As políticas públicas e os interesses espúrios, por Luís Nassif

Nesse terremoto institucional, o STF, redimido dos erros da década passada, torna-se o único instrumento de racionalização. Por quanto tempo?

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É curioso o embate entre o mundo onírico da teoria e o mundo prático da política. Dia desses, publiquei em um grupo de WhatsApp jogadas da Microsoft com o PSDB – na gestão de Paulo Renato de Souza no Ministério da Educação, e Maria Helena Guimarães na Secretaria da Educação em São Paulo.

A grande lobista da Microsoft era (e é) Maria Cristina Boner Leo, que em determinado período foi esposa de Frederick Wassef, o advogado de Bolsonaro.

Um dos participantes, economista conhecido, ficou indignado, dizendo que acusei a ambos de corrupção. Não adiantou explicar que os tratei como agentes do PSDB na arrecadação de fundos, assim como muitos membros do PT, do PL, do PSD. Nem que o MEC atual tentou emplacar um lobby de Jorge Paulo Lemann visando beneficiar a Starlink de Ellon Musk na digitalização das escolas na Amazônia.

O espanto e a indignação do economista, pessoa em geral tranquila, e muito enfronhada com o ex-PSDB, me passaram a mesma surpresa que teria vendo um adulto, de 50 anos, chocado quando soube que seus pais transaram para concebê-lo.

Na ocasião, discutia-se sobre as prioridades em políticas de educação. E era difícil para um teórico das planilhas aceitar que a maioria das políticas públicas são definidas de acordo com interesses explícitos ou sub-reptícios dos homens do poder.

Naqueles tempos, o MEC e a Secretaria da Educação de São Paulo fecharam acordos com a Microsoft para a compra do sistema Office, enquanto a nata do funcionalismo público usava softwares livres, que davam muito bem conta do recado.

No livro “Avenças e Desavenças”, Luiz Gonzaga Belluzzo e Nathan Caixeta discutem os fundamentos da economia dita científica. “Nasceu no século XVIII vestindo o manto de Economia Política tornou-se “Ciência Economica”. Na verdade, hoje e sempre ostentou e ostenta os poderes conhecidos da Política da Economia”, diz Belluzzo.

No livro “Poder e Progresso: uma luta de mil anos entre a tecnologia e a prosperidade”, de Daron Acemoglu e Simon Johnson, os autores, Prêmio Nobel de Economia, mostram que desde os primeiros movimentos de mercado, as decisões sobre novas tecnologias sempre obedeceram aos interesses da classe dominante.

Mas sempre há a necessidade de forjar uma explicação “científica” ou mesmo social para as decisões.

Agora mesmo, porta-vozes do tal mercado advogam cortes de despesas para combater a inflação, porque “os pobres são os maiores sacrificados”. Para salvar os “pobres”, eles propõem, então, corte de benefícios sociais, reforma na Previdência Social, nos Benefícios de Prestação Continuada, nas regras de aposentadoria do INSS, nas regras de reajuste do Bolsa Família. Tudo para salvar os “pobres”.

Tome-se o caso da educação. Em São Paulo, a maioria das escolas estaduais não têm sequer bibliotecas. Mas o Secretário da Educação quer fazer uma grande licitação de computadores.

A diferença entre países que dão certo, e os que naufragam na irracionalidade, está na existência ou não de um núcleo racional, composto por lideranças da sociedade civil, do meio empresarial, dos trabalhadores e movimentos.

O país – refletindo a onda mundial da ultradireita – está em um vácuo político. Cobra-se muito o presidente da República e o Ministro da Fazenda – e essas cobranças são importantes. Mas tem que se levar em conta que ambos caminham sobre o fio de uma navalha, acossados pelo Congresso, pelo mercado e por grandes interesses particulares.

Nesse terremoto institucional, o Supremo Tribunal Federal, redimido dos enormes erros da década passada, torna-se o único instrumento de racionalização. Mas por quanto tempo? Aqui e ali vêem-se movimentos de resistência, iniciativas visando organizar minimamente a periferia, fortalecer direitos humanos, montar uma frente civilizatória.

Mas esses movimentos têm que ganhar musculatura nos próximos anos, sob o risco do país cair nas mãos do que pior a política brasileira já criou.

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13 Comentários

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  1. “Tome-se o caso da educação. Em São Paulo, a maioria das escolas estaduais não têm sequer bibliotecas. Mas o Secretário da Educação quer fazer uma grande licitação de computadores.”
    Biblioteca? Jovens usam meios digitais pra acesso à informação.

    1. Jovens usam meios digitais para jogos, zoeira, pornografia, etc. Informação? Trabalho como terceirizado em uma escola estadual, aqui na Bahia. Jovens acessando informação? Na véspera de avaliações e atividades, tome control-c e control-v. E na hora de entrar na sala de aula, passam antes na secretaria para grampear os “trabalhos”.

    2. Na Suéci as escolas passaram a usar computadores e telemóveis para ensinar e o resultado foi péssimo sob todos os aspetos. Este ano, os livros e as idas às bibliotecas voltaram, segundo os próprios alunos, os livros são mais completos e não há a toda hora anúncios dizendo compre isto, compre aquilo.

  2. Ledo engano, o STF está massacrando os trabalhadores e servidores com decisões que retiram direitos, há pouco permitiram o libera geral com a permissão de contratação via CLT indistintamente, segundo alguns fulminando o regime único e a estabilidade….

  3. Não, eu não estou vivo para ler isso.

    Não.

    Eu vou olhar de novo.

    Oxi.

    Não é que está escrito mesmo?

    “Erro”?

    Sem comentários.

    Racionalidade?

    Onde?

    Além de manterem o mesmo protagonismo legislativo e a necessidade de se alimentarem pela mídia, vamos aos fatos, ou o que Nassif chama de prática ou realidade.

    Vamos a um singular exemplo:

    Revisão da vida toda INSS?

    Tome racionalidade no fiofó dos pobres aposentados.

    Possibilidade de contratação de servidores por regime CLT?

    Olha a racionalidade aí, gente, chora cavaco.

    Chora trabalhador.

    A “racionalidade” do STF, como toda racionalidade (o que seria racionalidade?) é seletiva e, como disse o próprio texto, busca legitimar narrativas de interesses (sempre de classes).

    Ora, chamar de racional quem nós trouxe até a irracionalidade, e dizer que o fizeram por “erro” é um tetra tuíste carpado para trás.

    Foi o STF o cúmplice indispensável, ou seja, co-autor do golpe de 2016.

    Foi o STF e o TSE que permitiram que personagens que incendiaram o que restava de “racionalidade” na República virassem governo(poder a direita sempre foi).

    A desculpa?

    Não interferir no jogo político e macular a distância entre poderes.

    Uai, mas e antes? No golpe? Não havia essa “racionalidade”?

    700 mil mortos?

    Tome “racionalidade” e nenhuma palavra ou gesto do STF, naquele momento, resguardado em sua racional distância (sempre seletiva) dos fatos.

    Na verdade, tenho que render tributos à lógica do Nassif.

    Sim, há uma racionalidade do STF e de todo poder judiciário em qualquer canto capitalista do planeta:

    Garantir privilégios dos ricos e manter os pobres sob o tacão dos deveres, sem direitos equivalentes.

    Ah, antes que esqueça:

    800 a 1 milhão de presos em masmorras judiciais, maioria sem pena definitiva, maioria pobres e pretos e nada, só promessas de “racionalidade”.

    Ahh, mas há sobrecarga nós juízes?

    Como assim, não são deuses remunerados com rendas e oferendas equivalentes a renda 20, 30, 40 mortais, sem mencionar os que sequer têm renda?

    Quem ganha tanto tem que trabalhar por 20, 30, 40.

    6 por 1, não?

  4. Se dentro de uma “racionalidade” de causa e efeito, considerando que TODAS as facções criminosas armadas que apavoram o país se formaram nas cadeias, e o poder judiciário é quem alimentou (e alimenta) esse fluxo, e mantém essa multidão de gente atrás das grades, por ineficiência em julgar e analisar a possibilidade de liberdade da maioria deles(presos por crimes menores e ou tráfico sem violência), podemos dizer que essa omissão foi produtora da mão e obra dessas falanges.

    Capitão Nascimento diria:

    “O sistema é f*da, parceiro!”.

    1. PS:alimenta o fluxo, retém o estoque de presos e sequer fiscalizar e muda as condições desumanas dos cárceres, principal fator de surgimento das facções, como sistemas paralelos de defesa dos direitos dos presos.

      Claro que é um argumento parcial e falso, mas se eu fosse preso, ficava com ele, e vocês, esperariam o CNJ?

      Ou a vara de execuções e o MP?

    2. A maior maluquice foi aprovar a adin dos guardas municipais, que hoje agem como outra polícia militar,hoje sentar numa praça a noite é um inferno, com todas as câmeras de reconhecimento facial por todo lado , sentou lá vem guarda querendo da geral, prá quem nao sabe os guardas foram e são instruídos e ensinados por polícias militares, agora imagina quando o dinheiro digital que Lula quer colocar logo em circulação vier, será que a ditadura vem fácil?

      1. E que na minha cidade deu em desastre, às quatro e meia da tarde do dia 8 de agosto de 1963, quando foram executados, pai e filho à porta da Prefeitura, respectivamente, o deputado federal Euclides Paes Mendonça e Antônio de Oliveira Mendonça. Pela Polícia Militar do Estado de Sergipe, “dando proteção a uma passeata de estudantes”.
        Euclides era tio de João Carlos Paes Mendonça, dono do Grupo Bom Preço. E havia recriado a Guarda Municipal com total poderes de polícia, batendo de frente com a PM do Estado.

        1. José, Dilma fez o estatuto dos guardas sem nenhuma necessidade, aqui começou a loucura, imagina você dar poder para pessoas que gostariam de ser policial nao conseguiram e vão para guarda, porque fica claro, que querem é poder mesmo, quando a bater de frente com a PM isso ja acontece, só ver no YouTube, é pior, até em entradas de rodovias federais tbm ficam, hoje, a guarda é pior que a polícia, o prefeito hoje é um verdadeiro imperador, entra governo Lula e a adin dos guardas passa pelo STF, ou Lula acaba logo com isso,ou que é um inferno com a PM, será 2 infernos com guarda, mas acho difícil porque o PT é a socióloga do Rio quer transformar guarda em polícia, será uma tragédia.

  5. Estamos nessa situação justamente porque o STF embarcou em tudo, desde a tercerizacao irresponsável, o fim do sigilo bancário, aprovou tudo que a lava jato fez, armou guardas municipais que hoje agem como polícia, sem nenhuma necessidade, poderia escrever um livro sobre o que o STF fez, e que nos trouxe até esse caos,

    A pergunta é, o STF vai mudar o que o stf fez?

    Se resposta for nao, então nao têm nem discussão, e Olha que nem vou falar de Manaus na pandemia, todos os Responsáveis estão soltos e continuaram.

  6. O STF me lembra a definição do morfe e assopra. Em momentos positivos, não se furta ao assopro e se alia ao engajamento que salva o país, da ameaça contra o estado democrático de direito. Em outro momento tentando justificar o injusticavel chega a dizer que não são que votam, mas sim as suas cadeiras. Sei muito bem que cadeira não recebe e nem usa penduricalhos, que também nunca recebeu auxílio moradia e nunca sugeriu trocá-lo para ter um índice de reajuste de seus vencimentos acima do mal e do bem.
    No caso da Revisão da Vida Toda, eu penso que quando ouço as justificativas de alguns ministros do STF sobre sua posição contrária aos aposentados e favoráveis ao INSS, sobre o Tema 1102 da Revisão da Vida Toda, eu os imagino como se eles estivessem atolados em um buraco com areia movediça. Afinal, quanto mais se justificam ou tentam explicar o que não se explica parece que afundam mais ainda na areia movediça.Afinal, o fato de tentar explicar o que não se explica, para mim indica ser uma grande maldade consciente.
    Também penso que se afundam ainda mais, em suas simbólicas areias movediças da prepotência e deixam impressão que distorcem e impõem suas vontades contra um mérito que já consolidou a não admissão de mudança, segundo declarações de alguns de seus pares e de outros profissionais da justiça que entendem da lei , tanto quanto eles.
    Também penso que se afundam ainda mais, em suas simbólicas areias movediças da parcialidade e deixam entender existir uma explícita tendência em favor do INSS. Tendência entendida, que os conduzem a passar pelo vergonhoso vexame da replicação de uma grave mentira sobre a previsão de um suposto rombo de R$480 Bilhões de Reais, quando na verdade o valor de fato e de direito, a ser devolvido na revisão, terá o custo de R$3,8 bilhões de reais que é um pouco menos de 1%, dessa indecorosa Fake News. Para aumentar o vexame, os R$3,8 bilhões de reais (1% da lorota do rombo) ainda serão parcelados em 10 anos.
    Também penso que se afundam ainda mais, em suas simbólicas areias movediças da irresponsabilidade, ao replicarem informações sérias e importantes com conotação alarmista e indigna, sem se darem o trabalho de sequer conferir a sua autenticidade e veracidade. Logo, aqui também parece haver rastros de uma parcialidade em consequência da pronta rapidez e dedicação com que foram aceitas palavras ao vento, sobre o suposto rombo de R%480 Bilhões de Reais, sem tivessem o cuidado com a responsabilidade necessária de investigar, analisar e conferir aquilo que Iriam replicar em plena sessão da Corte.
    Existe, ou não, uma aparente impressão de não se importarem com a segurança jurídica, com seus currículos, com a imagem da Corte e muito menos com os direitos legítimos de todos que contribuíram por 5, 10, 15 ou até mais de 20 anos anteriores ao ano de 1994? O fato de não reconhecerem o direito que os aposentados que tenham processos abertos dentro do prazo e com todas as exigências cumpridas mostra o cavalo de pau que constantemente atropela os direitos de que cumpre a lei, os deveres e os pagamentos compromissados. Penso que também não se importam com aqueles que conquistaram os seus maiores salários justamente no período anterior a 1994. Não se importam com aqueles cujo tempo de contribuição anterior a 1994, além de conter os seus maiores salários também ultrapassam mais da metade do período teto para a aposentadoria integral, que é de 35 anos de contribuições.
    Porém, o pior é parecer não existir sensibilidade da parte deles. Basta fazer um retrospecto de todo esse tempo em que o processo vem se arrastando, todo tempo vendo uma infinidade de processos mais recentes passarem a frente e todo tempo assistindo a indiferença do Poder Judiciário, que nos deixa entregues a própria sorte ou a própria tragédia. Agravam ainda mais o sofrimento, a ansiedade, a decepção, o sentimento de traição, de injustiça, de abuso, de apropriação indevida e da constatação de que o trabalhador honesto, cumpridor dos seus deveres e das suas responsabilidades com a lei e o trabalho é sempre o culpado, o otário, o Zé Mané, o mais prejudicado nas revisões, nas mudanças de planos econômicos, nas políticas anti-inflacionárias e também de todos os históricos fracassos governamentais que precisam encontrar alguém para o sacrifício e para bancar a incompetência oficial.br.
    Então fica a pergunta, que ninguém responde:
    – onde está a mesma volúpia para enquadrar e receber a dívida de pouco mais de R$150 Bilhões de Reais, que as 500 maiores grandes empresas devedoras tem com o INSS?
    – porque, pelo menos, não cobram os 5 (cinco) maiores bancos no Brasil, que devem quase R$10 bilhões ao INSS? O valor é quase três vezes o necessário para devolver o calote da apropriação do INSS com os contribuintes e só no 3º de trimestre o lucro líquido deles chegou perto de R$30 bilhões de reias e parece que falta coragem de falar grosso com eles e cobrar o que é direito do INSS receber. Com aposentados se apropriam descumprindo regras e normas e ainda impõe terror com Fake News alarmistas, distorcem interpretações e, pasmem, contradizem seus próprios julgamentos de méritos. Tudo isto para dar um calote nos velhinhos trabalhadores. Muitos já em final de vida estão conhecem o sabor amargo da traição, da covardia e do abuso de poder.
    E para que? – nem eles sabem, mas desconfio que seja para afirmação e talvez para poder tomar decisões acima da lei, encantar ao ego, a si mesmos e (quem sabe?) sob a garantia fiel de um corporativismo arrogante, irresponsável e perigoso.

  7. O mal que acompanha o honesto é que sempre estará em desvantagem frente ao malandro, porque, o honesto obedece acordos, padrões, leis. Já o malandro só obedece a sua vontade. Que muda como mudam as nuvens.

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