforme dados do IBGE, “a média de leitura do brasileiro está em apenas 1,8 livro por ano. 93% nunca foram a uma exposição de arte, 95% jamais entraram em um museu e somente 14% vão ao cinema. A cultura equivale apenas ao sexto lugar na lista de despesas das famílias brasileiras, correspondendo a uma média de 4,4% do total do rendimento familiar”.
Nessa arena em que grande parte das pessoas são cooptadas pela cultura do auto culto ao corpo, verificamos também o agravamento de doenças como síndrome do pânico, depressão, ansiedade e aumento do suicídio.
Impossível não refletirmos sobre esse fenômeno que só se agrava e que infelizmente muitos já foram sequestrados por ele e nem sabem, pois nada pensam e questionam sobre a sua vida e o caótico mundo em que vivemos.
Tudo é “normal” pois o que “faz bem” para a autoestima “vale sempre a pena”. E assim, é claro, a cortina de fumaça ideológica e cultural avança suavemente matando a beleza da alma.
*A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião do Observatório do Terceiro Setor.
Márcia Moussallem é assistente social e socióloga. Mestra e Doutora em Serviço Social (PUC/SP); MBA em Gestão para Organizações do Terceiro Setor. Professora Universitária. Publicou seis livros. Colunista do Observatório do Terceiro Setor.
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