Gilmar enfiou dedo na ferida quando impediu posse na Casa Civil, diz Lula

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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Jornal GGN – O ministro Gilmar Mendes fomentou o julgamento de Lula na imprensa quando do vazamento do grampo envolvendo Dilma Rousseff e a posse do ex-presidente na Casa Civil pelo juiz Sergio Moro. Em entrevista ao Tijolaço, Lula disse que, ali, Gilmar se aproveitou para enfiar o “dedo na ferida”, usando de um método que Lula já vem condenando há muito.

“Gilmar Mendes tocou o dedo na ferida. Há dois anos, numa cerimônia em homenagem ao Márcio Thomas Bastos no Ministério da Justiça eu já protestava contra estes métodos. Quando [Sérgio]  Moro definiu [ele se refere às entrevistas do juiz citando a Operação Mãos Limpas, na Itália] que a imprensa ajudava no processo, ele estimulou o julgamento pela imprensa. É preciso que o juiz volte a julgar com os autos, as provas.”

Para o ex-presidente, o vazamento de suposta delação de Leo Pinheiro (OAS) envolvendo o ministro Dias Toffoli pode tirar o Supremo da inércia em relação as abusos da Lava Jato.

Por Fernando Brito

Lula, exclusivo, ao Tijolaço: “Gilmar pôs o dedo na ferida”

Do Tijolaço

“Gilmar Mendes pôs o dedo na ferida”. O lead, obrigatório, da conversa que me permitiu, hoje, o ex-presidente Lula, precisa ser este, pelo imbróglio que se formou no enfrentamento entre o ministro do STF e a Procuradoria Geral da República pelo caso do vazamento da delação (ou ex-delação, se depender de Rodrigo Janot) do empreiteiro Léo Pinheiro, da OAS, seria este.

Mas vou me permitir seguir a ordem em que a conversa ocorreu, porque acho que importante, aqui, é o fato de deixar falar, e com o clima com que fala, um personagem da história brasileira – a recente, que ocorre neste instante e a que viveremos nos próximos tempos.

E ela começa assim que Lula sai do saguão do hotel, no Rio, para onde militantes, candidatos e repórteres se aglomeraram para ouvi-lo e desce as escadas para a garagem, em passo acelerado para um homem que completa 71 anos em menos de dois meses. Antes que lhe pergunte qualquer coisa, pergunta-me ele sobre os últimos tempos de Leonel Brizola, que ele, recém-empossado presidente e com as rusgas da política, não pudera acompanhar.

Dá a impressão de alívio ao saber que Brizola só se foi após os 82.

A primeira resposta vem já no carro, como um ensaio do que diria, daí a meia hora, no caminhão de som estacionado diante do Estaleiro Mauá, na Ponta da Areia, em Niterói, num ato em defesa do emprego que resta aos operários da indústria naval, náufragos ainda vivos da crise que afogou mais de 80% dos postos de trabalho. Era, afinal, o dia em que se iniciava o julgamento de Dilma Rousseff no Senado.

– Hoje é o dia da vergonha nacional, o dia em que os golpistas pensam que estão cassando Dilma Rousseff, mas cassam o eleitor, cada um deles que acordou, saiu de casa e votou para Presidente da República.

A energia das palavras, por um instante, dá lugar a um momento de perplexidade com a cassação política de um governante eleito.

-Desde a volta das eleições diretas, jamais imaginei que isso aconteceria. Não posso entender que alguém possa ser cassado por razões de uma possível perda de popularidade. Se fosse assim, todo governante seria cassado em algum momento de seu mandato.

Mas dura pouco a perplexidade com a onda de ódio político que está envolvendo o julgamento de Dilma. Logo chama para si a questão.

– Eu pensei que só tivessem tamanho ódio por mim, não por ela. Mas começaram tentando nos afastar, nos intrigar, desde o início do primeiro mandato. Quando viram que não conseguiriam, resolveram destruí-la e se aproveitaram de sua situação de fragilidade no campo da economia.

Que ele atribui, diretamente, às manobras de Eduardo Cunha.

–  Quando os Estados Unidos tiveram a crise, o presidente da Câmara, lá, ajudava a construir saídas. Aqui, além da mídia, ainda tínhamos um presidente da Câmara que trabalhava diariamente para impedir que Dilma fizesse os ajustes na economia e todo dia vinha com aquelas pautas-bomba.

A tolerância com Cunha, de olho no impedimento de Dilma, foi, para Lula, a razão para a degradação do clima político que atingiu seu ápice com a sessão deprimente da Câmara que autorizou a abertura do processo de impeachment, da qual fala com olhos arregalados, como se – como tantos – ainda não pudesse acreditar que tivesse ocorrido aquele episódio.

A mídia não lhe escapa e conta a opinião de Mário Soares, ex-primeiro-ministro e presidente de Portugal que, trabalhando como entrevistador para um programa de televisão de seu país veio entrevistá-lo há alguns anos, trazendo jornais do mundo inteiro sobre os sucessos do Brasil e lhe perguntou como, nos daqui, retratava-se “um Brasil que acabou”.

– A mídia construiu o discurso para a derrubada de Dilma e levou àquela cena…

Um telefone lhe é passado e interrompe seu raciocínio. São as conversas de que Lula não desiste para mover o que parece inamovível no voto dos senadores que votarão o impeachment. A esperança que escasseia é proporcional ao esforço que ainda faz, desmentindo as intrigas de que deixa Dilma à própria sorte e na conversa com um deles fica claro que ambos agem em sintonia.

Dá para perceber, em poucos minutos de conversa, o papel que ele teria desempenhado na Casa Civil, se Gilmar Mendes não tivesse impedido que ele a ocupasse. A história poderia ser outra, mas é esta que vivemos e me aventuro em tocar no nome do algoz de sua última tentativa de restabelecer a estabilidade política do governo eleito, citando a polêmica que está nos jornais, ressalvando que compreenderia que não entrasse num assunto em que ele, Lula, está sujeito a vinditas judiciais.

Não há nenhuma hesitação ou pedido de off:

– Gilmar Mendes tocou o dedo na ferida. Há dois anos, numa cerimônia em homenagem ao Márcio Thomas Bastos no Ministério da Justiça eu já protestava contra estes métodos. Quando [Sérgio]  Moro definiu [ele se refere às entrevistas do juiz citando a Operação Mãos Limpas, na Itália] que a imprensa ajudava no processo, ele estimulou o julgamento pela imprensa. É preciso que o juiz volte a julgar com os autos, as provas.

Para ele, o episódio pode servir para que se abra um debate sobre isso, agora que o vazamento atinge um ministro do Supremo Tribunal Federal e gera comoção. Lula não se verga ao conveniente e diz que é preciso que alguns juízes e membros do Ministério Público – “alguns, não todos’, ressalva – deixem de se comportar como ungidos por Deus para, a seu modo, definirem quem merece ou não ter direitos.

–  Sou vítima de mentiras há muitos anos. Sei o que é isso. Não posso aceitar que uma pessoa vá para o julgamento na Justiça já condenado pelo julgamento da mídia. E nem que os indivíduos, como alguns fazem, se comportem como se eles próprios fossem as instituições.

Agora é a visão dos barcos que servem à Petrobras fundeados na Baía da Guanabara que interrompe o assunto. Explico que eram muitos mais há algum tempo e, há mais tempo, antes dele, quase nenhum, quando só sucatas ficavam ancoradas no fundo da baía, a espera de desmonte, como ferro-velho. E os navios inconclusos, parados diante do Estaleiro Mauá, onde os operários sobreviventes o esperavam.

E a pergunta inevitável é sobre a perspectiva de retomada daquela indústria, que foi para o Rio, nos anos 60 e 70, como foi para São Paulo a indústria automobilística. Haverá, consumado o impeachment, a enxurrada de capital estrangeiro que, dizem, inundará o país?

–  Só virão comprar o que já existe. Comprar ativos, bens públicos. Acabar com a partilha [do petróleo do pré-sal]. Não se importam com a indústria nacional. Por que é que, em 2009, eu tive aquela briga com o Roger Agnelli, que Deus o tenha? Porque é que a Vale tinha de ir fazer lá fora aqueles navios de 400 mil toneladas [de porte bruto] que muito porto nem tinha calado para receber?

Já estamos na Ponta da Areia, passando no meio de um mar de gente que esperava Lula. Ele fica indócil, quer saltar do carro – “há quatro meses quero vir aqui” – e é desestimulado: “espera, presidente, espera a gente entrar [no portão do estaleiro], que de lá a gente vai para o carro de som”. Ele ainda insiste duas vezes, mas se conforma, sabe que está sendo cuidado.

Mas assim que entramos, sai do carro como um furacão e brilhando mais que sua guayabera branca, ergue os braços e sai pelo portão que o devia proteger daqueles que, de verdade, o protegem e acolhem.

Acabou minha meia hora. Lula agora está em seu meio. Volto a pé, ouvindo os comentários de admiração. Tomo um táxi, já uns 500 metros à frente. O taxista tem um irmão que era caldeireiro num dos estaleiros, irmão que agora está desempregado.

Fiz bem em levar o casaco desbotado que vesti para enfrentar o frio da manhã, quando saí para o encontro com Lula. Pertencia a Brizola e, como ele esqueceu numa produtora de vídeo onde foi fazer uma gravação e eu, assumidamente, não devolvi. Foi uma forma de levar Brizola ao lugar onde, creio eu, ele estaria.

Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

9 Comentários

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  1. O stf sairá da inércia apenas

    O stf sairá da inércia apenas pra proteger a si mesmo, não vamos nos esquecer que o medo tomará posse em breve do colegiado, o único destemido e triunfante que tem alí é o gilmar. Gilmar é o presidente da republica ideal para os novos tempos que estão chegando. Não sente nenhuma culpa pela democracia que se foi, será o dono da nova democracia à brasileira, tudo o que o mpu queria para si e não terá.

  2. O stf sairá da inércia apenas

    O stf sairá da inércia apenas para proteger a si próprio, não podemos nos esquecer que, em breve, o medo tomará posse no colegiado, alí apenas gilmar é destemido e age de forma triunfante. Gilmar é o presidente ideal do tempo que está chegando, não sente nenhuma culpa pela democracia que se foi e pode, sendo a figura mais versátil da máquina vitoriosa, inaugurar e consolidar a nova democracia à brasileira capacitado que é -como tia Grinover nos ensinou-, a reinterpretar todo o direito pátrio. Tudo que o mpu queria pra si mas não terá.

  3. DEDO EM OUTRO LUGAR

    Leendo estas considerações de Lula, se estão corretas:

    a) Gilmar mendes fez por defesa a ele próprio, ninguém chegas aos juízes do supremo.

    b) Esta mais provável, quee tenha vazado nna veja, e criado um álibi paraenterrar a Laava jato, já que pega todos os seus aliados, como fez com santiagraha.

  4. Eu nunca vi uma putaria tão grande. Vencedores? Os ladrões

    Grave foi o Moro receber a medalha

    O Jungmann e o Temer estão no papel deles    publicado 26/08/2016B1.jpg

    O Juiz (sic) Moro recebeu a medalha do pacificador (sic) do Exército

    Que horror, dirá o amigo navegante!

    Calma, amigo navegante!

    O Jungmann, suposto Ministro (sic) da Defesa (dos interesses de que pais?), capturado numprocesso judicial de corrupção, e o Traíra, informante do consulado americano e capturado pela Odebrecht, pelo Sergio Machado e pela jovem no Porto de Santos, o Temer e o Jungmann provavelmente agiram em legítima defesa!

    “Pacificar” o Moro!

    Mantê-lo à distancia, com o veneno mais mortífero: a vaidade!

    Escândalo não é o que fizeram o Temer e o Jungmann, nessa sub-Democracia do Gilmar e da Globo!

    Não!

    Escândalo é um Juiz aceitar do Jungmann e do Temer qualquer tipo de prebenda!

    Do Temer e do Jungmann.

    Que, se vier ao caso, ele terá de julgar!

    Os juízes da ONU saberão depositar essa medalha pacificadora num dos pratos da Justiça.

    PHA

       

     

  5. Questão de compreensão.

    Tive que ler o texto de novo quando o assunto é GM, pois pela manhã, quando entrei no “Tijolaço” e lí a entrevista a leitura que fiz quando Lula disse que GM tinha metido o dedo na ferida, era que ele se referia aos arroubos de Sergio Moro e procuradores na denuncia contra Toffoli, por iss tive que voltar ao texto aqui reproduzido e refazer a leitura. Minha compreensão permanece a mesma: O dedo na ferida aconteceu agora e não quando ele, GM se insurgiu contra a nomeação de Lula.

    Abaixo o trecho, que vou voltar a ler para ver se me convenço do contrário.

     

    “Dá para perceber, em poucos minutos de conversa, o papel que ele teria desempenhado na Casa Civil, se Gilmar Mendes não tivesse impedido que ele a ocupasse. A história poderia ser outra, mas é esta que vivemos e me aventuro em tocar no nome do algoz de sua última tentativa de restabelecer a estabilidade política do governo eleito, citando a polêmica que está nos jornais, ressalvando que compreenderia que não entrasse num assunto em que ele, Lula, está sujeito a vinditas judiciais.

    Não há nenhuma hesitação ou pedido de off:

    – Gilmar Mendes tocou o dedo na ferida. Há dois anos, numa cerimônia em homenagem ao Márcio Thomas Bastos no Ministério da Justiça eu já protestava contra estes métodos. Quando [Sérgio]  Moro definiu [ele se refere às entrevistas do juiz citando a Operação Mãos Limpas, na Itália] que a imprensa ajudava no processo, ele estimulou o julgamento pela imprensa. É preciso que o juiz volte a julgar com os autos, as provas.

    Para ele, o episódio pode servir para que se abra um debate sobre isso, agora que o vazamento atinge um ministro do Supremo Tribunal Federal e gera comoção. Lula não se verga ao conveniente e diz que é preciso que alguns juízes e membros do Ministério Público – “alguns, não todos’, ressalva – deixem de se comportar como ungidos por Deus para, a seu modo, definirem quem merece ou não ter direitos.”

    Será que temos que consultar o Fernado Brito, que fez a entrevista?

     

     

    1. CONCORDO

      Realmente o título do post é equivocado, porque encerra uma afirmação que não é verdadeira e deveria ser corrigida. Ninguém mais notou?

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