Queiroz e a vergonha alheia, por Wilson Luiz Müller

Queiroz é a vergonha do MPE-RJ, onde dormiu em gavetas esplêndidas a investigação do então não famoso nem poderoso motorista da República

Flávio Bolsonaro ao lado do ex-assessor Fabrício Queiroz. Foto: Reprodução/Redes sociais
Queiroz e a vergonha alheia
Por Wilson Luiz Müller *

Queiroz é o típico caso de vergonha alheia. Ele não sente vergonha de nada, e nem tanto é preciso. Outros se envergonham em seu lugar. Mais uns tantos são por ele envergonhados. Quem ainda não sente vergonha, em algum momento sentirá. E quem porventura não sentir vergonha em momento algum pelo que representa Queiroz,  é grande a chance de ter algum problema de má formação de caráter, de alienação profunda ou deformação cognitiva.

Queiroz é a vergonha do Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro – MPE/RJ. Desde janeiro de 2018 o relatório COAF (a primeira parte do inexplicável relatório fatiado do COAF) aportou entre as autoridades do órgão, onde dormiu em gavetas esplêndidas até duas semanas após a eleição de Bolsonaro, sem que ocorresse a algum doutor a ideia de dar andamento à investigação do então não famoso nem poderoso motorista da República. Depois disso, não havendo mais risco de prejuízos eleitorais para os patrões do motorista-miliciano, Queiroz foi intimado varias vezes pelos procuradores do MPE/RJ. A todas as intimações respondeu com uma solene banana. Agora o MPE/RJ não sabe como se desafazer da sua vergonha e passá-la para o colo de outrem.

Queiroz é a vergonha da Força Tarefa da Lava Jato, que, durante os preparativos da Operação Furna da Onça no Rio de Janeiro, teve que fazer vistas grossas para o relatório fatiado do COAF (de quem teria sido a genial ideia de Queiroz ali comparecer com apenas (sic!) R$ 1,2 milhão de movimentação suspeita, quando depois aparecerem relatórios complementares do COAF mostrando que a sua movimentação total tinha sido de R$ 7 milhões? Relatório COAF de R$ 7 milhões não tornaria incontornável a inclusão de Flávio Bolsonaro como alvo da operação Furna da Onça, que por sua vez não alteraria o resultado eleitoral de 2018?).

Queiroz é a vergonha do COAF, que até hoje não explicou por que, para o motorista, emitiu primeiro um relatório de R$ 1,2 milhão, para constar nos autos da operação Furna da Onça, e depois, emitiu outros relatórios para totalizar a fatura, se para os demais investigados o valor total da movimentação consta de um mesmo e único relatório.

Queiroz é a vergonha da Receita Federal, sempre tão eficiente para reter em malha centenas de milhares de pequenos contribuintes, notificados com prazo certo para irem comprovar as despesas da sua declaração de renda, mas incapaz o Leão, por velhice, covardia ou por ordem política, de fiscalizar as movimentações milionárias do motorista e seus patrões.

Queiroz é a vergonha do Supremo Tribunal Federal, que, sob o pretexto da segurança jurídica, da estabilidade e da governabilidade, acabou mandando as investigações do entorno do poderoso motorista para as calendas gregas.

Queiroz é a vergonha da justiça. Não do judiciário, apesar de ser deste também. Mas é, antes de mais nada, a falência do conceito de justiça, por desequilibrar a balança para o lado dos que operam a favor da turma do dinheiro. Para o ex-presidente Lula foram necessários 500 dias entre o início da investigação e a sua prisão. Passaram-se mais 500 dias em que ele se encontra preso, num processo que hoje o mundo inteiro sabe ter sido uma grande farsa. E agora os responsáveis e co-responsáveis pela farsa discutirão mais 500 dias como sair da farsa sem aumentar ainda mais a sua vergonha. Para o motorista-miliciano foram-se 500 dias até que se declarasse formalmente o início das investigações sobre as movimentações milionárias. Agora estão a transcorrer outros 500 dias sem que nada avance sobre o esclarecimento dos rolos. Para depois iniciar a contagem dos outros quinhentos para que os prazos transcorram para além da prescrição, e para que enfim ninguém mais fale do assunto.

Queiroz é a vergonha dos moradores dos palácios, donos ou inquilinos, por terem que acordar sobressaltados todo dia ante à possibilidade de ter sido algo mais revelado sobre Queiroz e, acordados, terem que gastar parte da energia e do poder para impedir que as autoridades responsáveis pelas investigações façam o que tem de fazer para esclarecer os fatos, porque isso seria uma tragédia capaz de interromper fabulosos negócios em andamento.

Queiroz é a vergonha dos coveiros que, obrigados a enterrar na pressa e no silêncio imposto pela escuridão medonha, frustram o direito dos entes queridos a dar o último adeus.

Queiroz é a vergonha dos abutres que, tendo que se orientar pelo cheiro de carniça vindo de todos os cantos, acabam por se confundir e não mais dão conta de chegar na hora certa para fazer o serviço certo.

Porque Queiroz deixou há tempo de ser alguém para ser apenas uma ideia. É a vergonha de termos de encarar o tamanduá cego pelo fogo da queimada amazônica, de não termos tido a capacidade de proteger a ele e a tantos outros irmãozinhos dele, indefesos, dependentes unicamente da nossa inteligência e solidariedade, aviltados pela fome e pela falta de árvores, carbonizados, corpo e alma insepultos, apodrecendo a seu aberto, para em seu lugar nascer capim, para virar cocô, para virar matéria prima para intermináveis conversas idiotizantes nos saraus palacianos.

É a vergonha de estarmos sendo liquidados enquanto nação, vendo as nossas riquezas sendo negociadas em indecentes balcões de negócios, nossa soberania sendo oferecida de forma humilhante a um presidente de país estrangeiro.

É a vergonha de todos nós que, tendo tantas coisas a fazer, tendo cada um poder para fazer muito mais, nos conformamos em ficar resmungando contra a fúria desvairada que governa nosso destino e ameaça nosso futuro.

 

*Integra o coletivo Auditores Fiscais pela Democracia (AFD)

 

Redação

7 Comentários

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  1. Os dois estados da corrupção em níveis mais degradantes agora vão ter esta guarida: há 30 anos os tucanos reinam com a ajuda dos seus engavetadores em SP; e o RJ onde o crime organizado opera com seus representantes políticos, vai se enredando com a política do esquecimento. Uma solução, talvez apenas com a elevação do nível do mar.

    1. Será que, em vez de vergonha, não seria mais realista reconhecer aí a predominância do orgulho, diante do cumprimento do dever de comparsa? Afinal, o CNMP não endossou a legitimidade do uso da gaveta (ou “pasta errada”) pelo ínclito Rodrigo de Grandis? O notável trabalho da Doutora Luciana Zafallon não comprovou que a lealdade entre comparsas é valorizada e regiamente recompensada na terra das milícias?
      https://jornalggn.com.br/justica/corregedoria-do-mpf-arquiva-apuracao-contra-de-grandis/
      Afinal o zé çerra mantém as suas vantagens intocadas e quem está condenado e preso é o Lula. As instituições estão funcionando, perfeitamente, enquanto milícias.
      https://www.youtube.com/watch?v=U3yzhHdwCsQ
      A única vergonha presente nesse caso é do contribuinte que não tem obrigação de pagar impostos para sustentar um bando de milicianos.

  2. Se juntarmos podemos fazer algo relevante quanto este assunto.
    Qual caminho? Favor orientar para que possamos escandalizar e ganhar tamanho adesão nessa causa. Pois estou achando que não iremos conseguir. Nada está acontecendo com esses meneninhos do Paraná.

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