Peça 1 – o austericídio alemão
A Alemanha vive seu pior momento no pós-guerra. O país, que já foi um dos motores do desenvolvimento mundial, parou. O país que, em outros tempos, dominou a indústria química, a elétrica, a siderúrgica, que inovou nas relações trabalhistas, parou. Não conseguiu avançar na digitalização, das novas tecnologias, derrotado pelas políticas de austeridade de Ângela Merkel – aliás, com autocrítica dela própria em sua recém-lançada biografia.
Deixou de investir em ciência e tecnologia, em inovação, em startups. Mais que isso, a partir da crise de 2008 impôs o padrão austericida do Deutsche Bundesbank a toda a União Europeia. Com o mercado europeu encolhendo, ampliou relações comerciais com China e Rússia, tornou-se dependente do gás russo. A falta de perspectivas, de melhoria da vida interna enfraqueceu o sucessor de Merkel, Olaf Scholz, que buscou o álibi de todo governante fraco: inventar um inimigo externo.
Envolveu o país na guerra da Ucrânia, afastou-se dos dois parceiros comerciais, foi afetado pela destruição do Nord Stream 1, o gasoduto que trazia gás da Rússia; não autorizou o Nord Stream 2, depois de investimento de bilhões. O austericídio matou as principais bandeiras do Partido Social-Democrata e, agora, a Alemanha está prestes a ser tomada pela ultradireita.
Peça 2 – o austericídio brasileiro
Questões climáticas elevam a inflação interna. Imediatamente amplia-se mais ainda a grita por aumento da taxa Selic. A taxa passa a 11,25% ao ano, com perspectiva de escalar mais ainda. Para esse nível, para estabilizar a relação dívida/PIB o superávit primário deveria subir para 1,5%, segundo a Instituição Fiscal Independente. Mas pode ir para 13%, para 15%.
Provavelmente abortará o crescimento do PIB de 2025, depois da boa surpresa de 2024. Empresas que estavam batendo na sua capacidade instalada, vão suspender investimentos: é mais rentável e seguro investir em títulos públicos. E haverá uma explosão de novas recuperações judiciais das pessoas jurídicas e de inadimplência das pessoas físicas, implodindo a indústria de fundos multimercados.
No terceiro trimestre de 2024, o país registrou 4.408 empresas em recuperação judicial, crescimento de 10,5% em relação ao mesmo período do ano passado, recorde histórico. Em outubro, o país registrou 68,1 milhões de consumidores inadimplentes, cerca de 41,2% da população adulta, 1,13% a mais que no mesmo período de 2023.
Aí, o CEO do Verde Asset, Luis Stuhlberger, depois de várias apostas erradas, proclama que o problema é o déficit nominal do governo. “Só Ucrânia, Rússia e Israel, países em guerra, têm déficit tão alto quanto o Brasil”, afirmou em entrevista ao Estadão. Como se sabe, o déficit nominal inclui os juros. Sem a conta de juros, a situação fiscal é equilibrada. E qual a saída? Mais juros.
Os bancos praticam taxas de spread suicidas. Se não houver tomador, não há problema: existem as operações compromissadas, pelas quais o Banco Central recolhe as sobras dos bancos e remunera pela CDI (Certificado de Depósito Interbancário).
E assim la nave va.
Peça 3 – a estratégia
A estratégia do governo é repetir o Lula 2: três anos de austeridade, para colher os frutos no quarto ano. A partir do próximo ano, o Banco Central estará nas mãos de um presidente racional e competente, que não repetirá as declarações irresponsáveis de Roberto Campos Neto e, se tudo for bem sucedido, certamente não trará a Selic de volta a um dígito.
Em 2008 houve um boom das commodities, que trouxe receitas adicionais extraordinárias ao país. As sobras serviram para atender o mercado e permitir políticas públicas criativas.
Agora, há a perspectiva de uma guerra comercial, comandada pelos Estados Unidos. Mais que isso. A variável de ajuste, na política monetária, é o câmbio. Aumentando os juros, entram mais dólares, ocorre uma apreciação do real reduzindo os preços dos produtos comercializáveis – e aumentando a insegurança para o investimento produtivo, que é o que realmente interessa.
Agora, o governo Trump promete, de um lado, aumentar as tarifas de importação; de outro, reduzir a tributação sobre as empresas. Mais tarifas, mais inflação, mais juros; menos impostos, mais lucros, mais dividendos. Nos dois casos, os EUA serão um sorvedouro de dólares, trazendo um complicador a mais para a política monetária: as taxas de juros não responderão apenas às altas de preços, mas aos movimentos de juros nos Estados Unidos. E cada espirro de Trump, ou de Ellon Musk, sacudirá o mercado.
Peça 4 – o perigo atrás do muro
Analise todos os fatores que impediram o golpe de Bolsonaro. Um dos principais foi a formação do Alto Comando e a falta de consenso em relação ao golpe.
Mas a operação da PF afastará definitivamente Bolsonaro e deixará o bolsonarismo em mãos mais hábeis, como Tarcísio de Freitas. Em pouco tempo no governo de São Paulo, Tarcisio transformou a Polícia Militar em uma máquina de matar, politizou a organização, promoveu uma queima dos principais ativos públicos, tentou investir sobre a USP, a Fapesp e, agora, a Fundação Padre Anchieta. É um desastre administrativo.
O que um presidente como ele, ou como Romeu Zema, ou como Ronaldo Caiado, fariam com a democracia brasileira, depois dos ensinamentos sobre o fracasso do golpe de Bolsonaro? O que fariam com o sistema de promoção das Forças Armadas ou mesmo com a instituição do Alto Comando?
A mídia transformou uma gestão amplamente medíocre de Tarcísio, em um governo modelo. A operação da PF contra o golpe tem merecido ampla cobertura por ser novidade, e por ser Bolsonaro. Não há nenhum sinal de que a imprensa tenha aprendido os valores democráticos, mesmo passando o que passou no governo Bolsonaro.
Por outro lado, os grandes grupos nacionais – os novos poderosos – sonham com um governo que lhes entregue a Petrobras e os bancos públicos.
Há um tigre faminto atrás da porta. Mas julga-se que viabilizando o arcabouço fiscal, todos os males serão afastados.
Peça 5 – os trunfos do país
Paradoxalmente, o país vive sua grande oportunidade, com a transição energética e com a aproximação com a China. Todos esses fatores exigem mudanças radicais no governo.
Há tempos cobra-se aqui um Plano de Metas, com metas e prazos definidos, com formação interministerial e com participação da sociedade civil, tal como foi o Plano de Metas de JK ou o New Deal.
Há dois protótipos iniciais que poderiam servir de modelo. Um, os estudos apresentados pela comunidade científica no 5o. Encontro Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação. Outro, as comissões montadas entre o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio e a China, para analisar os pontos de colaboração entre ambos os países.
Os temas definidos podem servir de base para um planejamento muito mais abrangente, no qual as possibilidades de parceria com a China sejam apenas um componente.
Contra o empreendedorismo individual da ultradireita, há o empreendedorismo colaborativo que poderia ser abraçado pelo governo, na forma de Arranjos Produtivos Digitais, estímulo ao cooperativismo, parceria com o sistema S e com as associações de classe.
Mas esse trabalho exigiria uma reforma ministerial que injetasse imaginação e iniciativa ao governo. Por enquanto, o que se vê são ministérios sociais e culturais acossados pela falta de verbas, espalhando o desânimo até em setores historicamente ligados a causas progressistas. Como ocorreu, aliás, com a Social Democracia alemã.
Há uma contagem regressiva para 2026. E uma bomba nas eleições de 2026, que poderá implodir o que resta de sonho brasileiro.
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Repetindo, ad nauseam:
“Não se negocia com o tigre, enquanto estamos com a cabeça em sua boca”, por Winston Churchill.
O governo Lula III está morto.
O PT idem.
Não há, nem nas instituições, nem no campo da luta política extramuros institucionais (os chamados movimentos sociais) qualquer suspiro de capacidade e coragem para fazer o debate necessário, eu repito, debate, quiçá a luta.
Quando se coloca essa demanda, boa parte da chamada “esquerda” brada: “ai meus deus, se falarmos algo contra o mercado, ou alguma heresia contra os cânones econômicos, será o fim”…
Ou pior, alguns ainda dizem: “tá pensando que a revolução está na porta, que irresponsabilidade é essa?”
Pois é…
A morte pela autocensura…a interdição pura e simples…
O office boy da faria lima, Fernando Haddad, está cumprindo o papel dele: acabar com o que resta da economia brasileira.
Está cada vez mais próximo o momento de declarar que:
ESTE GOVERNO ESTÁ ACABADO!
“Aumentando os juros, entram mais dólares, ocorre uma apreciação do real reduzindo os preços dos produtos comercializáveis – e aumentando a insegurança para o investimento produtivo, que é o que realmente interessa”….
Nassif, essa parte ficou confusa. A apreciação do real não seria ruim em um momento de pressão inflacionaria, principalmente no setor alimentício (carne está cara). E mesmo setores com produção excedente continuariam sendo competitivos mesmo com alguma queda do dólar. Além do que fica difícil pro setor industrial, com o dolar nesses níveis, renovar ou ampliar seus maquinários de produção.
Acontece que com o dólar nesses níveis não há por que investir em larga escala, pois o valor do dólar tira a competitividade. No momento em que escrevo a taxa real (Ipca, Igpm) de câmbio está em torno de R$ 1,20.
Se a aquisição de equipamentos sobe com a alta do dólar ela pode ser diluída à medida que a escala de produção se eleva. Mas para a escala se elevar é necessário a selic mais baixa e o dólar mais alto.
Perfeito.
Depreciação cambial sobre o preço interno das comoditties, pressionando a inflação e justificando mais alta de juros.
Assim a tunga vem pelos juros, pelo preço (da carne, por exemplo) e por fim, na regressão dos tributos sobre os mais pobres.
Deteriorada a economia pelo aumento da dívida pública pelo aumento dos juros, calabouço fiscal neles, e mais pobreza e piora dos serviços aos pobres e das redes de proteção social-previdenciaria…menos renda, menos consumo, menos tributos.
Ah, exportadores de comoditties não recolhem ICMS, afundando os estados onde estão.
Um belo futuro adiante.
Sobe e não sobre o preço
Exatamente. Para evitar os efeitos colaterais, antes, seria necessário o fechamento da conta capital e financeira.
Tudo isso é perigo real e imediato. E que só não se confirmará se houver um grande golpe de sorte.
Ou habilidade política, na hora certa. Que ninguém sabe qual será. Os perigos vêm de muito antes
Este artigo resume o que estamos passando:
https://www.viomundo.com.br/politica/mauro-lopes-a-cumplicidade-passiva-e-ativa-do-governo-lula-com-as-taxas-definidas-pelo-bc.html
O original foi publicado na Revista Fórum. Haddad, em seis meses como prefeito em 2013, jogou o fósforo na gasolina que possibilitou as confusões de junho/julho de 2013, com a sua recusa em dialogar a respeito de transporte público. Até hoje não fez a devida mea culpa a respeito, assumindo que sua incompetência política gerou tudo aquilo. No quadro atual, Haddad é mais complicado que Pallocci o foi no Lula1, pois é um crente no que faz, julga que o que faz é uma expressão da racionalidade técnica e, em consequência, como em 2013, despreza intelectualmente todos os que lhe criticam. Pallocci é, e sempre foi e será, apenas um oportunista hipócrita, como todos os oportunistas, querendo ganhar dinheiro e se cacifar para ganhar mais.
O Haiti, quase foi aqui…Tarcísio esteve na reunião do golpe. Confirmado! Thays Bilenky do UOL confirmou. Ficou por por 2 horas aproximadamente. Com certeza não estava discutindo amenidades no final do mandato de Bolsonaro em 120 minutos a portas fechadas com a rapaziada da boy Band dos Kids pretos. Em tese, se lá esteve e não comunicou a situação às autoridades, prevaricou. Impossível q o governador tenha sido excluído dessa quartelada. Era o homem de confiança dos generais, os Cardeais do Haiti e responsável pela movimentação das tropas naquele pais.Seria peça chave em todo o processo de logística da quartelada pela experiência no DENIT e na Minustah.