Terceirização, Morte e “Modernização”, por Leo Vinicius Liberato

Lourdes Nassif
Redatora-chefe no GGN
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Terceirização, Morte e “Modernização”

Leo Vinicius Liberato*

Diante de todo o conhecimento acumulado sobre as implicações da terceirização à segurança e saúde dos trabalhadores, a aprovação na Câmara dos Deputados do PL 4330, que sob pretexto de regulamentar a terceirização foi elaborado para permitir sua expansão, pode nos dizer muito sobre os rumos que nossa sociedade está trilhando.

Tema incontroverso entre pesquisadores da área de Segurança e Saúde no Trabalho (SST), todas as pesquisas e dados – eu disse todas – apontam relação e correlação entre terceirização e acidentes, mortes e agravos à saúde do trabalhador. Mesmo quando se analisa uma mesma atividade, em um mesmo setor, os acidentes e mortes de trabalhadores terceirizados são proporcionalmente maiores do que dos contratados diretamente. A título de ilustração, é bom lembrar que os relatórios do CREA-RJ, da ANP/Marinha, e da CPI da ALERJ sobre o acidente da plataforma P-36 da Petrobrás, em 2001, recomendaram o fim da política de terceirização da empresa. Mas por que a terceirização é um fator de aumento de acidentes, mortes e agravos?

Existem várias explicações mais detalhadas que não caberiam neste espaço. Mas podemos dizer, muito sinteticamente, que a terceirização é um modo de gestão da força do trabalho que resulta ou amplifica certas características da organização do trabalho que por sua vez aumentam e geram riscos. A organização do trabalho diz respeito à forma como é dividido o trabalho, às formas de controle, às hierarquias, às formas de remuneração, aos ritmos, às relações dos coletivos de trabalho etc. Como sabem os profissionais de SST, o controle de riscos e a prevenção de acidentes e agravos devem incidir tanto na concepção quanto na execução, e um dos elementos dos quais eles devem se ocupar é a organização do trabalho. Ora, como dissemos, todas as pesquisas e dados apontam a terceirização como amplificadora e geradora de riscos, por isso ofende a lógica, o bom senso e valores humanos que um Projeto de Lei tenha como próprio objeto expandir um fator de risco que implicará em aumento do número de mortes, mutilações, sequelas e doenças, em um país que já é o quarto em mortes por acidentes de trabalho. E para os que não se sensibilizam e acham que a vida tem preço, a terceirização é, nesse sentido, uma forma de reduzir custos externalizando suas consequências mórbidas ao trabalhador e à previdência social.

Não era o seu objetivo, mas o PL 4330 pode ser uma boa oportunidade para levantar a discussão de modo que a sociedade se mobilize para eliminar toda terceirização, pois suas consequencias à vida dos trabalhadores não condizem com nenhuma ideia sensata de “modernização”, como propugnam defensores desse PL.

Voltando à questão dos rumos que trilhamos, não é difícil concluir que uma sociedade de posse do conhecimento de que uma determinada forma de gestão da força de trabalho gera mortos e mutilados, e mesmo assim aceita ou decide difundi-la, certamente não caminha para uma modernização, mas sim para a barbárie.

*Leo Vinicius Liberato é Doutor em Sociologia Política, Engenheiro Químico e tecnologista da Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho.

Lourdes Nassif

Redatora-chefe no GGN

13 Comentários

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  1. A terceirização é pior que a escravidão!

    Na escravidão o escravo sabia contra o que lutava,com terceirização a treva é total.Então precisamos chamar o bicho pelo nome certo,terceirização é escravidão.E pronto.

  2. FIESP

    O texto diz que a terceirização “…implicará em aumento do número de mortes, mutilações, sequelas e doenças”. Aí eu pergunto: como pode o presidente da FIESP declarar apoio a esse PL, sendo que ele é o chefe da Serviço Social da Indústria de SP? “Social”. Entenderam?

  3.  Caro Naasif, do blog da

     Caro Naasif, do blog da Milly:

    “Os Estados Unidos não têm uma CLT como a nossa, por isso o país é a terra dos sonhos de qualquer empresário ou diretor de corporação. No país do consumo, contrata-se e manda-se embora de forma muito mais livre e dinâmica; sem indenizações, registro em carteira, férias remuneradas, fundo de garantia, 13o etc etc etc. De forma geral, a demissão só fica complicada para o lado do patrão e da empresa se o demitido alegar ter sido vítima de algum tipo de discriminação. Não sendo isso não tem tempo feio (para quem demite).

    O trabalhador americano praticamente não tira férias e outro dia, durante um curso de economia que eu estava fazendo, quando o professor falou para a classe de americanos que no Brasil um trabalhador tem direito a 30 dias de férias remuneradas por ano metade da turma quase caiu de cadeira em incredulidade. Eles não sabiam que isso existia, e eu não estou exagerando.

    Para a direita brasileira, as leis trabalhistas americanas são invejáveis porque são flexíveis, e todos os esforços estão concentrados em imitá-la já que, afinal, ela faz a economia andar porque o trabalhador, sem o rigor das exigências trabalhistas, não é um ônus para a empresa.

    Então, enquanto o Brasil se prepara para copiar os Estados Unidos e aprovar — quem sabe nessa quarta-feira 22 de abril — a chamada lei da terceirização, que libera a sub-contratação sem limite por parte de qualquer empresa, e assim dar uma rasgadinha na CLT, vale passar um pente fino na atual sociedade americana, essa que nossa direita que agora comanda Congresso e Senado tanto admiram, e ver como eles estão.

    Para que não haja ramirrami vou usar como fonte a revista Scientific American, uma publicação científica.

    Em matéria publicada na edição de 31 de março (“Economic Inequality: It’s Far Worse Than You Think”, ou “Desigualdade Econômica: é muito pior do que você pensa”) o jornalista Nicholas Fitz coloca a desigualdade, e a falta de noção da população sobre ela, em números, citando no decorrer do texto as mais recentes pesquisas feitas sobre o tema.

    Ele escreve: “O americano acredita que os 50 mais ricos têm 59% da riqueza, e que os 40% mais pobres têm 9% da riqueza. Mas a realidade é um pouco diferente. Os 20% mais ricos têm mais de 84% da riqueza do país, e os 40% mais pobres têm, em conjunto, 0,3% da riqueza. A família Walton [dona do Walmart], por exemplo, tem mais riqueza do que 42% das famílias americanas somadas”.

    Já seria estarrecedor, não apenas pelo tamanho da desigualdade, mas pela falta de noção da população a respeito dela (até porque que esse tipo de informação não dá no “New York Times” e nem no “Jornal Nacional”), mas tem mais, ou como conta Fitz usando as palavras da jornalista Chrystia Freeland: “Os Americanos na verdade estão morando na Russia enquanto acreditam viver na Suécia”.

    Em outro estudo, esse feito no ano passado, uma empresa de pesquisa perguntou a 55 mil pessoas de 40 países quanto eles achavam que CEOs e trabalhadores ganhavam, e, depois, quanto eles deveriam ganhar. Os americanos estimaram que um CEO ganhava 30 vezes mais do que o trabalhador normal, mas disseram que essa diferença, num mundo mais justo, deveria ser de sete para um.

    A realidade: um CEO ganha hoje nos Estados Unidos 354 vezes mais do que o trabalhador médio. Há 50 anos essa diferença era de 20 para 1.

    E, no final da matéria, o golpe de misericórdia.

    Embora a situação esteja bastante grave, 60% dos americanos acreditam que a maioria das pessoas pode alcançar o sucesso, para isso basta esforço e dedicação. A beleza do “sonho Americano”, esse que faz com que os Estados Unidos sejam considerados o país mais sedutor do planeta.

    Mas a dura realidade desmonta a farsa: Os Estados Unidos são hoje o país mais desigual entre as nações ocidentais (não sou eu que estou dizendo, são pesquisas divulgada pela Scientific American cujo link segue no final desse texto). “E para piorar os Estados Unidos têm menos mobilidade social do que Europa e Canadá” escreve Fitz.

    Em resumo: o menino sonho americano está morto.

    “A gente chama de ‘american dream’”, disse o comediante George Carlin citado por Fitz, “porque é preciso estar dormindo para acreditar que ele existe”

    E Fitz segue.

    “Como os sociólogos Stephen McNamee e Robert Miller Jr. mostram em seu livro ‘The Meritocracy Mith’ (O Mito da Meritocracia) os americanos acreditam que o sucesso vem do esforço individual e do talento. Ironicamente, quando o termo ‘meritocracia’ foi usado pela primeira vez por Michel Young no livro ‘The Rise of Meritocracy’ ele foi usado para criticar uma sociedade comandada pela ‘elite talentosa’. Young gostaria que a frase parasse de ser usada porque ela assegura o mito que diz que aqueles quem têm poder e dinheiro têm poder e dinheiro porque merecem (e os mais sinistros acreditam que os menos afortunados não merecem portanto)”.

    A decadência do império americano não está só nos números. Ela está nas ruas, e em todas as esquinas. A desigualdade nunca foi tão grande, a insatisfação nunca esteve tão evidente e o desespero vai apenas crescer se nada for feito para mudar isso.

    Mais grave: pesquisa feita pelo economista Edward Wolff e divulgada em dezembro do ano passado mostra que de 1990 para cá todo o crescimento econômico da nação foi para as mãos dos 10% mais ricos, que não por acaso têm 91% das ações colocadas no mercado. Como gosta de dizer outro professor de economia, Richard Wolff, os Estados Unidos estão caminhando apressadamente para virarem uma “banana republic”.

    Num país praticamente des-sindicalizado (uma cortesia de Ronald Reagan, cuja austeridade fez sumir do mapa os sindicatos e depois chegou ao absurdo cenário de admitir que algumas empresas se negassem a contratar homens e mulheres que fossem filiados a algum sindicato) o trabalhador não tem força para lutar por melhores salários e condições de trabalho (menos de 7% da força de trabalho hoje pertence a algum sindicato, em 1950 esse número era de 35%) e, depois de quatro décadas de direitos encolhidos e de salários que só fazem perder o poder de compra, a situação social é a que a Scientific American escrachou para todos verem: o poder concentrado na mão de uma elite minúscula, a pobreza crescente e a falta de informação generalizada, já que os meios de comunicação pertencem a essa elite minúscula e a ela não interessa compartilhar notícias ruins como essa, que despertariam a massa para a realidade ao redor.

    Nos Estados Unidos atual os discursos do trabalhador, como vimos recentemente com as manifestações de funcionários do McDonalds e do Walmart, pedem por sindicatos, por direitos, por condições de trabalho, pelo sonho de uma CLT como a nossa — esse o real sonho americano hoje; mas no Brasil ainda tem quem veja os Estados Unidos como exemplo. Não é de espantar que todos eles pertençam à elite – ou, nos casos mais graves de cegueira, querem acreditar que pertencem.”

    O texto da Scientific American: “Economic Inequality: it’s far worse than you think“ 

     

    http://blogdamilly.com/2015/04/21/aleluia-amanha-o-brasil-pode-comecar-a-virar-os-estados-unidos/comment-page-1/#comment-3028

     

    1. Uma coisa é uma coisa. Outra…

      O que tem uma coisa a ver com a outra???

      Se os argumentos que defendem o termino da terceirização no Brasil apresentam este teor defensivo, explicam porque o projeto foi aprovado pela câmara.

      Nem uma palavra em defesa dos empresários, que são os que verdadeiramente geram e distribuem, riqueza e prosperidade. Riqueza não é gerada por decreto. É necessário muita esforço, dedicação e sacrifício. Coisa que a cultura tupiniquim não cultivou no povo que mal informado e educado, aprendeu que a extorsão contra os empresários é um direito seu, o “direito” do trabalhador é algo que lhe permite utilizar afim de adquirir benefícios que a bem da verdade não possui. Assim a extorsão se tornou institucionalizada tornando a justiça do trabalho um beco que o empresário descuidado é espoliado até o limite da resistência, vitima de uma jurisprudência que cresceu em tribunais com o único intuito de manter uma maquina extorsiva em cima de quem produz, defendida por uma legião de escritórios de advocacia de fundo de quintal.

      Leis demagógicas que exemplificam a lei do menor esforço e do mal caráter.

      O custo brasil torna inviável qualquer projeto de prosperidade, ai vem o Estado que alimenta políticos oportunistas e agindo contra o próprio Pais, legislam em proveito próprio, matando com a galinha dos ovos de ouro. Ganha a minoria, a politica da exclusão segue firme e a maioria como sempre, fica a ver navios.

       

       Artigos – Celso Pastore

      Publicado no Jornal da Tarde, 02/03/2005.

      O trabalho na China

      Língua e precariedade de dados têm dificultado a estimação do custo do trabalho na China. Mas é certo que as diferenças entre a remuneração no campo e nas cidades são imensas. Mesmo nas cidades a variação é grande.

      Um estudo recente e baseado no Censo do Trabalho na China indicou salários industriais nas cidades que variaram entre o equivalente a US$ 1.06 e US$ 0.45 por hora. O salário médio é de US$ 0.64 por hora (Judith Banister, “How cheap is Chinese labor?, BusinessWeek, 13/12/2004).

      Como isso se compara com a situação do mundo ocidental? A diferença é fenomenal. Enquanto a China paga, em média, US$ 0.64 por hora trabalhada, os Estados Unidos pagam US$ 21.11. Levando em conta as diferenças de custo de vida, os US$ 0.64 compram US$ 2.96 nos Estados Unidos.

      Esse abismo salarial faz muita diferença nos custos de produção e no preço dos produtos. As indústrias chinesas de confecções, calçados, aparelhos elétricos e eletrônicos, materiais plásticos e outros conseguem produzir bens de consumo que chegam a ser 50% mais baratos do que os fabricados nos Estados Unidos. Muitas empresas americanas fecharam suas plantas nos Estados Unidos e se mudaram para a China onde encontraram condições mais propícias para produzir e vender, mesmo pagando, muitas vezes, salários superiores à média de US$ 0.64 por hora. De 2000 a 2004, estima-se que 2,7 milhões de empregos foram destruídos nos Estados Unidos. Para quem ficou no país, a regra passou a ser: “Os chineses estão chegando. Corte seus preços ou perca os seus fregueses”.

      Entre os dois países há uma verdadeira guerra comercial. Os americanos estão deixando o dólar se desvalorizar na esperança de desestimularem as exportações chinesas para os Estados Unidos. Mas, com essa enorme diferença no custo do trabalho, a desvalorização até agora praticada não conseguiu arrefecer a agressividade chinesa.

      O quadro tende a se complicar. As fábricas da China estão oferecendo benefícios que são atraentes para trabalhadores que migraram do campo para a cidade. Na província de Yue Yuen (sul da China), por exemplo, uma fábrica de calçados tem 70 mil empregados. É uma verdadeira cidade, com infra-estrutura própria, dormitórios, cantinas, serviço de correio, telefones, cinema, creches, escolas, clínicas e até um hospital com 100 leitos. A jornada de trabalho é puxada – 11 horas por dia e seis dias por semana. Mas, para quem veio do campo, onde não havia nada disso, a situação melhorou. A maioria dos trabalhadores é jovem. Há um grande número de mulheres. Todos põem muita fé no futuro.

      1. O que isso tem com o tema?

        o cidadão critica o outro por mostrar um lado da história dos paparicados Americanos pela direita no brasil e me vem com um contraponto semelahente aporntando a china como motivo para embasar a terceirização, que critica é essa que defende sua posição com a mesma ferramente do que você criticou o outro lado?

        1. Cooperativismo

          Pois é… Uma coisa é uma coisa outra….

          O que importa é o Brasil e por aqui mais uma vez vigorou a lei do chora menos quem pode mais.

          Os tubarões, as multinacionais os monopolios e conglomerados se safaram, estão dando risada, o abacaxi do vergonhoso custo trabalhista ficou para as pequenas e médias empresas que terão que arcar com TODOS os “beneficios” dos pobres trablahadores exolorados.

          Poderiam fazer o seguinte. Acabem com o patronato e o emprego, fica tudo como cooperativa o trabalhador só ganha o que produzir.

          Acaba todo o conflito né não?

      2. Então tá, quero ver

        Então tá, quero ver empresários valorosos gerarem riquezas sozinhos, sem nenhuma força de trabalho que não seja a deles. Já imaginou, uma indústria com 100 empregados? O valoroso empresário vai trabalhar por 100? Quem gera riqueza é trabalho; quem acumula é quem explora trabalho. Qualquer capitalista bobinho sabe disso e vc vem querer dourar a pílula? O tempo desse discurso já passou e deveríamos estar avançando para mundos melhores e não para voltar à era pré-fordista.

        1. O tempo desse discurso já

          O tempo desse discurso já passou e deveríamos estar avançando para mundos melhores e não para voltar à era pré-fordista.

          Só por curiosidade, na sua opinião como seria este avanço para mundos melhores?

           

  4. Terceirização: Derrota do trabalhardor

    Raciocinem comigo:

    Imeginem que eu tenha uma empresa que emprega 200 empregados com uma folha de pagamento de 400 mil/mês.

    Então eu demito meus empregados e terceirizo minha mão de obra. Porque eu faria isso? Faria somente se me trouxesse alguma vantagem , ou seja, lucro.

    Vamos imaginar que terceirizando eu teria uma economia de 10 mil por mês, ou seja, pagarei para uma terceirizada o valor de 390 mil/mês.

    A terceirizada por sua vez, terá que pagar seu custo operacional, pagar o pro-labore dos donos e dar lucro para seus acionistas (se existir, é claro) e tudo isso sairá dos 390 mil. Como fazer isso?

    Mágica? Não! para conseguir essa façanha a terceirizada ou vai diminuir a quantidade de empregados na minha empresa. Mas isso corre o risco de reduzir a produção e/ou cair a qualidade do produto, ou reduzir o salário dos empregados terceirizados em relação ao que ganhava os empregados da minha empresa.

    O argumento que muitos congressistas usam para justificar a terceirização é o aumento de postos de trabalho. Conversa fiada, pois como vimos a tendencia é no máximo ter a mesma quantidade de empregados, mas com um agravante, como os empregados terão uma remuneração menor, muitos terão que ter mais de um emprego. Isso significa mais mão de obra no mercado para o mesmo número de postos de trabalho.

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