Centenário do assassinato de Giacomo Matteotti e a luta antifascista hoje, por Arnaldo Cardoso

Matteotti se firmava como o mais combativo oponente de Mussolini, denunciando a violência política e fraudes dos fascistas e milícias

Centenário do assassinato de Giacomo Matteotti e a luta antifascista hoje

por Arnaldo Cardoso

O contexto em que se dá o 100º aniversário do assassinato do deputado italiano Giacomo Matteotti (1885-1924) marcado pela arregimentação de forças neofascistas em toda a Europa e outras partes do globo, reforça a premência da união e articulação em escala internacional de ações antifascistas, para que um século depois da chegada de Benito Mussolini ao poder na Itália, eventos similares não voltem a ocorrer, com impactos igualmente nefastos sobre todo o mundo.

Foi em 23 de abril de 1924, que o deputado socialista italiano Giacomo Matteotti chegou a Londres para angariar apoio do Partido Trabalhista inglês e de sindicatos contra o nascente regime fascista na Itália.

No Parlamento italiano, Matteotti se firmava como o mais combativo oponente de Mussolini, denunciando a violência política e fraudes perpetradas por parlamentares fascistas e milícias. Em um discurso de 30 de maio no Parlamento, Matteotti fez duras críticas aos representantes fascistas escancarando a inépcia, desonestidade e torpeza com que agiam.  Menos de dois meses depois, ele seria sequestrado e assassinado em Roma por um esquadrão fascista.

No próximo 23 de abril será realizado um seminário internacional na LSE (London School of Economics) reunindo vários estudiosos para celebrar a memória e Matteotti e debater o significado e contexto dos documentos entregues em 1926 à LSE pelo escritor e deputado socialista italiano Gaetano Salvemini (1873-1957), contendo cópias de processo sobre o sequestro e assassinato de Matteotti, com evidências da premeditação do crime e das práticas das milícias fascistas fiéis ao seu líder máximo, Mussolini.

Na época, a repercussão do assassinato de Matteotti impôs a abertura de um inquérito que, mesmo com supressão de provas e intimidações de fascistas presentes nas polícias e tribunais, foram identificados os envolvidos no crime. No entanto, quase todos foram inocentados ou receberam penas brandas depois anistiadas, em um julgamento farsesco conduzido por juízes leais ao líder fascista.

Na viagem de Matteotti a Londres, foram-lhe fornecidas provas relacionadas a um escândalo de corrupção de ministros fascistas concernente a uma concessão à empresa americana Sinclair Oil para extrair petróleo do centro e sul de Itália.

Abordando esse escândalo de corrupção, Matteotti escreveu um artigo (“Maquiavel, Mussolini e o fascismo”) que só seria publicado postumamente pela revista English Life.

Palestrantes do evento na LSE

Acadêmicos, pesquisadores, professores e escritores com trabalhos dedicados ao tema e correlatos participarão do seminário, dentre os quais: Alice Gussoni (University of Oxford), Amy King (University of Bristol), Andrea Pisauro (University of Plymouth), Gianluca Fantoni (Nottingham Trent University), Luke Cooper (London School of Economics) e Silvia Gallotti (LSE Library).

Para compreendermos a importância de se manter viva a memória sobre Giacomo Matteotti, conversamos com Andrea Pisauro, italiano que vive em Londres há mais de uma década e que é pesquisador e professor de Psicologia na Universidade de Plymouth e membro do Comitê Matteotti de Londres, do escritório de aconselhamento INCA CGIL, do Partido Democrático italiano e da associação cultural Manifesto di Londra.

Como ativista político engajado na defesa da democracia e dos direitos humanos, Pisauro sublinhou que “Matteotti merece reconhecimento global pela sua oposição intransigente a Mussolini e por sua aguda percepção das implicações do regime fascista para a democracia na Europa de então, uma vez que era indisfarçável sua natureza autoritária”.

Sustenta que ainda hoje “o legado político e moral de Matteotti oferece um exemplo poderoso de solidariedade internacionalista contra o autoritarismo que, face à ascensão nos últimos anos de partidos de extrema direita e iliberais e ao enfraquecimento dos princípios democráticos na Europa e em todo o mundo, tem grande valor e relevância”.

Diante da eleição para o Parlamento Europeu que ocorrerá em junho próximo e cujas sondagens apontam para um significativo crescimento da representação das forças de direita e extrema direita, Andrea Pisauro não esconde a apreensão, que é compartilhada por todos aqueles que lutam pela construção de um mundo mais democrático, com igualdade de direitos e justiça social para todos.

Arnaldo Francisco Cardoso, sociólogo e cientista político (PUC-SP), escritor e professor universitário.

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