2º maior Tribunal do Trabalho do País é acusado de negar direitos trabalhistas

Cintia Alves
Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.
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TRT-15 pagou mais de R$ 1 milhão para que duas empresas fizessem reformas em prédios públicos. Os trabalhadores que atuaram nas obras foram privados de direitos trabalhistas, mas o Tribunal se nega a ser responsável subsidiário em ações que cobram ressarcimento e indenização. Situações como essa podem se proliferar pelo País, graças a uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal
 
Foto: Denis Simas/TRT-15
 
Jornal GGN – Segundo maior Tribunal Regional do Trabalho do País, o TRT-15, que atende a região de Campinas, no interior de São Paulo, é protagonista de um enredo que, na visão do advogado Mario Henrique Ribeiro Suzigan, é a “maior contradição da história”. O órgão que julga ações trabalhistas é acusado de usar mão de obra tercerizada, em situação análoga à escravidão, e sequer poderá ser acionado na Justiça por isso, graças a uma decisão recente do Supremo Tribunal Federal.
 
Suzigan representa na Justiça, desde o início de 2016, quatro de 32 trabalhadores contratados temporariamente pelas empresas OSV Construtora e Consitec Engenharia e Tecnologia. Juntas, as empresas receberam mais de R$ 1 milhão dos cofres públicos para fazer reformas em prédios administrados pelo TRT-15, entre 2013 e 2016.
 
Segundo o advogado, esses trabalhadores foram demitidos sem pagamento de nenhum direito trabalhista e relataram, entre outros problemas, que durante as obras (tocadas com urgência a pedido do TRT-15) foram privados de descanso, alimentação adequada, convívio com a família e até de registro em carteira.
 
“Falavam para eles que não teriam direito a receber nada, perguntavam quem seria o louco de colocar um Tribunal do Trabalho no pau”, disse Suzigan. “É a maior contradição da história. Um Tribunal do Trabalho usar praticamente mão de obra, entre aspas, escrava, porque não recolheram nada e obrigavam os trabalhadores a atuar por longas horas, sem descanso nenhum, e não vão pagar nada por isso”, acrescentou na entrevista ao GGN, na segunda (3).
 
Na ação movida pelo advogado em nome do azulejista Abelardo Miguel de Azevedo, que busca ressarcimento e indenização por danos morais, o TRT-15 foi apontado como “terceira reclamada” por ter sido “beneficiária direta do serviço do reclamante”. A defesa apontou que o Tribunal deveria “responder subsidiariamente a presente ação trabalhista, em eventual condenação judicial, nos termos da Sumula 331, inciso IV e V, da TST, porque é responsável subsidiária” das empresas OSV e Consitec.
 
Mas o cenário mudou na última semana, quando o STF tomou uma decisão que vai impactar cerca de 50 mil processos.
 
Por 6 votos a 5 – num desempate patrocinado por Alexandre de Moraes – a maioria dos ministros entendeu que órgãos do Executivo, Legislativo e Judiciário só podem ser acionados em causas trabalhistas se forem comprovadas “falhas na fiscalização” que deveria ser feita em cima das empresas contratadas. (Leia mais aqui)
 
“Não tem como o Estado de qualquer forma ser responsabilizado [diante dessa decisão]. Em outras palavras, todos os juízes e funcionários do Tribunal do Trabalho da 15ª Região vão ter privadas colocadas por trabalhadores que não tiveram nenhum direito registrado, e ninguém vai pagar nada a eles”, avaliou Suzigan.
 
Para o advogado, a decisão do STF vai de encontro ao projeto de lei de terceirização. “Quem vai ser responsabilizado se a empresa terceirizada não pagar direitos trabalhistas? O STF entende que ainda que os funcionários tomem um calote das empresas, e esses funcionários tenham trabalhado para o ente público, não é mais responsabilidade do Estado pagar essas verbas trabalhistas.”
 
“Daqui para frente, o juiz vira, olha para minha cara e diz: ‘Olha, doutor, você já viu a decisão do STF. O TRT não pode mais estar no polo passivo porque ela não é obrigada a pagar. Por outro lado, as empresas falam que não têm dinheiro, que quebraram com a crise. Lamento. Vou tocando o processo, fazendo provas de que o trabalhador tinha vínculo com as empresas, que o Tribunal foi negligente, mas a responsabilidade por pagar vai recair apenas sobre as empresas que dizem que não têm mais nada no CNPJ’. É isso o que vai acontecer no final da história.”
 
MUDANÇA DE ESTRATÉGIA
 
Para conseguir que os trabalhadores sejam ressarcidos de alguma forma, o advogado disse à reportagem que a estratégia agora é mirar apenas nas empresas, constituindo título executivo do quanto é devido aos terceirizados, com valores mais baixo, e tentar aplicar em cima disso uma multa de 100%. Na prática, isso significa que os trabalhadores, se tiverem sorte, vão receber menos do que deveriam. A ação de Abelardo, na ordem dos R$ 40 mil, por exemplo, cairá pela metade.
 
As empresas, não aceitando ou cumprindo o acordo, podem sofrer um bloqueio de valores a serem recebidos por outras obras, após autorização judicial. É o caso do trabalhador Maurício Lopes da Silva, que vive a expectativa de obter uma pequena parcela de um total de R$ 128 mil que a OSV tem a receber de um projeto contratado pela Prefeitura de Lucéia.
 
OUTRO LADO
 
Procurado pelo GGN, o TRT-15 informou, por meio de assessoria de imprensa, que não fiscalizou especificamente a condição de trabalho dos funcionários que atuaram em nome da OSV e Consitec porque não se tratavam de contratos próprios de “terceirização”, mas sim “contratação por obra certa”.
 
Sem comentar a decisão do STF que beneficia os entes públicos, o Tribunal usou a Orientação Jurisprudencial 191, do Tribunal Superior do Trabalho, que estabelece que “o contrato de empreitada de construção civil entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas contraídas pelo empreiteiro, salvo sendo o dono da obra uma empresa construtora ou incorporadora.”
 
“Nesse caso específico, a precarização [dos trabalhadores das obras do TRT-15] deu-se diretamente na relação empregatícia estabelecida entre as empreiteiras e seus empregados, fato alheio à ciência desta Corte durante a execução dos serviços contratados.”
 
O TRT-15 ainda disse que “não se observa insensível ao problema apresentado”, mas sustentou que não pode agir em contrariedade às “delimitações jurisprudenciais” prescritas pelo TST e STF.
 
“Não havia qualquer vínculo entre o TRT da 15ª Região e os empregados das referidas empresas que trabalharam nas reformas, competindo a esta Corte, unicamente, a estrita fiscalização da execução da obra.”
Cintia Alves

Cintia Alves é graduada em jornalismo (2012) e pós-graduada em Gestão de Mídias Digitais (2018). Certificada em treinamento executivo para jornalistas (2023) pela Craig Newmark Graduate School of Journalism, da CUNY (The City University of New York). É editora e atua no Jornal GGN desde 2014.

10 Comentários

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  1. Está certíssimo em não

    Está certíssimo em não seresponsabilizar.

    Gente, tem de se dar alguma segurança jurídica nesse país.

    A Justiça do Trabalho é useira e vezeira de “se não tem tu vai tu mesmo”.

    Além disso os trabalhadores que ingressam na justiça do trabalho pedem tudo, mentem descaradamente, inventam horas extras, que não tiveram direito a intervalos, pedem indenização por dano moral, etc.

    Está na hora da justiça do trabalho chegar ao século 21.

    Se o Lula fosse processado por um juiz do trabalho, e não pelo Sérgio Moro, ele já teria sido enforcado, esquartejado, seu corpo salgado e seus restos mortais expostos em praça pública.

    Por que os trabalhadores não reclamaram quando da construção? Sem registro sem trabalho. Sem salario parem imediatamente.

    Justiça do trabalho é pior que tribunal de inquisição.

    1. E a solução portanto é acabar

      E a solução portanto é acabar com a justiça do trabalho para deixar os empresarios brasileiros (consistentemente incompetentes e desonestos, experiência própria) fazerem o que quiserem com os trabalhadores brasileiros? Em seguida você irá propor a volta do “pelourinho” e dos capitães do mato para ir atrás dos trabalhadores que tentarem escapar do trabalho “voluntário”?

      É por causa de escravocratas como você que o seu país continua parado na Idade Média.

      1.  
        Como se os trabalhadores

         

        Como se os trabalhadores brasileiros fossem competentes.

        Você dá a eles todos os itens de segurança, mas se algum se acidenta porque não estava usando, vão condenar a empresa porque não estava vigiando o funcionário e vendo se ele estava usando o material.

        Trabalhadores fumantes pedem para dar uma saidinha para fumar, e os trabalhadores não fumantes exigem também essa pausa mesmo não fumando.

        Ficam bravos quando o patrão não emenda feriados, mas quando o patrão diz que pode emendar mas o dia parado vai ser descontado ficam revoltadinhos.

        Quebram tudo que tocam, não tem o mínimo cuidado e respeito com as instalações e ferramentas da empresa.

        Acham que estão fazendo um favor à empresa quando trabalham e não tem o mínimo respeito por quem paga os seus salários.

        A Justiça do trabalho, então, é inominável. Deveriam mudar o nome para Injustiça do Trabalho.

    2. Brusque, vc continua repetino

      Brusque, vc continua repetino a bobajaiada de Alexandre Frota, Holydays, Kataguri, Globo, MBL etc caterva. Me poupe.

  2. Está tudo errado “traição”
    Está tudo errado “traição”! Como pode um Tribunal usar mão de obra escrava?! E incrível um idiota ainda insuflar atos Jurídicos como esse! Quem tem que entrar no século XXI é quem acha isso moderno! Quem foi prejudicado por esse ato deve procurar a imprensa e a OIT, até a imprensa internacional e denunciar isso para o mundo todo.

  3. A coisa tá séria

    Temo, como muitos, uma explosão de violência nesse país. Precisam ver as decisões absurdas que têm sido tomadas pela justiça do trabalho em Belo Horizonte. Sementes de uma revolta sendo plantadas de maneira cínica é cruel.

  4. No que deu usar mão de obra escrava sob desculpa de terceirizaçã

    No que deu usar mão de obra escrava sob desculpa de terceirização:

    Celg condenada por pagar salários diferentes para terceirizados

    iStock-522540308A Celg Distribuição S/A (Celg D) deverá pagar R$ 30 mil a cada um dos funcionários das empresas Arca Eletron e Eletrificação Ltda. e Construtora Incorporadora Santa Teresa Ltda., a título de indenização por danos morais, em razão de ter se recusado a equiparar os salários dos trabalhadores das empresas terceirizadas com aqueles pagos aos servidores da própria Companhia Energética. Em caso de descumprimento das medidas estabelecidas, a Celg terá de arcar com multa diária no valor de R$ 1 mil.

    A decisão, unânime, é da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO), tendo como relator, o desembargador Fausto Moreira Diniz. De acordo com os autos, as empresas participaram, em dezembro de 1994, do processo de licitação da Companhia Energética de Goiás – Celg, tendo por objetivo prestar serviços técnicos comerciais e de manutenção emergencial na capital e no interior de Goiás.

    Em razão de não concordarem com a planilha de cálculo do edital, entraram com ação na Justiça do Trabalho, contestando a diferença salarial entre os servidores da Celg e das terceirizadas. Embora as empresas tenham ganhado a ação, a Celg não efetuou o pagamento. Diante disso, as empresas interpuseram ação de indenização, onde foi concedida a tutela antecipada pelo juízo da comarca de Goiânia

    121213aA Celg, por sua vez, interpôs recurso, solicitando a extinção do feito na forma do artigo 269, inciso 1, do Código de Processo Civil. Após analisar os 17 volumes do processo, o desembargador Fausto Moreira Diniz reconheceu o direito de as empresas serem indenizadas, uma vez que a Celg possui diversas demandas trabalhistas. “A concessão da tutela cautelar está condicionada à presença de dois requisitos, os quais são caracterizados pela relevância dos motivos em que se assenta o pedido exordial. Diante disso, a tutela antecipada de urgência só foi concedida para evitar risco ao resultado últil do processo”, acrescentou Fausto Moreira.

    “Da detida análise do pedido e das provas constantes dos autos tenho por evidenciada a plausibilidade do direito aqui invocado capaz de assegurar o provimento acautelatório. A requerida tem a responsabilidade pelo pagamento de despesas processuais, bem como o reembolso do que já efetivamente gastaram a tal título nas ações trabalhistas apontadas nos autos”, finalizou o magistrado. Veja decisão (Texto: Acaray M. Silva – Centro de Comunicação do TJGO)

    http://tjgo.jus.br/index.php/home/imprensa/noticias/162-destaque2/14990-celg-foi-condenada-a-pagar-indenizacao-a-empresas-prestadoras-de-servico

     

     

  5. Casa de Ferreiro, espeto de pau

    Se o Tribunal não tem culpa in eligendo, deveria ter culpa in vigilando. Não?

    Façam o que eu digo, não o que eu faço.

    Esse troglodita Li de Brusque sabe o que é instrução processual? Sabe para que serve tal instituto?

    Rato Li de Brusque, você não sabia que:

    “Juridically proletarian and capitalistas are equal; but economically the worker is the serf of the capitalist . . . thereby the worker sells his person ant his liberty for a given time. The worker is in the position of a serf because this terrible threat of starvation which daily hangs over his head and over his family, will force him to accept any conditions imposed by the gainful calculations of the capitalist, the industrialist, the employer…. The worker always has the right to leave his employer, but has he the means to do so? No, he does it in order to sell himself to another employer. He is driven to it by the same hunger which forces him to sell himself to the first employer.

    The worker’s liberty . . . is only a theoretical freedom, lacking any means for its possible realization and consequently it is only a fictitious liberty, an utter falsehood. The truth is that the whole life of the worker is simply a continuous and dismaying succession of terms of serfdom – voluntary from the juridical point of view but compulsory from an economic sense – broken up by momentarily brief interludes of freedom accompanied by starvation; in other words, it is real slavery.” Bakunin

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