As dificuldades no empreendedorismo brasileiro

Matéria relevante sobre a integração entre ciência e mercado. O mercado fechado durante décadas acomodou os empresários, que não sabem a necessidade de adquirir inovação. Eu complementaria com o buraco que há nessa “logística” de distribuição do conhecimento.

Temos o Sebrae, que se comporta semelhante a uma universidade, e talvez por isso com um pouquinho de burocracia para cumprir suas metas, o que afasta o interesse de um mercado acostumado ao informal e desburocratizado.

Há também o Endeavour, privado, cuja eficiência ou abrangência eu não conheço.

Também há as pesquisas nos laboratórios públicos, que trazem o tal problema das externalidades negativas. O público suporta o preço para apenas uma empresa levar a inovação embora.

EmfiEnfim, dobramos o número de publicações na era Lula, o que é o melhor caminho. Mas não investimos nos canais de distribuição da ciência. Aliás, ciência no Brasil é quase palavrão – associada a academicismo, teoria inútil, e por aí vai.

Posso falar pela minha experiência pessoal. Atualmente há um boom de empresas júniores nas universidades. Trabalhei algum tempo na empresa júnior de Direito Empresarial da USP. Teria de ser um canal de distribuição de conhecimento semelhante ao Sebrae, ainda que de menor porte.

O apoio da universidade consistia no empréstimo de uma sala – algo importante, mas insuficiente. Outra vantagem – sem gastar um centavo – era ter a fenomenal biblioteca da faculdade a 100 passos de distância. Havia também o apoio informal de professores. Mas informalidade é pouco. Não havia troca de conhecimento mais ampla, nem ações para multiplicar a ação daquele grupo voluntário.

Logo após eu sair da universidade parece que houve a integração das atividades em empresa júnior como créditos para abater aulas em outras matérias – bom, mas quase irrelevante sem que haja organização. Para se ter uma idéia, ouvi durante dois anos sobre a modernidade do Schumpeter – contemporâneo do Keynes – sem que se discutisse claramente suas idéias sobre o boom e a inovação.

Lembro de ter sugerido buscar uma parceria com o Sebrae para a empresa, e que foi recebida com algum espanto. Não sei a razão exata. Talvez a grandeza e o “monopólio” da marca Sebrae cause essas perdas de oportunidades que eles nem imaginam. Fazer parceria com o Sebrae talvez soe como propor negócio à Petrobrás ou ao Bill Gates. Quando o foco é o pequeno empreendedor, isso é um problema.

Terminou que alguma coisa boa foi produzida, mas dispersou-se um grupo que foi redigir petições para grandes escritórios, pesquisar para outras universidades, e labutar em órgãos públicos. Quem perdeu foi uma coletividade inconsciente de microempresários, que poderiam ter o suporte do conhecimento e inovação que aquela gente hoje dá a grandes empresas do mercado. Como essa empresa deve haver centenas pelos cursos das federais do Brasil, para aproveitar a capilaridade, ou deveria haver.

Da Folha

Brasil não transforma ciência em lucro

Segundo nova pesquisa, país investe tanto quanto Espanha ou Itália, mas não consegue inovar em tecnologia

Cientistas não saem da academia; décadas de mercado fechado teriam acomodado a iniciativa privada, diz Unesco

RICARDO MIOTO
DE SÃO PAULO

O Brasil já gasta tanto com ciência quanto a Espanha ou a Itália, mas ainda está atrás de ambas na sua capacidade de transformar esse dinheiro em resultados palpáveis.

Essa é a conclusão de um novo relatório da Unesco, que é divulgado de cinco em cinco anos. Entre 2002 e 2008, os anos utilizados como referência, o investimento em pesquisa no país passou de R$ 25,5 bilhões para R$ 32,7 bilhões.

Esse foi um dos fatores que fizeram a produção científica brasileira pular de 12 mil artigos científicos para 26 mil nesse período.

A outra causa, na opinião de Hugo Hollanders, especialista holandês em inovação que é um dos responsáveis pelo relatório da Unesco, foi a evolução da internet, especialmente da banda larga, que permitiu a difusão mais rápida do conhecimento entre os pesquisadores dos países em desenvolvimento.

“A ciência mundial era dominada por Europa, Japão e EUA, mas o mundo está se tornando gradualmente multipolar. Coreia, Brasil, China e Índia estão desenvolvendo as suas potencialidades, ainda que a África continue atrasada em relação às outras regiões”, disse Irina Bokova, diretora-geral da Unesco.

A situação asiática, porém, é melhor do que a brasileira. Hollanders lembra que “nos últimos cinco anos, muitos líderes acadêmicos americanos e europeus têm recebido convites de trabalho e vultosos orçamentos de pesquisa em universidades do Leste Asiático”.

SEM EMPRESAS
O grande problema do Brasil, porém, é escorregar na hora de tirar a pesquisa da universidade e levá-la às empresas, diz o relatório. Três quartos dos cientistas do país estão nas universidades, quase sempre públicas -nos EUA, quase 80% deles trabalham na iniciativa privada.

Existem exceções, como a pesquisa tecnológica no setor aeronáutico e no campo (o cultivo de soja e a produção de etanol, por exemplo), mas, em geral, as empresas brasileiras investem relativamente pouco em inovação.

“A falta de ousadia da maioria das indústrias brasileiras pode ser fruto de décadas de funcionamento em um mercado fechado e em meio a uma economia pouco confiável”, escrevem a quatro mãos Carlos Henrique de Brito Cruz, diretor científico da Fapesp, e Hernan Chaimovich, professor da USP.

Além disso, as empresas do país reclamam da falta de trabalhadores qualificados, especialmente em áreas ligadas à engenharia.

Isso acontece porque o país começou a investir tarde em formação avançada.

Com universidades muito jovens (a Unicamp, por exemplo, tem menos de 50 anos), o Brasil pode gastar até mais do que países europeus (com universidades mais velhas que o Brasil), mas vai precisar esperar alguns anos ainda até ter uma massa crítica de cientistas.

O consolo é que, entre a os países em desenvolvimento, o Brasil vai bem.

O resto da América Latina está cientificamente estagnado. Na África, alguns países até crescem rapidamente, como Angola e Nigéria, mas partindo de atividades pobres em pesquisa, como a mera extração de petróleo com técnicas consagradas.

Luis Nassif

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