Dalmo de Abreu Dallari, um jurista comprometido com o seu tempo, por Rômulo Moreira

Uma perda irreparável para o ensino jurídico e para a democracia brasileira, ainda mais em tempos em que precisamos especialmente de homens e mulheres com coragem para resistir à barbárie que hoje se vê e se vivencia no Brasil

Divulgação

Dalmo de Abreu Dallari, um jurista comprometido com o seu tempo

Por Rômulo de Andrade Moreira[1]

Ontem, 08, morreu em São Paulo, aos 90 anos, um dos maiores juristas brasileiros de todos os tempos: Dalmo de Abreu Dallari, nascido em Serra Negra, no estado de São Paulo, em 31 de dezembro de 1931.

Em 1953 ingressou na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, concluindo o curso em 1957. Foi Professor Emérito da mesma faculdade, chegando ao cargo de diretor em 1986, função que exerceu até o ano de 1990, período no qual foi iniciada a construção do prédio anexo da faculdade.

Em 1963 concorreu à livre-docência em Teoria Geral do Estado e, aprovado, passou a integrar o seu corpo docente em 1964. No ano de 1974, passou a ministrar aulas no curso de pós-graduação da faculdade como professor titular de Teoria Geral do Estado.

Foram mais de 60 anos de excelência no magistério…

O Professor Dalmo Dallari também se destacou como um incansável e intransigente defensor e atuante na promoção dos direitos humanos, especialmente após o golpe militar e a instalação da ditadura.

Em 1972, ajudou a criar a Comissão Pontifícia de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, organização civil extremamente importante e ativa na defesa dos direitos humanos, prestando importante apoio jurídico a perseguidos políticos e denunciando os casos de violação ocorridos durante o período da ditadura militar no Brasil.

No ano de 1990, e até dezembro de 1992, foi secretário dos Negócios Jurídicos da Prefeitura do Município de São Paulo, na gestão da prefeita Luiza Erundina.

Sobre ele, disse o Professor Carlos Gilberto Carlotti Junior, atual reitor da Universidade de São Paulo: “O Brasil perde um de seus principais expoentes e, a USP, uma figura ímpar que ajudou a forjar esta Universidade com sua dedicação na gestão universitária e na formação de gerações de profissionais na área de Direito. Neste momento de consternação, a Reitoria se solidariza com os familiares e a comunidade acadêmica da Faculdade de Direito.”

Segundo o Professor Celso Fernandes Campilongo, diretor da Faculdade, a escola perde parte de sua história: “Perdemos um grande amigo. Dalmo sempre se dedicou a fazer o bem. Um defensor dos direitos humanos. Ele dizia, constantemente, que a construção desses direitos deveria se iniciar desde cedo. Somente assim as pessoas poderiam ter consciência do que é ser solidário e fraterno.”

Floriano de Azevedo Marques Neto, professor e ex-diretor da mesma faculdade, ressaltou o significado do professor Dallari para a história do país: “Perdemos hoje mais do que um professor sênior querido por todos e todas. A faculdade perdeu um líder e um formador de gerações de docentes e discentes. O País perde um expoente da democracia. Eu, pessoalmente, perco meu orientador, um amigo e uma referência em tudo que fiz e faço na minha vida. Alenta-nos o fato de que a partida do professor Dalmo Dallari não apaga o lugar histórico que ele tem e seguirá tendo nas Arcadas e na cena nacional.”[2]

O advogado e presidente do grupo Tortura Nunca Mais, Ariel de Castro Alves, escreveu em suas redes sociais que o Professor Dallari é o jurista dos direitos humanos mais importante da história do Brasil: “As principais previsões de Direitos Humanos da atual Constituição Federal foram idealizadas por ele. Grande defensor da democracia!”

Como se vê, uma perda irreparável para o ensino jurídico e para a democracia brasileira, ainda mais em tempos em que precisamos especialmente de homens e mulheres com coragem para resistir à barbárie que hoje se vê e se vivencia no Brasil, infestada que está a nossa terra de gente covarde, desqualificada, que debocha da tortura, que elogia os torturadores, saudosos da violência, da ditadura e dos “tempos sombrios”.

“Que mesmo no tempo mais sombrio temos o direito de esperar alguma iluminação, e que tal iluminação pode bem provir, menos das teorias e conceitos, e mais da luz incerta, bruxuleante e frequentemente fraca que alguns homens e mulheres, nas suas vidas e obras, farão brilhar em quase todas as circunstâncias e irradiarão pelo tempo que lhe foi dado na Terra.”[3]


[1] Procurador de Justiça do Ministério Público do Estado da Bahia e professor de Direito Processual Penal da Universidade Salvador – UNIFACS.

[2] Disponível em: https://jornal.usp.br/universidade/um-dos-maiores-juristas-brasileiros-dalmo-de-abreu-dallari-morre-aos-90-anos/. Acesso em 08 de abril de 2022.

[3] ARENDT, Hannah. Homens em Tempos Sombrios. São Paulo: Editora Schwarcz, 2010, p. 9.

O texto não representa necessariamente a opinião do Jornal GGN. Concorda ou tem ponto de vista diferente? Mande seu artigo para [email protected].

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