“Ninguém faz um filho pra se tornar criminoso”, por Ricardo Mezavila

A senhora Maria Teresa discursou na rua, mas sua voz deveria ser ouvida na Corte Internacional de Justiça e na Organização das Nações Unidas, que são palcos de uma elite branca quando querem fazer média com o mundo.

“Ninguém faz um filho pra se tornar criminoso”

por Ricardo Mezavila

Recebi um vídeo em que, Maria Teresa dos Santos, mulher negra de 61 anos, Coordenadora da Agenda Estadual pelo Desencarceramento e Presidente da Associação de Amigos e Familiares de Pessoas Privadas de Liberdade de Minas Gerais, discursa na rua de uma comunidade para dezenas de pessoas. 

A fala contundente e lúcida, denuncia uma tragédia social importantíssima para o esclarecimento definitivo das injustiças por qual as classes desfavorecidas passam.  

A senhora Maria Teresa discursou na rua, mas sua voz deveria ser ouvida na Corte Internacional de Justiça e na Organização das Nações Unidas, que são palcos de uma elite branca quando querem fazer média com o mundo. 

Trecho transcrito da fala de Maria Teresa dos Santos:

“Legaliza essa porcaria, começa a vender lá na farmácia, que eu quero ver os grandes empresários se matar igual aos nossos estão se matando, por um dinheiro que nem é deles. Porque eles vendem droga, morrem por causa da droga, são presos por causa da droga, mas nenhum de nós tem o dinheiro da droga para pagar um advogado para eles. É verdade, legaliza, vai fumar quem quiser fumar, porque ninguém é obrigado a fazer nada, porque proibido já tá e todo mundo tá fumando. Esse é um ponto. Outro ponto que é muito questionado é o, “nenhuma vaga a mais”. O presídio tá lotado, tem que construir mais presídio, esparramar essas cadeias. Meu marido tá dormindo no chão tem um ano, meu filho tem dois anos que tá preso dormindo na beirada do boi. Quando cria uma vaga, cria dez pessoas pra ocupar aquela vaga. Sabe essa vaga que a gente quer que seja criada para um familiar nosso que tá preso hoje?  Ela vai servir para nossa geração futura. O dinheiro de criar vaga em cadeia, ele tem que ser gasto na primeira infância, ele tem que ser pra criar creche pra quando a gente for trabalhar o nosso filho não precisar ficar jogado por aí, nem a gente precisar tirar do bolso pra pagar uma pessoa e não poder comprar um tênis pra ele. Aí ele Vê o cara do tráfico com um tênis legal, um tênis da moda, um tênis da hora e diz “ah, vou vender uma droguinha ali que eu vou comprar um tênis legal, um tênis da moda, um tênis da hora; ah, eu vou vender uma droguinha ali que eu vou comprar um rádio, aí vou comprar uma calça jeans, aí vou comprar um celular, aí vou para no cárcere”. Por isso é que nenhuma vaga a mais. Nós não queremos vagas em cadeia, a gente tem que lutar por isso, a gente tem que lutar por escola, por profissionalização dos nossos familiares, é isso que a gente precisa lutar. Vocês precisam, todas vocês, eu tenho certeza que tem acesso a internet, todos esses direitos que nós estamos reivindicando, tá lá na lei de execução penal, vocês precisam começar a ler a lei da execução penal para quando alguém dizer qualquer coisa pra vocês que não está de acordo com a lei, você responder dentro da lei. O regulamento prisional também é público na internet. Comecem a ler o regulamento prisional, vocês precisam começar. Quando vocês tiverem a certeza de que aconteceu uma violação com seu preso, vocês procurar o Ministério Público, trazer a denúncia no Ministério Público, e já na denúncia pedir a garantia de vida do seu apenado, porque aí acabou, ninguém vai encostar a mão nele mais. Perder o medo, começar a procurar, começar a denunciar, começar a não deixar, começar a contar o que acontece dentro do sistema prisional, porque ninguém faz um filho pra se tornar criminoso. No caminho da vida ele pega um atalho e para no cárcere e essa responsabilidade, ela não pode ser só nossa, metade dessa responsabilidade, ela é o Estado que não nos dá condições de criar melhor os nossos filhos, que protege meia dúzia de riquinhos, porque o pau que dá em Chico não dá em Francisco, e esse pau precisa começar a bater do lado de lá. Vamos reivindicar os nossos direitos com sabedoria e com determinação”. 

Ricardo Mezavila, cientista político

Este artigo não expressa necessariamente a opinião do Jornal GGN

2 Comentários

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  1. Apoiado.
    Sou favorável a liberação das drogas.
    A escolha entre não usar e usar é de cada um.
    Que sejam vendidas em farmácias e com impostos.
    Estes impostos seriam usados exclusivamente para bancar internações de usuários e campanhas de esclarecimento sobre o perigo das drogas.
    Os próprios usuários bancariam estas despesas.

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