EUA não sabem o que fazer com o acordo nuclear e França tem seus próprios planos

Jornal GGN – As negociações sobre o programa nuclear iraniano não serão um passeio no parque. Quarta-feira (20), em Genebra, elas serão retomadas com representantes diplomáticos de menor calibre do Irã e do P5+1 (os cinco integrantes permanentes do Conselho de Segurança da ONU – França, Estados Unidos, Reino Unido, China e Rússia – mais a Alemanha).

Enquanto isso, de acordo com artigo da revista Carta Capital, o Congresso dos EUA, o governo israelense e o da Arábia Saudita, ironicamente unidos nessa empreitada, e uma caterva de outros opositores ao acordo entre os dois campos terão tempo para apresentar novos argumentos, quiçá mais certeiros, contra Teerã.
 
A primeira rodada na Suíça – considerada ingenuamente como uma etapa definitiva – fracassou no domingo passado (10).  IO ministro do Exterior da França, Laurent Fabius, recusou-se a assinar a proposta inicial: um reator iraniano de água pesada, em Arak, produz plutônio suscetível de ser utilizado para fabricar a bomba atômica. O chanceler francês também exigiu garantias em relação à capacidade de enriquecimento de urânio, atualmente de 20%, porcentual demasiado elevado, já que pode rapidamente chegar a 90% – neste caso, suficiente para uso militar. 
 
Conclusão: a comunidade internacional representada pelo P5+1 não compartilha a mesma percepção sobre as intenções nucleares do Irã. No início, tudo parecia correr dentro dos trilhos, com o chanceler britânico, William Hague, assegurando a eminente assinatura de um acordo. Mohammad Javad Zarif, o chanceler do novo presidente iraniano, Hassan Rohani, festejou. Nunca tudo pareceu tão decisivo.
 
Após a inesperada intervenção de Fabius, teve início o “balé diplomático”. Segundo os líderes, “houve progresso, mas algumas diferenças permaneciam”. No entanto, flechadas de todos os lados revelaram que o minueto diplomático, mesmo no mais alto patamar, tem seus limites. De saída, o Líder Supremo, Ali Khamenei, o homem que realmente distribui as cartas no Irã, disparou em inglês de sua conta no Twitter que funcionários franceses têm sido hostis ao Irã nos últimos anos. A conta no Facebook do chanceler Fabius foi inundada.
 
Em visita a Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes Unidos, John Kerry finalmente se pronunciou. Quando Fabius impôs revisões do acordo, disse Kerry, Washington concordou com o chanceler francês. A história não parece ser bem essa, caso contrário Kerry teria se pronunciado já em Genebra. Incumbido por Barack Obama de consertar os fiascos no Oriente Médio, uma primeira etapa bem-sucedida em Genebra seria, pelo menos por ora, uma rara vitória para os Estados Unidos na conturbada geopolítica da região. 
 
Sem estratégia clara, Kerry acabou por mudar seu discurso ao sabor dos acontecimentos. Em Abu Dhabi, disse que o maior obstáculo em Genebra foi o fato de Zarif ter insistido sobre o “direito” do Irã de enriquecer urânio. Zarif revidou. E Kerry passou a distorcer aquilo que realmente ocorreu: a França é que se opôs ao acordo.
 
O acordo de cooperação entre o Irã e a Agência Nuclear da ONU, firmado na segunda-feira (11), é o atestado de boas intenções exibido por Zarif. O chanceler voltou a insistir que os fins do programa nuclear do país são pacíficos. Segundo o cientista político iraniano Hesam Houryaband, o processo de enriquecimento de urânio é considerado no Irã, por todos, como um “direito inalienável”.
 
A reaproximação, particularmente com Washington, teve início em junho, quando Rohani foi eleito presidente. Considerado um moderado, venceu graças, em grande parte, ao apoio de reformistas como o ex-presidente Khatami e a promessas como garantir maiores direitos civis e a libertação de presos políticos, inclusive aqueles da Revolução Verde de 2009. Rohani e Obama tiveram uma conversa telefônica histórica, a primeira entre líderes dos dois países desde 1979. Em viagem a Nova York, em setembro, Rohani conquistou simpatias ao dizer: “Trouxe paz e amizade dos iranianos aos norte-americanos”. Embora não duvide das intenções de Rohani de negociar o programa nuclear iraniano, Houryaband diz que o presidente não tem nada de moderado.
 
Em relação à questão nuclear, Rohani teria recebido carta branca de Khamenei porque o Líder Supremo confia nele. Ao contrário de Ahmadinejad, Rohani, de 64 anos, e Khamenei, de 74, são velhos amigos. Juntos depuseram o xá.
 
Por que, então, o Líder Supremo estaria hoje disposto a negociar com os EUA? O Irã quer lidar com questões internas, diz Houryaband. E o Oriente Médio atravessa mudanças. O futuro é imprevisível. Bashar al-Assad, apoiado pelo Irã através do partido libanês xiita Hezbollah, sobreviverá? Caso não fique no posto, a política expansionista do Irã, que depende da Síria, estará em xeque. O objetivo de ter primazia sobre o mundo muçulmano – nutrido pelo líder da Revolução Islâmica de 1979, o aiatolá Ruhollah Khomeini – dificilmente se concretizaria. E, é claro, Khamenei quer hoje, em troca do acordo, um arrefecimento das sanções econômicas contra o Irã.
 
Do outro lado, o chanceler Laurent Fabius percebe que é importante para a França reforçar sua influência política no Golfo Pérsico. E, por tabela, estreitar os elos comerciais com a região. Em outubro, a Arábia Saudita adquiriu seis fragatas francesas por 1 bilhão de euros. Em julho, os Emirados Árabes Unidos também pagaram 1 bilhão de euros por um sistema de defesa antiaéreo francês. E o Catar, onipresente na França, estaria interessado na compra de caças Rafale – aqueles mesmos que o Brasil esteve perto de comprar.
Redação

3 Comentários

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  1. Todos os países do mundo tem

    Todos os países do mundo tem o direito de enriquecer urânio, mesmos aqueles que assinaram o Tratado de Não Proliferação Nuclear. Escolher não fazer a bomba, não significa não desenvolver a capacidade de fazer, senão não seria escolha. No caso do Irã, um país rico em petróleo, localização estratégica e cercado de inimigos, principalmente Israel que tem a bomba e os EUA com suas bases militares e milhares de bombas (único que já usou), isso é uma questão de sobrevivência.  Mesmo que o Irã renuncie ao seu direito de denvolver as capacidades necessárias para defender sua soberania, que nesse caso significa não fazer a bomba já que é a única arma capaz de afastar a possibilidade de um ataque ou invasão, ele precisa demonstrar que em caso de agressão terá a capacidade para fazer. As grandes potências não estão prreocupados com a estabilidade do Oriente Médio, mas sim com sua hegemonia na região, caso quisessem mesmo um Oriente Médio estável um acordo seria fácil, é só Israel entregar seu arsenal nuclear, desativar as usinas usadas para desenvolver suas bombas e assinar o Tratado de Não Proliferação Nuclear, que com certeza o Irã não seria um empecilho. 

  2. É só chamar o Lula que ele

    É só chamar o Lula que ele resolverá isso rapidamente…

    Lula conseguiu fazer, em pouco tempo, o que todos estes incompetentes da Europa e dos EUA não conseguem em duzentos séculos: um acordo sério com o Irã.

    Chamem o Lula, cambada de franco-ianques imbecis!

     

  3. Na boa, os EUA/israel têm

    Na boa, os EUA/israel têm duas opções: 1) aceitar ou 2) aceitar.

    Ou eles (judeus/estadunidenses) reduzem as tensões, de maneira que garanta ao Irã a não necessidade de usar radioatividade para armas de guerra ou o Irã, não tendo outro opção de persuasão, termina logo o projeto de uso de armas nucleares e acabou (se é que já não desenvolveu).

    Não sei porque tanta discussão. Este acordo é muito mais vantajoso aos EUA/israel do que efetivamente ao Irã.

    É o inverso, o Irã é quem está cedendo.

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