O suposto esquema de Cunha para não ser visto no caixa 2 de sua campanha

Patricia Faermann
Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.
[email protected]

Cunha teria na Petrobras um complexo esquema para financiar a sua campanha eleitoral de 2010, com diversas empreiteiras e lobistas

Jornal GGN – O presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é alvo de um inquérito destinado a investigá-lo exclusivamente no Supremo Tribunal Federal. Com base nas delações premiadas do doleiro Alberto Youssef e indícios de documentos apreendidos em empreiteiras e levantados junto ao TSE, Cunha teria na Petrobras um complexo esquema de caixa 2 para financiar a sua campanha política, pelo menos de 2010, com diversas empreiteiras – UTC, Queiroz Galvão, Samsung, etc -, junto a diversos lobistas, e em duas áreas importantes da estatal (de Abastecimento e Internacional), elaborado sob cálculos para não deixar resquícios, e utilizando-se de pressão, ameaçando desbaratinar todo o esquema, em momentos de desagrado.

Em uma das constatações, Cunha teria se favorecido nas licitações para o aluguel de um navio plataforma, junto à área Internacional da Petrobras, comandada por Nestor Cerveró. Para que a Samsung vencesse o contrato, precisaria pagar uma quantia de propina a integrantes do PMDB, “notadamente o deputado federal Eduardo Cunha”, disse em depoimento, o doleiro Alberto Youssef.

O broker (quem intermediava as negociações, cargo, a priori, legal) neste acordo foi Julio Camargo, executivo da Toyo-Setal e da Mitsue. Era ele quem trabalhava para a Samsung, repassando os valores ao lobista Fernando Baiano que, segundo Youssef, representava o PMDB e o deputado Cunha junto à Petrobras.

Baiano era assim chamado Fernando Soares. De acordo com dados de Paulo Roberto Costa ao doleiro Youssef, Baiano seria o responsável por abrir o caminho de favorecimentos do PMDB com a estatal, tanto na Câmara, quanto no Senado. Teria sido graças ao PMDB, juntamente com o PP, que Paulo Roberto Costa, então diretor de Abastecimento da Petrobras, permaneceu no cargo. Assim, Costa não só garantia a propina dos contratos ao PP, como também ao partido do presidente da Câmara, e estendeu a influência aos contratos da área Internacional, por meio de Cerveró.

Segundo Youssef, Julio Camargo chegou a parar de receber a quantia da Samsung, depois que a empresa já começou a prestar os serviços, e o broker recorreu à Corte de Londres para receber as comissões que não foram pagas. Com a quebra no ciclo de repasses, Eduardo Cunha deixou de receber e, como resposta, abriu uma representação na Câmara, solicitando informações sobre as empresas de Julio: Mitsue, Toyo, junto à Petrobras. Diante da pressão, mesmo sem receber, o broker chegou a pagar um total R$ 6 milhões de reais, em espécie, por conta própria, a Baiano, durante os anos de 2012 e 2013.

Essas informações teriam sido transmitidas pelo próprio Julio Camargo ao doleiro Youssef. O doleiro, no entanto, nunca presenciou encontros do lobista Fernando Baiano com políticos do PMDB. Youssef contou, também, que pressionou Baiano, a pedido de Costa junto à Diretoria de Abastecimento, para receber os valores da Andrade Gutierrez para a campanha do PMDB de 2010. Youssef diz ter recebido da empresa três parcelas de R$ 500 mil cada.

“Embora não tenha como precisar neste momento se os valores mencionados nos termos em questão foram entregues diretamente ao Deputado Federal Eduardo Cunha, fato é que o colaborador Alberto Youssef reiterou, e com razoável detalhamento, que Eduardo Cunha era beneficiário dos recursos e que participou de procedimentos como forma de pressionar o restabelecimento do repasse dos valores que havia sido suspenso, em determinado momento, por Júlio Camargo”, escreveu o procurador-geral da República, Rodrigo Janot.

Os valores foram constatados, em forma de doação, nos comitês de campanha do PMDB e do deputado Eduardo Cunha. Também há registros de repasses do comitê do PP a Cunha. Outro indício levantado pelo MPF é que o motorista de Youssef afirmou ter levado dinheiro, “duas ou três vezes”, à residência de Cunha, ainda sem tê-lo visto e sem a certeza de ser a casa do parlamentar. Youssef negou que disse que a casa era de Cunha, mas confirmou que eram repasses das empreiteiras UTC e OAS, direcionados ao caixa 2 do PMDB.

A casa onde o motorista de Youssef enviava o montante ao PMDB

O MPF apurou e descobriu que a casa mencionada era de propriedade de Chico Reis, aliado do deputado estadual Jorge Sayeda Picciani, atual presidente do PMDB do Rio e que tem fortes ligações com Cunha. Uma planilha apreendida na empreiteira Queiroz Galvão também reitera o indício, trazendo o nome “Picciani”:

“Importante destacar, por oportuno, os vultosos valores recebidos por Eduardo Consentino da Cunha (em princípio como ‘doações oficiais’) de várias empresas que já se demonstrou estarem diretamente envolvidas na corrupção de parlamentares (especialmente em período prévio às eleições), reiterando-se que uma das formas de pagamento de propinas (anteriormente detalhado) era exatamente a realização de várias doações registradas ‘oficialmente’ aos Diretórios dos Partidos (que depois repassavam aos parlamentares)”, escreveu o procurador.

Cunha será investigado por crime de corrupção passiva qualificada. Em resposta, o deputado disse, ao Jornal da Band, não estar preocupado com as investigações. “Vamos rebater tudo porque estamos tranquilos neste processo”, afirmou.

Leia mais:
 

 

Patricia Faermann

Jornalista, pós-graduada em Estudos Internacionais pela Universidade do Chile, repórter de Política, Justiça e América Latina do GGN há 10 anos.

16 Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

  1. Já teve os seus quinze

    Já teve os seus quinze minutos de fama, de bajulação, de aplausos, de babação de ovo.

    Chegou a hora de voltar à realidade, ou seja, rumo ao xilindró que é lugar mais adequado para pessoas com o seu perfil.

    1. o lumpen parlamentar (olha o psdb) que votou nele é……

      E pode levar a bíblia, verificar antes se nela está esconidoa uma arma.

      Destes beatos o inferno está cheio e sem vagas, recusando novos candidatos.

  2. Se foi “por dentro”…

    Se foram doações devidamente formalizadas e registradas segundo a legislação eleitoral, não tem o que fazer.

    Caso contrário, todas as doações de empresas deveriam ser consideradas suspeitas.

     

     

  3. O nosso Frank Underwood…

    Pela forma como opera, Cunha é a encarnação brasileira do vilão Frank Underwood (House of Cards – Netflix). Como ele, sem que ninguém percebesse, especialmente a grande Imprensa, vai comendo pelas beiradas e pode acabar Presidente da República. Já passou da hora deste marginal levar a lição que merece; mas com essa nossa grande Imprensa familiar que aí está, obcecada em tirar o PT do Poder, e sabemos bem porque, é bem capaz dele conseguir o que seu “role model” americano conseguiu…

  4. e o resto?

    Continuo estranhando algumas ausências, digamos lacunosas, nesta lista. Além da limada que deram no Alves (PMDB-RN) e no Aécio, não consigo entender como o PP fluminense saiu-se desta. Se o PP gaúcho entrou praticamente em bloco mesmo sendo oposição odiosa ao PT, como os ex-arenistas fluminenses passaram imperceptíveis por esta investigação?

    No caso dos valores destinados aos finados Sérgio Guerra e Eduardo Campos, não há de se investigar onde foi parar esta dinheirama? Quem recebeu a partilha pode ficar tranquilo? Com a morte dos arrecadadores, os receptadores podem considerar o dinheiro como lavado?

  5. situação difícil para

    situação difícil para descobrir a trama, a verdade.

    parece que a característica de cunha é a chantagem.

    pode ter ocorrido o seguinte? : cunha faz chantagem,

    a empreiteira sente-se acuada e faz a doação legal?

    em alguns casos me parece que houve isso mesmo, sem chantagem…

    como os investigadores descobrirão a diferença entre um caso e outro?

  6. O “álibi” de Cunha

    Patrícia, há apenas uma imprecisão (ou a falta de explicitação) na narrativa da PGR sobre a extorsão a Camargo. É que Cunha, de fato, não apresentou, ele próprio, o requerimento, O fez através de uma deputada, suplente e ameaçada de cassação que ele ajudava a manter na Câmara: Solange Almeida, que reconhece dever muito a Cunha. O requerimento de Solange, de 2011 (data compatível com a retomada dos pagamentos), absolutamente genérico e envolvendo a Mitsui e Julio Camargo, está linkado no post Cunha  nega ter pressionado Mitsui com requerimento. Não, usou uma “laranja”. Está aqui

  7. Mas que “engenharia”! 
    Tudo

    Mas que “engenharia”! 

    Tudo bem: os indícios são fortíssimos de que houve mesmo a bandalheira. O problema é: como prová-las? Como já lembrou outro comentarista, se for só pela doações aos partidos que depois repassavam os recursos para os propineiros, então todas as contribuições das empresas envolvidas estarão sob suspeita. Vai todo mundo em cana, inclusive os “santos” do PSDB que receberam milhões. 

    A propósito, as doações ao PSDB, DEM etc foram à título de quê mesmo? Por patriotismo? Pela morenice de Aécio? A bela bôca do Aluysio  Nunes? O “lindo” nariz do Alckmin?

    Como o processo ainda está na inicial pode ser que surjam as “provas provadas”, ou seja, inquestionáveis de que houve corrupção.Mas que provas seriam essas? Documentais? Esse pessoal tão escovado iria colocar essas falcatruas em qualquer papel? Em meio eletrônico? Mas o quê? 

    1. Esse ponto das doações das empreiteiras não será tratado assim

      Ninguém vai levantar a tese resumida na seguinte fórmula: recebeu doações das empreiteiras, faz parte do esquema. As empreiteiras certamente doaram legalmente em algumas ocasiões. Em outras, não. A questão é quando a doação vem no lastro de outros fatos. Nisso, o PSDB não será considerado envolvido porque recebeu doação das empreiteiras envolvidas no Petrolão. Faltam os outros fatos, indicados nas delações, que sobram aos demais. Esse será o critério diferenciador entre uma doação e outra.

      O critério levará em consideração um conjunto de evidências que fazem das doações verdadeiros pagamentos de propinas, inclusive com alguns repasses descontando as comissões dos operadores, o que poderá ser rastreado e comprovado documentalmente (basta flagrar repasses dos diretórios nacionais para offshores ou empresas intermediárias de fachada, quando não pagamentos suspeitos em espécie).

      Os parlamentares deixavam as empreiteiras tomarem conta dos contratos da Petrobras em troca de uma parte das propinas, ora instrumentalizadas como pagamentos diretos aos parlamentares, ora instrumentalizados como doações de campanha. A investigação cuidará de demonstrar a origem ilícita dessas doações, os vínculos delas com o esquema de corrupção da Petrobras. Uma coisa é um político não citado na delação receber doação. Outra, muito diferente, é um político citado na delação receber doação, existindo documentos que comprovem a previsão da doação, o repasse de comissões a operadores etc. Tudo isso pode vir à tona nas investigações. Se houve esquema e má-fé, isso certamente aparecerá.

  8. Ora, os delatores (escolhidos

    Ora, os delatores (escolhidos a pão e água nos cárceres paranaenses) só delataram petistas, pobres, pu… e pretos, pelo visto. Obviamente que nenhum álvarodias seria delatado (já que assim assim com todos: doleiro, prato feito, por aí). Então a gatunagem graúda e gorda, por enquanto, está na boa, afinal, as investigações não deram em nada, por enquanto o pgr está se baseando na lábia dos delatores e em papéis que imitam o jogo do bicho. Mas, como sempre: o fato está dominado. Houvesse seriedade…

  9. Imprensa escondeu o fisiologismo como causa da eleição do Cunha!

    Não adianta a CBN com rosean kenedy e compania falar depois de verba pra viagem, construção de anexo, 10 milhoes por ano para cada parlamentar etc.

    esses jornalistas sacanas deitaram falação dizendo que ele derrotou a Dilma.

    reclamei e escrevi dizendo que quem ganhou foi o puro fisiologismos dos jovens deputados recém eleitos e quem perdeu foi o povo brasileiro.

    passaram duas semanas comemorando a eleição dele e só depois de confirmada a eleição esses jornalistas canalhas revelam o que já sabiam

  10. Se o presidente da Câmara

    Se o presidente da Câmara fosse do PT e com essas denúncias todas, como estaria agindo o PIG?

    Dr. Moro,  porque o Cunha não está preso até agora?

    Ele não tem que ser preso para confessar?

     

     

     

     

     

  11. Creio que ninguem ainda se

    Creio que ninguem ainda se deu conta de declaração ESSENCIAL dada tanto por Paulo Roberto Costa como por empreiteiro: O DINHEIRO DA PROPINA SAIU DO LUCRO DAS EMPRESAS.

    Ora, sendo assim não houve dano à Petrobrás! 

    Ora, sendo assim o Baslanço da estatal está errado!

    Ora, sendo assim o povo brasileiro “NÃO FOI ROUBADO”!

    Ora, …..E QUERO VER ALGUEM PROVAR QUE HOUVE SUPERFATURAMENTO SEM QUE HAJA DOCUMENTOS PROVANDO TAL…

Você pode fazer o Jornal GGN ser cada vez melhor.

Apoie e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.

Seja um apoiador