Imagem: Pixabay
Por Fábio de Oliveira Ribeiro
Antes de começar a ler vide a sugestão no final.
Hoje fui ao Shopping União, em Osasco, sentei-me próximo às escadas rolantes da Praça de Alimentação e fiquei durante quase uma hora vendo o movimento.
Centenas de pessoas desceram e subiram as escadas rolantes ou entraram na praça de alimentação pelo corredor próximo ao local onde eu estava.
Homens, mulheres, crianças. Idosos, adolescentes, brancos, pardos, negros e mulheres de meia idade. Alguns estavam bens vestidos, outros não. Corpos belos e esguios ou deformados e repugnantes, cada qual insulado em seu próprio universo de referências comerciais, emoções bem ou mal resolvidas e preferências políticas. Uma fantástica amostra de heterogeneidade humana desfilou diante de mim.
Sentado em silêncio comecei a divagar sobre a trilogia dos irmãos Wachowski, distopia em que os seres humanos vivem seus sonhos num ambiente virtual enquanto são cultivados como baterias que sustentam a Matrix. Sob o usurpador Michel Temer a Matrix brasileira está sendo destruída, portanto, todas aquelas pessoas estão fadadas a perder sua fonte de sustentação políticas. Alguma delas tem consciência disso, outras não.
Todas falam a mesma língua, duvido muito que elas consigam se entender se começarem a falar sobre futebol, religião e, principalmente, sobre o que deve ou não ocorrer a Lula. Prestes a ser sacrificado como se fosse Neo da trilogia Matrix, o ex-presidente petista deu uma surra no agente Smith da Justiça Federal. Qualquer que seja o destino que Smith imponha a Lula a Matrix brasileira irá inevitavelmente balançar e, eventualmente, reconfigurada. O resultado é incerto tão incerto quanto o destino de Sati ao fim da trilogia.
Durante todo o tempo que fiquei observando o formigueiro humano não vi nenhuma pessoa conhecida. Apesar de cheio de gente, para mim o Shopping é um deserto. O deserto do real.
Educado por Cypher, Neo se torna capaz de ver o que existe por trás da imensa coleção de números e ícones que deslizam em colunas de cima para baixo nas telas dos computadores da nave Nabucodonosor. Alheio ao movimento não consigo mais ver pessoas. Tudo o que vejo são recipientes de urina e de fezes que deslizam escada acima e escada abaixo. A semelhança da composição química do conteúdo de bexigas e intestinos anula qualquer distinção de idade, cor, raça, sexo, religião, ideologia e aparência externa.
Em algum momento todas aquelas pessoas irão ao banheiro e o resultado será o mesmo. Encanamento abaixo toda aquela matéria orgânica chegará inevitavelmente ao Rio Tietê. O que a periferia faz alguns bairros nobres cheiram. Cypher traiu Neo enquanto saboreava uma bisteca. É possível vê-lo trafegando pelos corredores do Shopping União de mãos dadas com o agente Smith de saias que passa falando mal de Lula. Felizmente ela não é capaz de identificar o código sob o qual minha consciência opera.
O deserto do real se torna uma ficção desértica em minha consciência. Não sinto absolutamente nada. Apenas observo o movimento e registro imagens muito diversas daquelas que se apresentam aos meus olhos. Cultivo minha terceira visão para além daquela que foi construída pela televisão. Não vejo mais as lojas que povoam a praça de alimentação. Tudo que vejo é o consumo de propaganda se deslocando escada acima escada abaixo.
Quem realmente precisa comer frango ensopado de óleo no KFC ou tomar um balde de coca-cola no MacDonalds? Com menos dinheiro é possível fazer uma boa refeição em casa. Desgraçadamente, o lar perde todo seu brilho quando a televisão está ligada e todos querem manter a ilusão acesa. E muitos ficam conectados à Matrix global até quando estão nos seus carros ou num restaurante do Shopping.
No século XIX Marx disse que a religião era o ópio do povo. Se vivesse no século XXI ele provavelmente diria que o povo é entorpecido por uma droga nova droga, pois até a religião se viu obrigada a passar por uma transmutação tecnológica e visual. Neo, a versão cinematográfica de Jesus, enfrenta um Smith que se multiplica ao infinito à medida que toca cada um dos outros personagens.
Lula, este Neo da política brasileira, enfrenta o código destrutivo que diariamente é infiltrado nas consciências de milhões de pessoas pela Matrix global. Sem qualquer freio, o agente Smith da Justiça Federal segue se multiplicando e adquirindo poder para julgar a consciência do réu, para inquiri-lo sobre crimes que não lhe foram atribuídos para condenar Lula porque a inexistência de prova de propriedade do Triplex é evidência inquestionável de ocultação de patrimônio como disse um jornalista da Folha de São Paulo.
Quantos daqueles recipientes de urina e de fezes que deslizam escada acima e escada abaixo gostariam de ser julgados pelos mesmos critérios que estão sendo utilizados contra Lula? Esta pergunta é irrelevante. Todos os que condenam Lula são incapazes de se colocar na posição do réu. Muitos deles são apenas bits que sobem e descem as escadas rolantes de uma Nabucodonosor ancorada na Matrix global que não levará ninguém a lugar algum.
Sugestão de trilha sonora para desfrutar melhor este texto:
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Caro Fábio
Faço um
Caro Fábio
Faço um comentário, e; perdoe-me se não entendi seu artigo: as pessoas não têm culpa, imagine um sujeito por 20, 30 anos; ouvindo CBN e jovem pig, vendo jornal nacional e sbt, lendo veja. O cara se aliena completamente,e acha que é culpado por seus fracassos (depois de neoliberalismo na veia e no cérebro por 30 anos); não compreende o fechamento de oportunidades, a seleção parcial, canalha e interesseira dos “vencedores”; nem que muitos perdem para poucos ganharem
“Culpa” talvez não. Mas que
“Culpa” talvez não. Mas que tal “responsabilidade”? Não é essa turma que diz que o socialismo doutrina?
O problema está em achar que é normal, natural e definitivo esse modo de viver. Os Flintstones eram capitalistas, os Jetsons também eram (serão?), o tempo parou e a história acabou no neoliberalismo…
Mas na realidade o tempo só parou e a história só acabou para quem morreu, como esse capitalismo. Nós estamos vivos, tranquilos e atentos. 😉
Caro enato,muito boa sua
Caro enato,muito boa sua observação, mas é a diferença entre culpa e responsabilidade considero difícil de distinguir. Como alguém pode ser responsabilizado se, a vida inteira apenas foi induzido a pensar de um modo. Podemos filosofar como hannah arendt e a banalidade do mal; mas vc tem consciênciA do mal. Creio que não, as pessoas não têm essa consciencia (nem nós! quanto fazemos que faz mal a outrem e não percebemos). Devemos, antes de tudo, mostrá-las que há outras maneiras de fazer e pensar
Caro enato,muito boa sua
Caro enato,muito boa sua observação, mas é a diferença entre culpa e responsabilidade considero difícil de distinguir. Como alguém pode ser responsabilizado se, a vida inteira apenas foi induzido a pensar de um modo. Podemos filosofar como hannah arendt e a banalidade do mal; mas vc tem consciênciA do mal. Creio que não, as pessoas não têm essa consciencia (nem nós! quanto fazemos que faz mal a outrem e não percebemos). Devemos, antes de tudo, mostrá-las que há outras maneiras de fazer e pensar
Esse lado de cá do mundo, o
Esse lado de cá do mundo, o do dólar, começou a enlouquecer depois do final da Segunda Guerra, acreditou que manequins eram humanos e vice-versa – Papai Sabe Tudo e a Feiticeira foram pioneiros -, mas despirocou de vez e vem piorando dia-a-dia desde o Grande Ataque do Capital, iniciado em 2008 e que não será interrompido por nenhum movimento repentino mas paulatina e localmente, na medida em que, de saco cheio, cada um for dando as costas para aquele que se arvora o Grande Irmão e assim encontrar alternativas.
Nas igrejas só vão os crentes. Mas fora dessas igrejas, onde se reza ao deus consumo, você não está sozinho, caro Fábio.
A culpa não é do povo
Fábio… entendo suas boas intenções, mas seu texto, apesar de belo, acaba sendo preconceituoso com a periferia. As referências de filho de uma classe média alta no Brasil (Matrix, a trilha musical) dão a tônica do retrato feito a partir de um ponto de vista “superior”. A divisão entre os “corpos belos” e os “corpos repugnantes”, os bem ou mal vestidos completam o julgamento de valor que você faz, menos sobre a elite, do que sobre a população do shopping da periferia (de São Paulo ou do globo). Poderia, por exemplo, inverter a fórmula do despejo: o que a elite faz, a periferia também cheira. Quanto à droga nova do século XXI, o consumismo, ela já é velha, e os filósofos falam o século XX: Adorno, Horkheimer, Pasolini, Baudrillard, etc etc etc. Eu não sei quantos anos você tem. Mas a impressão que fica é a de um texto adolescencial. Bem intencionado, mas que beira o preconceito. Citando Glauber Rocha (Terra em transe): “A culpa não é do povo! A culpa não é do povo! A culpa não é do povo”.
Primeiramente: Fora
Primeiramente: Fora Temer!
Segundamente: feliz dia das mães, Paula, se você o for.
Terceiramente: “menas ” ódio, por favor. Seu comentário destoa da intenção do Fábio. Apela para um patrulhamento que não tem nada a ver com a essência do texto. Parece coisa de psol…
Você é que está sendo
Você é que está sendo preconceituosa. Se não fosse, teria prestado atenção no que eu disse:
“Alheio ao movimento não consigo mais ver pessoas. Tudo o que vejo são recipientes de urina e de fezes que deslizam escada acima e escada abaixo. A semelhança da composição química do conteúdo de bexigas e intestinos anula qualquer distinção de idade, cor, raça, sexo, religião, ideologia e aparência externa.”
O seu preconceito fica mais evidente quando você diz que eu falei o que não disse. Você diz que o consumismo é um problema antigo. Mas não é dele que eu estou falando:
“O deserto do real se torna uma ficção desértica em minha consciência. Não sinto absolutamente nada. Apenas observo o movimento e registro imagens muito diversas daquelas que se apresentam aos meus olhos. Cultivo minha terceira visão para além daquela que foi construída pela televisão. Não vejo mais as lojas que povoam a praça de alimentação. Tudo que vejo é o consumo de propaganda se deslocando escada acima escada abaixo.”
“No século XIX Marx disse que a religião era o ópio do povo. Se vivesse no século XXI ele provavelmente diria que o povo é entorpecido por uma droga nova droga, pois até a religião se viu obrigada a passar por uma transmutação tecnológica e visual. Neo, a versão cinematográfica de Jesus, enfrenta um Smith que se multiplica ao infinito à medida que toca cada um dos outros personagens.”
o mais pare de citar aleatoriamente autores que não tem qualquer relação com o que você leu. Leia novamente o texto e veja se consegue entender algo. Se não conseguir, vá passear no Shopping, se entupir de coca-cola no MacDonalds e de frango oleoso no KFC como o seu “povo”. O meu não precisa necessariamente frequentar seu templo de consumo.
Primeiramente: Fora
Primeiramente: Fora Temer!
Segundamente: Muito interessante a ótica do texto, repassarei.
Terceiramente: Bela dica este Psych/Stoner rock alemão de 2007. Não chega a ser um “kraut”, mas cai muito bem com a cerveja escura do domingo…
Abraço!
Um dia a Matrix acabará
Sim, como dizia o agente smith, somos obrigados a encarnar nestes corpos mal cheirosos, ( que por mais que disfarcemos com perfumes, continuam sendo sujeitos a decomposição, e por isto ao mal cheiro ) .
O próprio Lula é um algoritmo escolhido pela Matrix, digo pela elite. Inconscientemente, simmas mesmo assim ele é. Em 1989, na disputa presidencial, a esquerda tinha Brizola e Lula, a elite abriu fogo cerrado contra Brizola, por ser mais radical e defender a cassação das concessões de TV da mídia, e poupou Lula, deixando-o chegar ao segundo turno. O algoritmo Brizola foi descartado e o algoritmo Lula foi escolhido para ser o ” Neo ” pois era ingênuo e não tinha Maquiavel. . Uma seleção perversa e maquiavélica.
————
Um dia a Matrix acaba, não se preocupe. Um dia a elite esgota os recursos naturais do planeta, com sua ganância sem limites, e iremos nos extinguir, seja por poluição atmosférica, e acumulo de CO² na atmosfera, seja por desertificação, esgotamento de recursos, super população causada por explosão demográfica ( que a elite com sua ganância incentiva para conseguir mão de obra barata ).
A única coisa real aqui é a consciência, que mesmo com o fim do planeta, ou seja, da Matrix, continuará existindo em outros mundos.
trilha sonora
a trilha casa muito bem com o clima do texto.
vou escutar depois o disco inteiro desse povo…
durante a leitura, me veio à mente um curta metragem distópico…
até porque o que vivenciamos hoje está perigosamente próximo de uma distopia.
Se quiser fazer um curta,
Se quiser fazer um curta, faça. Se usar o argumento do meu texto cite a fonte de inspiração nos créditos.
Farei uma pontinha no seu filme. Interpretarei um idiota que come maquinalmente frango do KFCtomando um balde de coca-cola enquanto olha o vazio com uma expressão vazia. Adoro ironias.
Ha, ha, ha…